Problemas?
O céu estava mostrando que uma tempestade estava por vir. As ruas de Londres estavam frias, desertas e perigosas, naquela noite. Nas calçadas, poucos eram os que se atreviam a caminhar sozinhos. Ela estava bem agasalhada, mas não bastava. Sua respiração formava uma pequena névoa à sua frente e era quase impossível não rilhar os dentes com a baixa temperatura. Os passos eram lentos e cuidadosos e faziam um barulhinho que ela particularmente gostava de ouvir. Se ela não escutava nem as batidas do coração, então qualquer ruído parecia bom o suficiente para preencher sua audição.
Gina Weasley era uma mulher diferente. Continuava com sardas no rosto, além dos longos cabelos ruivos, e ainda era muito bonita. Porém interiormente ela mudara bastante. Adquirira maturidade antes mesmo de sair da adolescência, começara a trabalhar primeiro que a maior parte de suas amigas e administrava sua vida ainda muito jovem.
Nada disso fazia diferença para ela. Diferentemente de algumas das suas colegas de escola, Gina não estava casada, não tinha filhos, e nem tinha vontade de montar sua família tão cedo. Ela simplesmente não via necessidade de se atar a uma pessoa tão nova. A vida era longa, para quê apressar as coisas?
Entretanto agora ela precisava de companhia. Não de um homem, mas de uma amiga. Havia terminado outro relacionamento hoje e precisava de um ombro. A que estava mais próxima, neste momento era Luna Lovegood. Luna entenderia o que estava se passando com ela e provavelmente a consolaria, como sempre fizera na época em que estudavam juntas em Hogwarts.
A casa de Luna era invisível aos olhos trouxas, claro, e uma graça, na opinião de Gina. Ela sentou-se nos degraus à porta, esperando pelo momento certo para bater. As luzes da janela estavam acesas e mostravam rápidas sombras, dando-na certeza que Luna estava presente. Gina apenas temia que ela estivesse acompanhada. Enfim, bateu. Luna, que estava com os cabelos loiros molhados e usava um roupão bastante longo, não pareceu muito surpresa ao ver Gina. Sem dizer nada, ela estendeu a porta, mostrando a Gina que ela era bem-vinda. Gina sorriu, mas antes de entrar precisou abraçá-la. Luna soltou a porta, retribuindo fraternalmente.
- Terminou, não?
Gina sabia a que ela referia-se e mexeu a cabeça afirmativamente.
- Como você sabe? – disse, soltando Luna.
Luna sorriu, enquanto Gina entrava e ela fechava a porta.
- As notícias correm rápido.
Gina olhou Luna por um instante, antes de ir sentar-se num dos sofás diante da lareira. Havia comida sobre a mesinha de centro e uma baixa melodia calma era ouvida de um aparelho bruxo. Luna sentou-se no chão, recostando-se na base de uma poltrona em frente a Gina.
- Como estão as coisas no Ministério?
Gina suspirou, afundando a cabeça numa almofada que acabara de pegar. Normalmente ela falaria do trabalho, mas agora o Escritório do Uso Impróprio da Magia estava sem muitas novidades.
- Normais. – respondeu. Parou por alguns minutos, abrindo os olhos, e fitou Luna – Qual o meu problema? – perguntou de repente.
Luna, que estivera voltada à sua comida chinesa, baixou a caixinha de fast food.
- A culpa não é sua. Bruce é um idiota e você sabe disso tanto quanto eu.
Gina não estava satisfeita. Ela sentou-se no chão também, comendo um pouco do yakisoba oferecido por Luna.
- Sim, ele é. Mas... por que nunca dá certo?
- Porque você não encontrou a pessoa certa.
Luna sempre parecia confiante. O mundo poderia desabar e ela continuaria com sua expressão acolhedora, pronta para admoestá-la, sempre.
- Você soube que Rony e Hermione terminaram ontem?
- De novo? – surpreendeu-se Gina. – Isso é o quê? A décima sétima vez?
- Ela disse que é definitivo.
- E quantas vezes ela já não disse isso? – Gina falou – No final eles sempre voltam mesmo.
Não queria Ter dito aquilo. Gina viu Luna baixar os olhos, comendo em silêncio, deixando Gina desconfortável. Luna a recebera com tanto carinho e ela estragara tudo com esta observação estúpida.
- Desculpe.
- Por quê? – Luna levantou o olhar – Eu... Eu já desencanei.
Gina procurou os olhos de Luna, para uma confirmação, mas Luna estava fitando o chão novamente.
- E como vão as coisas na revista?
Luna sorriu, ainda não olhando Gina.
- Eu acho que vão me promover. Você sabe, sobre aquele furo de reportagem.
- Editora chefe? – tentou Gina.
Luna riu mais abertamente.
- Acho que sim.
Gina atravessou a curta distância que as separava e abraçou-a novamente.
- Parabéns antecipadamente.
- Obrigada antecipadamente.
**
Era sempre assim. Eles estavam brigando constantemente, mas agora a situação havia passado do limite e tomado proporções impensáveis. Não dava mais para agüentar os resmungos um do outro, as reclamações alheias e as diferenças entre ambos. Quando namoravam na escola, tudo era diferente, porém quando passaram a morar juntos as coisas tornaram-se piores. Não que eles não se gostassem, mas as manias do outro incomodavam demais e acabavam atrapalhando tudo. Rony e Hermione estavam cansados disso. Era enfadonho Ter que encontrar Rony mal-humorado por causa de algum contra-tempo no Ministério; ou Hermione, por culpa de algum problema no St. Mungus.
Afundar a cara no trabalho não seria a melhor saída, no entanto era a única coisa que poderia tirar da sua cabeça pensamentos sobre ela. Ocupar a mente com suas obrigações e tarefas, mesmo que estivesse ultrapassando o horário normal da jornada, seria a alternativa certa para esquecer o que havia ocorrido. Ele chegaria tarde e fatigado em casa, então dormiria e não lembraria de Hermione.
- É cansativo. – explicou Rony laconicamente a Harry, que estava sentado à sua frente, no Escritório de Confederação Internacional da Magia. Harry havia trazido alguns papéis a ele, do Quartel de Aurores, e Rony estivera analisando-os anteriormente – Simplesmente estressante.
Harry suspirou.
- E como é que vai ficar tudo?
Rony voltou a ler os memorandos.
- Não fica. Sabe, eu acho que eu vou viajar por algum tempo, só para esfriar a cabeça. Quer dizer, eu precisarei ir à França encontrar com o representante da Confederação Francesa para resolver algumas coisas e talvez eu fique lá por um tempo. Seria uma boa idéia?
- Sinceramente? Assim parece que você está fugindo dos problemas.
Rony olhou Harry rapidamente.
- Não há problemas.
Harry levantou as sobrancelhas, falando:
- Eu não teria tanta certeza assim---
- Qual é, Harry? – Rony disse, raivoso – Vai ficar do lado dela? Você não sabe o quão irritante Hermione pode ser, quando quer.
- Não sei, mas se você---
- Eu? Já parou para pensar que sou sempre eu? Eu pedi desculpas das últimas vezes, eu mandei várias flores e declarações para ela, eu levei-a ao restaurante para nos reconciliarmos. E o que recebo em troca? Patada da Srta-Sabe-Tudo.
Harry riu à menção de um apelido tão colegial e antigo.
- Tudo bem. Faça o que você quiser, então. – ele levantou-se, sem vontade de voltar para casa – Eu preciso voltar. Os pais de Mya chegarão hoje da Suíça.
Rony sorriu para o amigo, entre os montes de pergaminhos.
- Quem diria que Mya Monschwatz enlaçaria Harry Potter, não? Grande mulher, ela.
Harry balançou a cabeça.
- Eu sei.
Harry despediu-se, deixando Rony sozinho novamente, perdido em sua imaginação. Quando isso aconteceria com ele, sobre arranjar uma mulher que não brigasse com ele o tempo todo e que não fosse tão irritável? Ele esperava que não demorasse.
**
Draco Malfoy não havia seguido o rumo tão cobiçado pelo seu pai e, por conseguinte, não havia sido preso após a decadência de Voldemort. Ao contrário: ele havia se tornado um respeitável e conhecido Auror, que infelizmente precisava cruzar com Harry Potter de vez em quando. Eles ainda eram inimigos, eles ainda se odiavam mutuamente, eles ainda não gostavam de trabalhar juntos, porém não com a mesma intensidade como em Hogwarts. Haviam tornado-se adultos, afinal, e desentendimentos infantis não faziam parte de sua rotina. Mesmo assim, não era nada que sequer chegasse perto de uma amizade.
Há coisas que nunca mudam.
Draco continuava o mesmo mulherengo de sempre, para decepção de sua mãe, que volta e meia reclamava porque queria uma nora. Uma nora definitiva. Dizia que não queria ver seu filho gastar sua herança com uma qualquer, mas Draco verdadeiramente não ouvia. Ele lembrou-se dos comentários de sua mãe porque havia marcado um encontro com uma garota, hoje à noite, porém os planos estavam sendo estragados pelo trabalho no Quartel.
Um homem carrancudo que acabara de entrar interrompeu seus devaneios.
- Malfoy, - trovejou, com sua voz grave – eu preciso que você vá até o Escritório do Uso Impróprio de Magia e verifique a ficha de Joseph Krushon. – ele largou uma pasta abarrotada de papéis na mesa de Draco – Para agora. Já.
Murmurando milhares de maldições a Benjamim Andrews, seu chefe pelo menos por enquanto, Draco pegou a pasta e saiu de lá rapidamente, analisando os vários crimes cometidos no norte do Reino Unido e que tinham Joseph como principal suspeito.
- Ohhh. – fez uma mulher morena, de belos olhos cor-de-mel, que estava na entrada do Escritório – Malfoy, há quanto tempo não nos falamos?
Ele levantou os olhos, reconhecendo-a de algum lugar. A mulher percebeu seu olhar e adicionou:
- Não se lembra de mim? Marissa---
- Gilmore. Marissa Gilmore, é claro que me lembro de você.
Marissa pareceu exultante, enquanto Draco perguntava se ela estava trabalhando no Ministério.
- Sim, mas não neste andar. Estou fazendo um tipo de estágio no sexto.
- Hum. Sabe me dizer quem está responsável pelo Escritório, agora?
Marissa forçou a memória.
- Acho que é... Só um momentinho. – ela consultou uma planilha, e depois o relógio – Gina Weasley está atrasada.
Draco olhou o próprio relógio, bufando. Ele adentrou o Escritório, sentando-se sobre um sofá negro próximo, pensando que seu programa tinha ido totalmente por água abaixo. Marissa disse-lhe um rápido ‘tchau’, e só então Draco lembrou-se que ambos já haviam se conhecido mais intimamente. Ele estava rindo para si, quando Gina apareceu, olhando-o com estranheza, ignorando-o e indo até sua sala particular.
- Weasley. – ele seguiu-a até o escritório de Gina; muito impessoal, por sinal – Eu preciso que você me dê a ficha de Joseph Krushon.
A ruiva estava de costas para ele, virada para a lareira, e apenas pronunciou:
- Deixe... deixe a pasta aí e eu chamo você depois que já estiver tudo pronto.
A voz dela, Draco percebeu, estava ligeiramente embargada, o que indicava que talvez ela estivesse chorando. Ele levantou a sobrancelha para a hipótese porque desde que começara a trabalhar mais com Gina nunca a vira demonstrar nada além de antipatia. Draco não a conhecia para saber dizer qual seria o motivo para tanto, mas deveria ser algo bastante forte.
- Você está bem?
Gina suspirou, não virando-se.
- Não importa. Deixe a pasta de Krushon aí e depois eu chamo você.
- Ok, ok.
Ele largou a pasta na mesa, fazendo muito barulho, e então marchou até a porta, quando um ruído na lareira indicava que alguém estava ali. A voz de Luna ecoou pelo escritório e Draco abriu e fechou a porta, fingindo que havia saído.
- Está tudo bem por aí?
Gina estava entre Draco e Luna, não deixando que um visse o outro. Draco quase jogou-se no chão quando percebeu que Gina virava-se, apenas para checar a segurança do local. Ele sentiu-se ridículo, deitado no assoalho do escritório de uma Weasley. Gina arfou.
- Eu achei que teria um pouco de sossego aqui – contou – e acabei encontrando com Malfoy. Droga. Não havia nem me lembrado que teria que trabalhar quase a noite toda.
Luna fez algum barulho com a garganta, enquanto Gina puxava uma cadeira e Draco avistava seus pés.
- Pelo menos não encontrei com Bruce no caminho. – ponderou ela – Seria muito constrangedor depois de tudo.
- Gina, pelo amor de Merlin! – ralhou Luna – Ele tem que aprender a conviver com a situação desde já. Vocês terminaram, e cada um tem que seguir seu caminho.
Draco enrugou a testa. Não sabia que Gina havia terminado seu namoro com Bruce Gordin. Aliás, o que isso importava a ele? Draco não ligava mesmo para a vida de Gina, então por que ouvir a conversa desta com sua amiga?
- Okay, nós já tivemos essa conversa, não?
- Sim, sim. – Luna tossiu – Nossa, conversar por lareira é bem desconfortável. Ah, Gina, hoje você esqueceu seu cachecol aqui. Amanhã eu passo pelo Ministério e deixo por aí.
Gina meneou.
- Luna, podemos continuar mais tarde? Sei lá, a gente sai para beber alguma coisa ou qualquer coisa do tipo amanhã, mas é que agora eu preciso terminar isso que o Malfoy pediu.
Luna concordou e desapareceu um minuto depois. Nesse meio tempo, Draco já havia levantado-se e fingiu estar entrando na sala no exato instante em que Gina virava-se.
- Está pronto?
Gina olhou-o raivosamente.
- Eu não disse que avisaria? Pois bem, eu não chamei-o aqui, chamei? Portanto ainda não terminei.
Draco sentou-se na cadeira à frente da mesa de Gina.
- Então eu espero.
Gina respirou, embora não tenha resmungado mais nada. Virou-se para um armário cheio de arquivos e pastas, analisou-as, escreveu algo num anexo e entregou uma delas a Draco.
- Aqui está.
Ele leu a ficha ainda no Escritório, olhou Gina e saiu de lá.
- Depois nos falamos, Weasley.
Gina viu-o fechar a porta, aturdida, e perguntando-se se havia ouvido direito.
**
Hermione folheou a revista com selvageria. Estava com a maior cara de aborrecida e nem fazia questão de disfarçar a raiva. Ela não estava realmente lendo a revsta, porém somente o ato de quase arrancar suas páginas deixava-a mais tranqüila, de certa forma. Não se importava se a jovem ao seu lado não parecia estar aprovando sua ação. Mya Monschwatz olhava de esguelha para Hermione, calculando há quanto tempo ela estava naquele silêncio colérico e questionando-se sobre quanto mais ela ficaria daquele jeito. Ambas estavam no apartamento de Hermione, que parecia monótono e quieto, tal qual sua vizinhança. A sala onde elas se encontravam estava mal-iluminada e o fogo da lareira e de alguns candelabros formava sombras sinuosas muito sinistras, na opinião de Mya.
A ‘noiva de Harry Potter’, como as revistas a chamavam, amarrou os cabelos escorridos num rabo-de-cavalo improvisado, somente para se distrair com algo. Ela mirou o rosto contorcido de Hermione com seus olhos azuis, fazendo Hermione se inquietar no sofá.
- Não me olhe assim. – anunciou, jogando a revista para qualquer lugar e catando outra – Me deixa desconfotável.
Mya levantou-se, puxando Hermione em seguida.
- Ah, vamos lá, Hermione, você não pode ficar assim para sempre. – disse, com a voz forçada por estar puxando Hermione, que enrijecera-se de propósito.
- Assim como? – perguntou, rendendo-se e levantando-se por vontade própria.
- Você esteve brava o dia inteiro. Acha que eu não percebi?
Fingindo não ouvir a sentença de Mya, Hermione foi até a cozinha e pegou uma caixa de chocolates que havia deixado em cima da mesa.
- Não adianta fingir que não está me ouvindo, você não vai melhorar nada desse jeito. – Mya seguiu Hermione, que estava indo para a varanda do apartamento – Agora você vai agir igual uma menininha deprimida---? Hermione!
Ela, que havia acabado de jogar a caixa de chocolates pela sacada, virou-se para Mya, realizada e mais leve por dentro.
- Sim?
- Que negócio é esse de jogar coisas pela---
Mas Hermione já havia retornado ao seu apartamento, juntando outras coisas pela casa que lembravam-na de Rony.
- Você não pode simplesmente jogar as coisas que ele te deu pela janela! É irracional e não é você!
Hermione virou-se para Mya.
- Você está certa. É imaturo fazer isso. – ela sentou-se novamente no sofá, resolvendo não jogar coisas pela varanda. Estava no quinto andar e talvez pudesse atingir alguém. Não era uma possibilidade completamente nula. Ao invés, Hermione mirou o fogo da lareira e lançou os objetos, como se estivesse jogando dardos – Assim é bem melhor, não acha?
Mya pôs as mãos na cintura, exasperando-se.
- Eu não vou lhe julgar por isso – disse ela – porque você não está pensando direito. – ela pegou seu casaco e sua bolsa, que estavam jogados num outro sofá – Olha, eu preciso ir porque meus pais vão chegar hoje e eu tenho que pegá-los na Estação. Não vá incendiar o apartamento, Hermione. Mais tarde eu passo por aqui e conversamos, tudo bem?
Analisando o diálogo, parecia que Hermione era uma criança de cinco anos que não sabia distinguir o que era certo do que era errado. Hermione balançou a cabeça, observando Mya sair do apartamento.
**
A Estação Moon West estava apinhada de pessoas, que corriam de um lado para o outro, com seus carrinhos de bagagem barulhentos e espaçosos. Mesmo as plataformas mais afastadas e menos usadas estavam abarrotadas de viajantes que chegavam ou que partiam. Em meio a grande multidão, fora quase impossível Harry e Mya se encontrarem para esperar o desembarque do Sr e Sra Monschwatz. Harry esperava de todo coração que eles fossem tão agradáveis quanto Mya garantira.
Na verdade, já era para o trem da Suíça Ter chegado e o atraso deixou Mya preocupada. Harry estava tentando acalmá-la, quando ouviu uma voz firme dizer atrás de si:
- Potter, o que pensa que está fazendo aqui? – disse Michael Monschwatz, junto com a baixinha Janie Monschwatz, que parecia envergonhada pelo tom que Michael estava usando com Harry – Chegamos aqui há mais de uma hora, procurando você por toda esta droga de estação britânica e cá está o infeliz, de papinho com minha filha!!
Harry olhou o homem com surpresa. Mya tentou falar.
- Mas pai---
- ‘Mas pai’ coisa nenhuma! O que deu em vocês que não estavam nos esperando na hora combinada?
- Pai – hesitou Mya – o desembarque estava atrasado, não? Vocês não iam chegar só às oito horas?
O Sr Monschwatz fechou os olhos, ficando vermelho e inchando seu rosto imediatamente, parecendo que estava irradiando calor. Janie interveio.
- Querida, dissemos que íamos chegar às dezoito horas. Houve algum engano na carta---
- Não houve engano nenhum. – interrompeu Michael – Eles é que não sabem ler direito, Janie.
- Papai! – guinchou Mya. – Culpa sua e dessa sua letra que é um verdadeiro garrancho. – ela agarrou Harry, que até então estivera calado, e andou com ele, gritando – Se quiserem que nos sigam! Se não, podem ficar.
Harry olhou Mya, que estava com a pequena boca retorcida em um bico de irritação. Os Monschwatz seguiram ambos, e a Sra Monschwatz ficou calada todo o caminho, porém Michael ficou resmungando o tempo todo que a culpa havia sido de Harry. Harry suplicou em silêncio que Michael não fosse superprotetor e obsessivo o bastante para fazê-lo mudar de idéia quanto ao futuro casamento.
**
Gina olhou o relógio. Estava mais que tarde. Não era impossível de se imaginar que todo o resto do país dormia, exceto ela, que estivera trabalhando até agora. Superficialmente, olhou as pilhas de memorandos, fichas, pergaminhos e cia. que estavam cercando-na, quando esta preferia estar envolta por fronhas. Ela, num momento de revolta e estresse, jogou todos os documentos que estivera redigindo na mesa e deixou o escritório, sem olhar para trás.
Dirigiu-se a um barzinho que tinha ali perto do Ministério, e o qual ela provavelmente não teria ido se estivesse em seu estado normal, simplesmente pelo fato que não bebia. Sentou-se num banquinho próximo ao balcão e segurou a cabeça com as mãos, pensando em tudo o que havia acontecido ultimamente – a briga com Bruce, o fim do namoro e tudo o mais. Ela estava tentando ouvir os próprios pensamentos a despeito da alta música do bar.
- Aqui está, señorita. – disse um barman, com sotaque espanhol, pousando uma taça com uma bebida azulada em frente a Gina.
Gina enrugou a testa.
- Mas eu não pedi nada.
- Aquele homem mandou para você. – e apontou para alguém que estava sentado numa mesa ao canto do bar.
Gina gemeu ao ver Draco acenar suavemente, enquanto conversava com uma mulher que parecia estar praticamente se atirando para ele. Mesmo assim, levantou a bebida, em forma de reconhecimento, e bebeu-a quase que imperceptivelmente. Sua cabeça voltou ao assunto ‘Bruce’ e, volta e meia, ela via-se pensando em Harry, sua paixão adolescente, e que agora estava prestes a se casar com uma mulher que ela mal conhecia. Lembrou-se também de Rony e Hermione, que haviam brigado mais uma vez, e de Luna, que parecia tentar esquecer seu irmão. Quando percebeu, havia bebido muitas outras taças que não havia previsto.
- Quer dizer então que a mais nova dos Weasley é pé inchado? – era uma expressão trouxa, ele sabia, mas fora a única da qual recordara-se para tentar ridicularizar a situação.
Gina, mesmo com o efeito que o álcool estava lhe causando, notou o sarcasmo no tom de Draco Malfoy, que agora sentara-se ao seu lado, pedindo uma bebida para si.
- Cale a boca.
- Tudo bem. – defendeu-se ele – Eu não quero mesmo me meter na sua fossa pós-chute-na-bunda.
Gina olhou-o com desprezo.
- Do que você está falando? – perguntou ela um pouco alto demais.
- Ora, todos já sabem que você e Gordin terminaram o namoro.
Ela abriu a boca para falar alguma coisa, mas, pensando melhor, resolveu tomar outro gole de sua bebida.
- Desde quando você vem aqui? – indagou Gina, mostrando o barzinho em geral.
- Ah, de vez em quando, para espionar garotas imaturas que levaram um fora e tentam esquecer de tudo ficando totalmente bêbadas.
Gina suspirou, coisa que vinha fazendo muito, frente ao insulto dele.
- Primeiro, - disse, apontando um dedo que girava sem parar – eu não levei um fora. Segundo, eu não sou imatura. E terceiro, eu não estou bêbada.
Draco riu para ela, que preferiu não levar em conta sua risadinha sardônica.
- Bom, - declarou ela, abrindo a bolsa e pondo dinheiro em cima do balcão – eu vou embora porque amanhã eu ainda tenho um loooongo dia de trabalho.
Gina levantou-se rapidamente, cambaleou em seu salto alto, levemente tonta, e Draco precisou segurá-la para que ela não se espatifasse no chão.
- Ops. – falou Gina, apoiando-se em Draco.
Ele balançou a cabeça, descrente pela cena que acabara de presenciar. Nunca imaginara ver Gina, a recatada, bêbada.
- Parece que eu vou Ter que levá-la até em casa, Weasley.
Draco arrastou-a bar afora, ignorando os olhares dos homens que pareciam apreciar a visão de uma garota alcoolizada. Assim que chegaram à rua, Gina soltou-se de Draco e sentou-se na calçada, soluçando um pouco.
- Vamos, Weasley, você precisa ir para casa. – ele, ainda sóbrio, levantou-a – Você consegue ao menos me dizer como chegar à sua casa?
Gina olhou-o, dizendo um claro “Não” com a voz alterada.
- Ótimo. O que eu vou fazer com você agora?
- Sabia que seus olhos são lindos? – interrompeu Gina sonhadoramente, olhando-o de um modo diferente que ele acreditou ser efeito das bebidas.
Draco engoliu e, mesmo sabendo que ela estava fora de si, sentiu-se um tanto sem jeito pelo comentário.
- Vamos. – ele falou, pensando no único lugar que podia levá-la para passar a noite. – Vou Ter que levá-la para minha casa.
Mas havia outro problema. Como levá-la?
Draco respirou fundo, colando seus lábios nos de Gina por um breve e rápido instante, até que eles tivessem aparatado às portas da Mansão Malfoy.
**
O jantar estava muito tedioso, na opinião dele. O pior de tudo era que Harry nada podia fazer para mudar a situação. O pai de Mya estava conseguindo estragar genuinamente o humor de Harry, de Mya e, de quebra, o de Janie também. Não importava o quão boa fosse a comida, o quão interessante fosse a conversa, ou o quão saboroso fosse o vinho, Michael estava sempre reclamando. Mya olhava desesperada para Harry e ele sabia que ela estava perguntando-lhe telepaticamente quando aquilo iria terminar. Uma hora depois, no quarto dos dois, ela desculpou-se.
- Oh, eu sinto muito pelo meu pai, Harry. É só que ele ainda não se acostumou com a idéia que---
- ... Sua única filha vai se casar. Eu sei, você já disse isso.
Com uma expressão quase chorosa, Mya sentou-se em frente a ele, encarando Harry continuamente.
- Desculpe-o, Harry. Eu prometo que conversarei com papai para que ele mude o seu comportamento.
Eles ficaram um segundo em silêncio, quando Mya falou, de repente, balançando seus cabelos:
- Você acha que ele pode atrapalhar alguma coisa?
Harry não sabia se podia ser honesto ou não. Deveria, porém mesmo assim sabia que precisava falar cautelosa e evasivamente.
- O que você pensa?
Mya encarou-o e depois baixou os olhos.
- Eu espero que não. – ela juntou as mãos – Mas por favor, Harry, não se deixe levar pelos comentários pessimistas do meu pai. Acredite, se ele quiser tentar acabar com isso, ele vai tentar mesmo. E eu não quero que ele consiga, definitivamente.
Harry deu de ombros.
- E voce acha que eu quero?
- Harry Potter, - elaborou Mya, levantando-se, engatinhando na cama e beijando-o brandamente – eu espero que a resposta seja ‘Não’. Ou você está morto.
**
A cama estava macia e os lençóis confortáveis. O quarto estava silencioso e seu sono imperturbável. Gina revirou-se na cama, estendendo o braço para abraçar um travesseiro. O que apavorou-a foi abraçar uma coisa sólida – alguém. Ela abriu os olhos, temerosa, e viu que estava abraçada a---
- Minha nossa Senhora! - gritou ela, caindo da cama, completamente sobressaltada e erguendo-se em seguida.
Foi aí que ela percebeu que a cama não era familiar, o chão idem, e tampouco o quarto em si. Gina olhou toda a mobília que ocupava o lugar, aterrorizada, querendo saber como parara ali. Sua cabeça estava doendo e em sua visão dançavam algumas manchas amareladas, que estavam deixando-a tonta.
O monte de lençóis que ela abraçara estava se mexendo e de lá emergiram cabelos platinados, olhos cinzentos e um rosto pontudo conhecido. A voz arrastada era inconfundível.
- Weasley, você está doida?
Gina arregalou os olhos. Ainda usava a mesma roupa do dia anterior, apesar de estar, logicamente, descalça. Draco, entretanto, estava usando uma roupa de dormir inteiramente negra.
- O-o que e-eu estou fazendo aqui? E-e por que eu estava d-dormindo aí, c-com você?
Draco encarou-a, com a cara amassada. Mas como era possível seus cabelos continuarem impecáveis?
- A bêbada Weasley não se lembra, ahn?
Gina forçou a memória, no entanto nada veio à mente. “Bêbada Weasley”? Do que diabos ele estava falando?
- Do que você está falando? E responda rápido, pelo amor de Merlin, eu preciso de outras respostas urgentemente.
Draco sentou-se, pondo os pés para fora da cama e levantando-se.
- Não lembra de nada? – ele levantou-se, encarando uma Gina estupefata – Pois bem: ontem você bebeu além da conta, não falava nada com nada, então eu não pude levar você à sua casa---
- E ao invés disso você me trouxe para a sua casa? - bradou Gina, perdendo o controle.
- Preferia dormir na rua?
Gina, irada, pegou a primeira almofada à mão e jogou em Draco, que desviou.
- Você não tem vergonha na cara, não? Aproveitando-se de uma mulher deprimida e frágil, embebedando-a e depois levando-a à sua casa! O que mais aconteceu? – ela parou e soltou um gritinho de horror – Nós não transamos, transamos?
Draco fez uma cara pensativa e safada.
- Não tinha pensado nisso.
Ela pegou um travesseiro e lançou-o de novo.
- Seu galinha! E quem mandou me deixar na mesma cama que você?
- Olha aqui, Weasley, - começou ele, com algumas passadas alcançando-a e focando seus olhos nos dela – primeiro que esta cama é minha. Eu não vou abdicar dela por você. E segundo, - ele baixou a voz – eu estava com medo de acordá-la, então preferi deixar você aí, porque você caiu e dormiu.
Gina retorceu o rosto numa expressão de aversão completa ao que havia acontecido.
- Você podia ser um pouquinho cavalheiro, não? – desequilibrou-se – Se você fosse um homem de verdade teria dormido no chão se fosse preciso!
- Acredite em mim, você não merece todo esse sacrifício.
Ela soltou outra exclamação aguda, batendo em tudo o que podia alcançar de Draco, enquanto ele apartava, segurando os pulsos de Gina vez ou outra. Ela soltou-se dele, os cabelos mais bagunçados que nunca, mas meramente satisfeita por Ter proporcionado a ele um pouco de dor. Quem sabe assim ele aprenderia a não fazer mais nada tão audacioso quanto isso. Gina se recompôs.
- Certeza de que não aconteceu nada?
- A bêbada era você. Eu estava totalmente sóbrio e sei exatamente o que aconteceu ou não.
Levemente incomodada com o tom que ele usara para isso (como se fosse decididamente abominável qualquer tipo de relação com ela), Gina pediu que ele lhe mostrasse um banheiro, porque ela queria tomar uma ducha e ir embora logo dali.
- Como se eu quisesse que ela ficasse.
**
Distraindo-se com o cachecol de Gina e andando inadvertidamente pelos corredores do Ministério, Luna planejava interiormente o almoço que ela e Gina haviam combinado em sua casa, na noite passada. Ela tinha notado, lógico, que Gina ficara bastante balançanda pelo fim de tudo. Não que Bruce valesse sequer uma lágrima que Gina não derramara, porém era algo que envolvia a situação no geral – continuava difícil manter uma relação séria e prolongada, do tipo que Gina prezava.
Luna entrou no elevador, percebendo que apenas uma outra pessoa iria acompanhá-la no percurso. Rony levantou os olhos dos papéis que lia cuidadosamente.
- Hey, Luna. O que você está fazendo aqui?
Ele olhou-a de relance e Luna esqueceu-se o que havia ido fazer no Ministério.
- Ah, vim ver Gina. Ela esqueceu o cachecol ontem, em minha casa.
Rony fitou-a, enrugando a testa.
- Ela não dormiu na sua casa?
- Não, por quê?
Ele levantou uma sobrancelha.
- Porque hoje eu fui à casa dela, para conversar sobre algumas coisas, sabe, e ela não estava lá.
Luna deu de ombros.
- Talvez ela tenho ido dormir no apartamento de Herm---
Luna interrompeu-se, baixando o olhar para o chão. Rony fez algum movimento qualquer, sabendo que ele perdera o bem-estar. Rony ficou quieto por alguns segundos, antes de virar-se para Luna.
- Luna, você quer almoçar comigo hoje? Quer dizer, se não tiver planos para---
Fora repentino, contudo Luna já estava respondendo.
- Tudo bem. – disse, com uma nota de hesitação – Quer dizer, depende do horário, porque---
- Ah, sim. Vai ser algo lá pelas uma da tarde.
Luna balançou a cabeça, incapaz de conter um sorriso.
- Ok, então, está combinado.
Haviam chegado no quinto andar e Rony precisou voltar a Confederação Internacional de Magia. Ela evitou dar um pulinho de alegria, lembrando-se que alguém podia ver e achar que ela havia enlouquecido. Luna sabia que havia combinado primeiro com Gina, mas sua amiga entenderia. Tinha que entender que isso não era nada que acontecia o tempo todo. Ela almoçaria com Rony, hoje, e não existia nem aconteceria nada que pudesse mudar seu bom-humor. Agora, o dia que parecia Ter começado por caminhos tortuosos, mostrava uma trilha ótima que ela pretendia seguir.
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- Foi torturantemente horrível! – praguejou Mya, defronte a Hermione.
O expediente no St. Mungos ainda não havia começado literalmente, porém Hermione tinha o hábito de chegar incrivelmente adiantada ao trabalho. Mya, assim como boa parte dos seus conhecidos, sabia que nem adiantava procurá-la em casa tão cedo porque esta já deveria estar à caminho do hospital.
O consultório que ela usava para atender seus pacientes, no quarto andar, estava vazia, o que possibilitava uma conversa quase normal entre Mya e Hermione, apesar de Hermione não parar por nem um momento, ajeitando detalhes aqui e ali, organizando bastante coisas e produzindo alguns remédios para sua assistente levar ao primeiro andar.
- Ele... Ele encheu o saco o tempo todo. – continuou Mya, olhando Hermione terminar uma complexa poção que ela achava que nunca conseguiria executar – Juro que tive vontade de enforcá-lo.
Hermione tirou os olhos da poção por um terço de segundo.
- Talvez ele esteja inseguro quanto a tudo isso. Quero dizer, o casamento de vocês deve parecer meio repentino para ele, não?
- Mas não tem nada de repentino! Nós namoramos há quase dois anos e eu tenho certeza do que quero fazer, e Harry também.
- Sim, eu sei. Mas vocês tem que dar um tempo ao Sr Monschwatz para ele se acostumar com a idéia. Quando vocês se conheceram, na Academia de Aurores, você já estava separada de seus pais e conhecendo-o pelo que você fala, ele deve Ter sentido bastante sua falta.
Mya balançou a cabeça, mesmo sabendo que isso era verdade e acreditando que esse seria a razão pela superproteção do pai.
- Oh, eu espero que ele não continue assim. – finalizou Mya, mexendo a cabeça. Então ela empertigou-se, sorrindo marotamente – Mas parando de falar de mim e mudando radicalmente de assunto, como vão ficar as coisas entre você e Rony?
Mya não era o que Hermione podia chamar de amiga totalmente confidente, até porque elas só começaram a se conhecer depois que ela namorava Harry. Apesar disso, Mya já tinha total ciência do que acontecia entre Rony e Hermione e tentava, sempre que possível ajudá-los com um empurrãozinho.
- As coisas vão continuar na mesma. Nós terminamos e desta vez não vamos mais voltar.
Mya mordeu o lábio, sorrindo.
- Porque não o chama para almoçarem juntos? Sei lá, só para mostrar que serão bons amigos---
- Fora de questão. – disse Hermione – Eu tenho... muito trabalho por aqui.
Mya abriu a boca para objetar, porém Hermione interrompeu-a, olhando seu relógio.
- Falando em horário, tenho que começar a trabalhar ou então serei despedida. – Mya levantou-se, sorrindo pela fuga de Hermione – Qualquer novidade, me avise.
- Okay, okay, eu já estou indo, não precisa me empurrar. – brincou Mya.
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