Sei que me amavas...
A cada dia que passava, Laura sentia como se mil facas a ferissem. A mera certeza de que seu pai e Snape já deviam ter conversado a fazia voltar às lágrimas. Não sabia como encarar o professor quando as aulas voltassem. Lembrava-se nitidamente da última vez que o vira... Do abraço, do beijo, da rosa... Ah, a rosa... Levantou-se da cama e foi até o piano. Tirou de trás dele o livro de Poesias e abriu na página onde estava a rosa, entre Shakespeare e uma poesia que ela própria escrevera:
“Sei que me amavas e agora é tão tarde...
Sei que me amavas e agora é saudade...
Quando se ama, o final se pressente...
Se sente um frio, um vazio tão triste...
Sabes que é chegada a hora das dores...
Dores de quando se acabam os amores...
Sei que muitas coisas não direi...
Porque o tempo não retorna mais...”
Uma lágrima solitária escorreu. Guardou a rosa e em seguida, o livro. Arrumou-se e desceu, todos já haviam saído. Decidiu espairecer. Afinal, depois de quase uma semana trancada no quarto, seria bom passear um pouco. Andou pela praça, pelo parque, até que parou em frente à floricultura. Quando entrou no lugar, o dono a recebeu com um grande sorriso:
-Laura! Como vai minha querida?-Ele lhe deu um forte abraço, ela sorriu para ele.- Espere um segundo, bambina. Sei exatamente o que você quer.- Ele sumiu por uma portinha e logo apareceu novamente trazendo consigo um lindo buquê de rosas azuis. Laura sorriu para si mesma ao ver que ele não havia se esquecido. Desde pequena, ela dava rosas azuis ao avô, e isso não havia mudado depois que ele morreu. O homem deu as flores de presente à menina e ela se foi. Vagou pelas ruas até chegar no cemitério...
Foi até o túmulo de seu avô e sentou-se. Arrumou as rosas ao lado da foto de Francesco e lá ficou... De tempos em tempos, ela olhava para o céu, até que sentiu um perfume...
Aquele perfume... “Não é possível!” Olhou para trás e não havia ninguém... Mas ela reconheceria aquele perfume há quilômetros de distância. Virou-se novamente e viu apenas um vulto negro passar por entre as árvores. E aquela voz que conhecia tão bem ressoou em sua mente: “Tudo vai ficar bem. Não se preocupe.” E uma chuva fina começou a cair. Laura não entendia nada, mas levantou-se e caminhou até a saída. Ao virar-se, pôde ouvir nitidamente outra voz: “Laura, figlia mia. Non si preoccupa. Se li fida!” Não se preocupou em esconder o sorriso tímido que brotou em seu rosto, e ela soube que tinha seu porto seguro novamente. Foi embora e a chuva ainda caia mansa. Continuou andando e foi parar no lugar que mais amava no mundo. O teatro estava na penumbra. Viu o lendário piano no canto do saguão e o retrato de sua antida dona pendurado sobre a tampa. Resolveu subir até o camarim. Quando entrou, era como se a paz a tivesse tomado, esqueceu-se de tudo e apenas a voz de seu avô soprava seus ouvidos: “Laura, minha filha. Não se preocupe. Confie em você!” Ficou lá durante horas apenas pensando em como seria a vida depois que o reencontrasse. Imaginou se ele seria o mesmo depois de tudo isso. Como será que o Karkaroff reagiria se soubesse... Até que ouviu um ruído vindo da parte de baixo do teatro. E um rangido na porta, arrepiou-se, não de medo. Aprendera que lá, jamais precisava ter medo, mas viu por baixo da soleira da porta patinhas de coruja. Instintivamente, pensou ser Cléo e sua intuição não falhou. Deixou que entrasse e pousasse em seu colo, deixando que a carta caísse de seu bico. Leu.
“Figlia,
Como deve imaginar, seu professor veio até aqui e nós conversamos pacificamente. Sei que você deve estar chateada comigo, mas tudo que fiz, foi pelo seu bem. Para minha surpresa, ele não veio sozinho. Trouxe consigo o namorado, que disse que te adora. Ele disse que gosta muito de você e que a vê como uma filha, mas que iria se afastar para manter você bem. Eu pedi que não o fizesse, pois só iria fazer com que você alimentasse mágoa dele. Me pareceu que ele tem medo de conversar com você, ou alguma coisa assim. A visita dele apenas reforça o que eu já lhe disse. E tenha um pouco de paciência, pessoas assim são mais frágeis do que parecem.
Ti voglio bene,
Papà”
Permitiu-se abrir a boca. Como Karkaroff podia adora-la se não haviam trocado uma palavra sequer? “Que cínico!” Deixou mais uma lágrima escorrer, ele queria se afastar dela... “Ma che porca vacca!” Xingou baixinho e recebeu de volta uma bicada de Cléo.
Decidiu descer e ir embora, queria ver alguém e pediu a Merlin que fosse alguém que lhe desse colo. Mas pareceu que ela não tinha muito crédito com ele. No saguão do teatro estavam ninguém menos que Alvo Dumbledore, Minerva McGonagall, Igor Karkaroff e ele, Severus Snape. Parou de súbito na metade das escadas, Dumbledore sorriu ternamente e a professora McGonagall levantou-se e caminhou até a menina. Laura se desfez do estado pasmo em que se encontrava e abraçou a professora.
-Professores...-Cumprimentou a todos e recebeu respostas de todos. Snape fez uma pequena reverência com a cabeça e Karkaroff sorriu, mas seu sorriso não era verdadeiro, tampouco falso. Era um sorriso cruel, estremeceu só de lembrar que ele sabia e que a prova disso estava em seu bolso. Dumbledore se ergueu e também a abraçou.
-Mas o que faz aqui minha querida?-Perguntou a mulher.
-Eu sempre venho aqui, cresci nesse lugar e é o melhor lugar do mundo pra pensar.- O velho diretor sorriu como que entendendo tudo o que se passava naquele coraçãozinho tão frágil.
-Entendo...-Não pôde terminar, pois naquele segundo, entrou pela porta o diretor do teatro, que sorriu ao ver Laura lá, cumprimentou os outros e chamou a menina num canto. Foi só naquele momento que ela percebeu as vestes trouxas e não pôde deixar
de pensar no quanto ele ficava bonito de jeans. Snape baixou os olhos para as mãos e Karkaroff continuou olhando a menina que agora, sorria timidamente conversando com o homem negro e baixinho, até que ela deu um pulinho e o abraçou. Ela voltou trazendo consigo um sorriso que não estava estampado em seu rosto quando vira o quarteto.
-Professor Dumbledore...-Chamou.
-Sim querida.- Ela se aproximou e apresentou os homens.
-Professor Vianello, este é o professor Alvo Dumbledore.- Eles sorriram um para o outro.
-Chiquita, nós já nos conhecemos.-Laura engasgou com o apelido “carinhoso”. O olhar de Snape, que até agora se manteve neutro, escureceu de raiva ao ouvir o homem chamá-la por aquele apelido. Via-se claramente que Minerva tentava segurar o riso.
-Continuando... Professor Dumbledore, o professor Vianello foi meu professor na 5ª série.
-Então, suponho que seja um dos responsáveis pela excelente aluna que é...- Laura corou e sorriu. Lembrou-se do que havia acabado de conversar com o ex-professor.
-Ah... Professor, gostaria de lhe convidar para o espetáculo de hoje à noite.
-Ah sim, sim... O que vai fazer? Tocar?
-Na verdade não... Vou dançar...
-E apresentar um monólogo.-Cortou-a.
-É. E apresentar um monólogo. O que o senhor acha? Fica?- A expectativa era grande. O homem olhou para Minerva e para os outros dois homens sentados. Olhou novamente para a menina presenteando-a com um grande sorriso.
-Ficamos.- Foi tudo muito rápido. A professora sorria, Snape e Karkaroff fecharam a cara e Laura pensou “Era bom demais pra ser verdade.”...
-Ótimo...-Apressou-se em disfarçar.- Nos vemos à noite...- Despediu-se de todos formalmente e deu um beijo estalado na face de seu ex-professor. Se foi imaginando o que aconteceria... Pensou em falar com alguém, mas quem? Uma luz brilhou em sua mente. “Eryck!” Correu para a casa do amigo, ainda tinha tempo. Faltavam mais de três horas para se arrumar... Contou tudo, tremia só de lembrar da cara de Karkaroff. Aquele homem deveria ser exatamente o que diziam. Eryck ouvia tudo atentamente e disse que ela haveria de ter calma. Era uma teia de aranhas com nós tão delicados, que se tocasse, poderia se desfazer num piscar de olhos. Laura lembrou-se de Bella. Queria tanto saber como estava...
-Mas Laura, segundo o que você me disse, o Karkaroff é louco a tal ponto que tentou matar a Lestrange.- Disse o rapaz.
-É verdade... Ele fez um belo estrago nela, pobrezinha, estava tão ferida. Mas ela também não deixou por menos, nem andar direito, ele conseguia.
-Nunca pensei que fosse dizer isso, mas ela podia ter caprichado mais.
-Eryck!
-O que foi? Eu to mentindo?- Defendeu-se.
-Olha, eu não quero que aconteça nada a ele. Se o professor Snape está feliz, eu também estou...-Falou tentando convencer mais a si própria do que ao amigo.
-Oh. Estou vendo o quanto!-Disparou.
-Muito bem. A conversa ta muito boa, mas eu tenho que ir. Você vai?
-Ah, eu não sei... Talvez eu apareça lá.
-Tudo bem. Tchau.- Correu para casa. Tomou banho e se arrumou. Pegou sua roupa e desceu. Ao chegar na sala, lembrou-se do monólogo, subiu as escadas correndo e pegou um papel dobrado dentro de uma gaveta e saiu em disparada para o teatro.
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