Quando o incomum vira a regra

A nevasca havia piorado consideravelmente. Apesar disso, o cavalo imprimia cada vez mais velocidade, como se entendesse que a situação exigia um esforço superior ao de conduzir turistas para aproveitar a estação fria em Hertfordshire. As patas do animal que se confundia com a própria neve não afundavam entre os flocos de gelo e isso assegurava um bom desempenho, mesmo naquela tempestade tão densa.

Já fazia duas horas que Rony corria pelos campos cobertos de branco. Contudo, não havia encontrado sequer um sinal da presença de Hermione por ali. Imaginou o que poderia ter acontecido para provocar um acidente num lugar calmo como aquele, mas percebeu que seria improdutivo arriscar qualquer hipótese. O melhor era encontrar a amiga e precisava fazer isso rapidamente.

Mais alguns quilômetros se passaram e Ronald podia sentir a sua face congelando. Tinha esperança de que o próprio cavalo conseguisse encontrar um rastro invisível de onde poderia estar o outro. O tempo mostrou que ele não tinha errado. Entre um local estreito e repleto de árvores, o animal subitamente parou. Rony desceu preocupado avaliando o lugar para compreender por que havia sido levado até ele, porém não foi preciso muito trabalho. Separado por uma mínima distância de três metros, o ruivo avistou a amiga que estava deitada na neve com o peso de um cavalo negro concentrado sobre suas pernas. Desesperado, o menino correu até Hermione numa rapidez que contrastava com a sua despreocupação costumeira.

- Mione! – chamou o garoto tão logo a alcançou.

A morena tinha uma expressão de dor na face. Seu rosto estava pálido e pontilhado de flocos de neve. Mesmo assim, ela foi capaz de esboçar um sorriso para Rony que sentiu seu coração se aliviar ao vê-la consciente.

- Fica calma. Vou tirar você daqui – informou ele, entretanto ainda não tinha descoberto como fazer exatamente o que planejava.

O ruivo circulou o cavalo negro que também possuía um olhar sofrido até observar a existência de um ferimento em sua pata dianteira. Provavelmente, uma mordida. Tentou puxá-lo pelas rédeas para fazer com que levantasse, no entanto era visível a inutilidade daquele esforço.

- A varinha, Ron – sugeriu Hermione com uma voz fraca. – No primeiro ano foi você quem me lembrou de que eu era uma bruxa e não precisava usar madeira para obter fogo. Acho que sou eu quem vai recordá-lo disso agora, não é?

O ruivo buscou a situação na memória por alguns instantes. Sem querer, ele deixou escapar um meio sorriso, mas logo direcionou sua atenção ao que necessitava ser feito. Apanhou a varinha, evitando mais demora, e conjurou um feitiço simples, contudo eficiente.

- Vingardium Leviosa!

O cavalo levitou a uma altura suficiente para que Rony pudesse retirar Hermione e, pouco depois, o ruivo fez o animal pousar seguro sobre o chão. O garoto acolheu a amiga nos braços cuidadosamente, lutando contra a enorme vontade que tivera de observá-la nos olhos. Sentindo-a quase congelada, ele despiu os casacos pesados que vestia a fim de agasalhá-la melhor.

- Desse jeito você vai se resfriar – advertiu Hermione sentindo a face enrubescer um pouco ante a proximidade de Ronald.

- Não sou eu quem importa agora – respondeu o ruivo com o semblante sério. – Procura não conversar muito, está bem? Poupa suas forças. Temos uma longa viagem pela frente. - A morena anuiu com a cabeça sentindo-se mais aquecida e observou Rony procurar alguma coisa entre as vestes.

- Toma isso – o ruivo retirou a garrafa do chocolate de leite de dragão que ainda permanecia incrivelmente quente e a virou com delicadeza na boca da amiga.

Logo, o pálido do rosto de Hermione foi sendo substituído por uma cor mais viva. Ronald agradeceu aos anjos por ter tido a idéia de levar um pouco daquela bebida.

- Volto logo, está bem? Fica aqui deitada um pouco... Só vou olhar a pata do seu cavalo.

- O feitiço episkey, Ron, deve servir. Não poderei montá-lo porque o machucado é profundo, mas será o bastante para que ele consiga nos acompanhar.

Ronald foi até o cavalo negro que repousava sobre o gelo. Posicionou a varinha, concentrando-se, e conjurou o feitiço sugerido por Hermione. Um jorro de luz atingiu o local ferido na pata do animal. Rapidamente, a mordida aparentou encolher de tamanho. O garoto forçou a rédea para o alto e, dessa vez, o belo cavalo negro levantou. Tinha o cavalgar ainda lento, entretanto seria o bastante para chegar até onde precisavam.

O ruivo se voltou até Hermione, carregou-a nos braços de maneira devotada, apreensiva e a fez se sentar sobre a sela do animal saudável. Depois, cautelosamente, subiu também e então a aconchegou contra o peito, iniciando um trote rápido em direção ao centro de Hertfordshire. Pouco atrás, o outro cavalo os acompanhava.

A volta se fez mais célere do que a ida e, no caminho, Rony e Hermione sequer recordavam a briga que os tinha separado. Aquele afastamento fora dolorido para ambos. Na verdade, nenhum dos dois entendia ainda o porquê, mas agradeciam intimamente a oportunidade que estavam tendo de se manterem tão perto um do outro e, mesmo assim, em paz. Os dois nutriam um desejo secreto de que aquele sossego acolhedor durasse para sempre.

Não demorou muito e encontraram Harry e Cedrico; ambos estavam empenhados nas buscas, bem como professores e autoridades locais. Todos preferiram ir diretamente à hospedaria de Piaf. Vítor Krum já havia sido levado até lá e repousava em um dos quartos sob os cuidados de Karkaroff. O Dr. Miller também já aguardava no saguão e examinou a garota logo após a sua chegada, constatando que tudo ficaria bem.

- Realmente estranho um ataque de lobos aos cavalos de gelo – comentou o médico com a dona da hospedaria.

- Verdade, doutor... – assentiu Madame Piaf enquanto lhe servia uma xícara de chá.

- Sorte da menina que o rapaz tivesse um pouco do chocolate... não sei o que poderia ter acontecido sem isso e sem a rapidez com que ele retornou... – admitiu o Dr. Miller que passou a explicar à Professora Minerva todos os cuidados necessários ao restabelecimento de Hermione e Krum.


*****


Muitas semanas se seguiram após aquela viagem. O torneio tribruxo havia se encerrado com um desfecho trágico e os alunos, ainda abatidos com a morte prematura de Cedrico, arrumavam as malas para tornarem as suas casas. Harry não conseguira ainda articular uma palavra sobre o acontecido, contudo era evidente: o retorno de Voldemort havia deixado marcas muito maiores do que um simples medo pelos desafios que ele teria de enfrentar.

Hermione e Rony já estavam se falando, no entanto não haviam conversado ainda a respeito daquele dia em Hertfordshire. Também, nenhum dos dois teve coragem de questionar Harry acerca do acontecido no cemitério, nem o próprio Potter foi capaz de dizer a qualquer deles alguma coisa. Talvez o tempo se encarregasse disso.

No último dia que antecedia as férias, Hermione encontrou Harry sentado no salão comunal de Grifinória. O garoto tinha o olhar distante, perdido em algum lugarejo difícil de chegar. A morena colocou a mão direita sobre o ombro do amigo que virou em sua direção e agradeceu em silêncio por ela o ter trazido de volta daquele sonho acordado do qual, certamente, ele preferia não se lembrar.

- Último dia – Hermione falou carinhosamente enquanto se sentava perto de Harry.

O garoto riu da melhor maneira que conseguiu naquele instante e segurou as mãos da amiga como quem se prepara para dizer alguma coisa verdadeiramente importante.

- Último dia, Mi. Não acha que você e Rony precisam dele para esclarecer o que houve? – questionou o moreno sem perder o contato entre o olhar.

- Não quero falar de mim... não sou o tema mais adequado para hoje – resistiu a menina.

- Você é o melhor assunto de agora – Harry sorriu de forma mais desprendida. – Rony está tentando conversar com você há certo tempo. Por que não o deixa se aproximar?

- Sinceramente, não sei... Acho que...

- Está com medo do que pode ocorrer? – completou Potter.

Hermione riu da capacidade que Harry tinha de compreender algumas coisas nela com uma facilidade única.

- Bem, não tenha. Apenas permita que aconteça. Só isso – disse o garoto por fim. – Quer ir lá fora comigo? Estou precisando caminhar...

A morena aceitou o convite e eles deixaram o salão comunal rumo ao jardim. Calmamente, andaram pelo verde cativante das árvores enquanto Hermione refletia sobre aquilo que o amigo acabara de aconselhar. Era uma manhã incrivelmente bonita aquela. Os pássaros estavam mais irrequietos do que costumavam ser e uma brisa suave aliviava o leve calor, dando um clima morno e romântico ao dia.

- Ainda não agradeci ao Rony – confessou repentinamente a garota, interrompendo o silêncio que havia se instalado até então.

Antes que Harry respondesse, ouviu-se a conhecida voz de Ronald se aproximando cada vez mais.

- Harry! Harry! Eu procurei você por toda a escola... professor Dumbledore quer conversar. Está no dormitório...

- É a sua chance de dizer, Mi – Potter cochichou com a amiga e logo depois seguiu para a casa Grifinória, deixando ela e Ronald a sós.

O tempo parecia ter parado. Rony e Hermione se observavam constrangidos da própria vergonha que tinham em principiar uma conversa. Mas era preciso. O encerramento das aulas marcava também o fim de uma fase e ambos tinham ciência de que melhor seria começar algo novo sem os fantasmas do passado.

- Queria saber como você está – aventurou-se Rony. – Fiquei sinceramente muito preocupado com o que houve...

- Está tudo bem e graças a você... Realmente obrigada...

- Não mereço agradecimentos... Eu fui um grande idiota e qualquer coisa que faça ainda me deixará em débito pelo modo como agi – admitiu Ronald deixando transparecer certo embaraço.

- Não seja tão severo consigo mesmo, Rony. Fiquei magoada, mas consigo entender – disse Hermione com ternura.

- Sempre me achei pouco para você... Na verdade, sempre acreditei que você fosse demais para mim – assumiu o garoto, encarando pela primeira vez Hermione nos olhos.

- Nunca nos achamos o bastante para quem amamos, Rony, mas sempre seremos além do suficiente se formos amados – ponderou a morena com uma voz trêmula.

- Pensei que estivesse com o Krum...

- Não poderia continuar com ele... – murmurou Mione com timidez.

- Você me diria por quê? – indagou o ruivo indiretamente. – Quer dizer, se você quiser falar – acrescentou com rapidez.

- Pela mesma razão que fez você me procurar aquela noite em Hertfordshire...

A face de Rony pareceu se iluminar. O garoto se aproximou cuidadosamente de Hermione, como se estudasse a melhor forma de lhe fazer carinho. Passou a vida inteira evitando demonstrar o afeto que sentia e, agora, via-se incapaz de romper a barreira por ele mesmo edificada.

- Queria ter sido o seu primeiro beijo – acrescentou finalmente o ruivo com uma expressão encabulada e honesta.

- Eu também gostaria de ter sido a primeira para você – Hermione assumiu de forma emocionada e foi evidente que suas palavras fizeram o próprio Rony corar. - Só que não podemos apagar o passado...

- Poderíamos construir um futuro com o nosso presente – arriscou Ronald fazendo Mione sorrir. – Não seremos os primeiros de cada um, mas você poderia ser o último e único beijo que gostaria de dar daqui para frente.

A morena mordeu o lábio inferior e caminhou mais alguns passos em direção a Rony. Agora estavam muito próximos e era possível que cada um sentisse a pulsação irregular do outro. O ruivo venceu o obstáculo levando calmamente a sua mão grande até o rosto da amiga. Retirou com cuidado uma mecha do cabelo que lhe caía na face e aproximou os lábios de forma tranqüila e envolvente, sem pressa; apenas para saborear uma presença que sempre quisera tão íntima e, agora, finalmente a tinha tão próxima.

O que haveria daquela data em diante era incerto como se faz imprevisível o futuro. No entanto, existia uma certeza; a convicção de que dias incomuns - como o dia daquele beijo - tornar-se-iam mais freqüentes do que as sucessões de semanas, do que a passagem dos anos; e como essa rotina era desejada pelos dois.


Fim.


Arwen Undómiel Potter
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Agradecimentos Finais:


Meus queridos,

Realmente, sinto-me muito grata a TODOS VOCÊS nesse terceiro e último encontro! Escrever uma ficção Rony e Hermione nasceu de uma inspiração momentânea que me veio enquanto conversava com uma fantástica autora de ficções Bruh Angellore. Interessante porque não debatemos em nenhum momento sobre o shipper aqui presente, no entanto a idéia nasceu e aceitei o desafio de escrever um casal diferente daquele que marca a minha primeira ficção (“A Poção da Felicidade”). Só posso agradecer VOCÊS pela generosidade imensa em lerem, comentarem e/ou votarem e a Bruh pelos diálogos sempre primorosos e enriquecedores! Como se trata do último capítulo, gostaria que opinassem a fim de que tenha uma idéia sobre a impressão que essa fic deixou em vocês. Para tanto, eu disponibilizo também o meu e-mail: [email protected] agradecendo, desde já, aos que futuramente opinarem por aqui e/ou me escreverem via correio eletrônico! Agora vamos aos comentários finais dos comentadores:

Minha querida BRUH ANGELLORE, eu não acredito! Você por aqui? Lendo uma Rony e Hermione e gostando? Nossa, esteja certa de que fiquei mais que lisonjeada com sua presença! Estou absolutamente radiante para ser mais exata, para ser mais precisa! Agradeço com sinceridade o seu comentário, afinal de contas eu, que sou sua fã, sei que você entende como ninguém de emoções, dramas e conflitos! Beijos, minha querida, e obrigada pela presença também aqui!

JANAÍNA FERREIRA! Continuei, meu anjo! Não só continuei como encerrei também! Desde o começo, essa shortfic foi programada para se para terminar no terceiro capítulo. Espero que tenha apreciado o último! Obrigada por se fazer presente aqui! Esteja certa de que a sua presença é muito importante para mim e foi um estímulo para o cap. 3! Beijos e muito obrigada mesmo!

LETÍCIA M. KLEIN! Olá, querida! Puxa, seu comentário me deixou sem fôlego! Sério? Você não conseguiu desgrudar o olho? Nossa, fico extremamente contente em saber disso, assim como por ver que também gostou da capa! Agradeço seu carinho com a minha escrita e com essa shortfic! Espero que nos encontremos em outras ficções! Grandes beijos, Arwen.

DIBIELA querida, sinceramente agradeço por ter se feito presente já no início dessa shortfic e continuar aqui até hoje! Saiba que sua vinda me ajudou e marcou bastante! Alegra-me que tenha gostado do capítulo 2 e espero que tenha apreciado o encontro de Rony e Mi! Um super beijo para você!

ADRIANA SNAPE! Que honra! A grande autora de Deena Knocks me fazendo uma visita! Nossa! Muito obrigada, minha irmã da Família FicWriters! Fico feliz que tenha gostado do que leu por aqui e lá em “A Poção da felicidade” (assim que a betagem dela terminar, eu te passo os capítulos! Não esquecerei!). Um grande beijo para ti e para Dee, querida!

EDN! Você gostou do segundo encontro? Que maravilha, meu anjo! Quero agradecer a sua presença por aqui desde o nascimento dessa shortfic! Hoje ela se encerra, mas saiba que guardarei com carinho as lembranças dos seus comentários que tanto me alegraram! Tomara que nos encontremos em outras ficções e saiba que sua companhia nos encontros foi um prazer para mim! Um beijo especial e obrigada por tudo, Arwen.

Torno a agradecer a TODOS pela presença, pelos votos e/ou comentários! Vocês são de uma generosidade fantástica! Seja por se fazerem presentes, seja por auxiliarem com suas sempre bem vindas opiniões!

Um grande beijo em todos, fiquem com Deus, obrigada pela companhia prazerosa e até a próxima ficção,


Arwen Undómiel Potter.

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