O PACOTE

O PACOTE

Dias cansativos podem ser muito perigosos. Um dia faz você agir sem pensar, sem medo. Tudo parece tão ruim, que mais uma ou menos uma coisa péssima não faz a menor diferença. Eu tive um desses dias cansativos.

Algumas características específicas marcam dias cansativos. Eles normalmente já começam ruins, mas você ainda tem esperança que até o final do dia as coisas melhorem. Obviamente elas não melhoram...

O apogeu. Ninguém que está tendo um dia ruim deveria ficar a menos de cem quilômetros de distância da civilização até que tudo passasse. No apogeu é quando o pensamento 'Não tem como ficar pior' surge. Nós sempre descobrimos que tem como ficar pior.

Eu não sei o que aconteceu com o tempo! Começar o dia sem sol não é um bom presságio. Eu devia ter desconfiado. Eu acordei com uma chuva fina, irritante. Depois da minha descoberta, ver Tiago Potter já era uma tortura, agora ver Tiago Potter sem sol é querer me matar! É alguma coisa pessoal, ó ser divino que controla o tempo?

A minha primeira desagradável surpresa foi ver os marotos novamente no nosso lado da mesa. Acho que Potter considerou seguro sentar ao meu lado depois de eu ter chorado SOLUÇANTEMENTE na frente dele. Que vexame Lílian Evans!

Eu fui à última a chegar para tomar café. Agatha me avisou que queria encontrar Remo e simplesmente desapareceu antes que eu pudesse abrir os olhos. Eu fui recebida com um "Bom dia" por quase todos da mesa. Potter, no entanto, apenas sorriu. Ele devia estar se divertindo com isso. Afinal, ele leu o meu diário! Ele sabe que isso me deixa um tanto quanto transtornada!

Eu estava decidida a não falar com ele. De fato, a única coisa que pronunciei durante o café foi: "Passe as torradas, por favor?". Ele não pode achar nada de mais nisso, pode? O dia como um tudo passou dessa forma. Nas insuportáveis aulas de segunda feira, eu fiz estritamente o que um estudante deve fazer em aula, e durante o almoço eu fui pra a biblioteca, acabar o imenso relatório da monitoria do mês. Infelizmente, Potter havia de certa forma se controlado. Pegou apenas duas detenções. Realmente decepcionante!

Tudo começou realmente depois da última aula, trato de criaturas mágicas. Eu fui uma das primeiras a sair da sala e uma das últimas a chegar no salão comunal. Um tanto quanto ilógico? Não se você é atacada pelo ar!

Sim eu fui atacada por um ar feroz, causador de um vento avassalador. Vento que ataca pessoas inocentes, e desprevenidas. Pessoas carregando milhares de pergaminhos! Pergaminhos que voaram para o infinito! Espero que esteja satisfeito, ó ser divino que controla o tempo, por ter levado todas as minhas anotações de história da magia! Engula a revolta dos duendes! Quem precisa dela, afinal de contas?

Eu cheguei bufando no salão comunal, com mais cabelo na cara do que no topo da cabeça, e com um pedaço da minha capa rasgada. E tudo isso, porque eu, se já não fosse o bastante ter sido atacada pelo ladrão de anotações de história da magia, cai como uma pata-choca no meio do jardim.

Eu não fiz questão de encarar as pessoas que olhavam assustadas para o meu estado deplorável. Caminhei pisando fundo até Agahta, que estava sentada na poltrona próxima a lareira, e literalmente, me joguei no sofá a sua frente.

O meu corpo parecia ter entrado em greve. Do jeito que eu cai, fiquei. De barriga no sofá, certamente com pessoas me observando estranhamente, e com a cara enterrada. Pelo menos eu não tinha que ver o que se passava a minha volta. Já era o suficiente ouvir comentários como: "O que deu nela?". Pergunta pertinente. Eu respondo. Eu tive um péssimo dia, cansativo, perdi as minhas anotações e cai teatralmente.

"Lily, você está bem?". Agatha perguntou cautelosamente.

"Eu tenho cara de quem está bem?". Eu respondi, mas o som da minha voz foi abafado pelo sofá a minha frente.

"O que?". Ela perguntou, e tinha razão para isso.

Eu tenho a impressão de ter feito um esforço tremendo para virar a cabeça e a encarar. "Eu estou cansada!". Disse inutilmente. Quem ainda não havia percebido?

Nessa mesma hora o retrato da mulher gorda girou, e mais quatro adolescentes irritados entraram. Que eles se juntassem ao clube. E foi o que fizeram. Tiago, Sirius, Remo e Pedro vieram em nossa direção e começaram a se jogar, da mesma maneira que eu, nas poltronas grifinórias. No entanto, obviamente, não tinha lugar para todos. Tiago reivindicou um lugar no sofá. Eu estava deitada, ocupando dois deles.

"Lily, eu quero sentar!". Tiago pedia pela segunda vez o lugar.

"Seja lá quais forem os seus motivos para estar irritado, o meu são mais fortes. Eu mereço os dois lugares.". Eu respondi sem me dar ao trabalho de mexer um músculo sequer.

"O meu cabelo está totalmente bagunçado, me irritando profundamente, e eu não tenho que ter motivos mais fortes do que os seus para sentar.". Ele respondeu muito aborrecido. Eu o olhei como quem vai dar uma gostosa gargalhada.

"Quando o seu cabelo não está bagunçado?".

"Lílian Evans, eu quero sentar!". Ele respondeu, e eu sinceramente achei que teria um troço. Foi apenas por esse motivo que levantei a um milímetro por minuto. Eu deveria ganhar um prêmio por ter conseguido me mexer depois de um dia como aquele.

Quando eu achava que tudo não podia ficar pior, Remo me fez constatar um absolutamente desesperador fato. Eu me senti tão derrotada depois daquilo, que não me importei se estava ou não fazendo uma coisa muito sensata.

"Lily, você conseguiu acabar o relatório?". Eu, que agora estava sentada, fechei os meus olhos com um pesar. Relatório, pergaminho, anotações de história da magia, vento ladrão. Não! Eu mal conseguia acreditar que o relatório que havia me tomado quase todo o mês, cheio de anotações minuciosas, havia sido levado pelo ser divino que controla o tempo. Divino não! Infernal!

"Remo.". Eu comecei quase sem voz. "O vento levou.".

"Vento, que vento?". Ele parecia mesmo confuso;

"Como assim, que vento?". Eu perguntei muito irritada. Duvido muito que alguém não tenha notado o furacão que passou por Hogwarts.

"Por favor, não me diga que você perdeu...". Ele estava com um tom de voz 'é só isso que faltava'.

"Eu não consegui segurar. O vento levou tudo! Relatório, anotações de história da magia!". Sem perceber eu fiz uma das coisas mais imperceptíveis para o meu cérebro. Eu simplesmente voltei a deitar, como se Potter não estivesse lá. Entretanto, ele estava, o que me obrigou a deitar, apoiando a minha cabeça no colo dele. Por um momento ele se assustou, mas como se tudo aquilo fosse muito normal, ele começou a passar a mão no meu cabelo.

"Perder anotações da história da magia é realmente um desastre.". Sirius comentou. "Você faz um esforço enorme para ficar acordado naquela aula, e depois simplesmente perde tudo.".

"Não me lembre disso.". Eu pedi como quem implorava.

"Você pode pegar a minha se quiser, Lily.". Agatha logo se pronunciou, e recebeu pedido de todos os marotos, inclusive Remo. Aquilo me assustou.

"Bem". Lupin se dirigiu a mim. "Esse mês será um presente. Eu não vou refazer o relatório, e nem você.". Ele concluiu surpreendendo-me novamente.

"Tudo bem.". Eu respondi, mas confesso que já estava me sentindo meio desorientada depois de cinco minutos deitada no colo de Potter. "Tiago só tinha pegado duas detenções mesmo.".

Ele foi a primeira pessoa que riu depois de meia hora encarando apenas faces emburradas. Isso me despertou. Eu estava deitada no colo de Tiago Potter, e me sentia muito bem por isso. Tão bem, que por mais que eu mandasse o meu corpo para com esse tipo de atrevimento, ele não me obedecia.

Depois de alguns minutos em que todos os marotos, eu e Agatha estávamos em silêncio, Remo levantou-se, assustando a todos. Como se fosse pedir de mais avisar quando fosse tomar essas atitudes bruscas. A consideração pelo susto dos corações alheios anda mínima.

"Eu acho que vou dormir.". Ele disse já caminhando para as escadas que davam no dormitório masculino.

Logo em seguida Agatha também levantou, também sem consideração se eu iria ou não me assustar.

"Eu também vou.". Ela disse. "Lily?". Eu balancei a cabeça negativamente. Qual era o meu problema? Eu apenas vi Tiago sorrindo satisfeito, e Sirius e Pedro marotamente. Sem ao menos comunicar que estavam partindo, os dois se distanciaram.

Tiago continuou a passar a mão delicadamente no meu cabelo. Eu sinceramente nem sentia mais. Já havia fechado os meus olhos, e apenas contemplava o momento. Eu estava me sentindo embalada, quando Tiago falou: "Lily, eu não quero ser rude, mas também estou com sono.". É claro, eu estava em cima dele.

Virei-me de barriga para o ar para que pudesse o encara. Sorri. E manhosamente consegui sentar, enquanto murmurava um "Desculpa.". Ele não disse nada, apenas me livrou de algumas mechar do me cabelo que insistiam em cair sobre os meus olhos, e ficou me contemplando por um longo tempo.

"O que foi?". Eu perguntei quando já não conseguia mais sustentar o silêncio.

"Você é teimosa, sabia?".

O que isso tinha haver afinal com qualquer coisa daquele momento? Eu, pelo menos, devia estar pensando em outra coisa. Para falar a verdade, eu não lembro de ter conseguido pensar.

"Porque isso agora?". Eu perguntei meio rindo.

"Você demorou tanto para admitir Lily.". Ele logo respondeu, e eu começava a entender. Admitir que eu o amava? É eu demorei, mas quem pode me culpar? Tiago não foi exatamente legal todo o tempo, é meio difícil perceber esse tipo de coisa seja qual for à situação.

"Eu estou ouvindo isso do Sr. Persistência em pessoa?".

Tiago riu e passou a mão automaticamente em seu cabelo. No meio do ato, no entanto, ele parou e me olhou cauteloso.

"Não vai reclamar?". Sem dúvida a pergunta se referia ao constante hábito dele passar a mão em seus cabelos, e incrivelmente eu não me irritei.

"Não.".

"O que foi?". Ele perguntou desconfiado.

"Sabe.". Eu fiz uma pausa. "Até que é charmoso.".

Ele sorriu, e se aproximou perigosamente de mim. Ao contrário da outras vezes, que eu mal vi quando ele me envolveu, ele fez questão de passar com uma tortuosa demora as mãos ao redor da minha cintura. E diferentemente das outras vezes, eu o beijei.

"É eu sei.". Tiago respondeu depois que nos soltamos, e eu levei alguns segundos para conectar os neurônios.

"Você não muda.". Eu disse zombeteiramente.

"Mudar o que?". Ele parecia estar se fazendo de desentendido, mas segundos depois eu vi que o caso era de excesso de confiança. "Uma vez eu lhe disse, Lily, que só devemos mudar se for para melhor. E bem, o que eu tenho para mudar?".

Eu ri, e não respondi àquela pergunta. Tiago é assim, e é dessa forma que eu descobri que o amava. Sem tirar nem por. Com todos os defeitos e mania de auto-glorificação, eu gosto de Tiago. E ele gosta de mim, apesar dos meus dramas e falta de delicadeza em certas situações. Afinal, não posso selecionas as torradas assim como Agatha faz no café da manhã. O pacote inclui todo o qualquer tipo de particularidade. Ele é indivisível, e possessivamente falando, meu.

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