HESITAÇÃO



Eu e minha grande boca! Quando a minha voz traidora não falha, ela fala demais. Desta vez, no entanto, ela conseguiu superar qualquer limite. Tudo bem ela falhar em frente ao Potter, eu já estou me acostumando com isso, mas ela decidiu tomar a dianteira perante as decisões da minha vida. Isso é inadmissível! Não estou dizendo que estou presa a decisão que ela tomou, porque Potter entendeu as circunstancias, mas de qualquer forma, sem consultar o meu cérebro - igualmente traidor - ela simplesmente foi falando, como se estivesse autorizada a isso.
Se as partes do meu corpo continuarem a me trair desse jeito, só há um fim que eu posso imaginar. Um fim completamente desastroso. Para falar a verdade, eu nem gosto de pensar sobre isso, porque certamente eu saberei controlar a situarão, e não deixarei ela chegar nesse ponto lamentável.
Tudo começou na manhã de segunda feira, após aquele dia desastroso, em que os marotos mais a Agatha armaram aquela espécie de complô e argumentaram dez razões do porque eu deveria ser mais simpática com Tiago. Sinceramente? Eu nunca pensei em ser realmente mais amigável, mas, aparentemente, alguma parte dentro de mim levou aquelas dez razões muito a sério, porque logo no dia seguinte eu me peguei até sorrindo para ele. Realmente terrível. Mas nada se compara a minha atitude no final da tarde, depois da última aula (Defesa Contra as Artes das Trevas). Provavelmente foi uma armação muito bem articulada entre o meu cérebro e a minha voz.
Eu acordei bem mais animada do que achava que estaria e do que deveria. Logo percebi que estava sozinha. Todas as outras garotas, inclusive Agatha, já tinham descido para o café. Eu me lembro de ter pensado em ralhar com ela por não ter me esperado.
Agradecendo ao tempo por estar fazendo sol, eu desci, animada, as escadarias que levam ao salão comunal da Grifinória. Já estava praticamente fora quando notei uma figurinha, que parecia estar muito concentrada em um livro. Sentada na poltrona mais próxima a lareira, - que essa hora estava apagada. - Agatha fechava cada vez mais os olhos na tentativa de enxergar as letras já gastas de um livro de criaturas mágicas. Involuntariamente, eu procurei trazer o meu calendário de provas do fundo da minha memória. Criaturas, mágicas, criaturas mágicas... nós não tínhamos prova. Eu não podia ter esquecido de anotar, podia?
"Agatha?". Ela fechou o livro com tamanha rapidez e brutalidade, que uma grande porção de poeira flutuou e foi iluminada pelos raios solares, que entravam pelas janelas do salão.
"Lily!". Ela disse parecendo aliviada. "Nunca mais me dê um susto desses!".
"O que você está fazendo?". Eu perguntei muito desconfiada daquele comportamento atípico.
"Estudando. Péssima em criaturas mágicas. Café?! Estou morrendo de fome. Acho que hoje vou comer umas duas torradas a mais.". Ela mudou de assunto, ou foi só impressão minha? Eu resolvi não fazer mais perguntas, mas eu não precisava pensar muito para saber que ela estava me escondendo algo.
Caminhamos até o salão comunal com Agatha falando mais do que a boca. Acho que ela estava tentando não me fazer falar, caso eu resolvesse fazer perguntas desconfortáveis.
Assim que sentamos no lugar de costume, Agatha começou a escolhera suas torradas, e eu me servi de um pedaço de bolo. Olhei para cima e sorrir diante de um céu completamente azul. Entretanto quando baixei meus olhos, uma tempestade parecia ter se formado. O que os marotos estavam fazendo nessa parte da mesa? Porque os marotos estavam sentando ao nosso lado? Porque Potter tinha que sentar ao meu lado?
"Resolvemos que de agora em diante vamos tomar café com vocês.". Black começou. Como se eu não estivesse notando esse pequeno detalhe. Além do mais, um holofote parecia ter se acendido em cima da minha cabeça, e da de Agatha, porque muitas cabeças do salão começaram a virar em nossa direção.
"Afinal...". Eu me virei para olhar Tiago. Ele interrompeu o que estava dizendo e sorriu brevemente. E como se os músculos da minha face tivessem recebido uma ordem para contraírem-se, eu sorri de volta. Um sorriso tímido, mas mesmo assim um sorriso. Socorro!!! Tiago, eu notei, ficou espantado com essa minha atitude, e como se aquilo já não tivesse sido o suficiente, ele sorriu novamente, daquele jeito perturbado, que faz os seus olhos se iluminarem e uma vozinha dentro de mim gritar: "Pare de se atormentar com isso Lílian Evans!". Ele tem olhos castanho-esverdeados. "Afinal...". Ele voltou a falar. "A Agatha é namorada do Remo e a Lily prometeu não brigar mais tanto comigo."
"Faz sentido.". Agatha respondeu, Remo sorriu, Tiago passou a mão em seu cabelo (Francamente!), Sirius parecia estar olhando para a mesa da Corvinal, Pedro comia com vontade todas as torradas da mesa e apenas eu parecia estar insatisfeita, pois olhei Agatha com cara de 'Como assim faz sentido, Agatha?'. Ela, no entanto, se notou isso não demonstrou, pois começou a disputar com Pedro as torradas. O que estava acontecendo? Desde quando era normal os marotos decidirem sentar do nosso lado da mesa? O que eu perdi?
Eu sinceramente estava atordoada com toda aquela situação. Os marotos tomavam café como se todo dia invadissem espaços de mesas alheias. Eu estava tão distraída que quando Tiago começou uma conversa, fiquei tão assustada que respondi.
"Então Lily, preparada para o sábado?".
"Claro.". Entretanto para mim nada estava claro. Sábado? O que tinha no sábado? Foi com um grande choque que eu me lembrei de Hogsmead. Eu tinha dito "claro"?
"Então você vai mesmo?". Ele demonstrava um misto de surpresa e excitação. Eu tive uma idéia genial para não responder novamente. Apenas pequei e mordi a primeira torrada que vi pela frente (recebi olhares furiosos de Agatha e Pedro, que aparentemente estavam disputando aquela torrada especificamente), e concordei com a cabeça, espiando o sorriso de Tiago pelo canto do olho.
"Bem...". Sirius entrou na nossa conversa. "Eu já tenho tudo preparado para Hogsmead.". Ele sorriu marotamente e indicou com a cabeça uma garota sentada na mesa da Corvinal. De longe, eu só pude identificar o liso, longo cabelo preto da corvinal.
"Belle?". Tiago riu divertido. (Como eu não desconfiei que Tiago a conhecia?) "Como você, afinal, consegui essa façanha?".
"Esse tipo de segredo a gente não revela em público.". Sirius zombou.
"Eu sei como ele conseguiu!". Foi a vez de Remo entrar na conversa. Ele não parecia estar com cara de quem estava disposto a guardar esse segredo do 'público'.
"Como?". Tiago perguntou.
"Ele usou aquele dote canino dele.". Tiago riu de tal forma que eu deu um pulo da cadeira.
"Aluado!". Sirius exclamou bravo.
"Por favor Belle!". Remo imitou o que eu imagino ter sido a voz e cara de Sirius convidando a garota. Cara de cachorro abandonado. Eu não pude deixar de sorrir.
"Sinceramente Almofadinhas, eu pensei que você fosse superar o meu record!".
"Caro Pontas, o seu record é realmente inatingível!".
"Que record?". Agatha perguntou o que estava na ponta da minha língua.
"De 'nãos'.". Remo respondeu. "Tiago recebeu 57 da Lily, e Sirius 32 da Belle.". Eu sinceramente simpatizei com a garota mesmo antes de a conhecer.
"Aula!". Sirius berrou muito irritado. "Rabicho, solta a torrada. Pontas, Aluado, vamos!". E foi ai que Tiago fez aquilo mais uma vez. Ele se despediu de mim com um beijo na bochecha, e disse: "Nos vemos, Lily.", sorriu de modo perturbador e saiu do salão rindo de um Sirius que o atacava com alguns livros.
"Sinceramente, o que tem nele, que só fica me beijando?". Agatha não se deu ao trabalho de responder, apenas me olhou com cara de 'É realmente um segredo guardado a sete chaves. Ninguém nem desconfia'.
Como se uma felicidade esquisita tivesse se apoderado de mim, o meu dia foi estranhamente encantador. Deve ter sido por estar sol. Sempre deixa as pessoas mais felizes. No entanto, no final na tarde, como se de repente furacão passasse por Hogwarts, a minha conjuntura mudou. Eu saí irritada da última aula por estar ouvindo uma gritaria sem fim no corredor. "Cale a boca, Potter". Eu tremi, de novo não!
"Retire o que você disse, Seboso.". Uma risada, um feitiço.
Lupin que estava perto da briga, tentava em vão fazer Tiago se acalmar. Eu tinha que fazer alguma coisa.
"Parem!". Ninguém parecia ter me escutado "Parem! PAREM!". Mais uma vez fui ignorada. E simplesmente não poderia continuar a acontecer. Era hora de apelar para medidas drásticas. "Petrificus Totalus! Petrificus Totalus!".
Eu respirei descompassado. Eu tinha enfeitiçado Tiago Potter? Eu olhei para Lupin, e ele também parecia desconcertado. Depois eu olhei para Snape, igualmente petrificado. Eu me virei novamente para Tiago, e corri em sua direção, ajoelhe-me ao seu lado e murmurei "Finite Incantaten...". Tiago "acordou" prontamente, ele me olhou confuso, e depois sorriu.
"Você está bem?". Eu perguntei receosa. Ele olhou para si próprio e depois para mim. Envergonhada, eu percebi que estava quase, literalmente, em cima dele. Ele sorriu mais uma vez e respondeu: "Claro!".
"Certo.". Eu disse ainda sem graça. Me levantei, caminhei até Snape. "Finite Incantaten!". Snape "acordou" agitado. Nunca vi alguém se colocar em pé com tamanha rapidez. Ele já estava caminhando na direção de Tiago com a varinha empunho, quando eu o interrompi, me colocando entre ele e Tiago, e apontei a minha varinha para o peito de Snape. "Você nem pense nisso.". Ele ainda me encarou por alguns segundos, deu dois passos para trás, guardou calmamente a varinha em suas vestes, e riu falsamente. "Namoradinha, Potter?". Tiago se irritou verdadeiramente com aquela pergunta. Ele estava decidido a "partir para cima do Snape", quando eu o impedi, me colocando como um obstáculo e murmurando um "Não Tiago.".
Muito contrariado ele se afastou, Snape o olhou com superioridade e eu voltei a discussão.
"O que você disse, Snape?". Eu perguntei com uma idéia em mente. Até agora eu não como ela surgiu, e nem como se concretizou, mas o fato é que ela aconteceu, e eu não consegui impedi-la. Ele me olhou satisfeito por alguém estar decidido a responder a sua pergunta, virou-se para Tiago e repetiu a pergunta. "Namoradinha, Potter?". Eu o olhei satisfeita. "Exatamente!". Por Merlin! De onde raios surgiu aquela palavra?
Eu vi muitos rostos chocados, outros intrigados, Snape parecia "murchar", mas a única reação que eu não queria ver, me encarou chocada e com um sorriso que vacilava em seu rosto.
"O Show acabou! Para suas salas comunais!". Eu fiquei muito satisfeita quando ouvi a voz de Remo gritar.
Eu continuava a encarar um Tiago, incerta se sorria, falava, ou permanecia em silêncio. Ele tampouco conseguiu decidir por uma reação. Ficamos em silêncio. Caminhamos em silêncio. O silêncio pelo menos não saia por ai falando que era namorada de Tiago Potter. Quando estávamos em frente ao quadro da mulher gorda, e eu já abria a minha boca para dizer a senha, Tiago disse subitamente: "Não!".
"Não, o que?". Eu respondi muito satisfeita por ele ter começado uma conversa.
"Você só disse aquilo para encerrar a discussão, não?". Ele de alguma forma parecia decepcionado.
"É.". Eu respondi tentando ser o mais amigável possível.
Tiago sorriu, e passou a mão por seus cabelos.
"Tudo bem. Eu estou acabando o nosso namoro aqui.". Eu ri aliviada.
"Até que você não daria um mal namorado.". Eu disse brincando, eu acho.
"A menos, que você não queira terminar.". Ele falou e por uma fração de segundos eu achei que fosse sério, e por causa dessa fração eu hesitei. Não respondi nada, e mesmo que quisesse, não pude. O quadro da mulher gorda se abriu, e uma Agatha um tanto quanto transtornada apareceu. "Que bom que vocês estão aqui!". Ela nos puxou para dentro e de repente eu me vi em mais uma reunião com os marotos.

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