O Aletômetro




Apesar de estar bastante cansado, Harry teve considerável dificuldade para pegar no sono aquela noite. Virava-se de um lado para o outro na cama, sem conseguir encontrar uma posição agradável. Rony e Mione aos beijos, Malfoy e suas piadinhas estúpidas... Era simplesmente demais para seus nervos! Se não extravasasse sua raiva logo, Harry sentia que ia ficar maluco.

Sentia um ciúme tão violento de Rony que chegava a assustá-lo. E aquele nó em sua garganta tornava até difícil respirar. Harry nunca sentira nada parecido antes, nem quando gostava de Cho Chang e ela namorava Cedrico. Jamais imaginara que um sentimento pudesse resultar em dor física, dessa forma.

Mas as coisas haviam mudado.

***

Harry acordou na manhã seguinte sentindo que não dormira nem uma hora, de modo que assistir às primeiras aulas da manhã foi praticamente impossível. Rony tinha que ficar cutucando-o de cinco em cinco minutos para acordá-lo. Na aula de Defesa Contra as Artes das Trevas eles acabaram sentando em lados opostos da sala, e Harry acabou pegando no sono e babando toda a página de abertura do primeiro capítulo do livro texto.

O professor de Defesa Contra as Artes das Trevas ainda era o mesmo do ano anterior, o que certamente devia ser um recorde. Atlas Sabah era mais jovem do que aparentava ser. Falava um inglês carregado com um sotaque estranho que ninguém conseguia identificar ao certo, e tinha a pele mais branca e pálida que Harry já vira na vida. Seus olhos eram acinzentados, e seu cabelo negro sempre penteado em ângulos esquisitos. Circulava um boato de que ele cortava o cabelo sozinho com um facão de mato e um espelhinho de bolsa, mas ninguém tivera a oportunidade de confirmar.

No geral, ele era um bom professor. É claro que não chegava aos pés de Lupin, mas era um bom professor. E pelo menos não demonstrava nenhuma tendência para as artes das trevas, o que era um alívio para todos - alunos e professores - que não agüentavam mais as trocas anuais de professor de Defesa Contra as Artes das Trevas.

O Prof. Sabah era sempre simpático com Harry, mas isso não o impediu de descontar 5 pontos da Grifinória porque o garoto estava roncando no meio da sua aula. O lado bom é que as risadas dos colegas serviram para despertar Harry, e ele pôde manter-se o mais atento quanto possível na aula de Poções.

- Vamos ver o que teremos a seguir - Rony disse checando a tabela de horários na hora do almoço, a boca cheia de pastelão.

- Vocês têm Adivinhação e eu tenho Estudo dos Trouxas - informou Mione, antes que Rony achasse o horário na tabela.

Ele encarou a namorada, incrédulo.

- Mione! Como você conseguiu decorar o seu horário e o nosso em apenas uma manhã?

-Bem...

Harry lembrou-se de que deveria falar com a prof. McGonagall, e constatando que ela não estava na mesa dos professores, imaginou que deveria ir procurá-la em sua sala.

- Vejo vocês depois - Harry disse, dando uma última mordida em um pedaço de frango. Jogou a mochila nas costas e desapareceu das vistas dos amigos antes que eles pudessem fazer qualquer pergunta.

Conforme Harry havia previsto, a Profa. Minerva estava aguardando-o em sua sala.

- Está atrasado, Sr. Potter - disse a bruxa, sem se abalar de trás da sua mesa quando Harry bateu na porta e entrou.

- Bem, a senhora não especificou nenhum horário - falou Harry indulgente - Tive que adivinhar que deveria procurá-la agora.

McGonagall ignorou a resposta um tanto quanto desaforada do garoto. Com um gesto indicou uma cadeira para ele se sentar. Harry obedeceu, largando a mochila no chão com um ruído seco.

A professora o fitava de maneira estranha, como se o avaliasse. O rapaz empertigou-se na cadeira.

- Acredito - começou a professora lentamente. - que você não tenha chegado a tomar conhecimento da herança que seu padrinho Sirius Black lhe deixou.

- Não, nunca me disseram nada de herança alguma - Harry disse, erguendo uma sobrancelha.

- Não era mesmo interessante que o senhor soubesse disso - McGonagall falou. - Até agora.

Harry sentiu uma onda de irritação percorrer seu corpo. Depois de sete anos eles continuavam a lhe esconder as coisas que lhe diziam respeito. Típico.

McGonagall pareceu perceber o que se passava na cabeça do garoto, pois apressou-se em explicar a Harry que havia um motivo maior para terem novamente escondido algo dele. Ela apanhou uma chave, abriu a segunda gaveta de sua mesa e retirou algo de dentro dela. O que quer que fosse, estava envolto por uns trapos velhos e sujos.

Minerva depositou o embrulho diante de Harry, que sentiu sua curiosidade aguçar. Ele ergueu os olhos para a professora.

- O que está esperando? Abra! - disse ela, impaciente.

Harry apanhou o objeto e desembrulhou-o rapidamente. A princípio, o garoto achou que se tratava de um relógio. Era redondo, feito de um metal dourado que parecia ouro, pequeno o suficiente para caber na palma da mão, e pesado o bastante para provocar um estrago se caísse no pé de alguém. Uma série de símbolos e figuras estavam desenhadas ao redor da circunferência. Havia três ponteiros: dois maiores, que permaneciam parados, e um menor, que passeava pelos desenhos aparentemente sem seguir qualquer padrão.

- Professora - Harry disse, voltando sua atenção para a bruxa. - O que é isso?

- Chama-se aletômetro* - explicou McGonagall, com um suspiro cansado.

- Aletômetro - repetiu o rapaz com estranheza. - Mas para que exatamente esse troço serve?

- Não se deixe enganar pelas aparências, Potter - disse McGonagall, endireitando-se na cadeira. - Há mais magia nesse troço do que num raio de trezentos quilômetros. Ele é muito raro e antigo. Dizem que não foram fabricados mais de seis desses, sendo que somente quatro são registrados pelo Ministério. Esse, particularmente, esteve na família de seu pai por mais de um século, até que ele deu de presente ao seu padrinho.

- Se é tão raro e estava na família há tantos anos, por quê meu pai resolveu dá-lo ao Sirius? - indagou Harry.

- O aletômetro, Potter, é um objeto mágico bastante complexo. Ele pode responder com precisão a qualquer pergunta que lhe seja feita, mas seu funcionamento é extremamente complicado. O que posso lhe dizer, basicamente, é isso: cada símbolo possui uma série de significados. O sol, por exemplo, quer dizer dia. Mas também pode significar autoridade, verdade. Para fazer uma pergunta você deve usar uma combinação de três símbolos, movendo cada ponteiro até cada um dos símbolos. A resposta é dada no mesmo sistema, com um ponteiro movendo-se rapidamente para cada uma das figuras necessárias. - McGonagall respirou fundo. - Entende o que estou dizendo, Potter?

- Sim - Harry respondeu com os olhos no aletômetro. - Eu acho.

- Como você pode perceber, é necessário possuir uma velocidade de raciocínio e percepção muito grande para acompanhar o ponteiro e compreender o que ele está dizendo. Mesmo porque, o aletômetro normalmente não responde duas vezes. Seu pai, Harry, era muito inteligente. Um dos melhores alunos que já tive, se me permite dizer. Talvez mais do que a Srta. Granger. Mas o fato é que, apesar disso, ele nunca conseguiu ler o aletômetro.

- E Sirius conseguia - Harry deduziu.

- Sim, você entendeu - McGonagall sorriu brevemente. - Agora preste bastante atenção, garoto: esse objeto, em mãos erradas, pode trazer muitos problemas. Ele é a chave do conhecimento. Aquele que sabe manejar o aletômetro tem todas as respostas que quiser. E acredite, há muita gente interessada em colocar as mãos nele. Estávamos mantendo-o escondido na Ordem, e por isso achamos que não havia necessidade de falar-lhe sobre ele.

- E por quê vocês mudaram de idéia? - perguntou Harry, desconfiado. - Por que decidiram dá-lo para mim? Não é muito mais seguro mantê-lo sob a proteção da Ordem?

- Não, Harry - a professora disse com um suspiro. - Não mais.

Harry franziu o cenho, confuso.

- Então isso significa que...

- Há um traidor na Ordem.

***

*Objeto mágico retirado da trilogia Fronteiras do Universo (His Dark Materials), de Philip Pullman.

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