Um Infeliz Natal





Capítulo Trinta e Oito
Um Infeliz Natal


Apoiei minha cabeça mais uma vez sobre as mãos. Estava sentada naquela almofada grande e colorida, pertencente a torre da astronomia, apenas esperando que Deena fizesse toda aquela análise em alguma coisa de alguma constelação. Não sabia o que as pessoas achavam de tão interessante nisso. Via os flocos de neve cair através das vidraças, era até engraçado. Já contei quarenta e três. Calma, Hermione, apenas mais um dia.

- Achei! – Disse Deena vitoriosa. Eu não disse nada, apenas fiquei a olhando entediada. – Hermione, por favor, ânimo! – Pediu pela terceira vez sentando ao meu lado naquelas almofadas. – A professora vai brigar com a gente.

- Achou? – Concordou. Mais uma vez, apoiei minha cabeça lá. – Ótimo.

- Caramba, vamos! – Pegou no meu pulso e tentou me levantar. – Depois que você voltou com o McLaggen, anda tão desanimada para as coisas! A festa do Slughorn você nem quis saber!

- O Mc não ia. – Soltei fracamente.

- Você está totalmente amarrada a ele! E olha que nem completou um mês que vocês estão juntos. – Voltou a olhar na luneta. – E o Harry? Anda falando com ele? – Me levantei e peguei a prancheta para fazer as anotações.

- Nem sei. – Peguei o lápis e comecei a olhar na luneta também.

Não sei o que deu em mim, mas se eu ficasse sentada ali, olhando Deena procurar estrelas, ia continuar me achando uma inútil e ela me metralhando de perguntas que não quero saber das respostas.

– Não vejo a hora de sair de Hogwarts. – Soltei ainda olhando as estrelas.

Queria ser uma. Não ter nada com que se preocupar, apenas eu ficar brilhando de noite e de dia, fingir estar morta. É assim que minha vida deveria ser.

- Esse cara não tá fazendo bem para você. – Disse Deena sabiamente.

- Menos conversa, mais trabalho! – Gritou Professora Sinistra chamando a atenção não só de nós, como de todos que estavam ali.

- Como foi seu encontro com o Ron? – Caiu nos ombros.

- Que encontro...?! Nós fomos até o Três Vassouras e ficamos conversando. – Soltou o ar que prendia.

- Pensa pelo lado bom, estão bem amigos. – Tentei sorrir mas estava cansada.

A sineta acabou de tocar.

- Todos vocês! Quero esses relatórios hoje à tarde na minha mão! Tenham um bom dia, que os astros guiem vocês! – Começamos a arrumar nossas coisas em silêncio, até que alguém adentrou na sala e foi ao meu encontro, pegando na minha cintura e me dando um beijo.

- Minha linda! – Soltou me dando mais beijos. Tentava arrumar minhas coisas mas ele não deixava. – Olá, Deena.

- Olá... – Disse envergonhada. – Nos vemos depois, Mione. – Acenou e saiu dos nossos olhares.

- Espera pelo menos eu arrumar minhas coisas...? – Me soltei e voltei a arrumar. Ele pegou numa das lunetas e começou a olhar lá em baixo, no pátio. Enfiei minha pena dentro da minha bolsa e arrumei os livros. – Vamos. – Peguei em seu braço e o arrastei dali. Pegou na minha cintura e me deu beijos carinhosos na bochecha e no pescoço na boca da escada. – Iremos cair desse jeito. – Disse apreensiva, querendo espaço, coisa que não me dava.

- Se está comigo, sempre estará segura! – Mc riu. Forcei um sorriso e virei os olhos. – Está cansada?

- Oh, sim. – Passei uma das mãos na nuca, fingido estar a pessoa mais cansada do mundo.

- Hoje é a última reunião dos monitores, irá, não é? – Reunião. Será que agüentarei até lá?

- Lógico. – Sorri lhe dando um pequeno beijo ao fim das escadas.

- Pode ir indo para o Salão Principal, tenho que passar na biblioteca. – Separou-se de mim acenando num largo sorriso. Um sorriso tão verdadeiro que comecei a desconfiar de suas reais intenções.

Namorar McLaggen não era aquilo que estava pensando. Ele consegue ser tão romântico, tão prestativo que parece ser irreal. Acho que se eu contar, ninguém acredita. Ele não pediu – nenhuma vez – para conhecer meu quarto. Não tem essa curiosidade, não é possível!

Isso está me esgotando, estou sentindo isso. Estou com uma pessoa obrigada por mim mesma. Cada vez que penso em algo que terei que fazer junto com ele, sinto um desânimo. E também, ele tem sugado todo meu tempo disponível. Tive não sei quantas festas, reuniões, comemorações, confraternizações e encontros em Hogsmeade nesse quase um mês.

Num logo bocejo, entrei no Salão Principal. Estavam todas sentadas no mesmo lugar. Tem coisas, que nunca mudam. Sentei-me jogando o prato para o lado e apoiando a cabeça nos braços.

- Graças a Deus. – Soltei fracamente.

- O quê? – Perguntou Verônica piscando algumas vezes.

- Acabou... – Ergui minha cabeça e sorri fracamente. – Acabou! – Gritei para que todos ouvissem, e ouviram. Voltei a abaixar minha cabeça e relaxar meus olhos.

- Oh, sim. Todos estão bem animados. Depois de amanhã é natal. – Ponderou Kim terminando seu prato. – Não irá comer?

- Estou sem fome.

- Você não anda se alimentando direito, Hermione, tem que comer. – Forçou Parvati.

- Estou bem assim.

- Quantos quilos você falou que emagreceu nessa última semana?

- Dois quilos. – Respondi ainda com a voz abafada pelos meus braços.

- E continuará emagrecendo se não se alimentar.

- Parem de bancar minha mãe! – Quase gritei levantando minha cabeça com rispidez. – Que inferno... – Dei uma profunda olhada em todas elas.

- Se está nervosa, não precisa descontar em nós. – Disse Deena com receio.

- Ótimo. – Fui grosseira.

Levantei-me, peguei meus livros e me recolhi daquele Salão. Comecei a subir as escadas principais, passando pelas estadas vivas e entrando no corredor para ir logo a minha torre.

O que elas tinham dito, era verdade. Não me alimentava bem fazia algum tempo. Sempre beliscava uma ou outra coisa de noite. Só bebia nas festas. Uma vez, tive que tomar uma solução feita pelas meninas de glicose e mais algumas ervas para que meu organismo voltasse ao normal. Estava acabando com a minha saúde, sabia disso. Mas não sentia fome, não sentia vontade de fazer quase nada. Por um lado, McLaggen e por outro, a falta de alguém para ao menos conversar, ter uma boa conversa.

Faz duas semanas que não converso ou ao menos vejo Draco. Harry era um caso que desde o jogo de Quadribol, não me dirigi nenhuma palavra. Pode até ter sido isso a causa do meu desânimo total. Tinha que arrumar minhas malas, tinha que correr para meu quarto arrumar minhas malas. Mas será que Harry ainda quer minha companhia nessa viagem? Oh, não. Foi esses pensamentos que ficaram me tirando as noites de sono e a vontade de comer.

Cadê o chão? ... Perdi a sensação de profundidade, me escorei numa das tantas paredes que tinham se formado na minha mente que não consegui mais ver nada. O chão era duro, podia sentir...

***


- Ela está acordando! – Uma voz invadiu minha cabeça que doía. – Hermione! – Abri os olhos lentamente. Reconheci a cabeleira ruiva de Ron, estava debruçado em cima de mim.

- Deixe-a respirar! – Outra voz conhecida. Parecia ser a voz de Parvati, da Kim, não sei direito. Queria me mover mais estava muito debilitada. – Hermione, como você está? – Abri os olhos rapidamente, levantando da cama num susto, ofegante e suando.

- Senhorita Granger! Deite-se agora! – Tinha pelo menos umas dez pessoas ali. – E vocês?! Saiam! Xô! Xô! – Começou a espantar algumas pessoas a mais.

- Mas somos amigas dela! – Era Verônica, Kim, Parvati, Padma, Deena, Ron, Tony e por último, Mc.

- Apenas o senhor McLaggen! Os outros podem sair! Agora! – Ordenou mais uma vez.

Todos saíram reclamando. Mc levantou-se da cadeira que estava sentado e me deu um beijo na testa. Estava visivelmente preocupado, mas não tinha idéia se era por mim.

- Quanto tempo estou assim? – Perguntei levando uma mão a testa e depois voltando a deitar.

- Umas três horas. – Olhei no relógio e reconheci que eram quatro da tarde. – O senhor Weasley que te encontrou desmaiada nos corredores, senhorita Granger! Teve muita sorte.

- Ela ficará bem?

- Está com anemia, como você quer que ela fique boa em três horas?! – Fiquei pálida. Não sabia que era tão grave assim.

- Anemia? – Perguntou Mc olhando para mim, assustado como eu. – Mas ela-

- Se voltar a se alimentar bem e tomar essas pílulas, logo ficará bem! – Sorriu e pegou uma prancheta indo até a cama de outros pacientes.

- O que anda fazendo? Não está se alimentando? – Perguntou segurando em minha mão.

- Estou completamente sem fome, não sei o que pode estar acontecendo. – Passei uma das mãos no rosto e respirei fundo, um pouco preocupada.

- Está acontecendo alguma coisa, Mione, que você não está querendo me contar? – Quase sussurrou. Olhei dos lados.

Numa das camas, algum aluno que colocava as tripas para fora de tanto vomitar. Outro desacordado e outro com uma das pernas engessadas.

- Se estivesse acontecendo, eu contaria. – Sorri.

- O Potter não está enchendo sua cabeça com as idéias loucas dele, não é? Eu sei que ele sempre tem uma história sem noção sobre tudo que está-

- Não. – Fui curta e um pouco grossa. – Ele não tem absolutamente nada a ver com isso. – Pisquei algumas vezes mudando meu humor.

- Me promete que irá se alimentar e se cuidar enquanto estivermos separados? – Segurou nas minhas duas mãos.

Como dizer não a ele?! Como, meu Merlin?! Consenti com a cabeça e sorri. Sentei com os pés para fora da cama e calcei minha sapatilha, peguei o frasco de pílulas que Madame Pomfrey me indicou e sai de lá abraçada com Mc.

***


- ÚLTIMA CHAMADA! – Gritou Hagrid.

Estava sozinha, correndo entre as pessoas. Tinha me atrasado, isso era horrível. Estava nevando fraco mas poderia deixar qualquer um com frio.

- Hagrid, viu o Harry ou Ron?? – Perguntei parando na porta com um pé para dentro do vagão outro para fora.

- Não, mas entre! Já irá partir! – Consenti com a cabeça agradecendo sendo empurrada por alunos grandalhões.

- Com calma, OK?! – Ordenei parando todos eles. Riram mas me respeitaram antes que eu tenha que dizer que era Monitora Chefe da Grifinória. Passei por cada cabine. Todas estavam lotadas. Alguns torciam os pescoços para me olhar e faziam comentários. Estava com alguma coisa no rosto, no meu cabelo?! Por que todos estão me olhando?

Todos que eu achava que poderia saber onde estaria Harry ou Ron, perguntava na maior cara de pau. Até que Simas revelou que estavam nas últimas cabines se é que embarcaram. Não, se eu peguei esse trem sozinha, alguém irá morrer amanhã. Não sei, mas quanto mais cabines passavam, mas o desespero de não encontrar eles ali, passava pela minha cabeça. Meus passos aceleraram até que quase comecei a correr. Esbarrava nas pessoas, pedi desculpas e quase atropelei o carrinho de doces daquela gentil mulher.

- Hermione! – Voltei uma cabine e lá estavam Harry e Ron. Como me senti aliviada. Virei os olhos e abri aquela porta com brutalidade.

- Custava me esperar? – Entrei fechando a porta e me sentando ao lado de Ron, de frente para Harry que se enfiava dentro daquele Profeta Diário.

- Desculpe, é que-

- Tudo bem. – Soltei abrindo minha bolsa e pegando aquele frasco de comprimidos. Engoli dois de uma vez e logo o fechei.

- Está se sentindo melhor? – Apenas o ruivo me dirigia a palavra.

- Não muito, um pouco tonta mas, bem melhor comparada a ontem.

- Não devia estar viajando por muito tempo... – Advertiu para minha graça.

- E ficaria naquele castelo sozinha?! – Ri mais uma vez. Ri de nervosa, isso sim. Meus olhos foram naquele jornal. Inclinei a cabeça para a esquerda até ler uma manchete. "MAIS DE DUZENTOS MORTOS" Meu sangue pareceu correr ainda mais rápido. "TROUXAS PAGAM O PREÇO". – Quando terminar me empresta? – Abaixou lentamente o jornal e ergueu uma das sobrancelhas.

- Aham. – Disse voltando a ler um pouco aborrecido. Não demorou muito até ele me passar. Logo pus na primeira página, Harry já sabia o que eu ia ler, era incrível.

"MAIS DE DUZENTOS MORTOS / TROUXAS PAGAM O PREÇO"

"O Ministério da Magia de Londres, nessa última segunda feira, calculou que duzentos e trinta e três trouxas foram encontrados mortos em toda a região com causa e conseqüência desconhecidas. A ligação entre um corpo e outro era remota. Muitas famílias foram encontradas torturadas em suas próprias casas. O Ministro trouxa já está sendo avisado das possíveis causas onde pode variar de seguidores de Aquele-que-não-deve-ser-nomeado até simples arruaceiros..."


Abaixei o jornal lentamente com os olhos fixos nas outras noticias. Não sei o que Harry e Ron conversavam, apenas fiquei concentrada naquilo. Mais uma vez, fiquei com aquela sensação pessimista.

- Que horror... – Soltei para mim mesma mas ouviram perfeitamente.

- Não é novidade. – Ergui meu olhar a primeira palavra que Harry me dirigiu esses dias todos.

- Não é novidade? Está ocorrendo uma matança lá fora! Mais de duzentos corpos foram achados e você só diz um 'não é novidade'?

- Não podemos fazer nada para-

- Podemos sim, trouxas estão morrendo por uma coisa que até desconhecem, isso tem que parar.– Meus olhos se encheram de lágrimas. Dobrei aquele jornal de uma maneira bruta e saí da cabine deixando minha bolsa lá.

- Parabéns, Harry... – Ouvi Ron dizer de lá de dentro. Não tinha ido tão longe assim. Só estava ali fora, encostada na cabine ao lado. – Você sabe que ela está doente e a trata desse jeito?! – Doente?

- Doces, querida? – Aquela mulher me assustou profundamente.

- Não, o-obrigada. – Comecei a andar em outra direção, enxugando as lágrimas que caiam.

Doente?! Eles não sabem o que é estar doente. Isso que estou passando não é nada comparado ao que eu passei logo que aquilo aconteceu.

Fui até o último vagão. Abri aquela portinha e um vento sem tamanho entrou. Estava um frio que só vendo, mas não estava nevando, muito menos um tempo fechado. O pôr do sol era aparente daquele lado. Fechei a portinha atrás de mim e me debrucei naquelas grades de segurança. Ventos de todos os lados, tingiu meu rosto de vermelho e meus cabelos de laranja. Juntei as mãos e fiquei apoiada nos antebraços. Dane-se que estava com a bunda bem virada para a porta, quem está ligando?!

Aquele pôr do sol me acalmava, apenas isso que sei. Era tão lindo. Estava sumindo atrás das montanhas e das arvores cobertas pela neve. Respirei fundo e abri um leve sorriso. Mesmo depois dessa chateação, me senti mais aliviada.

- Posso me apoiar também? – Ouvi uma voz atrás de mim. Era Harry. – Não está com frio? - Neguei com a cabeça. Apoiou-se ao meu lado, também olhando aquele por do sol, olhou para baixo e viu os trilhos passar numa velocidade sem tamanho.

- Se veio aqui porque Ron mandou, por ir in-

- Ron não manda em mim. – Me calei. – Por que você se distanciou tanto de mim?

- Porque você se distanciou de mim. – Respondi com meu olhar fixo apenas no horizonte.

- Eu me distanciei porque pensei que estava com raiva de mim.

- Raiva por que? Por sentir ciúmes? Até aí, sinto todo o tempo que penso em você. – Oh, não, falei merda. – Esquece... – Levei uma mão na testa.

- Eu senti um pouco de ciúmes, sim. – Mirei meu olhar nele. – OK, eu senti ciúmes pra caramba, mas- – Comecei a rir. – Qual é a graça? – Ria ainda mais. Parei de me apoiar e coloquei uma das mãos na boca. – Hermione, qual é a graça? – Parei de rir e abri a portinha passando para dentro. – Irá embora sem me dizer qual é o motivo para tanta graça?! – Não respondi. Fui embora o deixando para trás sem uma resposta digna.

***


- Onde Tonks disse que ia nos esperar? – Perguntei acabando de pegar meu malão no desembarque das malas. Harry e Ron me esperavam encostados a uma parede para não serem pisoteados pelos alunos loucos para verem novamente seus pais e amigos trouxas.

- Sei lá! – Respondeu Ron ajeitando seu gorro que sua mãe tinha lhe feito no último natal. Estava um barulho só, apitos, gritos, tumulto. Odiava aquilo.

Passamos a passagem para a estação King Cross e nos dirigimos até alguma saída. Tonks era tão legal que ainda não tinha dado as caras para nos guiar dali. Aquela estação estava realmente lotada.

Também, era fim de ano e véspera de Natal. Nossa, véspera de Natal e eu não comprei um presente se quer nem para Harry, nem para Rony. Que horror.

- Olhem! – Ron apontou para cima. Era uma coruja preta piando alto, fazendo círculos em volta de nós.

- Vamos segui-la. – Sugeriu Harry e assim fizemos. Aqueles malões era realmente pesados, e ainda tinha a gaiola de Bichento para levar.

- Ron, leva para mim? – Perguntei já exausta.

- Eu levo. – Pronunciou Harry pegando a gaiola da minha mão e dando um pequeno sorriso.

Retribui ficando sem jeito. Ron nos olhou e riu. A coruja nos guiou para uma das saídas da estação. A saída mais conturbada e cheia. Ficamos um pouco perdidos até Harry apontar para um dos cantos e reconhecermos a cara fechada de Moody.

- Por que não entrou e nos esperou lá dentro? – Perguntei sem paciência, me sentindo um pouco exausta, me sentando no malão de Ron e respirando fundo.

- Porque odeio lugares cheios. – Virei os olhos. – Estão esperando o quê? Vamos. – Começou a mancar para dentro daquele Beco. Trocamos olhares suspeitos e entramos junto. Estava um pouco escuro mas reconhecemos quatro vassouras.

- É a minha vassoura, o que ela está fazendo aqui? – Perguntou Harry pegando a sua FireBolt.

- Plantando alface, Potter... – Virou o único olho inteiro que tinha.

- Aparatando não seria melhor? – Perguntou Ron apontando para os malões e as gaiolas.

- Francamente, o que você tem na cabeça...? – Repreendeu Moody rapidamente, ensinando a amarrar as malas nas vassouras. - Vassouras são os meios de transporte mais seguros que existem.

- Por que Tonks não veio? – Perguntei amarrando a minha mala a vassoura e depois a gaiola de Bichento.

- Porque é uma folgada. – Hoje era um dia bom, Moody estava num humor luminoso. – Vamos lá, Harry! Você na frente. – Harry consentiu e arrancou de primeira. Minhas pernas começaram a tremer, um medinho sem vergonha. – Vá, Granger! – Não conseguia sair do chão. – Vamos logo! – Fechei os olhos e dei um impulso forte. – Mulheres... - A vassoura que estava não era nenhuma FireBolt, mas era rápida o suficiente para alcançar Harry.

- Com medo? – Gritou o moreno rindo.

- Não, imagina...! – Ironizei me abaixando na vassoura e seguindo, agora, Moody.

O caminho era desgastante. Voamos durante meia hora em alta velocidade. Aquele frio era de cortar qualquer pele bem hidratada. Moody fez um sinal para que descemos e assim obedecemos. Londres estava realmente iluminada, era incrível como ficava ainda mais linda na época de Natal. As luzinhas, os enfeites, tudo era perfeito. Quando coloquei os pés no chão, me senti mais leve, morta de frio, mas mais leve. Pegamos os malões e subimos a soleira da porta, quando a porta se abriu, um forte cheiro de bolor invadiu meu nariz.

- Deixem as coisas aí. – Tinha um enfeite macabro naquela porta, mesmo que seja de natal, colocava medo em qualquer um. O corredor estava iluminado por velas com enfeites natalinos e algumas bolas e meias.

- Até que enfim! – Gritou Tonks surgindo de um dos cômodos e me dando um forte abraço. – Me desculpem não ter ido buscar vocês é que-

- Não tente iludi-los com as suas desculpas, Ninfadora... – Soltou Moody. Tonks mudou seu cabelo pra uma cor vibrante e pegou a varinha, apontou para a bunda de Moody e a incendiou. Começamos a rir com o desespero do velho para apagar aquela chama. Até que Lupin apareceu e acabou com a nossa festa. – NINFADORA! VOCÊ ME PAGA! – Ameaçou indo para a cozinha chamando por Lupin. – PEGUE GELO E UMA BACIA! – Rimos e a seguimos até a sala comunal.

- Como passaram esse finalzinho de aulas? – Perguntou atraindo uma jarra de cerveja amanteigada para perto de nós e pegando quatro copos.

- Péssimo. – Soltamos os três juntos.

- Oh, que delícia. – Riu. – Está se sentindo em casa, Harry? – Ele olhou ao seu redor segurando com as duas mãos o copo ainda em cima da mesa, estava cheio pela metade. Tinha um mero sorriso no rosto e depois o fechou, provavelmente se lembrando de Sirius.

- Sem ele não é a mesma coisa. – Tonks segurou nas suas mãos e consentiu com a cabeça.

- Vamos se animar, OK? – Ligou aquele rádio e procurou alguma rádio boa. – Afinal, é Natal! – Sorriu largamente.

***


Dei uma respirada fina e alta. Agarrei ainda mais os joelhos contra o peito e voltei a encostar a cabeça naquele vitral. Era difícil dizer o que eu estava vendo ali fora: um monte de neve e muitas luzes coloridas. A noite estava tão fria que a ponta dos meus dedos não sabiam o que era vida. Aquele lugarzinho era um dos menos horripilantes que tinha naquela casa; Uma almofada rala roxa em cima de um acento abaixo da janela. Era confortável. podia ouvir a música que ainda tocava e a conversa intensa que vinha da cozinha ou da sala, não sabia. Faltavam alguns minutos para meia noite, não queria dividir o que estava passando com ninguém, apenas isso.

'Tudo novo, você sentirá ainda mais falta deles', dizia o terapeuta que minha tia tinha me enfiado. E estava certo, tinha que dar o braço a torcer. Ele tinha dito tudo em poucas palavras. Foi assim no meu aniversário que, rapidamente, ocupei minha mente de pensamentos felizes, mas como irei ocupar minha mente desses tais pensamentos se estou numa casa onde você tem que andar abaixado para não decapitar sua cabeça?

Girei aquele anel na minha mão direita e engoli seco. Não tive coragem de tirá-lo desde o dia que Draco colocou-o no meu dedo. Fraca. Ele tem sua vida agora e você tem a sua, não devia ficar se prendendo a ele. Não queria magoá-lo mas não queria também, magoar aqueles que estão a minha volta. Meu Deus, fiz tantas loucuras esse ano, fiz tantas coisas que me arrependo tanto...

Só por hoje não quero ocupar minha mente desses pensamentos. Cansei de tudo. Vamos nos animar, como disse Tonks. Não posso ficar me provando das coisas desse modo! Se eu ficar aqui, além de enlouquecer, irei congelar e isso não é nada bom. Porque deixei um namorado preocupado – ou não – longe daqui e mais um ou outro que zela pelo meu bem estar. Levantei-me respirando fundo. Engoli todo aquele choro que estava por vir e passei a mão nos olhos.

- Já cansada? – Ouvi a voz de Lupin aparecer para me dar um susto. Estava com um gorro de Papai Noel e uma pilha de presentes indo para a sala principal.

- Não, só-

- Vamos, já é Natal! – Disse sorridente. Logo Tonks surgiu também com aquele gorro entregando um para mim.

- Coloque. Todos têm um! – Piscou e pegou em meu braço enquanto eu encaixava sobre minha cabeça. Aquela sala era a mais quentinha, era tão agradável.

Tinha uma árvore seca no meio da sala no lugar daquela mesa de confabulações, tinha pufes enormes, uns dez. Lupin colocava os presentes em volta da árvore e Moody se ajeitava numa poltrona ainda resmungando de Tonks e todas suas travessuras.

Parei na porta, num leve sorriso no rosto, até sentir alguém me empurrar para dentro rindo e parece que jogando Neve artificial dos Weasley em mim. Só que aquela neve, não era uma neve comum, além de ser muito mais gelada do que a original, ela tomava vida própria e começava uma guerra inútil de bolas de neve.

- Garotos... – Balbuciou Tonks ajudando Lupin a arrumar os presentes.

- Se uma dessas bolas me acertar, eu juro que mato um de vocês! – Ameaçou Moody no seu mau humor. Tonks pegou um dos gorros e sentou no braço daquela poltrona.

- Que mau humor! – Enfiou um naquela cabeça suja. Moody tentou tirá-lo, mas Tonks o selou com um feitiço. – Até que ficou bonitinho? – Riram. – OK, vocês dois! – Pediu calma entre Harry e Ron que ainda travavam a guerrinha de bolas de neve. – Um minuto pro Natal! – Tonks absorveu as bolas com sua varinha e sorriu maliciosamente para eles.

- Tonks, isso é FireWisky, eles são menores... – Começou a dizer Lupin, quando viu que a moça começou a servir seis copos da bebida.

- Mas são responsáveis. – Piscou. Levitou um copo a cada um de nós e pediu que nos sentássemos naquelas grades almofadas. Ficamos em silêncio, um silêncio tão incomodo. – Então? Irão ficar com essas caras?

- Os presentes. – Sugeriu Lupin após outro longo silêncio. Começou a distribuir, tinha uma outra pilha atrás da árvore onde seriam os artesanatos da senhora Weasley. – Hermione, Harry- - Olhou o embrulho e sorriu para Ron, o menor de todos. – Rony.

- A gente nem- – Comecei a dizer, mas Harry me interrompeu:

- Comprou nada para vocês, obrigada.

- Vocês já nos dão um belo presente não nos deixando sozinhos nesse natal! – Sorriu Tonks. Começamos a desembrulhar os nossos enquanto eles conversavam sobre alguns assuntos bobos. Ron tinha ganhado um par de Luvas de Pele de Dragão Suíço, a melhor e mais cara luva que tinha no mercado. Desembrulhando aquele embrulho roxo, reconheci uma bolsa maravilhosa e ainda tinha mais, havia uma caixa em veludo preta, abri mirando meu olhar em Harry que olhava atentamente e curiosamente para o que eu tinha recebido. Era um colar maravilhoso, podia ser simples mas era lindo. Uma correntinha de muito bom gosto e um coração em brilhantes e ouro branco, tão lindo que nem sabia o que dizer. – Esse último, sua mãe que mandou para nós. – Meu olhar mirou-se nela e deixei uma lágrima escorrer.

- É lindo. – Soltei ainda pasma com tudo aquilo. Tonks sorria assim como Lupin; - Hã... Abra o seu, Harry. – Disse para todos tirarem a atenção de mim. Harry começou a abrir, rapidamente, por mais que Moody dizia 'O embrulho é bonito! Vá com calma'. – O que é? – Perguntei me inclinando.

- Harry, é um Porta Fotos Refletor! – Disse Ron ansiosos. – Só existem três deles no mundo!

- Como você sabe...? – Perguntei erguendo uma de minhas sobrancelhas. Ron me fuzilou com os olhos e pegou das mãos de Harry.

- Funciona assim: - Pegou numa das chaves que estavam penduradas e o abriu. Era do tamanho de um livro, com uma aparecia velha. Era dourado mas tinha perdido o brilho, muitas coisas estavam escritas em uma língua estranha sobre a sua capa. Havia três chaves: uma para o presente, uma para o passado e outra para o futuro. Quando Ron abriu, uma luz amarela surgiu quase nos cegando, tinha chaves para dar corda e tinha outras peças que davam continuidade ao mecanismo. – Como é do presente, irá refletir o que você quiser ver, se estiver ao alcance, entendeu? – Concordou com a cabeça. – Por exemplo, me mostre Gina Weasley. – Aquele suporte para fotos começou a girar tão constantemente que parecia que ia explodir. – Aqui, ainda está no trem. – Mostrava como se você estivesse vendo tudo do alto. – Lógico, aí vai do bom senso da pessoa de não ficar pegando as outras em momentos constrangedores.

- E as outras chaves? – Ron o fechou.

- Passado, Presente- - Percorreu com o dedo. – Futuro. - Vi que os olhos de Harry mudaram, ficaram fixos naquela última chave. – Mas essa, é muito perigosa.

- E nem tente usá-la, Harry. – Moody meteu-se na conversa. – Muitos bruxos acabaram enlouquecendo, mostra uma coisa e no final de tudo, não é aquilo que espera. – Tonks levantou-se e pegou a última chave para guardá-la consigo.

- Vamos esperar mais um pouco. – Disse a moça guardando a chave no decote da blusa e sorrindo.

- Quem me deu isso? – Os três ficaram em silêncio, foi instantâneo. – Quem deu? – Perguntou mais uma vez.

- Sirius. – Respondeu Lupin juntando as mãos um pouco feridas. – Ele- - Moody tossiu. – Harry pelo menos tem o direito de saber isso. – Entreviu.

- Não diga que eu não avisei... – Soltou de muito mau gosto.

- Ele pediu que lhe entregasse no seu último ano em Hogwarts. – Harry segurou aquele livro com uma força sem tamanho, não disse nada, apenas ficou olhando fixamente para o chão, como se quisesse achar as respostas ali, escritas em poeira talvez.

- Obrigada... – Soltou fracamente, ainda com os olhos no chão.

- Fico feliz que gostou. – Não tinha o que dizer. – E você, Mione? Gostou da bolsa? Eu que escolhi.

- Adorei! – Sorri para Tonks que agarrara Lupin com a desculpa de olhar se o assado já estava pronto. Moody se levantou e parou a nossa frente, nos olhando de cima com um olhar um pouco reprovador.

- Sei que vai usar isso para o bem, Harry. – Soltou todo o ar e saiu da sala. Harry tirou seu gorro lentamente alisando aquele livro lentamente com as pontas dos dedos. Ron pegou os embrulhos da sua mãe e distribuiu para nós. Me fez um lindo cachecol em tons rosados.

- Agradece sua mãe, achei lindo. – Sorri para o ruivo.

- Pelo menos o seu não é isso. – Para Ron, tinha feito um par de meias laranja e um par de luvas vermelhas com um R em cada uma delas.

- Combina, ainda por cima... – Comecei a rir. – Abra o seu Harry. – O moreno se levantou pegando o embrulho, o livro e saindo dali, sem dizer uma palavra. Ron e eu trocamos olhares e depois encaramos a porta, vimos Harry subir as escadas rapidamente. – Eu falei alguma-

- Não, deixa, eu falo com ele. – Abaixei meu olhar assim que Ron se retirou.

- Brigaram? – Tonks perguntou num tom desanimado, encostada ao batente da porta.

- Quem dera. – Juntei os dedos e fiquei os analisando. – Como minha mãe-

- Hermione, por favor, né? – Cruzou os braços e se sentou ao meu lado, onde estava Harry. – É uma parte da herança, é muito bonita. – Abri novamente a caixinha e sorri. – Senhora Granger tem um bom gosto. – Sorriu. – Não pretende contar a eles?

- Não, pelo menos, agora não. Chega de fazer o Harry sofrer. – A fechei e coloquei junto com a bolsa. – Como o Ministério não tomou a frente dessa matança que está ocorrendo lá fora? É tão- - Não tinha palavras para expressar tamanha atrocidade. – Não, não dá...

- Não posso entrar em detalhes mas providências estão sendo tomadas como o recrutamento de novos aurores. – Deu ênfase a última palavra. – Não quero que escolha essa profissão como um tipo de alavanca sua vingança.

- Eu nunca pensei em vingança, nem passou pela minha cabeça. Eu sei que seria a primeira reação já que temos uma arma em mãos e- - Não continuei.

- Fez o certo. – Colocou uma mão no meu ombro. – Feliz Natal.

- Feliz Natal.

***


- Você não entende, não é Ron?! – Parei em frente aquela porta entreaberta. Apenas a luz do quarto onde Ron tinha uma longa conversa com Harry estava iluminando o frio corredor. – Sirius me deu isso com um propósito!

- E você vai fazer o quê?! ... Você queria ver o futuro, não é? Ver onde tudo isso vai parar! – Apertei o embrulho. – Cara, tem pessoas que se importam com você! Eu, a Hermione, a Gina! Até minha mãe! Nós somos sua família agora, bota isso na sua cabeça!

- Se eu descobrisse tudo que vai acontecer, poderia ajudar, poderia evitar mais tragédias...

- E acabar se metendo ainda mais nesse mundo! Parece que quanto mais falam pra você que-
- Segurei na maçaneta. – Voldemort está querendo ver você morto, mais você quer segui-lo!

- Não estou querendo isso! Chega de pessoas inocentes pagar por uma coisa que tem a ver comigo! Foi assim com Cedrico, Sirius e mais um monte de trouxas!
– Calaram-se ao me ver abrir aquela porta, Harry me olhou longamente e depois se levantou guardando aquele livro dentro do seu malão com brutalidade.

- Tonks já irá servir o jantar. – Disse com receio, sob os olhares de Ron, apenas dele. – Ela quer que-

- Já estamos indo. – Disse de costas. Harry se dirigiu a mim com um tom diferente, um tom que desconhecia.

- Hã, tudo bem, eu vou-

Não terminei, apenas saí do quarto em silêncio.

***


Deixei minhas coisas no quarto onde ia dormir e desci as escadas sem ouvir uma palavra do que Harry e Ron ainda discutiam ali dentro. Ele não queria que eu soubesse, até parece que não irei descobrir. Na sala comunal, ajudei Tonks a colocar os pratos na mesa. Não demorou muito e logo aqueles dois desceram, em silêncio, privando todos ali de um pingo do assunto. Moody disse que ia sair e não voltaria tão cedo. Mesmo com Lupin dizendo que uma forte nevasca estava se aproximando, não quis saber. Era verdade, não tinha parado de nevar um instante enquanto estávamos ali dentro.

O jantar foi embalado por algumas conversas intensas, algumas piadas de Ron e Tonks, outras histórias de Lupin e o velho clima tenso que estava desde o começo da noite. Eram quase duas da manhã, Lupin levou Ron e Harry para a sala principal e deixou a arrumação e limpeza por nossa conta e por conta dos elfos. Tonks tinha virado minha maior confidente, uma das minhas melhores amigas, mesmo que ela ainda seja muito misteriosas em alguns assuntos que deixava escapar.

- Onde coloca esses pratos? – Apontou para o armário e lá os coloquei.

- Harry está muito estranho... – Comentou apoiando na mesa e olhando para a porta entreaberta onde os três se encontravam.

- Acho que é por minha culpa. – Arrumei aquele pano de enxugar louça em cima da mesa e fiquei analisando seus bordados.

- Não, não é sua culpa. É o presente, o deixou tão pilhado que desconta no primeiro que vê. – Com a cozinha organizada, fomos até a sala onde eles estavam. A lareira estava acesa, deixava o cômodo quente e aconchegante.

Ficamos ali durante duas horas, tantas conversas surgiram... O primeiro a se recolher foi Lupin, depois Tonks. Ficamos apenas nós três, como nos velhos tempos. Sentada mais próxima da lareira, tentava esquentar minhas mãos. Harry estava no outro canto, com os olhos mirados lá fora. Ron era o único bem posicionado, no meio da sala feito um saco de batatas deitado naquela grande almofada. Apenas o barulho do fogo e das altas respiradas do ruivo. Era corrosivo.

- O que pretender fazer quando saírem daqui? – Perguntou Ron, com seu rosto e corpo virado para o teto. – Hein, gente? – Movi minha cabeça para Harry e vi que aquele não responderia tão cedo.

- Auror. – Agora lhe chamei a atenção. – Já me decidi.

- Co-como disse? – Indagou Ron erguendo-se lentamente.

- Recebi uma carta do Ministério da Magia me chamando para fazer parte da nova seleção. – Dei uma resposta curta, engolindo seco nas últimas palavras.

- Mas por que te chamaram? – Olhei para Ron e virei os olhos.

- Melhor aluna. – Consentiu com a cabeça ainda um pouco surpreso.

- É muito perigoso, não era isso que você me dizia? – Disse Harry entre os dentes. Movi minha cabeça e soltei o ar que prendia calmamente.

- Disse bem: 'eu dizia'. – Me ajeitei naquela almofada. – E você?

- Recebi uma carta também. – Meus olhos cresceram. – E já me decidi.

- Caramba, viu. – Soltou Ron. – Sobrou para o Weasley cuidar dos negócios da família... – Resmungou cruzando os braços.

- Você pode se escrever. – Sugeri.

- Não! Credo- - Tossiu. - Digo, não me envolvo nessas coisas nem ferrando.

Eu ri cruzando os braços e molhando os lábios. Harry estava cansado, podia ver em seus olhos, queria dormir mas insistia em achar as respostas lá fora ou no vidro sujo que ficava separando seu mundo, do mundo lá de fora.

- Pretende ficar quanto tempo com o McLaggen? – Perguntou Ron rindo.

- Não é da sua conta, OK? – Disse fazendo um gesto com a mão. – E você e a senhorita Deena? Nenhum beijo até hoje? – Ron piscou e riu.

- Francamente, Hermione...

- Ainda digo que você é o cara mais lento no muito! – Ri.

- E você é a mais rapidinha? – Fiz uma cara de deboche.

- Pelo menos, não estou encalhada. – Dei ênfase à última palavra.

- Vocês dois falam tanto nessa Deena que estou começando a achar que é um complô contra o pobre ruivo aqui… - Apontou para o peito e se ajeitou.

- Não é nenhum complô! – A conversa era entre duas pessoas, queríamos incluir Harry nela mas ele não se pronunciava. – Um dia você irá enxergar Deena com outros olhos-

- Já enxergo, minha cara, é que-

- Luna. – Respondi cruzando os braços e virando os olhos. – E nesse lado, você também é muito lerdo! Ela não tá brava com você.





All this feels strange and untrue,
Tudo isto parece estranho e irreal,

And I won't waste a minute without you.
E eu não quero perder um só momento sem você.

My bones ache, my skin feels cold...
Meus ossos doem, minha pele está fria...

And I'm getting so tired and so old.
E eu estou ficando tão cansado e tão velho.


- Como sabe? – Suas orelhas ficaram vermelhas.

- Ela me contou e-

- Lembra do que você me prometeu? Não ia se meter nesse assunto mais. – Coloquei as duas mãos na boca fingindo ter esquecido.

- Tudo bem, não quer, não terá minha ajuda. – Pisquei rindo. – Mas não venha chorar se fizer alguma besteira.

- Não, pode deixar. – Riu. – Tá vendo, pensou que nunca íamos superar isso, não é?

- É, pensei que você nunca mais olharia na minha cara. – Ron deu uma olhada no perdido Harry e depois em mim.

- Sabe,- - Tossiu. – não se pode dizer 'nunca'.


The anger swells in my guts
A raiva me corrói por dentro,

And I won't feel these slices and cuts
E eu não vou sentir os pedaços e os cortes.

I want so much to open your eyes
Eu quero tanto abrir seus olhos,

Cos I need you to look into mine
Por que eu preciso que você olhe nos meus!


- Luna me disse isso. – Pisquei algumas vezes num mero sorriso.

- Adivinha quem me disse também?! – Rimos. – Sabe o que é o mais engraçado? A gente tá caindo de sono mas ainda estamos aqui, nos congelando.

- Com certeza! – Rimos mais uma vez. Harry ainda estava lá, preso no seu mundo.

- Eu vou dormir que eu ganho mais. – Levantou-se reclamando de dores que lhe rendeu um 'seu velho', da minha parte. – Boa noite, gente.

- Boa noite, Ron. – Soltei acompanhando aquele ruivo com os olhos. A porta se abriu e se fechou rapidamente. Assim conservava o lugar mais quente. Fiquei alguns segundos com os olhos presos ao chão até ir ao lado daquele garoto e sentar numa das almofadas. – Um cicle pelos seus pensamentos. – Moveu sua cabeça para mim e abriu um mero sorriso. – OK, um milhão de cicles pelos seus pensamentos! – Ri, tentando animá-lo. – Harry, o que está acontecendo? – Olhou para os próprios dedos e voltou a encarar o vidro.

- Não quero te preocupar.

Tell me that you'll open your eyes.
Me diga que você abrirá seus olhos.


- Me preocupar do que?

Ficou em silêncio.

- Sempre esse papo. – Me levantei e fiquei de costas para ele, cruzei os braços e segurei as lágrimas. – Olha, não estará me poupando de nada... Se você acha que eu sou algum tipo de fraca, não sei, está muito enganado. Já sofri muito em silêncio, já sofri coisas que ninguém imagina.

- Do que está falando? – Perguntou quebrando o silêncio que tinha se formado.

- Nada... Nada para se preocupar. – Fui até aquela árvore enfeitada grosseiramente com o que de mais fofo tinha na casa. Mexi numa bola vermelha quebrada. – É aquele presente? Ele te deixou assim?

Silêncio.


Get up, get out, get away from these liars
Levante, vá embora, saia de perto desses mentirosos.

Cos they don't get your soul or your fire
Porque eles não pegam sua alma ou seu fogo.

Take my hand, knot your fingers through mine
Pegue minha mão, entrelace seus dedos entre os meus

And we'll walk from this dark room for the last time
E nós sairemos deste quarto escuro pela última vez.


- Como você quer ajuda se você não me diz por que está assim?! – Perguntei indo ao seu lado novamente, estava desesperada. Olhou-me, ergueu sua mão e pegou minha nuca. Aproximou-se com brutalidade e me beijou.

- Não quero ajuda. – Disse ao se separar de um beijo falso, um beijo apenas para dizer que me beijou.

- Não quer? – Perguntei passando lentamente a mão nos lábios. – Pois eu estou disposta a fazer qualquer coisa. – Cruzei os braços. – Eu irei de ajudar, e não adianta discordar com isso. Se você não me contar o que está acontecendo, eu interrogo Ron, não tem nenhum problema! – Uma lágrima escorre.


Every minute from this minute now.
Cada minuto a partir deste agora.

We can do what we like anywhere.
Podemos fazer o que gostamos em qualquer lugar.

I want so much to open your eyes
Eu quero tanto abrir seus olhos

Cos I need you to look into mine...
Porque eu preciso que você olhe nos meus...


- Não se meta, é melhor para você. – Falou no mesmo tom que tinha, rude, grosseiro. Encarou lá fora como se fosse para eu sair dali, mas não ia.

- Melhor para mim? – Mais lágrimas caiam. – Tem certeza? É melhor pra mim ficar vendo o homem que eu amo preocupado, tenso e sofrendo pelos cantos?! – Quase gritei mas não estava ligando para quem estivesse ouvido.

Harry olhou os dedos, depois me olhou calmamente.

- Como pode amar alguém como eu? – Dei uma risada gostosa de raiva.

- Francamente, Harry. – Soltei cruzando os braços. – Você é um idiota.

- O quê...? – Perguntou sem entender com um olhar incrédulo.

- Um completo idiota. Não está se achando isso agora? Se não estiver, eu estou achando por você, nem precisa se incomodar. – Me levantei e saí da sala deixando a porta aberta.

Subi as escadas tão atordoada que errei de quarto. Acabei entrando num dos quartos que nem tinha conhecimento da sua existência. A porta atrás de mim se fechou num estralo, receio ter acordado alguém. Apenas a luz de fora iluminava aquilo. Tinha um cheiro incomodo e por final, muitas coisas jogadas no chão. Peguei minha varinha e fiz luz. Era um escritório, mas também tinha uma cama.

Achei o interruptor mas não funcionava, não era para menos, não havia uma luz se quer nos abajures pendurados nas paredes. Esse quarto me dava arrepios. Tinha quadros negros em todos os lugares, como se estivessem vazios. A cama estava em perfeita ordem mas com uma grossa camada de sujeira. Passei uma das mãos sobre a cômoda rústica e me arrependi. Teias de aranhas, coisas macabras por todos os lugares. Não me espanto não ser diferente de toda a casa. Havia um porta retrato limpo – o único – em cima da cabeceira da cama, aproximei-me e o peguei na mão. Era uma foto com várias pessoas, Sirius, os pais de Harry, Rabicho, mais alguns familiares, Moody e Lupin.


Tell me that you'll open your eyes.
Me diga que você abrirá seus olhos.


- Não devia estar aqui, Hermione. – Ouvi a voz de Lupin surgir na porta. O porta retrato quase foi a chão com o susto que levei. O deixei no lugar e guardei minha varinha.

- Me desculpe, professor Lupin. Eu errei de quarto. – Ainda estava em choque. – Desculpe a curiosidade mas, quem dormia aqui? – Perguntei já me intrometendo em toda a história. Sai e logo Lupin tranco aquela porta com a chave mestra da casa.

- A Senhora Black. – Sorriu e me conduziu até meu quarto. – Não fique se perca da próxima vez, OK? Boa noite. – Concordei com a cabeça e também lhe dei boa noite.


All this feels strange and untrue
Tudo isto parece estranho e irreal

And I won't waste a minute without you
E eu não vou perder um só momento sem você.


***


Meus olhos abriram instantaneamente. Parecia que algo tinha caído perto de mim. Desencostei minha bochecha da minha mão direita e ergui minha cabeça. Tirei as cobertas pesadas de cima de mim e acendi o abajur. Não tinha ninguém no quarto além de mim e Bichento. Aquele gato arranhava a porta como se quisesse sair.

- Fique quieto, Bichento. – Soltei coçando os olhos e me levantando. O peguei no colo e abri a porta para passá-lo para fora quando Tonks passou apressada pela minha frente colando seu roupão. – Tonks?

- Fique no seu quarto, Hermione. – Sussurrou apontando para dentro.

- Mas-

- Obedeça. – Disse imponente.

Fechei a porta frustrada; Um profundo suspiro e uma olhada para meu roupão, ia sair dali sim. Peguei e o vesti rapidamente abrindo a porta ignorando as ordens de Tonks. Estavam lá em baixo, podia ouvir a conversa daqui. Apoiei-me no corrimão da escada e me debrucei para poder ouvir apenas mais um pouco.

- O que houve? – Ouvi Ron chegar junto com Harry, me cercando.

- Shiu! – Pedi em advertência. – Orelhas extensoras seriam uma boa. – Soltei a mim mesma.

- Não trouxe nenhuma comigo. – Disse o ruivo. – Mas o que está acontecendo?

- Não sei. Vamos. – Comecei a descer alguns degraus da escada junto com Harry e Ron, o moreno tomou a frente. No último degrau, me apoiei no ombro de Harry e estiquei minha cabeça para poder ver dentro da sala como ele.

- Isso é um horror, Moody... Você tem que ir ao hospital! – Disse Tonks.

- Fala baixo. – Ordenou o velho bruxo tossindo logo em seguida. Foram só alguns cortes.

- Só alguns cortes, Alastor? Você está desfigurado. – Meus olhos cresceram, a reação dos garotos não foi diferente.

- Foi por pouco. – Uma quarta voz surgiu.

- O Ministério irá querer saber o motivo. – Uma outra voz também apareceu.

- O que está acontecendo?? – Sussurrei no ouvido de Harry sentindo meus dedos congelarem.

- Acho que- - Deu alguns passos mesmo sob pedidos meu e de Ron para que voltasse. Ao chegar perto da porta, ela se abriu para o espanto de nós, Shacklebolt foi quem abriu. Era dono da primeira voz desconhecida, agora consegui fazer as associações.

- Temos visitas. – Abriu a porta totalmente. Pudemos ver Moody, estava esvaindo em sangue sentado numa cadeira, estava terrível. Também estava sem seu olho de vidro, uma cena de filme de terror.

- O que eu disse?! – Tonks surgiu entre Shacklebolt o empurrando para dentro e fechando a porta atrás de si. – Vocês não tem nada a ver com isso. – Fui até Harry.

- Por que ele está assim? – Perguntei rapidamente antes que mandássemos nós para os nossos quartos.

- Não se metam. Subam agora! – Apontou para a escada.

- O que aconteceu, Tonks?

A moça ficou um pouco atordoada, pegou no meu ombro e no ombro de Harry e nos tirou dali chamando por Ron. Estava nervosa e soando frio. Os arrastou para a cozinha, mandou que nós nos sentássemos e se serviu da coisa mais forte que tinha ali.

- Por isso que vocês se ferram tanto! Querem saber de tudo a todo o momento! E ainda é assim: quando vocês querem, tem que ser no mesmo minuto! Isso mata qualquer um! – As palavras saíram vomitadas.

- O que aconteceu com ele? – Perguntou Harry.

- Dá um chute. – Ergueu uma das sobrancelhas e se serviu com mais bebida.

- Voldemort. – Respondeu juntando as mãos apoiadas na mesa. – O que ele fez?

- O que ele não fez, seria a pergunta mais correta. – Bebeu em três goles. – Mas o Moody procurou. Oh sim, procurou e encontrou!

- Por que? – Perguntou Ron começando a ficar pálido de frio.

- Segundo seu ex-professor, apenas um atrativo e pronto, já apareceu três comensais prontinhos para acabar com alguém. – Meneou com a cabeça. – Moody é tão burro! – Colocou uma mão na testa. – Ele fez de propósito, só pode ser! Ficou andando pelas redondezas do último caso de trouxa morto, até que apareceu três comensais e uma cobra, se ela tivesse lhe picado, estaria morto.

- Mas por que ele fez uma coisa dessas? – Perguntei completamente confusa.

- Aquele velho anda sem um parafuso. – Apontou para a cabeça. – Queria provocá-los, queria ter uma briga frente a frente. Uma dessas vitimas trouxas, foi uma de suas irmãs. – Levei uma mão à boca. – Um aborto, o único na família de, quando soube, saiu daqui daquele jeito. - Deixou o copo em cima da mesa e cruzou os braços. Harry deu um murro na mesa assustando todos nós.

- POR QUE ESSES DESGRAÇADOS TÊM QUE ACABAR COM A VIDA DESSAS PESSOAS INOCENTES?! – Deixei uma lágrima escorrer até enxugá-la discretamente. Levantou-se indo até a porta, parando a sua frente e soltando o ar que prendia.

- Fica calmo. – Pediu Tonks indo ao seu lado e colocando as mãos sobre seu ombro. – Fica calmo... – Disse mais uma vez olhando para seu semblante nervoso. – Vão descansar, amanhã o dia vai ser pesado para vocês. – Soltou de Harry e se dirigiu até a sala onde estava Moody e todos os outros. Ron e eu nos levantamos, o ruivo passou por Harry e o chamou, nada fez. Eu passei e peguei em sua mão, estava fria como gelo. Entrelacei meus dedos no dele com um olhar calejado, até conseguir fazer com que ele se mova e saia desses pensamentos.

- Quando irão parar?! – Perguntou Ron para os céus, entrando em seu quarto. Eu os acompanhei, isso conseguiu tirar o sono de qualquer um. O ruivo se jogou em sua cama de uma maneira desconfortável e eu e Harry nos sentamos na sua cama. – Isso nunca muda... – Olhou para o teto. Mirei meu olhar em Harry e vi que estava mais calado do que antes. Peguei em seu rosto e encostei minha testa em sua cabeça fechando os olhos.

- Sei como está se sentindo... – Soltei para que só ele ouvisse.

- Não sabe.

- Sei, pode ter certeza que sei. – Também fechou os olhos e passou a mão pelo meu ombro me segurando um pouco mais ali.





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