Parte II





Parte II


Ainda muito pequena, minha irmã me contara o conto daquele que dividia comigo o nome. Eu, então, já sabendo o quão bela era, temi que eu compartilhasse também a história de Narciso.

Ao iniciar meus anos em Hogwarts, percebi que afinal, a beleza não era algo tão importante assim. Eu poderia ter várias pessoas ao meu redor, poderia ter influência, um bom partido (realmente conseguira um).

Mas veio a época em que isso era o que menos importava, o que eu menos queria. Eu sabia que se eu contasse isso para alguém essa pessoa se riria, diria ser apenas uma fase, que eu tinha demais e por isso desprezava (eu realmente desprezava o que tinha).

Foi quando eu o encontrei, aquele que ouvia o que eu tinha a dizer, que estava sempre ao meu lado. Eu soube, no dia em que eu deixei que ele me visse chorar, que eu não estava tão sozinha assim (pensara então que jamais ficaria sozinha novamente).

Porém isso acabara há um ano, quando eu me casara com Lucius, quando ele se unira ao Lorde do meu marido. Eu voltara a ser apenas a boneca de porcelana, colocada em uma prateleira como enfeite, olhos de vidro fixos no nada, bela e inútil (mamãe me dava bonecas assim quando eu era pequena).

E lá estava eu, parada em frente a um espelho, mirando meu rosto, encarando de volta o olhar vazio. Senti uma enorme vontade de jogar a escova que usava para pentear os cabelos contra ele, sete anos de azar (o que seriam sete anos de azar?).

Batidas na porta, o criado entrava para anunciar uma chegada. Após dispensá-lo, lancei um último olhar ao meu dito inimigo (pensar que um dia fomos amigos).

Afinal, da sina de Narciso eu escapara. Já não via mais motivos para me apaixonar pela minha própria imagem (quem se apaixonaria?).

—*—

Ao chegar na sala de visitas, fiquei parada na entrada, sem acreditar no que via. Eu não o esperava, e por mais que desejasse estar com ele novamente, sua presença não me era algo exatamente reconfortante.

Ele se vira, e o que parecia ser os velhos tempos está de volta. Eu me aproximo, sorrindo, o abraço, ignoro o quão encabulado ele fica com o gesto.

Nos sentamos, eu pergunto o que o traz aqui. Ele fala que está em uma missão e como a noite prometia tempestade e ele estava por perto, resolvera parar.

Tento disfarçar minha desilusão pelo fato de ele estar ali ser apenas algo prático. Pergunto, quase casualmente, se ele tem notícias de Lucius.

Ele evidentemente não quer responder, e começa a olhar pela janela. Eu pergunto de novo, temendo a resposta.

Ouço-o dizer que meu marido também está em uma missão, e ele não precisa dizer qual é para eu saber. Eu sabia o que eles faziam, mas ouvir disso dele naquele dia foi o bastante para eu piorar.

Silêncio, constrangedor e indelicado. Eu só penso na família escolhida, em como eles se sentiram ao saber que a morte viria rápida, tingida de verde e que as últimas palavras que eles ouviriam seriam Avada Kedrava.

Seria hipocrisia se eu dissesse que realmente me importava com o fim dos traidores do sangue, de trouxas, seria hipocrisia dizer que eu não simpatizava com a causa. Mas... E as crianças que seriam mortas sem nem ao menos saber o porquê?

Pela segunda vez, um criado me retira de meus pensamentos, e eu me sinto aliviada por essa trégua. Após algumas ordens, me retiro, quase feliz de, por ora, não correr o risco de lembrar de coisas que não quero me lembrar.

—*—

Às seis horas em ponto, como manda a etiqueta, o jantar está servido, e eu o espero unir-se a mim para iniciar a refeição. Como vinha ocorrendo ultimamente, eu tenho pouco apetite, e isso não escapa aos olhos dele.

Quando terminamos, voltamos para a sala de visitas, para continuar a conversa de horas atrás. Eu mando os criados se retirarem, mas depois, temendo os reais motivos por tê-lo feito, me afasto dele.

Por uma das janelas, observo a neve cair agressiva do lado de fora, como um retrato do que se passa dentro de mim. Lembro-me das regras sociais, então o ofereço algo para beber.

Ele aceita, pede Whisky de Fogo, e eu, enquanto sirvo, observo o líquido amarelo que meu pai costumava tomar. Sem reparar, já estou falando isso para ele, relembrando mais uma vez a época em que eu não podia ao menos saber o nome daquela bebida.

Eu tomo vinho, sem saber que mais tarde ele traria lembranças indesejáveis. Continuo a falar, primeiramente sobre assuntos um tanto quanto neutros, que por sua vez conduzem a tantos outros que eram o motivo da minha angústia.

Voltávamos então a Narcissa e ao Severus, sentados sozinhos na torre da sonserina quando todos os outros já dormiam. Mas é somente quando eu reprimo as lágrimas que imploram para cair que eu percebo que aquele tempo de inocência jamais voltaria.

Então, sem olhar para ele, defiro o golpe final. Eu não contara nem ao pai que eu estava grávida, e não fora pela falta de oportunidades, e sim por aquele desespero que me atormentava desde quando eu soubera, afinal, o que uma pessoa que não podia lidar nem com os próprios problemas poderia oferecer a um filho?

Não o vejo se aproximar, somente o sinto quando ele toma minhas mãos entre as dele, me obriga a me erguer. Em um impulso, me envolvo nos braços falsamente amigos, buscando o conforto que há tempos não encontrava.

Ergo meus olhos a procura dos olhos dele, e imperceptivelmente nossos lábios estão se aproximando. Viro meu rosto, e digo mais para mim mesma que não poderia trair Lucius.

Mas no momento seguinte toda a convicção se esvai, e você promete a si mesma que é só por aquela noite, só porque você é fraca demais para resistir. Acima de qualquer suspeita, ninguém esperaria que vocês fossem inconseqüentes o bastante para tal.

Mas como eles esperavam que você pudesse suportar?

—*—

A manhã seguinte é fria e quieta, sem nem ao menos olhares trocados. Nos despedimos com palavras impessoais, e eu acredito que a dor que isso causa talvez ajude a esquecer.

Observo-o saindo debruçada no parapeito da janela do meu quarto, longe da vista de qualquer um, principalmente da dele. Lembro-me da primeira noite de casada, quando Lucius me disse o que era esperado de uma Malfoy, e então dos longos discursos de Bellatrix sobre o que era ser uma Black.

Eu sabia que teria de ser forte, não apenas por mim, mas também pelo meu filho, que estaria tão desamparado quanto eu estava agora. Seria uma Malfoy, seria uma Black, seria o que eu deveria ter sido antes que fosse tarde demais, e que agora não deixava opções.

A neve ainda cai lá fora, e dessa vez traz lembranças de quando ela me parecia bela, de quando tudo era simples. A criança nascerá em Paris, e eu espero que ela possa ter ao menos uma parte da felicidade que eu tive lá.

Olho para baixo, e ele ainda está atravessando o jardim. Algo me diz que ele não seguirá para o destino que anteriormente planejado, sorrio ao pensar aleatoriamente na sala comunal sonserina.

Em um último pedido, antes que o que se passara ficasse para trás, ouço minha voz, em um sussurro quase inaudível, e espero que, de alguma maneira, ela chegue até ele.

Protège Moi

—*—


NA:

A fanfic, apesar de não ter partes da mesma, é inspirada na música Protege Moi, do Placebo. Escrita para o II Challenge de Shippers Pouco amados do fórum Aliança três Vassouras.

E, para lembrar, comentários não matam, sabia?

Bruna F.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.