Sexta-feira dia e noite



Sexta-feira.
- Mãe! Elas ainda estão dormindo! – ouviram uma voz de criança gritar da porta do quarto.
Um travesseiro voou nesta direção.
- Bernard! Me deixa em paz! – gritou Marianne.
Lily pegou seu próprio travesseiro e cobriu o rosto, tentando abafar qualquer som ou luz que a impedisse de voltar a dormir.
- Eu preciso dormir mais, ontem foi um longo dia – sussurrou para si mesma.
- Hoje será um longo dia, querida amiga! – ouviu Marianne dizer, entre o estar entusiasmada e morrendo de sono.
E definitivamente seria. Não apenas um longo dia, pois o tempo não passava e não chegava a hora de irem ao primeiro dia do Festival, como aquela noite seria longa.
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O mesmo se dava para os dois moradores da casa em frente.
James andava de um lado para o outro em seu quarto, enquanto Sirius apenas aguardava sentado na cama do amigo.
Até que o relógio do quarto marcou ser sete horas e vinte minutos da noite e um pomo de ouro saiu de dentro dele para avisar:
- Início da partida. Início da partida. Início da partida.
Para então se recolher novamente dentro do relógio.
James encarou o amigo, sorriu, saiu do quarto, sendo acompanhado pelo outro. Eles se dirigiam ao final da rua, em direção contrária à praça. No caminho, nada coincidentemente, encontraram Daniel.
Eles o cumprimentaram. Daniel, que não estudava em Hogwarts, não sabia da obsessão de James por Lily, então não tinha motivos para desconfiar de nada. James, como um bom amigo, ajeitou a gola da blusa do outro e lhe desejou boa sorte com sua garota. Em seguida continuou seu caminho com Sirius.
Este último parou em frente a uma casa e esperou a garota que tinha convidado naquela tarde descer. James voltava, tomando cuidado para não encontrar Lily, assim como os dois se evitaram durante toda a tarde, e aguardaria dar oito horas para ir à casa de Marianne.
Noite de Sexta-feira.
Após sua amiga ter sido encantadoramente levada por seu par, Marianne sentou-se numa poltrona em sua varanda e ficou a esperar por seu próprio par. Será que ele seria tão romântico quanto Daniel? Não, James Potter e Sirius Black eram galanteadores, não românticos. Eles apenas usavam os truques certos para se conquistar uma garota. Eles apenas sabiam o que deveriam fazer. Daniel era poético por natureza. Fazia parte da essência dele aquele ar de ‘Don Juan’. Principalmente pelo fato de ser um pouco mais velho, mais maduro.
Marianne não poderia esperar de Potter mais do que ele poderia lhe dar. Caso contrário poderia machucar-se seriamente. Além do que, não era por ela que os olhos dele brilhavam daquela maneira diferente e especial, como brilhavam apenas para uma única garota, mesmo com todas as garotas com quem ele já saira.
E flutuando em pensamentos Marianne não notou que Sirius Black passara em frente a sua casa acompanhado de uma bela garota loira. E, pelo mesmo motivo, foi surpreendida com uma rosa que alguém segurava a centímetros de seu rosto. Uma bela rosa amarela cujas pétalas era vermelhas nas suas bordas.
A garota ergueu a cabeça para encarar um sorridente James Potter, para quem ela sorriu derretida em resposta.
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Não era porque o encontro havia sido armado que deixava de ser um encontro. O fato de ser um meio para atingir um fim não tira a importância do meio. Seu objetivo principal ser sair com Lily Evans não o impedia de sair com outras garotas. Muito menos de se divertir com elas. E era isso que James Potter pretendia fazer àquela noite. Mesmo que de fundo houvesse o plano de vigiar sua ruiva. Seria uma árdua tarefa, conciliar as duas coisas, mas nada impossível para um maroto. Se ele consegue achar um minúsculo pomo de ouro voando em meio à tempestade, porque não conseguiria achar uma bela ruiva em meio às pessoas? O problema seria não se deixar distrair com aquela morena esbanjando... James engoliu em seco ao olhar a outra de cima a baixo... Vitalidade.
Ele estendeu a mão a ela, que prontamente aceitou e se levantou.
O Festival estava igualzinho ao do ano passado, observava James. Barraquinhas de comes e bebes, de jogos e brincadeiras, um palco bem no meio da pracinha e, é claro, as varinhas flutuando por todo o local, formando túneis, trilhando caminhos de idas e vindas pela praça.
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- É a primeira vez que você vem a este Festival, não é? – perguntou Daniel, ao que Lily respondeu que sim com a cabeça. – Então você precisa ir naquela tenda.
O rapaz apontava para uma pequena tenda no outro extremo da praça. Eles deram a volta, passando por entre brinquedos, crianças, barracas, pessoas e o palco, até finalmente chegar à tenda. E lá entraram.
Luzes azuis brilharam como estrelas num cenário totalmente negro. Era tão escuro que Lily instintivamente segurou o braço de Daniel, como que para não se perder. Uma varinha surgiu do nada a sua frente.
- Vamos, toque na varinha. – ouviu a voz de Daniel ao seu lado.
Lily, sentindo-se idiota por parecer uma criança assustada, largou o braço dele e tentou pegar a varinha, mas ela se afastou ao mais suave toque de seus dedos, descrevendo uma onda de luz pelo ar.
- A primeira varinha surgiu no início dos Tempos – dizia uma voz feminina narradora – quando o homem ainda não havia se divido em trouxas e bruxos.
A escuridão acima de suas cabeças deu lugar à estrelas reluzentes. Um homem aparentemente muito real surgiu agachado mais à frente. Com cabelos cumpridos desgrenhados e sujos, ele era um típico homem das cavernas. A temperatura ambiente esfriou consideravelmente e o homem esfregava os braços numa tentativa inútil de se aquecer.
Lily pôde sentir aquele frio e viu-se imitando o gesto do homem primitivo.
Bruscamente, ele agarrou um grande graveto que havia no chão e o partiu ao meio. Quando levantou o braço para atirá-lo longe, num gesto de raiva devido a sua impotência perante o frio, os outros gravetos a sua frente no chão ascenderam-se em chamas.
- Talvez por acaso, talvez por instinto. – continuou a narradora – O homem descobriu a mágica. Percebeu que repetir aquele movimento, com aquele graveto, na intenção de se aquecer, produzia o fogo. Aquele pequeno pedaço de madeira, que já havia sofrido as mudanças do tempo, incapaz de fugir da chuva, da areia, das penas dos pássaros que por ventura houvessem caído sobre ele, da corrosão dos efeitos da natureza de uma maneira geral, em contato com a magia que emanava daquele ser, foi a primeira varinha de que se tem notícia no mundo. Não foi fácil reproduzi-la novamente. Mas o avanço do homem, evoluindo como ser humano e como bruxo, criaram o que hoje chamamos de Varinha Mágica. E foi assim que surgiu a varinha.
A imagem do homem das cavernas desapareceu, assim como o céu estrelado e a voz da narradora. Logo estavam os dois sozinhos na tenda escura novamente. Até que uma luz surgiu ao lado de Lily.
- E então? Gostou? – perguntou Daniel, com sua própria varinha a iluminar o interior da tenda.
- Sim. – respondeu uma sorridente Lily – Foi impressionante. Bem diferente da história que os trouxas contam sobre como fazer fogo...
- Que bom que você gostou. Agora vamos?
- Claro. – respondeu ela, mantendo forçadamente o sorriso.
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Sirius, por outro lado, tinha intenções diversas ao levar sua garota àquela tenda.
- Black, eu já conheço a história do surgimento da varinha. – disse Amy – Eu venho nesse festival todo ano e definitivamente não é por causa dessa tenda...
- Isso, minha querida, é porque o seu ex-namorado era um chato que não tinha capacidade para aproveitar devidamente essa tenda – respondeu Sirius, sorrindo maliciosamente.
Ela estava prestes a responder, de uma forma nada gentil, Sirius pôde notar, quando viram um casal saindo da tenda. Imediatamente se instaurou um pesado e confuso clima no ar. Era justamente o ex-namorado de Amy que saíra daquele local comumente usado pelos casais que queriam alguns minutos de total privacidade e escuridão. Aquele local para o qual Sirius queria lhe levar para fins nada inocentes. E lá estava ele, com uma garota que Amy nunca vira na vida, mesmo tendo lhe prometido que não iria ao festival com ninguém. Mesmo tendo terminado um namoro de anos apenas há uma semana atrás.
A loira então segurou a mão de Sirius e caminhou em direção à tenda.
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James observava a cena com um sorriso tão triunfante quanto o sorriso que Sirius ostentava ao entrar na “tenda infalível”, como eles a chamavam, já que era impossível sair de lá sem ter conseguido arrancar ao menos um beijo de uma garota.
- Ele é muito baixo. – ouviu Marianne dizer, lembrando-lhe que estava ao seu lado – É óbvio que eles não vão lá pra ouvir a historinha, ele só quer agarrar mais uma vítima! Todo mundo sabe pra que aquela tenda é utilizada. É muita cara de pau entrar lá assim, na frente de todo mundo.
- O quê? – perguntou James.
- O Sirius! Não é isso que você está olhando? – disse ela, voltando-se para ele novamente, posto que originalmente estava de costas para a tenda e havia virado o rosto apenas para ver para onde James olhava e porque sorria.
James percebeu que Marianne iria virar-se novamente para confirmar o que vira antes, e se o fizesse viria o casal que ficou do lado de fora da tenda, veria o ex-namorado de Amy, a loira que entrou com Sirius na “tenda infalível”, e a garota ruiva ao seu lado. Veria que na verdade James estava olhando para Lily. Para evitar isso, ele agiu rápido. Segurou o pescoço de Marianne e lhe deu um beijo. Um longo beijo. Um beijo que a deixou atordoada e confusa. Que a fez esquecer-se completamente do que estava falando antes.
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Atordoada e confusa estava Lily.
- O que foi isso? – perguntou.
- Amy. – respondeu Daniel, com o olhar perdido no chão. – A garota com Black, é Amy, minha ex-namorada.
- Ah. – foi todo o som que ela emitiu.
“Que ótimo”, pensou ela. Não teve dúvidas, isso era armação. Só podia ser coisa do Potter, pra tentar estragar sua noite e fazer com que ela não fosse beijada. Olhou ao seu redor e não foi difícil achá-lo por perto. Provavelmente observando seu truque dar certo. Ou não. Difícil observar alguma coisa em meio àquele agarramento com Marianne. Totalmente desnecessário aquilo durante uma festa com todo o povoado presente, crianças circulando, senhoras olhando.
Lily tinha lhe pedido pra sair com Marianne, não pra comer a cara da garota. Então ele podia beijar, mas Lily não? Que espécie de acordo era aquele? E por que ela precisava cumprir? Ele já tinha saído com Marianne, já tinha até beijado a garota, né, agora Lily poderia fazer o que quisesse, não havia motivos para se prender ao acordo. Não que ela não já estivesse fazendo o que quisesse. Se não fosse um momento totalmente inoportuno, ela poderia muito bem beijar Daniel agora. “Mas que droga!”, xingou mentalmente ela, era um momento inoportuno porque Potter criou essa situação desfavorável, propositalmente, utilizando-se de um amigo e dos sentimentos de duas outras pessoas! Lily cerrou as mãos furiosamente, tentando controlar sua crescente raiva.
Quando o casalzinho finalmente deixou alguns centímetros de distância existirem entre seus rostos, Lily foi até lá. Contudo, ao deparar-se com a fonte de sua fúria e também com sua amiga, percebeu que não poderia desfazer abertamente o acordo, pois Marianne ficaria muito triste em saber que Potter só estava ali com ela porque havia um acordo entre eles. Lily olhou para James, que obviamente já havia pensado nisso, e sentiu-se chantageada. Sobre uma coisa, entretanto, ela ainda poderia reclamar.
- Foi idéia sua, não foi? – perguntou para ele.
- Do que você está falando? – perguntou ele em resposta.
- Do Sirius saindo com a ex do cara com quem eu estou saindo!
- Você não quis sair com o Sirius. Vai ver ele pensou em um meio de se vingar. – James mal conseguia esconder o sorriso – Sabe o que acontece, Lily? Meu mundo não gira ao seu redor...
Sem ter o que dizer, sem poder dizer mais nada, a ruiva apenas respirou fundo, cerrou os dentes, girou nos calcanhares e voltou para o lado de Daniel, que continuava perdido perto da tenda, provavelmente imaginando o que o outro casal estaria fazendo lá dentro. Certamente o tempo da explicação já havia acabado.
- Vamos sair daqui. – disse Lily para Daniel, e para si mesma.
Era impossível não notar o quão abalado Daniel ficara, e mais impossível ainda fingir que nada havia acontecido. Por isso Lily levou-o para longe da música, onde pudessem conversar melhor e tentou fazê-lo se abrir.
- É complicado. – disse ele, passando a mão pelos cabelos, num gesto de preocupação, de quem está com o pensamento distante, mas que lhe lembrou imediatamente de uma outra pessoa que faz tal gesto constantemente.
- Você não está bem, quem sabe falar um pouco não ajuda? – perguntou uma sorridente ruiva.
Ele sorriu em resposta e sentou-se no chão, encostado a uma das árvores.
- Nós terminamos por causa de uma bobagem, mas uma bobagem estritamente ligada à confiança. Eu disse a ela que conseguiria fazê-la confiar em mim novamente, mas isso agora vai ser impossível.
- Só porque você veio ao festival com uma garota? Ela também veio acompanhada! – argumentou Lily.
- É, mas ela não me prometeu nada! Enquanto eu lhe prometi que não viria com garota alguma, que não iria sair com ninguém! – ele apoiava a cabeça nas mãos, de forma que Lily não conseguia ver seu rosto – Mesmo que eu tente explicar, ela não vai acreditar que eu tenha vindo com uma garota como seu amigo, pra que ela não ficasse sozinha no festival.
Boquiaberta, Lily sentiu-se diretamente atingida pelas palavras de Daniel. Percebendo o que tinha dito, ele levantou seu rosto rápido o suficiente para ver a reação da outra. Levantou-se de um pulo.
- Não foi isso que eu quis dizer. – apressou-se em tentar consertar.
- Foi exatamente isso que você quis dizer sim. – disse ela calmamente, expondo o que lhe restava de dignidade. – Mas saiba que não precisava ter se dado ao trabalho. Eu já tinha recebido dois convites para vir ao festival antes do seu e mesmo que não viesse com garoto algum seria um problema pra mim. Agradeço a generosidade, mas recuso a piedade.
- Não! – gritou ele antes que ela se virasse para ir embora – Não foi isso! Me desculpe, eu me expressei mal, totalmente equivocado, por favor, não vá embora.
Lily não pôde resistir a esse pedido. Acabou sorrindo para aquela cara de “cachorro que caiu da mudança”.
- Que tal se esquecermos tudo e curtimos o resto da noite? – perguntou ele, estendendo uma mão para ela, que a aceitou e juntos ele voltaram para a praça agitada e barulhenta.
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James saíra com a desculpa esfarrapada de que ia comprar algo para beberem e, sozinho na fila, observava discretamente o outro casal graças a sua brilhante idéia de usar os espelhos dele e de Sirius. Infelizmente não havia conseguido colocar áudio, até porque isso chamaria a atenção de Marianne, mas a visualização era perfeita para James, enquanto o outro reduzido espelho, colocado no colarinho da blusa de Daniel àquela noite, não refletia nada, não mostrava nada, era praticamente invisível.
Apesar de não ouvir a conversa, James percebera que houvera uma discussão, mas viu o sorriso de Lily no final e não gostara nada disso. Teria de continuar tomando conta de sua garota o resto da noite.
- Por que demorou tanto? – perguntou Marianne.
- A fila estava muito grande. – respondeu ele, com seu sorriso que fazia todas as garotas de Hogwarts se derreterem. Exceto Lily.
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- Venha, isso vai ser divertido. – disse Daniel, puxando Lily pela mão até uma barraca onde havia uma jovem mulher que lhe lembrava uma cigana trouxa, com um véu vermelho sobre os cabelos e um vestido da mesma cor.
- A Tenda da Sorte? – perguntou incrédula.
- Sim. Você coloca sua mão no aquário e puxa um pergaminho, onde estará escrita sua sorte. – explicou ele.
- Aquário? – perguntou ela.
Só então Lily notou que a mesa à frente da “cigana” na verdade era a borda de um enorme aquário, dentro do qual havia inúmeros pergaminhos, juntamente com várias espécies de peixes que nadavam de um lado para o outro.
- Tenham muito cuidado – disse a “cigana” – Se o peixe não deixar, desista no pergaminho, procure outro.
- Como assim “não deixar”? O que o peixe pode fazer? – Lily estava cada vez mais surpresa, confusa e assustada.
- Tente. – disse a “cigana”.
Lily então mergulhou a mão dentro do aquário e foi pegar o primeiro pergaminho que viu, quando, de repente, sentiu uma mordida em sua mão. Em um ato reflexo, retirou a mão imediatamente.
- Pergaminho errado, minha doce menina. – a “cigana” sorria.
Na segunda tentativa, novamente um peixe ia em direção a mão da garota, mas dessa vez ela foi mais rápida em tirar a mão do alcance do animal. Na terceira tentativa, também não foi no pergaminho certo.
- Há apenas um pergaminho para cada pessoa, e ele já está predestinado a ela antes mesmo dela pensar em vir aqui. Você deve achar o seu pergaminho, a sua sorte, o seu destino.
Lily respirou fundo, já querendo desistir, já perdendo a paciência com a tal “cigana” que lhe parecia enganar tanto quanto as ciganas enganam os trouxas.
- Vamos, menina, abra sua mente, deixe que os peixes lhe guiem.
“Deixe que os peixes lhe guiem”? Com muito esforço Lily conseguiu controlar sua enorme vontade de rir. Mas já que estava lá, por que não uma última tentativa? Mergulhou a mão mais uma vez e foi observando a reação dos peixinhos nos locais onde tentava ir. Quando via que algum peixe se mexia enfurecido, mudava a direção da mão, até que chegou a um pergaminho sem nenhuma tentativa de mordida. Puxou-o antes que algum peixe mudasse de idéia.
- E então? O que diz? – perguntou Daniel enquanto ela abria o pergaminho enrolado.
- “O futuro lhe trará um caminho” – leu em voz alta – O que isso deveria significar?
- Que no momento, minha doce menina, você está no caminho errado. – respondeu tragicamente a “cigana”, que em seguida abriu um sorriso para Daniel – E quanto a você, jovem rapaz, não vai tentar?
- Por que não? – perguntou Daniel para uma ainda revoltada Lily.
Ele então seguiu o procedimento recém descoberto pela garota e chegou a um determinado pergaminho. O tirou, abriu e leu.
- “Você passará por um difícil teste que lhe fará mais feliz”. Como um difícil teste pode me fazer mais feliz?
- Não sei, mas que tal darmos uma volta? – perguntou Lily, numa delicada maneira de pedir pra sair dali.
Contudo, não atingiu seu objetivo.
- Lily! – ouviu Marianne gritar – O que você está fazendo nesta barraca?
- Lendo a minha sorte? – respondeu forçando um sorriso.
- Ah! Eu também quero.
- E eu adoraria ler a de vocês. – disse James, que somente agora se juntava a eles.
- Deixa de ser fofoqueiro. – brincou Marianne – Eu vou ver a minha.
- Enfia a mão nesse aquário, mas cuidado com os peixinhos. – Lily não conseguiu se controlar.
- Você está bem, Lily? Aconteceu alguma coisa?
- Não, Mari, está tudo bem. – respondeu, evitando olhar para James, ou para Daniel, ou para a falsa “cigana”.
Após algumas mordidas, Marianne tirou seu pergaminho do aquário.
- “Não deixe que os amigos abusem de você. Trabalhe com calma e em silêncio”. Era pra entender?
- Não, não era. – respondeu Lily – Agora podemos ir?
- Mas é claro que não! – respondeu um sorridente James, mesmo que a pergunta não tivesse sido destinada a ele – Falta o meu.
Incrivelmente sem peixes furiosos nadando atrás de sua mão, James pegou com facilidade seu pergaminho.
- “Você nunca hesita em agarrar os problemas mais difíceis”. Ah, o meu foi fácil de entender. – disse ele sorrindo abertamente.
Tão fácil que Lily revirou os olhos e Marianne fechou o sorriso.
- O que foi? – perguntou Daniel – Ele tem uma queda por desafios?
- Não se você fala de uma prova de Herbologia.
- Ah! Saquei – Daniel então abriu um sorriso de cumplicidade direcionado a James.
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James desfez o sorriso ao perceber que não deveria dar em cima de Lily enquanto estivesse saindo com Marianne. Ao menos não na frente dela. O palerma do acompanhante de Lily, contudo, não havia percebido. De qualquer forma, achou melhor se distanciar do casal e levou Marianne para uma outra barraca. Foi notável a alegria da morena perante a atitude, e James logo percebeu que a garota queria ficar um pouco a sós com ele, então a levou para entre as árvores que rodeiam o campo de quadribol, uma vez que este local se encontrava bem iluminado e nada vazio, mas o mesmo não poderia ser dito em relação às árvores. E quanto mais distante melhor.
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Lily observou a retirada discreta do casal para fins libidinosos de maneira nada aprovadora. Sentia raiva de James Potter e raiva de si mesma. Em primeiro lugar por ter aceitado tal acordo estúpido. Em segundo lugar pelo fato das coisas estarem saindo como ele havia planejando, obviamente dando certo para ele. Em terceiro lugar porque... Porque simplesmente detestava aquele garoto e não precisava de motivo para isso. Ele era imaturo, prepotente e impositivo. Tinha jogado sujo ao armar com Sirius para abalar Daniel usando Amy. James tinha de aprender que nem sempre as coisas podem ser como você quer que sejam. E se ele não conseguia aprender isso com todos os “nãos” que Lily lhe dava ao longo de anos, ele aprenderia de outra forma. O difícil seria conseguir isso com alguém tão depressivo ao seu lado.
- Daniel, você precisa reagir! – cansou ela – Ou você vai atrás da sua Amy ou esquece isso e fica aqui comigo!
O rapaz ficou surpreso com a bronca. Não esperava isso vindo de uma garota tão doce quanto ela tinha se mostrado até aquele momento. Mas gostou disso. Afinal, ela tinha total razão. Se ele estava com ela, não era pra ficar pelos cantos sentindo-se mal por causa de outra. Então Daniel resolveu mudar inteiramente sua postura.
- Eu fico com você. – respondeu ele decidido.
- Ótimo. – disse Lily sorrindo – Então vamos aproveitar a noite.
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Foi necessário um tremendo jogo de cintura para que James pudesse, de vez em quando, continuar observando o que sua ruiva andava fazendo enquanto ele próprio se divertia com Marianne. A morena era uma garota extremamente divertida, sem falar na parte da beleza tão bem ressaltada por Sirius durante suas espiadas pela janela. Fora por isso que James havia saído com ela pela primeira vez. Mas muita coisa havia mudado desde então.
Agora ele era um homem com um objetivo. Por mais que continuasse a sair com todas as garotas que pudesse, não era mais a mesma coisa que fora há tempos atrás, aquela diversão por simplesmente sair, pelas apostas com Sirius, pela competição de números, pela competição de qualidade. Definitivamente não era mais a mesma coisa.
James não sabia precisar quando as coisas tinham mudado. Ou como tinham mudado. Mas sabia o porquê de terem mudado. Infelizmente ela não acreditava nele. Não podia culpá-la, nem mesmo seus amigos acreditavam! O que era um total absurdo, pois a palavra de James Potter deveria ter mais credibilidade! Mas também, com a fama de conquistador que tão bem adquirira, de Don Juan insensível que visa apenas sua próxima garota, não poderia de uma hora para outra querer mudar isso. Mas ele queria.
O espelho na gola de Daniel lhe mostrava exatamente ela quando os dois estavam de frente um para o outro. Sempre que era mantida uma distância razoável entre os dois, era possível vê-la perfeitamente. E até aquele momento Lily não havia aparecido perto demais do espelho e isto significava que não estivera perto demais de Daniel.
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A partir daquele momento Lily teve uma ótima noite, divertida e agradável, melhor do que poderia ter esperado. Após se cansarem nos jogos mágicos, eles foram até a área do campo de quadribol e se sentaram no gramado.
- Você tem uma ótima mira! – elogiou Daniel.
- Que nada, foi sorte. – respondeu ela.
Então finalmente chegou aquele momento. O momento em que os dois se olham sem saber se devem se beijar ou não, se devem tentar uma aproximação ou não, se seu desejo é recíproco ou não.
E Lily não pôde deixar de pensar que queria que James estivesse por perto para ver aquilo. Mais uma vez sentiu raiva. Sua vontade deveria ser apenas de ficar ali com Daniel, e não de querer ficar ali com Daniel para esfregar na cara de James Potter que ele não mandava nela. Que ela poderia sim beijar quem quisesse se ele poderia sair com Marianne e beijá-la. Um acordo não é justo se só um sai ganhando. Lily sabia que o que ganhava no acordo era para Marianne. Um gesto altruísta do qual começava a se arrepender.
- O que foi? – perguntou Daniel – Você parece estar tão distante.
- Não foi nada. – respondeu com um sorriso.
Ao ver seu desejo íntimo e repreendido tornar-se realidade, Lily desejou não ter desejado isso antes. Nada poderia ser pior do que James e Marianne se aproximando para estragar aquele momento com Daniel. Mas era a oportunidade perfeita. E Lily, sem pensar duas vezes, a aproveitou.
Olhou Daniel bem nos olhos, tentando recuperar aquele clima de romantismo que havia se instalado há pouco entre os dois e sorriu para ele, que entendeu o recado e se aproximou do rosto dela. Sendo correspondido, os lábios logo se encontraram num beijo delicado.
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James nem ao menos tentou se conter. Não pensou se era certo ou errado. Se era justo ou não com Marianne. Ele simplesmente soltou a mão da garota e avançou para perto do outro casal, esperando de pé, braços cruzados e com muita raiva, que o beijo terminasse.
Eles se afastaram e Lily apenas o encarou, com um ar desafiador que o deixou ainda mais irritado.
- Algum problema? – perguntou Daniel em um tom imponente, sendo, contudo, ignorado por James.
- Você não cumpriu sua parte do acordo. – disse James.
- E você realmente esperava que eu fizesse o que você quisesse? – perguntou Lily, já de pé.
- Sim, já que você deu a sua palavra de honra.
Ele realmente esperava que pudesse confiar na palavra dela, já que ela era conhecidamente uma garota responsável e tinha todas aquelas qualidades irrelevantes de monitora.
- O que você impôs não era justo. – James não entendia o que ela queria dizer com “justo”, pois se ela objetivava algo, fizera o acordo e ele havia cumprido sua parte, como ela poderia estar assim revoltada? Mas achou melhor não a interromper e ouvir o resto do discurso – Pelo contrário, era um absurdo. Principalmente se levar em conta que você ficou aos beijos com Marianne.
James mentalmente chegou a uma conclusão que o fez descruzar os braços e abrir um enorme sorriso.
- Lily Evans está com ciúmes!
- Não, não estou! – gritou ela, surpresa e horrorizada – Isso é um absurdo! Não distorça minhas palavras, Potter. Eu disse que o acordo não era justo uma vez que você poderia sair com Marianne e eu não poderia sair com ninguém!
- Mas eu achei que fosse exatamente isso que você queria! Que eu saísse com Marianne. E eu não a proibi de sair com ninguém.
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- Só não queria que eu beijasse ninguém! – explodiu Lily, perdendo o resto do controle que lhe faltava.
Só então Lily percebeu que a discussão era o centro de atenções do campo, bem como que tanto Marianne quanto Amy estavam presentes na platéia, bem próximas a eles.
Marianne, com a mão sobre a boca e os olhos cheios de lágrimas, saiu correndo e desapareceu na multidão. Amy começava a travar uma discussão paralela com Daniel. Algo sobre ele ter beijado Lily. Parecia que ela também tinha visto.
James não lhe parecia mais tão feliz. Talvez ele tivesse percebido a besteira que havia feito, que magoara os sentimentos de Marianne e criara um problema para Lily. Um problema que poderia lhe custar a amizade.
Notou ainda que Sirius ria. Aquilo lhe deixou enfurecida. Olhou uma última vez para Potter, desejando poder fuzilá-lo com os olhos, antes de sair atrás de Marianne.
Inutilmente, entretanto, pois a garota já havia corrido para longe dali, provavelmente para sua casa, então Lily achou melhor não entrar. Sentou-se numa confortável poltrona que havia na varanda da casa de Marianne e lá ficou, esperando que a outra dormisse para poder entrar, até que ela própria adormeceu.

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