para sempre e nunca mais
Bubu ([email protected])
muito obrigada pelos comentarios
qndo li essa fic eu confesso q chorei muito
agora vou mostar pra vcs o ultimo ca
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Capítulo 15: Para Sempre e Nunca Mais
“Hope” is the thing with feathers/That perches in the soul/And sings the tune without the words/And never stops at all,
And sweetest in the gale is heard;/And sore must be the storm/That could abash the little bird/That kept so many warm.
I’ve heard it in the chilliest land/And on the strangest sea,/Yet never, in extremity,/It asked a crumb of me.
“Esperança” é a coisa com penas/ Que empoleira-se na alma/ E canta a melodia sem as palavras/ E nunca pára,
E doce na ventania é ouvida;/ E dolorida deve ser a tempestade/ Que poderia envergonhar o pequeno pássaro/ Que manteve tantos aquecidos.
Eu o ouvi na terra mais fria/ E no mais estranho dos mares/ Ainda assim nunca, em extremidade,/ Ele pediu um pedaço de mim.
(“Hope” is the thing with feathers, de Emily Dickinson)
O céu estava escuro. Escuro como a noite após o Dia do Julgamento Final deveria ser. Surpreendentemente, contudo, não era noite. Amanhecera há menos de três horas e ainda era possível ver os vestígios das estrelas no alto e da lua minguante no oeste. O sol, contudo, não parecia muito disposto a mostrar sua cara, o que, afinal de contas, não deveria ser assim um mistério tão grande, já que o mês de dezembro trouxera chuva e frio. Por que, então, aquele não-amanhecer em particular parecia estar carregado de maus presságios?
— Eu estou ficando velho — a voz se fez ouvir no corredor silencioso. Era um sussurro que soou retumbante em meio a todas as preocupações.
— Não diga bobagens — foi a resposta feminina, incisiva e curta que ele recebeu — Você não está velho.
— Sim, eu estou — e seus olhos cansados pareciam testemunhar a favor da sua declaração — Pensei que nós já tivéssemos derrotado essa sombra de uma vez por todas. Pensei que...
— Que o quê? — a outra soou impaciente.
— Que eu fosse poder finalmente descansar em paz ao lado da sua mãe. Sinto falta dela em dias assim — ele acrescentou tão baixo que a mulher fingiu de boa vontade não ouvir. Aquela manifestação de cansaço a deixara desconfortável.
— O descanso virá cedo ou tarde. Não adianta nada desejá-lo antes da hora — ela respondeu friamente e o homem a olhou por um instante, se perguntando até que ponto ele realmente a conhecia. Seus papéis pareciam cada vez mais invertidos nos últimos tempos. “Talvez seja assim que aconteça”, ele pensou, “quando nós nos aproximamos da morte”.
— Com licença — ambos foram interrompidos por uma terceira voz que acabara de sair de uma das várias portas que adornavam o corredor — vocês podem entrar agora — completou, seguindo seu caminho quase que imediatamente.
— Não — ele levantou a mão para impedir que a mulher entrasse, recebendo em resposta um olhar surpreso e indagador — Esse papel é meu — explicou. A outra aquiesceu levemente com a cabeça e deu um passo para trás.
— Eu espero aqui, então.
— Está bem — ele disse abrindo a porta e passando para o interior do quarto. “Esse papel é meu”, repetiu mentalmente. Sim, sem dúvida, era um dos pesos sobre seus ombros.
As palavras ecoaram na mente de Draco como num sonho ruim. “Um pacto de sangue não pode ser desfeito”, a voz de seu pai voltou à sua memória saída de uma lembrança do além-túmulo, “a não ser pelo derramamento de mais sangue”. “Sangue de quem?”, uma versão mais jovem de si mesmo perguntara diante da velha escrivaninha que queimara tantos anos atrás. “Essa é a questão, não é mesmo?”, seu pai lhe devolvera a pergunta, arcando uma das sobrancelhas com um brilho no olhar que não significava boas notícias.
— Não — ele falou em voz alta antes que pudesse evitar — Não — repetiu, desta vez olhando firmemente para sua mãe — Você está entendendo? Não!
— Mas, meu filho, você sequer sabe o que eu vim te pedir. Não é bem-educado responder dessa forma — ela virou-se e sentou no sofá calmamente, como se aquela não passasse de uma visita social. O’Brien, contudo, permaneceu de pé. Ele parecia calmo e, enquanto Draco ainda tinha sua atenção voltada para Narcisa, tirou a varinha do bolso com um movimento suave.
— Não se mexa! — Malfoy ainda tentou impedi-lo, mas era claramente tarde demais e, antes que ele pudesse fazer qualquer coisa, seu ‘amigo’ já tinha Gina na sua mira.
— Que pena! — o outro exclamou pesaroso — Eu realmente não queria que as coisas terminassem assim. Tinha grandes planos para você.
— Planos para mim?! — Draco sentiu a raiva começar a dominá-lo e tentou lutar contra ela. Precisava de todas as suas faculdades alertas naquele momento.
— Sim, para você. Se eu tivesse percebido um sinal, qualquer sinal, de que a sua ligação com esta... Weasley não passava de um encanto temporário, de que sua lealdade estava onde deveria estar desde o princípio... Mas não. Você persistiu no erro por tempo demais. Mas agora, talvez, diante das circunstâncias, você considere se juntar a nós. Não? — ele acrescentou quando o outro não disse nada.
— Nunca — Malfoy respondeu firmemente. O que aqueles dois não seriam capazes de compreender é que ele não dizia isso por uma total aversão aos seus métodos. Ele dizia isso apenas porque eles certamente pediriam em sacrifício a única coisa que Draco não poderia dar. A única coisa da qual ele não seria capaz de abrir mão.
Ele sabia que estava em uma situação ruim. Gina não podia fazer mágica, então simplesmente mandá-la aparatar e fazer o mesmo em seguida não era uma opção. Ao mesmo tempo, seus dois oponentes estavam armados e prontos para qualquer tentativa desesperada de fuga. Não havia dúvidas sobre o motivo dessa visita e, se algo não acontecesse logo para modificar a balança de poder naquela sala, Malfoy não queria nem imaginar as possibilidades.
— Que pena! Mas talvez seja melhor assim. Afinal, nós temos que concordar que você foi incrivelmente tolo — O’Brien falou com desdém — acreditando em cada palavra do que eu dizia. Um sonserino deveria saber que não há amigos verdadeiros nesse mundo. Só interesses verdadeiros — ele sorriu e subitamente Draco compreendeu o que tinha que fazer. Aqueles dois podiam tê-lo encurralado, mas eles não sabiam da mensagem que ele enviara para Granger e Weasley antes de ir para casa. Não sabiam que tinham pouco tempo e Matt, Malfoy podia perceber, estava louco para contar a sua história e provar como fora inteligente e astuto.
— Então você estava mesmo nisso desde o início? — perguntou dando corda ao outro e, ao mesmo tempo, se movendo discretamente para frente de Gina. Só precisava ser capaz de protegê-la por mais alguns minutos.
— Você ainda não tem idéia do que diabos é “isso”, não é mesmo?
— Então por que você não me conta? Eu sei que não foi você quem seqüestrou e matou as mulheres. Sei que foi o Eames. Só pode ter sido ele. Vocês dois estavam juntos na história? — Draco trocou um olhar rápido com Gina tentando acalmá-la. Parecia que todo o sangue saíra-lhe do rosto e suas sardas destacavam-se horrivelmente. Ela também não sabia que a ajuda estava a caminho.
— Juntos? Bem, essa é uma questão, digamos... relativa.
— Relativa só se for na casa do caralho! — Malfoy viu sua raiva crescer diante das evasivas. Como aquele homem tinha a coragem de enganá-lo por tanto tempo e ainda assim ficar ali, de pé, fazendo jogos de palavras???
— Ora, querido, comporte-se! Essa não foi a educação que eu lhe dei — sua mãe interveio sorrindo — Você anda convivendo demais com grifinórios. Por acaso não consegue mais perceber as sutilezas da vida? — se possível, seu sorriso aumentou mais — É claro que Eames estava trabalhando para nós. Ele só não sabia disso.
— O quê?!
— Será que você está começando a entender agora, Malfoy? Essa era a beleza toda do plano: nós deixávamos Eames fazer o trabalho sujo sem envolver diretamente nossos nomes e, conseqüentemente, sem arriscar nossos pescoços e, no fim, quando o Lorde das Trevas ressurgisse, nós assumiríamos o poder ao seu lado — a gargalhada de Narcisa soou na sala logo que a voz de O’Brien silenciou.
— Ele claramente ainda não compreendeu. Filhinho, deixe-me lhe contar um segredinho que talvez ajude a esclarecer as coisas — ela se levantou do sofá e se aproximou deles. Gina segurou instintivamente a mão de Draco. Ela estava suando frio — Sabe todo o dinheiro que o Ministério confiscou da mamãe, querido? O dinheiro que a mamãe entregou a eles de mão beijada?
— Porque você preferia me ver arruinado e, se possível, morto. Sim, mamãe, eu sei de qual porra de dinheiro a senhora está falando!
— Tolo! E você realmente acreditou que eu ia dar toda a fortuna da nossa família para aqueles idiotas do Departamento dos Aurores?! É claro que não!!! Nem todo o nosso dinheiro foi ganho através de meios ilícitos. Boa parte dele veio realmente de herança. Eu era uma Black antes de ser uma Malfoy, esqueceu? Acha que os meus pais também não me deixaram nada?! Não, querido. Uma parte razoável da fortuna que eu e seu pai herdamos estava muito bem escondida fora do país. E, perceba você, continua lá, é claro, porque aqueles malditos aurores não são capazes de encontrar sequer suas próprias sombras! Pensando bem, querido — ela pareceu considerar por um minuto — você até que encontrou o lugar certo para trabalhar. Vocês realmente se parecem — acrescentou — O que eu não sei foi o que Lúcio e eu fizemos para merecer você como um filho! — ela completou com desprezo, mas Draco sequer ouviu as últimas palavras. Sua cabeça estava girando a mil. Então ele não estava pobre? Não estava arruinado? Subitamente, uma fúria maior que o mundo o preencheu, pois ele percebeu naquele momento como boa parte do seu sofrimento poderia ter sido evitada. Se ele fosse rico, não teria brigado com Gina quando ela lhe contou sobre o bebê. Se eles não tivessem brigado, ela não teria ido para a casa dos seus pais e, se ela não tivesse ido embora, então talvez não tivesse sido seqüestrada! A culpa era dela! Toda dela! Daquela mulher odiosa que lhe dera à luz e que Draco, naquele momento, só conseguia enxergar através de um véu de fúria vermelha. Como ele pôde amá-la em algum momento da sua vida?! Deveria ter saído do seu ventre já a odiando.
— Eu vou te matar! — gritou antes de disparar na sua direção. Não estava pensando claramente. Sequer estava pensando, na realidade. Só queria derrubá-la, chutá-la, socá-la, comprimir sua garganta com as duas mãos, assistindo friamente a cada instante, até que o último suspiro lhe abandonasse e continuar comprimindo depois, e mais e mais, para que as marcas dos seus dedos a maculassem por toda a eternidade. Queria acabar com a sua vida como fizera com a de Eames.
Antes que pudesse alcançá-la, contudo, sentiu-se sendo empurrado violentamente contra a parede enquanto sua varinha voava para longe. Não houve tempo para luta. Ele sequer tinha ouvido O’Brien gritar o feitiço, sequer percebera o movimento. Apenas sentiu quando sua cabeça bateu na parede dura e, em seguida, cordas foram conjuradas e seus pulsos, amarrados enquanto ele ainda estava atordoado demais para fazer qualquer coisa.
Gina tentou impedi-los, tentou se aproximar dele, mas Narcisa a manteve quieta sob a mira de sua varinha e não havia nada que ela pudesse fazer contra isso. Teria que continuar agora sem sequer o consolo de ter sua mão entrelaçada à de seu marido.
— Você é a razão disso tudo, Weasley — Narcisa falou — Você foi a ruína da minha família. Se não fosse pela sua maldita interferência, eu não teria ido parar em Azkaban. Eu teria posado como uma vítima do meu marido e meu filho teria me apoiado. Ele teria se casado decentemente, teria gerado mais um herdeiro puro-sangue para a nossa família. Seria poderoso e rico e eu não precisaria tê-lo agora preso aos meus pés. Você acha que eu gosto de fazer isso com o meu próprio sangue?
— Eu não acho que você saiba o que realmente significa a palavra ‘mãe’ — Gina respondeu corajosamente, encarando a outra mulher nos olhos — Eu tenho pena de você.
— Você o quê?! — e a máscara de calma de Narcisa oscilou por um instante, revelando uma raiva semelhante à que seu filho era capaz de sentir.
— Eu tenho pena de você — Gina respondeu com ainda mais firmeza, levantando seu nariz no ar e ignorando a expressão de desespero no rosto de Draco. Ele conhecia sua mãe e sabia que ela não deixaria isso barato.
— Gina, pelo amor de Deus, fique quieta!
— Por que eu deveria? — ela respondeu também com raiva — Por que eu deveria me submeter a essa mulher que entrou na nossa casa para nos ameaçar? Você não é nada! — ela virou para Narcisa de novo, se movendo para frente — Você não é nada além de uma sombra! De um fantasma que tenta a todo custo se agarrar a esperanças perdidas. Você não é ninguém! E eu tenho pena de você, sim! Porque isso é tudo o que você merece de mim — ela acrescentou, revelando-se exatamente como qualquer sonserino esperaria: corajosa e tola. Mas, de um jeito ou de outro, suas palavras atingiram o alvo e, furiosa, Narcisa levantou a varinha e disse apenas uma palavra:
— Crucio!
— NÃÃÃÃÃÃÃÃO! — Draco gritou, tentando se arrastar pelo chão, querendo fazer alguma coisa, qualquer coisa, para impedir aquilo. Mas era tarde demais. Gina já estava caída, o corpo contraído em posição fetal, as mãos abraçando seu estômago como se uma espada a estivesse perfurando e a voz ecoando pela sala num grito de agonia profunda — PARE COM ISSO!!! — Draco berrou para sua mãe em desespero — PARE! O que quer que seja, o que quer que você tenha vindo me pedir, eu faço, mas DEIXE ELA EM PAZ!!! — finalmente, ele viu a outra abaixar o braço e Gina parou de se contorcer. Ela permaneceu deitada, contudo, imóvel e ofegante. Seus olhos estavam fechados e Draco aproximou-se dela, rastejando com dificuldade. Ele não podia tocá-la, então contentou-se em abaixar a cabeça e mergulhá-la no seu pescoço, murmurando que ia ficar tudo bem. Para sua própria surpresa, seus olhos estavam molhados com lágrimas não derramadas.
— Você não pode imaginar a minha felicidade quando eu soube que Eames escolhera essa sua mulher como uma de suas vítimas — Narcisa falou calmamente, quebrando o silêncio na sala — Eu sabia como funcionava o ritual. Sabia o que ela iria sofrer. Minha felicidade foi indescritível. Mas, infelizmente, ela sobreviveu. Malditos Weasleys! Sempre têm mais vidas do que nós gostaríamos. E, para completar, ela sequer se lembra do seu suplício. Qual a vantagem de se torturar alguém e deixar a pessoa viva se ela sequer poderá ser atormentada pela lembrança no futuro?! — acrescentou como se fosse uma pergunta retórica.
— Eu realmente te odeio — Draco levantou a cabeça para encará-la.
— Ah, que gracinha! Ele está chorando, Matt! Que romântico!
— Eu realmente te odeio — ele repetiu trincando os dentes.
— Naturalmente, meu filho, naturalmente. Eu fiz questão de te dar todos os motivos para isso.
— Então tudo o que você fez foi para me atingir?
— Não seja egocêntrico, querido. O mundo não gira ao seu redor. O que eu fiz foi por mim! Eu usei uma parte do dinheiro escondido para criar a organização da qual Matt faz parte e isso não teve nada a ver com você.
— Mas eles são uma organização que investiga crimes!
— Não seja tolo. Esta é apenas a fachada. O seu trabalho real é ficar perto do Ministério e manter os olhos e os ouvidos bem abertos para toda e qualquer atividade suspeita. Eu estava apenas esperando uma oportunidade para voltar à ativa, assim como vários bruxos das trevas. Ou você acha mesmo que algum dia será possível acabar com todos nós?
— E foi assim que vocês descobriram Eames — Draco disse, finalmente começando a entender a história toda.
— Exatamente. Ele era apenas um garoto na época, mas já tinha um sonho grandioso: fazer ressurgir o Lorde das Trevas. Um propósito nobre, não acha?
— O problema — O’Brien acrescentou — é que o detetive que descobriu o que estava acontecendo era honesto. Nós tínhamos que contratar alguns deles para manter a credibilidade da organização, entende? Só que quando ele veio nos contar tudo, ao invés de ir ao Ministério, nós resolvemos tirar proveito da situação.
— E Smith teve que sofrer um acidente — Draco concluiu.
— Assim como sua mulher, é claro. Um terrível inconveniente, mas que outra saída nós tínhamos?
— Você chama um duplo homicídio de um terrível inconveniente?! — Gina interrompeu, sentando-se no chão.
— Querida, por favor, fique quieta — Malfoy implorou.
— Ah, mas que gracinha! Você chama ela de ‘querida’? Era assim que seu pai me chamava, se lembra? — Narcisa sorriu para os dois.
— A diferença é que ele só falava isso por falar. Nunca significou nada. Ele não sentia. Ou você acha que eu não sei?
— O que, por favor, você sabe, querido? Na certa, é algo assustador — ela debochou.
— Eu sei que você não era a única dele. Eu sei que ele te traiu.
— Crucio! — Narcisa lançou o feitiço antes mesmo que Draco tivesse terminado de falar, mas não apontou para ele. Apontou para Gina e a mulher voltou a se contorcer no chão.
—Fui eu quem falei! Aponte a porra da varinha para mim, mas deixe ela em paz!!! — Malfoy gritou desesperado diante da sua própria impotência, mas dessa vez sua mãe levantou a maldição rapidamente.
— Você fala uma besteira, ela sofre. É assim que funciona.
— Sua...
— Tem certeza de que você quer terminar esta frase? — ela perguntou friamente, apontando de novo a varinha na direção de Gina — E agora vamos direto ao assunto porque eu não sei quanto tempo ainda nos resta aqui.
— Sábias palavras — O’Brien concordou sorrindo e se aproximando.
— O que você quer de mim? — Malfoy perguntou, fechando os olhos e xingando mentalmente Weasley e Granger por ainda não terem aparecido. Os dois tinham que ter lido o bilhete! Aquela era a única esperança que lhe restava.
— Muito simples. Eu quero que você a mate.
— O quê?!
— Que parte da minha frase você não entendeu? Eu. Quero. Que. Você. Mate. A. Sua. Mulher. O ritual ainda não está completo porque ela ainda está viva. Portanto, eu quero que você a mate e, assim, traga de volta o Lorde das Trevas. Ah, e você tem usar isso, é claro — acrescentou tirando do bolso um punhal embainhado — Ela deve morrer de hemorragia, mas eu deixo você escolher a artéria que preferir.
— Eu não vou matá-la! Eu não posso matá-la! Você está louca!
— É uma recusa isso que eu ouço saindo da sua boca, querido? Será que eu preciso te lembrar de qual é a penalidade por quebrar um juramento de sangue?
— Você sempre soube que eu iria recusar. O que você quer é me ver morto!
— Draco, não...
— Quieta, Gina.
— Eu não quero que você morra! — ela se sentou com dificuldade.
— E eu não tenho o mínimo desejo de morrer, mas eu também não vou te matar! — ele exclamou, mas Gina não estava ouvindo. Num movimento rápido do qual ninguém imaginou que ela fosse capaz, a mulher se levantou do chão e correu na direção da mesa de centro, onde havia um pequeno cortador de papel.
— Não! — Narcisa exclamou antes que ela pudesse alcançar seu objetivo e Matt cuidou de murmurar um:
— Impedimenta — que a fez parar e cair para trás.
— Você quer que eu morra! — Gina exclamou olhando para sua sogra — Que diferença faz quem me mata?!
— Weasley, você realmente não tem talento para isso. É claro que faz diferença quem te mata! Eu quero que o meu filho o faça porque eu quero que ele destrua a única coisa que ele ama neste mundo. Passei muitos anos pensando em qual seria a tortura adequada para ele e, acredite, eu sou especialista no assunto. Mas, de alguma forma, a dor nunca me pareceu a melhor opção. Eu não quero você morto, meu filho. Eu quero você vivo e, de preferência, com a consciência de que a morte dela foi culpa sua. Toda sua.
— Então você perdeu a viagem, porque eu não vou matá-la e não há nada que você possa dizer ou fazer para me obrigar!
— Tem certeza? — ela perguntou e Malfoy hesitou antes de responder. Havia algo de perigoso naquele tom de voz — Você sabe o que eu sou capaz de fazer. Você sabe que eu tenho muita experiência em causar dor aos outros.
— O que você está querendo dizer?
— Draco, não dê ouvidos a... — Gina tentou interrompê-lo, mas foi ignorada.
— Eu estou querendo dizer que você tem uma escolha — Narcisa continuou — Você pode matá-la com suas próprias mãos e, nesse caso, ela terá naturalmente uma morte rápida e misericordiosa. Ou... você pode me deixar matá-la.
— Não.
— Sim. Crucio! — ela gritou em seguida, como quem quer mostrar que está falando sério.
— PARE!
— Não. Eu não vou parar! — Narcisa respondeu e não havia nada que Draco pudesse fazer para ajudar Gina. Ela estava na sua frente, sofrendo. Ele conhecia aquela dor, sabia como era horrível e tudo o que podia fazer era assisti-la sofrer e chorar de raiva. Não podia sequer envolvê-la em seus braços tentando consolá-la — Eu não vou parar, meu querido. Não até você me dar a sua resposta.
— Deixe ela em paz! — foi tudo o que ele conseguiu dizer.
— Ah, mas eu não posso fazer isso, posso? Não. Acredite, este é apenas o começo. Ela tem que morrer de hemorragia, se lembra? E a Cruciatus não provoca sangramento. Então, logo eu terei que mudar de tática.
— Aliás, o que você acha, Malfoy, de nós os levarmos para um lugar mais reservado? — Matt interrompeu — Um lugar onde não haverá riscos de interrupção e onde eu poderei, digamos, ajudar a sua mãe a cuidar da sua mulher com a maior calma do mundo? Eu tenho que admitir: sempre fiquei curioso em descobrir o quanto Eames aproveitou antes de finalmente tentar matá-la...
— CALA A BOCA! — Draco gritou com ódio nos olhos. Ele sabia sobre o que O’Brien estava falando e a mera menção era suficiente para levá-lo à loucura — Levante a maldição!!! — ordenou, encarando Narcisa — Levante a maldição! — repetiu desesperado. Era angustiante ver Gina sofrer tanto e não poder fazer nada — Por favor — ele pediu — levante a maldição e nós poderemos conversar.
— Acontece que eu não quero uma conversa — a outra respondeu, mas mesmo assim abaixou o braço e Gina parou de se mexer, inconsciente — Eu quero é que você entenda — ela se agachou para que seus olhos ficassem no mesmo nível dos dele — que não há como sair dessa situação. Ou você a mata ou você será obrigado a me assistir matá-la. E eu lhe garanto— ela acrescentou numa voz baixa e controlada — que será um espetáculo demorado. Você sabe por acaso quantos cortes é possível fazer numa pessoa antes que ela morra de hemorragia, meu filho? Sabe quanto tempo eu serei capaz de fazer isso durar? Sem falar, é claro, que como boa Weasley e boa grifinória, a sua mulher será provavelmente uma lutadora. Eu não duvido que ela dure mais do que o normal. Basta que eu evite as artérias principais para garantir-lhe uma dor excruciante antes de terminar tudo. Ela viverá o inferno na Terra e você assistirá a cada minuto, a cada segundo da tortura. E depois, infelizmente, você morrerá por ter quebrado o juramento. Quisera eu ser capaz de te manter vivo para relembrar cada instante de novo e de novo na sua mente. Mas que posso fazer? Nem tudo é perfeito.
— Eu te odeio — Draco falou. Sabia que não tinha opções. Perdera a esperança de que Granger e Weasley fossem aparatar no seu apartamento a tempo de salvá-los. Ele estava perdido. Gina estava perdida. E, ao mesmo tempo, ele sabia que nunca seria capaz de matá-la. Nunca.
— Faça a sua escolha. Nós não temos tempo para declarações de amor.
— Me dê o punhal — Malfoy falou, piscando enquanto duas lágrimas escorriam pelas suas bochechas.
— Bom menino — O’Brien respondeu. Narcisa entregou-lhe o punhal e Matt o usou para cortar as amarras nos pulsos de Draco. Sua mãe o mantinha imóvel apontando-lhe a varinha.
— Não se engane, querido. Tente qualquer gracinha com o punhal e tenha certeza de que o seu amorzinho sofrerá em dobro.
— Eu nunca duvidei disso, mamãe — ele respondeu com uma expressão dura. O outro entregou-lhe, então, a arma com um sorriso no rosto.
— A honra é toda sua, Malfoy. Só é uma pena que ela tenha perdido a consciência. Assim, não poderá ver quem lhe dará a facada final.
— Cale-se — Draco ordenou, mas Matt apenas sorriu de volta e se afastou alguns passos, levantando a varinha.
— Por outro lado também, assim nós não teremos que presenciar a piegas cena de despedida dos amantes, não é mesmo? Agora, ande logo. Não há tempo a perder.
Com as mãos finalmente livres, Malfoy pôde virar o rosto de Gina na sua direção. Ela estava pálida, suas sardas em destaque, seus lábios secos. Ele apoiou o punhal no chão, ao lado dos dois para que pudesse puxá-la para o seu colo e abraçá-la. Deus, ele a amava. Como ele a amava! Será que existia realmente um amor daquele tamanho? Será que não era doença, loucura, obsessão? Talvez fosse. Mas, de um jeito ou de outro, fora apenas através daquela loucura que ele conhecera alguma felicidade na sua vida. Alguma felicidade verdadeira.
Desde a primeira vez em que ele a envolvera em seus braços, soubera que havia algo de errado nos seus sentimentos em relação a ela. Ele sentia muito mais do que deveria. Era inexplicável. Incompreensível. Mas estava ali. Estava lá. E ele não podia matá-la. Não poderia viver sequer um instante com a consciência de que havia tirado aquela vida. Mas, ao mesmo tempo, não podia vê-la sendo torturada. Sabia que sua maior preocupação deveria ser em relação à dor que ela sentiria e que ele tinha o poder necessário para evitar. Sabia disso. Mas não era assim que o seu coração funcionava e a sua maior preocupação era com a dor que ele próprio sentiria ao vê-la sofrendo tanto. Sua mãe lhe oferecera uma escolha que ele simplesmente não podia fazer.
Com cuidado, Draco levou seus dedos aos lábios dela e, em seguida, a beijou de leve. Lágrimas escorriam agora livremente pelo seu rosto e ele se lembrou daquele beijo na soleira da casa de Emily Watson, quando ele pensara que nunca mais a veria novamente. Dessa vez, contudo, Gina não respondeu e o beijo terminou da mesma forma que começou: frio e salgado.
Uma de suas mãos trêmulas tateou o chão até encontrar novamente o punhal e, colocando delicadamente Gina de volta no chão, Draco o segurou firmemente entre seus dez dedos. Olhou para ela com a visão embaçada. Queria que ela entendesse o que ele estava para fazer. Queria que ela soubesse. Queria ouvir daqueles lábios que ela o perdoava. Queria que sua mãe tivesse morrido junto com seu pai e que aquele pesadelo nunca tivesse começado.
Mas agora era tarde demais para desejos.
Ergueu-se, então, sobre os joelhos e levantou o punhal no ar, diante de seus olhos. Encarou Narcisa por um último instante e, então, fez o que tinha de fazer.
Vermelho. O vermelho era a única cor do mundo e o corpo de Gina à sua frente parecia tingido de um vermelho vivo. “Sinal de que uma artéria foi atingida”, Draco pensou antes que o grito de sua mãe invadisse seus sentidos. Ele ergueu seus olhos para ela e sorriu. Estendeu suas mãos ensangüentadas para que ela visse e se lembrasse do que ele fizera. Tentou falar algo, mas, assim que abriu a boca, pôde sentir o sangue escorrendo. Negro. O mundo diante dele estava ficando negro e Draco sentiu sua cabeça pesar. Sentou-se novamente no chão e caiu para o lado, deitando-se perto de Gina. Não conseguia perceber mais nada ao seu redor. Tudo estava gradualmente se transformando em escuridão.
Ele sempre soube que teria que morrer antes dela. Não poderia vê-la morrer, mesmo se fosse por meios naturais. E não poderia contribuir para a sua morte, mesmo se fosse para acabar com o seu sofrimento. Amava-a demais para isso e, por esse motivo, fizera o punhal descrever um arco no ar e atingi-lo no peito. Esperara acertar o coração, mas obviamente errara. “Senão, não estaria vivo agora”, pensou. Um pulmão, contudo, com certeza fora perfurado, ele chegou à conclusão. Podia sentir o sangue saindo pelo ferimento. Podia senti-lo escorrendo pela sua boca. Não conseguia mais respirar. Estava frio. Estava ficando escuro.
Não demoraria muito agora e, silenciosamente, ele desejou que alguma outra pessoa pudesse vir e salvar Gina. Ele não se importaria sequer se fosse o Potter. “Afinal de contas”, pensou, “eu não vou estar aqui para ter que agradecer”, e esse pensamento provocou uma gargalhada irracional que serviu apenas para fazê-lo engasgar. Ele estava se afogando. Afogando-se em seu próprio sangue.
Não era capaz de ouvir a voz de sua mãe ou de Matt. Estava com frio. Não era mais capaz de sentir Gina ao seu lado — “A parte mais dolorosa da morte”, pensou — e não era mais capaz de dizer se estava com os olhos abertos ou fechados. Tentou abri-los, mas, de um jeito ou de outro, só havia escuridão. Escuridão e silêncio. Ele estava sozinho.
“A qualquer instante agora”, pensou. A qualquer instante, sua mente cessaria de existir, seu corpo tombaria como carne inerte. Ou então, quem sabe, a qualquer momento, ele fosse começar a sentir o calor das labaredas do inferno. Seria bom, ao menos, parar de sentir tanto frio.
Em seguida, contudo, em meio a toda aquela escuridão e a todo aquele desespero, Malfoy começou a ouvir uma música distante. “Sem dúvida, não são os anjos com harpas do paraíso”, pensou, e novamente teve vontade de rir, como se a idéia dele ir para o paraíso fosse a coisa mais absurda do mundo. Dessa vez, entretanto, não engasgou. Não sentiu nada, na realidade, além da leveza do ar. Ele estava flutuando e, ao mesmo tempo, aquele canto insistente não o deixava em paz. Não era a voz de uma pessoa, ele sabia. Não era o som de nenhum instrumento musical. Era um canto... reconfortante.
Draco tentou se concentrar nele. Queria identificar sua origem antes que tudo acabasse, mas não conseguiu. Lembrou-se de que deveria estar preocupado por algum motivo muito importante, mas não conseguia dizer qual. Sabia que devia estar sentindo uma dor tremenda, mas não estava. Sequer se lembrava da razão pela qual deveria estar sofrendo. À sua frente, havia apenas a escuridão, a leveza e o canto.
E, em seguida, havia apenas o silêncio.
Pelo resto da sua vida, sempre que tentava se lembrar do que acontecera depois de que tudo se apagara, a única coisa que vinha à mente de Draco era o cheiro. Aquele cheiro tão familiar, tão querido e tão desejado. A verdade é que aquele cheiro era o seu lar e os olhos dela, o seu paraíso. Todo o mundo poderia desabar ao seu redor. Ele não se importava com guerras, com loucos bruxos das trevas ou com ainda mais loucos bruxos do bem. Sua vida concentrava-se em volta do cheiro e dos olhos de uma única mulher e enquanto ela vivesse e o amasse, ele também viveria.
Por um tempo, ele se lembrava se ter apenas deitado lá, seus sentidos completamente preenchidos pela fragrância no ar. Em seguida, contudo, apenas para provocá-lo, uma leve carícia tirou seus cabelos do lugar e, ao menos uma vez, ele não se importou nem um pouco. O toque continuou na sua teste e nas suas bochechas e no seu nariz. Ele hesitou um instante sobre seus lábios, tão suave que quase podia ser confundido com o leve movimento dos cabelos dela. Depois, sumiu subitamente, deixando-o nu, exposto ao ar frio do quarto, até reaparecer, segurando sua mão esquerda entre duas outras com uma delicadeza que parecia irreal.
Draco soube, então, que não estava morto, pois as mãos que lhe tocavam não eram frias e, sim, quentes. Ele estava vivo e, mais do que isso, ela também estava.
Ainda mantendo ambos os olhos fechados, Malfoy deixou um meio sorriso iluminar seu rosto. Gina percebeu imediatamente e se mexeu na cadeira, ansiosa.
— Draco — ela chamou num sussurro, com medo de que o movimento não tivesse passado de sua imaginação — você está acordado?
— Não — ele respondeu igualmente sussurrando e virando a cabeça para o lado de forma que seus olhos pudessem se encontrar — Eu acho que ainda estou sonhando — e sorriu novamente.
— Oh, Draco! — Gina exclamou deixando escapar um soluço. Outros se seguiram e, antes que Malfoy pudesse fazer qualquer coisa, ela já havia se curvado sobre a cama, chorando e soluçando, e o tempo inteiro murmurando coisas incompreensíveis.
— Está tudo bem — Malfoy tentou usar sua mão livre para acariciar os cabelos dela e se levantou um pouco da cama — Está tudo bem, meu amor, está tudo bem...
— Não, você não entende!... — Gina levantou a cabeça, mas continuou chorando — Você... — os soluços aumentaram de novo — Você quase... quase... quase... — ela hesitou, e se inclinou para frente, dessa vez abraçando Draco pelo pescoço e apertando com tanta força que ele mal conseguia respirar — Me perdoa, por favor... por favor...
— Gina, está tudo bem — ele tentou acalmá-la assim que conseguiu se desvencilhar de seus braços — Não há nada o que perdoar.
— Mas é claro que há! — a outra respondeu com um pouco de irritação na voz — A culpa foi minha! Eu sou uma imbecil! — ela levantou da cama e começou a andar de um lado para o outro — Como eu pude ser tão estúpida?!
— Não havia como você saber que O’Brien era um traidor. Eu mesmo...
— Não é disso que eu estou falando! Será que você não entende?! — ela estava começando a ficar com raiva agora — Eles te deram um punhal enfeitiçado! Você não parava de sangrar, Draco! Já faz dois dias! Dois dias!!! E tudo o que eu pude fazer nesses dois dias foi me sentar nesta porcaria de hospital, segurar sua maldita mão e rezar para que você não... não... — sua voz estava novamente embargada, mas Gina respirou fundo e completou a frase — não morresse antes que eu pudesse te dizer o quão estúpida eu sou! Eu não consigo me lembrar de um momento onde eu tenha me sentido pior.
— Gina, a culpa não é sua! Eu é que obviamente confiei em quem não merecia confiança alguma!
— Mas essa é que é a parte que você não está entendendo! Se eu não tivesse... Se eu não tivesse corrido de você que nem uma louca no Ministério, talvez...
— Você não sabia — Draco hesitou. Aquela era uma lembrança dolorosa que ele não estava certo se deveria trazer à tona — Você não tinha mais certeza se me amava — completou por fim em voz baixa, desviando os olhos.
— É claro que eu tinha! — ela exclamou imediatamente, surpreendendo-o — É claro que eu sabia — repetiu — Eu só estava assustada. Muito assustada.
— Assustada com o quê? — ele não entendeu.
— Draco, você matou um homem... Você espancou-o até a morte!
— E... ? — Malfoy ainda não havia entendido qual era o grande problema — Gina, você não achou que... que... Gina, eu nunca encostaria o dedo em você!
— Eu sei. Não foi por isso que eu fugi. Eu fiquei assustada comigo mesma. Com a minha própria capacidade de te amar — ela acrescentou num sussurro. Draco preferiu não interrompê-la. Aquilo era bom demais para ser verdade e ele temia que ela fosse retirar o que dissera a qualquer instante — Quero dizer... Como eu podia ouvir o que você falou, ver as suas mentiras na audiência e ainda assim não deixar de te amar? Como o fato de que você fez algo abominável pôde não ter nenhum impacto nos meus sentimentos?!
— Não foi isso que você falou quando foi embora — ele disse sério, ainda esperando pelo ‘mas’ que teria quer vir a qualquer momento agora.
— Eu sei — Gina respondeu, sentando-se novamente ao lado da cama e pegando a mão dele na sua com uma delicadeza dolorosa — Eu... eu não sei. Acho que apenas agi como achei que deveria agir. Quer dizer... Como o meu cérebro me disse que qualquer pessoa no meu lugar reagiria e não como o meu coração queria que eu agisse. Isso faz algum sentido para você?
— Nenhum — o outro admitiu — Mas quem se importa? Você está aqui e isso é tudo o que eu quero.
— Você me perdoa, então?
— Não há nada o que perdoar.
— Draco, você quase... quase morreu. Eu acordei num quarto estranho, sozinha e tive que gritar com toda a minha família e com metade deste hospital para que nos colocassem na mesma enfermaria! E, depois disso, tudo no que eu pensava era em como você podia... podia... podia morrer sem saber...
— ...o quão estúpida você é? — Draco interrompeu com um sorriso encorajador ao perceber que Gina iria começar a chorar de novo — Mas eu já sabia disso. Você casou comigo, não casou?
— Eu te amo, Draco — ela respondeu com lágrimas nos olhos.
— Sem dúvidas?
— Sem dúvidas. Sem medo. Sem reservas. Incondicionalmente — Malfoy fechou os olhos por um instante ao ouvir isso e, quando os abriu, ficou surpreso ao notar que uma lágrima escapara pelo lado de seu rosto. Ela o amava incondicionalmente.
— Incondicionalmente — ele repetiu em voz alta — Acho que essa é a única forma através da qual eu posso ser amado — e sorriu. Naquele momento, tudo estava bem no mundo para ele e, sem querer, uma velha memória voltou à sua mente — Ei, Gina — ele chamou antes que pudesse mudar de idéia. Ao menos uma vez em sua vida, tinha o direito de fazer uma loucura — O que você acha do Caribe para o Natal?
— O quê? — ela franziu as sobrancelhas surpresa.
— Eu, você e muita pouca roupa no Caribe para o Natal. O que você acha?
— Mas...
— Sem ‘mas’, Weasley. Você me ama incondicionalmente ou não?
— É claro que sim, mas... — ela respondeu séria. Muito mais séria do que o tom brincalhão de Malfoy deveria ter permitido.
— O que houve? — ele perguntou, então, ligeiramente alarmado — Há algo que... Você está bem, não está? Quer dizer, minha mãe não... Ela não fez mais nada depois que eu desmaiei, fez?
— Não, não. Nada disso. Eu estou bem, Draco. O Professor Dumbledore disse que...
— Dumbledore esteve aqui?
— Foi ele quem nos salvou, Draco. Ele e o seu pássaro estranho...
— A fênix? — o outro perguntou, finalmente entendendo o canto que ouvira antes de perder a consciência.
— Foi. Eles tentaram usar a ave para curar seu ferimento, mas ele continuava sempre reabrindo... Eles realmente não sabiam se... se você iria... — por um momento, pareceu que ela começaria a chorar novamente, mas Gina conseguiu se controlar — Enfim. Isso não importa mais. Não é esse o problema. O que acontece é que... — hesitou.
— O que há de errado? — Draco perguntou, erguendo-se um pouco e sentando-se com as costas apoiadas na cabeceira. Ele não estava mais sentindo dor alguma.
— Algo que a médi-bruxa me disse. Quero dizer... Esse tempo todo, nós... bem, você sabe, nós temos... enfim — ela corou — e nós não temos tomado precaução alguma com... com tudo o que poderia acontecer... Entende?
— Entende o quê? Você não está fazendo muito sentido agora, querida — Gina suspirou cansada.
— Draco — ela fez uma pausa — eu estou grávida.
“Eu estou grávida”. As palavras ecoaram na sua mente. Gina estava grávida. Grávida. E a primeira coisa que veio à mente de Malfoy era como ele não queria um filho, como uma criança iria atrapalhar sua vida e dividir sua mulher. Ele não gostava de compartilhar suas coisas. Ao mesmo tempo, contudo, ele não podia esquecer todos os anos de sofrimento que a sua primeira recusa provocara. Como ele poderia fazer isso de novo? E, ao mesmo tempo, como ele poderia sinceramente dizer a ela que queria ser pai?
— Eu te amo, Gina — Malfoy falou quando percebeu que o silêncio estava se alongando por tempo demais. Ele podia ver o início de decepção nos olhos dela e sabia que dizer não à criança o condenaria a viver sem a mulher. Cometer o mesmo erro duas vezes seria fatal — Como eu poderia não amar qualquer coisa que venha de você? — falou com mais convicção do que realmente sentia.
— Eu sei que nós não planejamos, nós não...
— Está tudo bem, minha querida — ele sorriu e acariciou delicadamente a sua face — Mas você ainda não respondeu à pergunta que eu fiz.
— Que pergunta? — ela franziu o cenho.
— Eu, você e muita pouca roupa no Caribe para o Natal. Pense bem, logo logo nós vamos estar exaustos graças às muitas noites mal dormidas e, Deus me perdoe, cheios de fraldas para trocar. Umas férias agora realmente nos fariam bem, você não acha?
— Você está brincando?! Três loucos tentaram me matar em menos de seis meses!
— Isso é um sim? — Draco perguntou sorrindo, lendo a resposta nos olhos dela. Antes que Gina pudesse dizer mais qualquer coisa, entretanto, os dois foram interrompidos pelo barulho da porta da enfermaria se abrindo.
Draco estava sentado na cama com as costas eretas, apoiadas na cabeceira, enquanto Gina se punha de pé ao seu lado. Da primeira vez que a porta abrira, a enfermeira fora a única que entrara para verificar como os dois estavam. Agora, contudo, ambos sabiam que era Dumbledore que viria e estavam ansiosos para fazer suas últimas perguntas e deixar aquele pesadelo para trás de uma vez por todas.
Quando o diretor finalmente entrou, no entanto, Malfoy mal conseguiu suprimir uma exclamação de surpresa. O homem que estava à sua frente não parecia o mesmo bruxo energético e excêntrico do qual ele se lembrava. Provavelmente pela primeira vez em sua vida, Draco achou que o outro parecia realmente... velho.
— Fico feliz com a notícia de sua recuperação completa, Sr. Malfoy — ele falou sem nada do seu antigo tom brincalhão na voz. Até Gina pareceu notar a diferença e Draco sentiu a tensão em seu corpo.
— Pelo que eu ouvi, o senhor teve muito a ver com isso, Diretor.
— Sim... — hesitou — Logo que recebi a coruja avisando sobre a fuga de sua mãe... bem, digamos que eu imaginei para onde ela iria primeiro e o que tentaria fazer — disse, lançando um olhar significativo à Gina — Mandei Fawkes na frente e fui logo depois de notificar os aurores. Nós quase chegamos tarde demais — Draco pensou em perguntar como Dumbledore sabia do ritual, mas logo desistiu. Aquele velho bruxo sempre pareceu saber mais do que os outros e pelo menos isso não mudara com o tempo. Mudando de idéia, entretanto, fez outra pergunta que não poderia esquecer:
— Como aquela mulher escapou da prisão?
— Suborno — Dumbledore respondeu simplesmente — Os aurores estão desmantelando a organização dela neste exato momento. Creio, aliás, que Granger e Weasley virão conversar com você em breve sobre esse assunto.
— Por quê? — indagou, subitamente furioso com a idéia de que eles poderiam estar desconfiados de sua participação. Depois, entretanto, lembrou-se de que era mais provável que os dois quisessem apenas um depoimento — Eles querem saber o que Narcisa falou na minha casa?
— Não, não — o diretor respondeu juntando as mãos na frente do corpo e se aproximando um pouco — Eles já sabem tudo o que precisam saber sobre isso. Aparentemente, entretanto, foram encontradas algumas contas da sua mãe no exterior e, como a origem desse dinheiro não parece, a princípio, ser ilegal, a soma é sua por direito.
— O Ministério vai me dar o meu dinheiro de volta?! — Draco perguntou não ousando acreditar nos próprios ouvidos. Aquilo era bom demais para ser verdade.
— Provavelmente sim — Dumbledore confirmou, fitando-o com uma expressão impenetrável nos olhos.
— E como eles descobriram tudo? Quer dizer...
— Usaram veritaserum. Conseguiram uma autorização especial do Ministério após tomarem o depoimento de Gina.
— Veritaserum? Mas em quem? — ele franziu o cenho confuso — Por favor, não me diga que aquele maldito do O’Brien sobreviveu?!...
— Sinto desapontá-lo, Sr. Malfoy, mas tanto ele quanto sua mãe sobreviveram e o veritaserum foi usando nos dois.
— Na minha mãe?! — Draco percebeu uma sensação gelada no fundo do seu estômago — Como assim na minha mãe?! Ela não pode estar viva! Não pode! — o medo era suficiente para fazê-lo esquecer a felicidade que sentira apenas alguns instantes atrás.
— Está tudo bem, meu querido — Gina interrompeu, segurando sua mão com uma delicadeza dolorosa — Eles aumentaram a segurança...
— Não! Você não entende! Eu e minha mãe tínhamos um pacto de sangue! Se ela ainda está viva... — balançou a cabeça desejando apagar de sua mente as possíveis conseqüências deste fato — Um pacto de sangue só pode ser quebrado se uma das partes envolvidas morrer — recomeçou tentando recuperar a calma — Eu quebrei o pacto quando me recusei a te matar! Se você ainda está aqui e eu ainda estou aqui, então a minha amada mãe deveria estar no quinto dos infernos e não em uma cela de Azkaban! Como ela pode estar viva e eu também?! — Draco exclamou por fim, olhando para Gina com uma expressão interrogativa no rosto. A mulher, contudo, não foi capaz de lhe oferecer nenhuma resposta satisfatória e, igualmente confusa, levantou os olhos para Dumbledore, repetindo em silêncio a mesma pergunta inquietante.
— E então? — Malfoy acrescentou após alguns instantes sem que ninguém dissesse nada — Você tem alguma explicação para isso? — indagou diretamente ao diretor.
— A princípio, não — o outro respondeu vagarosamente — Realmente, se um pacto de sangue tivesse sido feito, vocês dois não poderiam estar vivos agora.
— Um pacto de sangue foi feito!
— Draco, calma!...
— Calma? Calma?! Como é que eu vou me acalmar diante da possibilidade daquela mulher ainda ter uma faca pendurada sobre a minha cabeça, Gina? Como?!
— Eu tenho certeza de que há alguma explicação para isso...
— Qual? Eu gostaria muito de saber! — Malfoy estava quase gritando agora.
— Se eu puder fazer uma sugestão... — Dumbledore os interrompeu.
— O quê? Agora, de repente e do nada, você descobriu o motivo?
— Não, mas eu só posso ver uma possibilidade para isso.
— Qual?!
— Bem, se um pacto de sangue foi feito e você ainda está vivo mesmo após quebrá-lo, então a única possível explicação é que a sua mãe também quebrou a parte dela no trato.
— Mas ela não quebrou! Ela me disse onde a Gina estava!
— E tudo o que ela precisava fazer era te dizer onde a Srta. Weasley, ou melhor, a Sra. Malfoy estava? — o diretor perguntou novamente com uma calma enervante.
— Não! Eu tinha que encontrá-la também e, como ela está bem aqui na nossa frente, eu diria que eu a encontrei!
— Quando procuramos algo, nem sempre o objeto encontrado é exatamente o que foi perdido em primeiro lugar.
— E o que diabos você está querendo dizer?! — Draco estava quase se levantando da cama agora — Que essa por acaso não é a minha mulher?! Não é a minha Gina?!
— Em absoluto. O que eu estou querendo dizer é que esta talvez não seja exatamente a mesma Gina que você perdeu.
— Isso é ridículo! — Malfoy se deixou cair novamente na cama — É claro que ela é a mesma pessoa! — exclamou, falhando em perceber a sombra de dúvida que surgia nos olhos da mulher.
— O que você sabe sobre o ritual ao qual Gina foi submetida? — o diretor perguntou ainda completamente calmo.
— Pouco e não quero saber mais!
— Draco...
— Não, Gina! Não! Eu passei dez anos da minha vida te procurando e quando eu finalmente te encontro, tenho que ouvir que talvez você não seja a mesma pessoa?! Isso é um absurdo! Eu conheço você! Eu conheço a minha mulher! — virou-se para Dumbledore.
— E eu não duvido disso, Sr. Malfoy. A diferença a que estou me referindo é muito mais... sutil.
— O que grifinórios sabem sobre sutileza?!
— O nome do ritual — o diretor o interrompeu, ignorando o último comentário e erguendo-se ainda mais ereto na enfermaria — pode ser traduzido por algo como ‘a morte da alma’.
— E daí?
— A questão, entretanto, é definir neste caso particular o que é a alma.
— "timo! Uma discussão filosófica! Exatamente o que eu preciso agora! — Draco cruzou os braços na frente do corpo, claramente contrariado.
— Veja bem — Dumbledore continuou como se estivesse dando uma aula em Hogwarts — se a palavra fosse usada no mesmo sentido que no caso do beijo do dementador, está claro que a Sra. Malfoy não estaria aqui agora.
— O ritual não foi completado nela!
— Não... — o outro pareceu meditar por alguns instantes — A ‘alma’, neste caso, tem um significado muito mais sutil. Afinal de contas, o que é a alma de um bruxo? — ele encostou no pé da cama com uma das mãos e, por alguns instantes, pareceu exatamente com aquele Dumbledore de quem Draco se lembrava, da época onde a única coisa importante no mundo era quem ganharia a Taça de Quadribol ou quem seria o novo professor de Defesa contra as Artes das Trevas. Fechando os olhos e balançando a cabeça, Malfoy afastou aquelas lembranças de sua mente e se obrigou a prestar atenção no que estava acontecendo.
— Não sei, mas algo me diz que estou para descobrir — falou mal humorado.
— A ‘alma’ de um bruxo é a sua magia — o diretor sorriu indulgente — É aquela faísca que o torna diferente dos trouxas e especial de certa forma. Algo intangível e imaterial, mas ainda assim incrivelmente poderoso.
— E é isso, essa... faísca, que o tal ritual queria roubar?
— Sim — ele concordou devagar — O ritual tem como objetivo trazer uma pessoa, um bruxo, de volta à vida. É muito antigo e não há registros de alguma vez ter sido praticado com sucesso na história. Especialmente porque o sacrifício que ele exige em retorno é muito alto.
— Quatro vidas? — Draco perguntou.
— Não, não apenas quatro vidas. Quatro ‘almas’.
— E qual é a maldita diferença? — o diretor pareceu considerar por alguns segundos antes de falar qualquer coisa.
— Para responder completamente a essa pergunta, Sr. Malfoy, eu teria que saber o que acontece com cada um de nós quando morremos. Nem mesmo o meu conhecimento é capaz de enxergar através deste véu. Como há diferenças em vida, no entanto, creio que não seria absurdo presumir que também deve haver diferenças na morte.
— Diferenças entre o quê?
— Não, não entre o quê. Entre quem.
— Isso não está fazendo sentido algum! — exclamou frustrado, mas Gina ao seu lado discordou.
— Não, meu amor, isso está fazendo muito sentido.
— O que diabos você está querendo dizer? — Draco a encarou surpreso.
— Eu sabia que havia algo... diferente. Algo errado comigo desde que...
— Não há nada de errado com você! — ele se recusou a ouvir.
— Há sim! Escute, você se lembra quando nós fomos até a escola e você descreveu como ela deveria parecer de longe para os trouxas?
— Claro, mas...
— Era daquele jeito que eu a via. Não como um castelo imponente, mas como ruínas a ponto de desabar.
— Isso não quer dizer nada!...
— Dez anos, Draco, dez anos! E eu nunca fiz nada estranho acontecer! Meus irmãos não param de comentar as novas travessuras de seus filhos, como um fez o cabelo do irmão crescer e o outro explodiu todas as lâmpadas da casa, ou ainda como um terceiro fez o seu bolo de chocolate preferido sumir da cozinha e aparecer no seu quarto! Tudo isso com mágica indisciplinada. E eu nunca fiz nada do gênero em dez anos inteiros. Nada! Nem mesmo quando havia um louco na minha casa com a sua aparência, tentando me matar! Aquela teria sido uma boa hora para alguma pequena mágica espontânea, não é mesmo?
— Sim, mas... Não — ele balançou a cabeça, ficando cada vez mais confuso — Tenho certeza de que há uma explicação...
— E há. Você apenas não quer admiti-la — Gina o interrompeu.
— Isso é verdade? — Draco perguntou a Dumbledore após alguns instantes de silêncio — Gina agora é uma... ela não pode mais fazer magia?
— Não.
— Nunca mais? — ele insistiu — Nem mesmo com prática e estudo? Nós podemos tentar comprar uma varinha... Talvez um médi-bruxo...
— Este não é um estado passageiro, Sr. Malfoy. Como eu disse, o sacrifício exigido pelo ritual é monstruoso. Apenas uma força muito grande seria capaz de trazer de volta à vida uma pessoa já morta.
— Então, para ressuscitar um bruxo, você precisa sacrificar a ‘alma’ de quatro outros.
— Sim.
— E depois, precisa ainda sacrificar a vida de quatro... de quatro trouxas.
— Exatamente.
— E precisa colocá-los dentro de uma árvore cheia de areia, vivos, para deixá-los sangrar até morrer?!
— As mortes precisam ser causadas por hemorragia, sim. O simbolismo do sangue parece não ter fim — Dumbledore aquiesceu — E a areia é um subproduto da poção produzida durante o ritual...
— Poção?
— Sim. O ritual é extremamente complexo, cheio de detalhes. Ele especifica, por exemplo, que as mortes deveriam ocorrer sempre com um ano de distância entre elas. A cada passo, o bruxo que se deseja ressuscitar seria trazido para mais perto da vida. Ele não especifica, entretanto, que as vítimas sacrificadas deveriam ser mulheres nem que deveriam ser colocadas com a areia dentro do tronco de uma árvore. Creio que essas foram adições modernas do assassino.
— Eames — Draco disse o nome ainda com ódio.
— Sim. Elas não parecem ter significado, contudo.
— Ou talvez Eames soubesse de algo que nós não sabemos.
— Talvez — Dumbledore inclinou a cabeça — Mas nós nunca saberemos ao certo agora, não é mesmo? — perguntou com seu olhar penetrante fixo em Draco, como se ele também soubesse mais do que estava deixando transparecer sobre essa história.
— Não, não saberemos — o outro respondeu com o nariz erguido, ainda orgulhoso do que fizera.
— E o triângulo? — Gina os interrompeu, desviando a atenção dos outros dois — Draco falou que havia um triângulo pintado na porta de cada vítima...
— Ah, sim — o diretor pareceu se lembrar desse detalhe apenas agora — O símbolo do sacrifício.
— O quê? — ela franziu o cenho, sem entender. Malfoy ainda hesitava em encontrar seus olhos.
— O triângulo é o símbolo desse ritual. Ele é pintado nas vítimas do sacrifício para marcá-las: suas duas pontas inferiores representam o bruxo que o está realizando e o poder sendo sacrificado, enquanto a ponta superior representa o objetivo, o bruxo que se deseja trazer de volta.
— Por acaso haveria alguma menção a cartas de baralho nessa história toda? — Draco perguntou.
— Não — Dumbledore o encarou, aparentemente confuso — Por quê?
— Nada. Provavelmente também foi apenas uma ‘adição moderna’ do nosso Eames — respondeu — Assim como a tortura — acrescentou. Apenas mencionar o assunto já era o suficiente para despertar toda a raiva dormente em seu interior.
— Está tudo bem — Gina passou as mãos pelos seus ombros, como se fosse ele que precisasse de consolo e não o contrário — Eu não me lembro de nada, então é como se não tivesse acontecido.
— Mas aconteceu! — ele exclamou calorosamente, ao mesmo tempo que uma idéia cruzou seus pensamentos — Diretor, a amnésia de Gina tem alguma coisa a ver com o fato de que ela... ela não pode fazer mais mágica? — era difícil até dizer aquilo.
— Creio que não. A amnésia dela é clínica, como os médicos trouxas disseram.
— Nada mais justo — ela falou subitamente — Afinal de contas, eu sou uma trouxa agora.
— Sim, é — Dumbledore concordou, mas Draco ainda não estava pronto para lidar com todas as implicações deste fato agora — E foi isso que te salvou do pacto de sangue, Sr. Malfoy. Como eu disse, a Gina que você encontrou não é exatamente a Gina que você perdeu.
— E por isso a minha mãe não cumpriu a parte dela no trato — ele acrescentou, finalmente ganhando coragem suficiente para levantar a cabeça e olhar para sua mulher. Ele a encontrou exatamente igual, com os mesmos olhos castanhos encarando-o de volta, tão gentis como ele se lembrava. Talvez, uma Gina trouxa fosse melhor do que Gina nenhuma.
— Bom, acho que isso explica tudo, não é mesmo? — ela falou na direção de Dumbledore, sentindo que precisaria de algum tempo sozinha com Draco antes que ele pudesse se acostumar com tudo aquilo.
— Sim — o diretor respondeu, mas pareceu hesitar por um instante, como se ainda houvesse algo a ser dito. Ele observou seus dois ex-alunos por alguns momentos, talvez considerando mentalmente todas as provações pelas quais eles passaram em um período tão curto e depois, finalmente, falou: — Eu lhes desejo felicidade — e sorriu um sorriso triste, de quem sabe que o desejo tem grandes chances de não ser realizado.
Draco estava pronto para deixá-lo sair pela porta da mesma forma que ele entrara. Chegava a achar que seria melhor se o homem nunca tivesse vindo, porque assim ele poderia ainda pensar que a sua mãe estava morta e que a sua Gina ainda era uma bruxa. Que diferença isto fazia, afinal de contas? Racionalmente, não deveria fazer nenhuma. Ela era a mesma pessoa. Mas havia muitos anos e muitas camadas de preconceito embutidas em Malfoy para que ele pudesse aceitar o fato levemente. Por acaso isso significaria que o filho deles não seria um puro-sangue? E se, pior, a criança fosse trouxa também?! A idéia era ruim demais para sequer considerar.
— Espere — ele foi tirado de seu devaneio pela voz de Gina, que se afastara da cama indo na direção de Dumbledore. O diretor já havia aberto a porta e parara com ela entreaberta para ouvir o que mais a mulher tinha a dizer. Gina, entretanto, pareceu congelar diante de alguma visão do corredor.
— O que houve? — Draco perguntou, sentindo a tensão na postura dela.
— Você já terminou? — uma voz feminina e seca interrompeu a cena, provavelmente dirigindo-se a Dumbledore. Apesar de não poder ver a dona da voz, Malfoy conseguiu reconhecê-la e sentiu o seu próprio corpo reagir, tenso e frio. Ele não sabia o que estava acontecendo do lado de fora e não era capaz de ver a troca de olhares significativos entre o diretor e a mulher. Não sabia também por que Gina ficara subitamente silenciosa, mas isso não era tão difícil de imaginar. Ela com certeza não estava acostumada a presenças como a que estava no corredor naquele exato instante.
Quando Dumbledore falhou em responder à pergunta, a mulher entrou na enfermaria. Draco sabia que ela estava vindo mesmo antes de poder vê-la, já que o diretor chegara para o lado, dando passagem, e Gina se aproximara novamente da cama. Esse conhecimento, entretanto, não foi suficiente para prepará-lo para a figura que apareceu na sua frente.
Ele se lembrava daquela mulher. Fora seu aluno em Hogwarts há muito tempo. Durante vários meses consecutivos, a vira quase todos os dias, na mesa dos professores. Depois, encontrara-a em mais algumas ocasiões. Lembrava-se dela quando a vira pela primeira vez, sua imagem manchada por tantos boatos e rumores; lembrava-se dela depois, quando uma aura de poder pareceu envolvê-la. E lembrava-se dela, ainda, em algumas velhas fotografias que existiram na Mansão há muito tempo, onde ela aparecia jovem ao lado de sua mãe.
Nenhuma dessas lembranças, contudo, assemelhava-se à mulher que entrara na enfermaria agora. Ela envelhecera, claro, e os sinais dos anos mostravam-se no seu rosto, nos seus cabelos, nos seus olhos. A idade, contudo, não a fazia parecer mais velha. Ao contrário, era como se ela fosse agora o que deveria ter sido sempre. Como se todas as suas versões anteriores não passassem de esboços mal feitos. Não havia dúvida na sua postura, nem no seu andar. Não havia nada de infantil ou de brincalhão na sua maneira de encarar Draco, ainda que esse olhar se suavizasse ligeiramente quando era dirigido a Gina. Ela não era uma mulher cruel, apesar de conhecer a crueldade. E também não era sem coração. Mas não parecia haver nenhuma delicadeza no seu modo de se colocar no cômodo. Tudo sobre ela parecia seco e duro. Era uma aparência impressionante e imponente tanto pelo medo que inspirava quanto pelo poder que emanava.
— Você pretendia dizer algo — ela falou finalmente, olhando para Gina. Dessa vez, entretanto, sua voz soou menos seca e mais suave, como que para mostrar que não havia perigo.
— Sim... — a outra hesitou por um instante, alternando olhares nervosos entre Dumbledore e Draco. Por que nenhum dos dois havia se preocupado em apresentar aquela mulher que surgira do nada?
— Perdoe-me — ela falou, como se tivesse lido os pensamentos de Gina — Nós nos conhecíamos antes, mas creio que diante das circunstâncias novas apresentações se fazem necessárias.
— Sim — respondeu, ganhando coragem — Quem é você?
— O meu nome é Moira — foi a resposta.
— Ela é minha filha — acrescentou Dumbledore e Gina teve dificuldade em conciliar em sua mente as imagens de duas pessoas tão diferentes como pai e filha.
— Você queria fazer alguma pergunta? — Moira indagou novamente, deixando um leve sorriso chegar aos seus lábios.
— Sim, é que... — Gina virou-se para Draco, incerta.
— O que houve? — ele perguntou, tentando encorajá-la.
— Bom, é que quando... quando eu fui atacada na minha casa... bem... no caminho para o hospital... o meu coração parou. Ele parou por quase dez minutos — ela acrescentou, notando a troca de olhares entre pai e filha. Malfoy ainda não percebera onde ela queria chegar — Tecnicamente, eu estive morta. Quer dizer... — ela torceu as mãos nervosamente e Draco finalmente compreendeu o medo de Gina. Sentiu suas próprias entranhas congelarem diante da possibilidade — O que isso significa em termos do ritual? Significa que ele foi completado ou... Eu não sei...
Um silêncio incômodo pareceu preencher a enfermaria, onde ninguém tinha coragem suficiente para dizer a próxima frase.
— Sim — Draco ouviu por fim a voz de Moira e o seu próprio coração quase parou — Isso foi suficiente para completar o ritual.
— Mas então... — Gina hesitou.
— Não pode ser! — Malfoy interrompeu, olhando para Dumbledore em busca de algum tipo de esperança — Ele não pode estar vivo de novo! Essa história toda já acabou!
— Foi o que todos nós pensamos — o diretor disse e, finalmente, a razão do seu cansaço ficou óbvia. Quem poderia culpá-lo?
— Não pode ser verdade! — Draco ainda tentou negar — Por acaso alguém já o viu? Por acaso...
— Ele está vivo — Moira interrompeu — Talvez não aqui, talvez não na mesma forma, talvez ainda se passem anos antes que possamos entrevê-lo novamente. Mas ele está vivo — afirmou com firmeza e Draco não duvidou dessa vez. Afinal de contas, quem melhor do que ela, bruxa das trevas e ex-noiva de Tom Riddle, para saber? E quem poderia ter mais motivos para querer que ele estivesse realmente morto? Além de Potter, é claro, mas isso não vinha ao caso agora...
— Meu Deus! — Gina exclamou deixando-se cair na cama e Malfoy não teve escolha a não ser ecoar mentalmente sua exclamação.
— Escutem — Dumbledore os arrancou de seus respectivos devaneios com um pouco de sua antiga energia de volta — Não há sentido em vocês se preocuparem com isso agora.
— Você está louco?! — Draco deixou escapar.
— Não, não estou. Tudo o que eu sei é que vocês dois já passaram por dificuldades suficientes nos últimos tempos e a verdade é que, seja através de Voldemort ou de um outro bruxo qualquer, a paz que vocês conquistaram será ameaçada e desafiada. Não há como evitar isso. Se eu posso lhes oferecer um conselho, é este: não sofram agora pelos problemas futuros, porque isso não os impedirá de chegar.
— Uma coisa de cada vez, certo? — Draco perguntou, olhando para o velho diretor. Estranhamente, ele sentia uma certa tranqüilidade em saber que, independente de qualquer coisa, essa felicidade recém-alcançada não duraria para sempre. A certeza de que seria interrompido apenas dava a ele mais liberdade para aproveitar a calmaria sem culpa.
— E de preferência sem esquecer que vocês não estão sozinhos diante deste perigo — Moira interrompeu seus pensamentos com o tom de voz mais suave que ela usara até então.
— Exatamente — seu pai concordou — E agora, nós devemos ir. Tenho certeza de que vocês gostariam de algum tempo sozinhos antes que os Weasleys cheguem — Dumbledore acrescentou, com o antigo brilho no olhar de volta. Moira o seguiu sem dizer mais nada e, quando eles saíram, foi como se a enfermaria parecesse subitamente muito mais vazia, muito menor. Por alguns instantes, os dois permaneceram em silêncio, ouvindo apenas a respiração um do outro e a mão de Draco procurou instintivamente a de Gina.
— E então? — ela finalmente perguntou, encarando-o incerta.
— Então o quê?
— O que nós vamos fazer? Quer dizer... Tem o fato de que eu não sou mais bruxa, o fato de que a sua mãe ainda está viva, o fato de que um dos piores homens de todos os tempos está vivo de novo... Por onde você quer começar? — ela sorriu para encorajá-lo a despeito de todos os problemas e Draco esqueceu momentaneamente por que deveria estar preocupado. Bruxa ou não, ele nunca conseguiria abrir mão daquela mulher.
— Nós vamos... — ele começou sério, mas em seguida sorriu também — passar o Natal no Caribe. E vamos ter um bebê. O resto não importa.
— Draco, você sabe que isso não é verdade...
— Não, não. Tudo o que eu sei — o outro falou, puxando-a até que Gina estivesse deitada na cama dentro dos seus braços — é que nós merecemos férias. Os problemas podem esperar até a volta. Acredite, querida, eles não vão a lugar algum...
— Exatamente! E é por isso... — ela foi subitamente silenciada com um beijo rápido.
— É por isso que nós devemos aproveitar um pouco agora.
— Eu sei, mas...
— Mas o quê? — ele suspirou cansado.
— Você realmente não se importa com o fato de que eu não sou mais uma bruxa? — ela perguntou.
— Bem... digamos que você-trouxa é melhor do que não-você. Entende?
— Draco, eu estou falando sério! — ela riu.
— E eu também! A única coisa que importa é que nós estamos juntos, Gina, e que vamos continuar juntos. Eu não poderia ligar menos para o resto.
— Eu também não — a outra concordou com um belo sorriso e os olhos brilhando — A não ser pela nossa viagem para o Caribe e pelo nosso bebê. Não necessariamente nessa ordem, é claro.
— É claro — Draco concordou, trazendo-a para ainda mais perto e preparando-se para beijá-la por um longo tempo. Os problemas existiam e existiriam sempre. Ele teria que ser muito tolo para negá-los. Mas ali, deitado com Gina segura dentro de seus braços, Draco se permitiu um momento de otimismo.
E mesmo depois, quando a família dela chegou, e mesmo pensando em quanto ele teria que agüentar dali para a frente, Malfoy não conseguiu se livrar da sensação surpreendentemente reconfortante de que tudo — absolutamente tudo — ficaria bem enquanto eles permanecessem juntos.
Desmayarse, atreverse, estar furioso,/áspero, tierno, liberal, esquivo,/alentado, mortal, difunto, vivo,/leal, traidor, cobarde y animoso;
no hallar fuera del bien cientro y reposo,/mostrarse alegre, triste, humilde, altivo,/enojado, valiente, fugitivo,/satisfecho, ofendido, receoso;
huir el rostro al claro desengaño,/beber veneno por licor süave,/olvidar el provecho, amar el daño;
creer que un cielo en un infierno cabe,/dar la vida y el alma a un desengaño:/esto es amor: quien lo probó, lo sabe.
(Soneto, de Lope de Vega)
nota da autora /E assim termina a história... Espero que vocês tenham gostado.
Antes que a primeira pessoa pergunte: não, não haverá uma continuação. Eu sempre tive a intenção de terminar a história de uma forma meio aberta, porque, na minha opinião, é assim que histórias de suspense devem terminar. Sem falar que eu freqüentei a escola de Titio Chris Carter por nove anos, então já estou bastante contaminada. O que importa é que o Draco e a Gina estão juntos e vão continuar juntos, independente de todo o resto. A propósito, eu tinha prometido a Nanda Weasley que ela poderia escolher o nome do bebê dos dois — que é uma menina — e ela escolheu Nicole. Eu ia colocar isso na história, mas acabou ficando sem cabimento. De qualquer forma, vocês sabem agora.
E, por fim, o que todo mundo deve estar se perguntando é: quem diabos é essa filha do Dumbledore e o que a Flora estava cheirando quando a inventou?! Aí é que está: eu não a inventei. Quem a criou foi a Frini, na sua fanfic “Harry Potter and The White Death”. Nós duas resolvemos juntar as nossas fanfics em um mesmo universo, onde a dela conta o que aconteceu bem antes, enquanto as crianças ainda estavam em Hogwarts e a minha mostra o que aconteceu bem depois. Portanto, se vocês querem saber quem é a Moira, que história é essa dela ser noiva de Voldemort e, mais importante ainda, como o Draco e a Gina se apaixonaram, entrem em: , cliquem em “Harry Potter and The White Death” e comecem a ler! Vocês com certeza não irão se arrepender!... As personagens que a Frini criou são maravilhosas e o Draco dela é todo bom e todo Malfoy! :-D
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