Capítulo XXIV
Hermione e Harry encontraram-se na porta da cozinha, onde Bryan os esperava com aparência solene.
- Bem-vindos à Pizzaria Potter-Weasley. – Ele disse com tom sério antes de deixá-los entrar.
A cozinha passara por uma transformação. Uma toalha xadrez vermelha e branca cobria a superfície da mesa, e uma vela queimava cintilante presa ao gargalo de uma garrafa de vinho. A música que pairava no ar chamou a atenção de Harry: era uma música trouxa que contrastava com o ar solene que eles criaram. Provavelmente fora uma escolha de Bryan, sabia que se chamava Perfect, e que quem cantava era um grupo chamado Simple Plan.
- Vou levá-la a sua mesa, Senhora Juíza. – Bryan ofereceu o braço num gesto formal.
- Obrigada, cavalheiro. Ouvi dizer que a pizza daqui é muito famosa. – Era evidente que ela pretendia participar integralmente da brincadeira criada pelo filho.
De repente, Harry também queria a mesma coisa. Uma noite de riso e diversão, sem pensar no passado ou preocupar-se com o futuro. Ele agarrou o avental do gancho perto do fogão e amarrou-o na cintura.
- Eu sou o chef deste fabuloso estabelecimento. – E estalou os dedos para Bryan e Rony. – Estes são meus aborrecidos e tolos alunos tentando, em vão, é claro, superar-me em minha especialidade. Rony fez uma careta de desdém e Bryan riu.
- Veremos quem é o verdadeiro mestre quando o concurso terminar. Por enquanto, ainda temos de cozinhar.
Hermione escolhera os ingredientes de forma a não favorecer um ou outro participante. Em espaços de trabalho separados no balcão, cada um dispunha de um pote de molho e uma dúzia de produtos que poderiam ser utilizados na cobertura. Todos podiam usar os temperos do armário, e cada um contava com uma fôrma própria para assar sua criação.
Harry tinha consciência de Hermione sentada à mesa, bebericando uma taça de vinho tinto. O conjunto de moletom (justo) e calça (mais justa ainda) cor azul bebê que ela usava dava um ar juvenil e faziam-no lembrar do passado, quando Hermione ainda era uma adolescente obcecada por livros. Harry franziu a testa e concentrou-se no trabalho.
- Bryan, sabia que uma caixa prensada de forma a tornar-se plana pode deslizar sobre a grama com a mesma velocidade de um trenó cortando a neve? – Rony perguntou.
- É mesmo?
- Oh sim! Quando estávamos seu tio Harry, meus irmãos e eu, apostávamos corrida descendo a encosta da colina sentados sobre caixas de papelão amassadas. Lembra-se disso, Harry? Na época não podíamos usar mágica pra nos divertir.
Harry riu e cobriu a bola de massa para deixá-la crescer por alguns minutos. Depois virou-se para o amigo.
- Sim, eu me lembro. E também lembro que você voou longe mesmo quando avisamos que não era daquele lado que era pra ir.
- Sério, tio?
- É... eu esqueci de olhar para onde ia. – Rony contou. – Voei montanha abaixo direto para dentro de um arbusto cheio de espinhos. E ainda fiquei de castigo quando chegamos em casa.
A história invocou outra, que provocou mais uma, e enquanto trabalhavam, a cozinha foi sendo invadida pelo riso e pelo calor de uma reunião familiar. Harry tentava manter os olhos longe de Hermione, mas era impossível. Como uma mariposa atraída pela luz, era atraído de forma irresistível pelo riso em seus olhos, pelo prazer que iluminava seu rosto enquanto as histórias iam se tornando mais divertidas e engraçadas.
Quando todas as pizzas foram para o forno, a cozinha lembrava um campo de batalha. Farinha cobria todas as superfícies, e havia pingos de molho de tomate sobre o fogão e a bancada. Pedaços de cogumelo, queijo, pimentão e cebola podiam ser vistas pelo chão, transformando o ladrilho branco e um caleidoscópio de cores e formas.
- Ainda bem que posso usar mágica, senão estaria frita pra limpar essa bagunça. – Hermione comentou, bebendo um gole do segundo copo de vinho. Harry não sabia se era a bebida, o calor do forno ou a conversa, mas o rosto dela estava corado e brilhante e lindo como jamais vira antes.
- Bem, você sempre foi boa com feitiços, não deve ser difícil arrumar toda essa sujeira. – disse Harry contemplando aqueles olhos castanhos.
- É, além do mais, um gênio não pode criar sua obra de arte sem fazer um pouco de sujeira. – Rony protestou com um suspiro exagerado. - Quanto tempo ainda teremos de esperar? Estou faminto. – Reclamou, jogando na boca um pedaço de queijo que encontrou na bancada.
- Mais alguns minutos e poderemos comer.
- Ótimo. Se não comer alguma coisa bem depressa vou acabar ficando tonta. – Hermione revelou empurrando o copo de vinho. – E se tenho a enorme responsabilidade de julgar este concurso, preciso manter-me sóbria.
- Não vai precisar de sobriedade para constatar que minha pizza é a melhor. – anunciou Rony. O comentário vaidoso provocou vaias por parte dos outros dois concorrentes.
Harry não conseguia lembrar a última vez em que se divertira tanto. Comportavam-se como crianças tolas e inconseqüentes, e o calor afetuoso da reunião se prolongava enquanto comiam.
- Não tomarei nenhuma decisão enquanto não tiver comido todas as pizzas. – Hermione declarou antes de cortar o primeiro pedaço. Todos provavam pedaços pequenos de cada uma das criações, e enquanto se alimentavam, a conversa agradável prosseguia.
- Mamãe, acha que já pode tomar uma decisão? – Bryan perguntou ansioso. Hermione sorriu e limpou a boca com o guardanapo, removendo a mancha de molho.
- Sim, estou pronta para anunciar o nome do vencedor.
- Antes disso, mamãe, quero lhe dizer algo. – O menino levantou-se e foi colocar-se ao lado da mãe, passando um braço sobre seus ombros. – Só queria dizer que você é a melhor mãe do mundo.
- Ei, não pode adular a juíza. – Harry protestou.
- Eu? Tio, só queria que ela soubesse que a amo acima de tudo!
- Se alguém pode manipular este julgamento envolvendo a juíza, este alguém sou eu. – Rony declarou. – Afinal de contas, sou o único que corre o risco de não estar aqui dentro de duas semanas.
Hermione ficou boquiaberta, e toda a frivolidade relaxada que invadira o espírito de Harry foi destruída pelo peso das palavras de Rony. De repente sentia-se tomado pelo medo de possibilidades ainda não exploradas, pela raiva irracional, pela culpa indomada e pela dor de promessas quebradas. Rápido, levantou-se impelido pela necessidade de sair dali… antes de perder o controle. Quando saiu da cozinha, ouviu a voz de Bryan censurando o pai com tom triste.
- Puxa, papai…
- Foi só uma piada. – Rony explicou calmo.
Esse era o problema, Harry pensou. Não era uma piada. Era uma possibilidade, uma chance concreta que até aquele minuto se recusara a reconhecer. Correndo, foi trancar-se no quarto sentindo a necessidade do ambiente familiar, da privacidade de um aposento só seu. Precisava ficar sozinho porque, pela primeira vez depois de muitos anos, corria o risco de perder o controle.
N/A Este cap. ficou um pouco grande, mas acho que ficou legal. Espero que tenham gostado de um pouquinho de drama. O próximo cap. está muito bom!!! Se comentarem, vou postar logo, logo.
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