Dura realidade
O tempo foi correndo e eles nunca mais se encontraram. Narcissa havia se mentalizado de uma vez por todas que James estava certo: um caminho com dois sentidos, e eles não se encontravam no mesmo. Era inevitável.
Depois que Narcissa deu à luz um menino, a sua vida tornou-se mais agitada e cansativa. Não lhe sobrava tanto tempo para desperdiçar com devaneios, mas a cada instante que olhava a criança em seus braços, lembrava do último encontro com James. O seu olhar se enchia de ternura quando pegava no menino e o adormecia no seu colo. E mais ainda sentia quando o amamentava. Era maravilhoso perceber o quanto aquele ser tão indefeso necessitava dela.
Mais de um ano se passou depois disso. Narcissa nunca mais recebeu notícias de James ou o viu. Tinham sido meses dolorosos, perdendo horas a fio sentada no sótão, esperando incansavelmente uma coruja que nunca veio. Continuou contemplando a rosa todos os dias, sem qualquer exceção. Ela permanecia intacta desde o ultimo encontro com James. Não havia caído uma única pétala até então.
Um dia, subitamente, acordou sobressaltada, com seu coração palpitando a um ritmo frenético, parecendo prestes a sair do seu peito. Não entendeu exatamente o que estava acontecendo, mas uma enorme angústia se apoderou de si sem razão aparente.
Rapidamente desceu as escadas da mansão a fim de beber um pouco de água na cozinha. Mas, para sua surpresa, Lucius estava na sala, inquieto, caminhando de um lado para o outro. Estava nitidamente furioso. Algo de muito estranho estava acontecendo.
Narcissa se aproximou vagarosamente. Lucius imediatamente se virou para ela, sentindo os seus passos arrastados pelo soalho. Ela pode ver fúria ardendo nos seus olhos cinzas e frios.
-Aconteceu alguma coisa? – perguntou Narcissa suavemente.
-Claro que aconteceu! Você não sabe? Como pode você não saber? – vociferou, indignado.
-Lucius, eu não estou entendendo do que você está falando!
-O Lorde desapareceu! Pensa-se que esteja morto, Narcissa. Percebe agora a gravidade da situação?
-Você está falando sério? – perguntou ela, fingindo indignação. Na verdade sentiu uma enorme tranqüilidade atingindo seu peito. Porém, a angústia parecia ainda persistir – Como isso aconteceu?
-Os malditos dos Potter’s! – berrou Lucius furioso. Nesse momento, Narcissa sentiu seu estômago se contorcer fortemente.
-Os Potter’s? – perguntou enquanto sentia que algo devastador estaria para vir. – Como assim, Lucius?
-Aquela Sangue-Ruim e o traidor estão mortos! Apenas o filho deles sobreviveu, aquele imundo… Ele acabou com o Lorde!
-Eles… eles estão mortos? – Narcissa engoliu em seco.
Nesse instante, sentiu o mundo desabar sobre a sua cabeça. Como se lhe tivessem atirado um balde de gelo sobre todo o corpo. Não, não poderia ser verdade, poderia? James não podia estar morto. Ela não conseguiria viver sem ele. Era demasiado duro viver longe dele, mas viver sem ele era pior do que a ideia de morrer. Aliás, isso até não parecia uma má ideia…
-Eles morreram sim, aqueles desgraçados! Pena que não foram torturados até à morte! – gritou Lucius, ainda mais descontrolado.
-Eu… eu…
Narcissa não conseguiu formular uma frase sequer. Todos os seus sonhos, esperanças, vontade de viver, tudo havia sido destruído violentamente. Sem pensar em mais nada, correu para fora dali. Os seus pés a guiavam para algum lugar e ela ainda não sabia a razão.
Parou em frente da velha porta de madeira. Velha, mas ainda imponente. Sentiu uma lágrima fria invadir seu rosto enquanto a sua mão tremia, segurando o puxador da porta. Respirou fundo, tomando coragem para abrir a porta e entrou.
O cômodo permanecia exatamente igual, mesmo depois de todo aquele tempo. Ainda era visível todo o pó cobrindo os móveis e as teias de aranha formadas nos cantos, junto ao teto. Os seus olhos marejados rapidamente se voltaram para a cômoda que permanecia junto à parede.
Sentia medo. Não queria olhar a rosa. Tinha medo do que podia encontrar. Ainda não havia assimilado toda aquela história. Ainda não se convencera a si própria de que James estava realmente morto. Não podia ser verdade. Simplesmente, não podia!
Deixou seu corpo escorregar pela parede suja até atingir o chão frio, igualmente sujo. Levou as mãos ao rosto e começou chorando desesperadamente. Não fazia ideia se os seus soluços eram audíveis ou não no corredor, mas isso não era importante no momento. Não podia. James tinha de estar vivo.
Olhou novamente a cômoda, ligeiramente desfocada devido à água que inundava seus olhos. Ela precisava vê-la. Precisava ter a certeza de que ele tinha morrido, para poder acreditar. Mas como estaria a rosa? Será que permanecia intata, como havia estado durante todo aquele tempo? Narcissa cerrou os olhos com força e continuou chorando incansavelmente, enquanto uma enorme vontade de gritar a plenos pulmões parecia se apoderar dela.
Não tinha coragem. Simplesmente não conseguia se mover do lugar onde estava para ver o que, provavelmente, seria o seu fim. A prova de que tudo era real demais.
Porém, talvez a amargura que sentia perante a dúvida lhe desse força. Não haviam muitas dúvidas, mas ela ainda guardava uma vaga esperança de que tudo não passasse de um equívoco, ou quem sabe até de um sonho. Levantou-se e caminhou lentamente até à cômoda. Fitou-a durante longos minutos, sentindo seu coração batendo alucinantemente. Queria sair dali. Queria simplesmente não ter de fazer aquilo.
Com um pouco de coragem que, na realidade, nunca pensou possuir, ela abriu hesitantemente a gaveta. Fechou os olhos antes de poder ver qualquer coisa que fosse. Mas não demorou muito até os voltar a abrir novamente.
Cerca de seis ou sete pétalas estavam espalhadas sobre a gaveta. Sentiu a angústia inundá-la com uma força que nunca sentira. Pegou a rosa com cuidado, mas mais pétalas caíram. Negras pétalas, carregadas de sofrimento. Pétalas que quebravam toda a falsa esperança que restava no seu peito. E ao mínimo movimento, mais pétalas caíam, impiedosamente, até embaterem no soalho.
Sentiu as lágrimas correrem ainda mais em seu rosto. A rosa estava quase sem pétalas.
Subitamente, entre lágrimas e soluços de desespero absoluto, Narcissa viu algo que lhe captou a atenção. Um pequeno pergaminho fino, dobrado inúmeras vezes, encontrava-se no centro da rosa. E, ao pegá-lo, As últimas duas pétalas caíram, declarando o seu fim.
Abriu o pergaminho com receio. Não sabia exatamente o que iria encontrar lá.
“Querida Cissy,
Sem ter o céu como limite,
ter a lua como iluminação,
nos seus braços paraliso,
sinto as lágrimas deslizarem!
E caio onde não sei...
Agora espero na morte,
encontrar o conforto que senti nas tardes de Inverno,
deitado sobre o seu ventre,
fazendo carícias no seu cabelo...
olhando para os seus olhos e vendo que respirava com dificuldade,
o amor que eu tinha para lhe dar...
Se estiver lendo isso, com certeza eu estarei morto, porque jamais deixaria de pensar em você. “Amor até à morte”, lembra? Essa rosa deixaria de ter vida se eu morresse. E eu não desejaria morrer sem lhe dizer certas coisas que permanecem no meu coração. Cissy, você é a mulher que eu mais queria. E a que eu nunca pude ter. Todas as tardes que passamos juntos, todas as noites de prazer e amor… Eu precisava tanto do seu toque, do seu cheiro, de tudo e qualquer coisa sua! Se eu pudesse, eu ficaria com você. Se eu pudesse… não teria te dado essa rosa. Não precisaria que você a usasse para saber o quanto eu gosto de você. Eu te provaria isso todos os dias, ao amanhecer. Assim como fazia nas manhãs em que acordava com você do meu lado, dormindo. Posso nunca te ter dito, mas eu te amava em vida. Sim, Narcissa, porque se você estiver lendo isso eu não estou mais vivo. E eu sabia que não te podia amar. E eu sabia que o meu maior erro foi um dia ter-me deixado levar pelo prazer sem pensar que isso poderia ter conseqüencias tão devastadoras em nossas vidas. Mesmo assim, eu voltaria a comete-lo só para voltar a sentir que você poderia ser minha, nem que fosse durante breves momentos.
Saiba que o meu último desejo é que você tente ser feliz sem mim! Siga em frente, não importa que eu esteja morto. Eu estarei olhando por você. Prometo.
Beijos apaixonados,
James.”
Sentiu o perfume dele impregnado no pergaminho. Agora era tudo real demais. Tudo se tornara devastadoramente real. Queria adormecer e não acordar mais. Queria morrer junto com ele. Talvez depois da morte pudessem ficar juntos. Porque na vida ela já não encontraria mais felicidade. Jamais.
Caiu de novo no chão, de joelhos. A dor que sentia era infindável. Marcava todas as suas expressões, se cravava na pele e circulava nas suas veias. Os seus sonhos terminaram naquele instante. As palavras da carta de James ecoavam na sua mente como se ele próprio as tivesse falado para ela as ouvir. Queria morrer, fugir para algum lugar onde não existissem sentimentos, onde não tivesse alma.
Ele estava morto. Era essa a realidade. A mais dura de todas. Muito mais duro que não poder estar com ele, era não o ter mais. Era saber que ele já não estava mais ali, como prometera.
Não sabia que mal tinha feito para merecer tanto sofrimento. Seria assim tão má pessoa? Teria cometido assim tantos pecados que merecesse tal pena?
E rapidamente todas as respostas se formulavam na sua mente. Os pecados que havia cometido sem qualquer hesitação. Tinham sido tantos, inúmeros, incontáveis. Pecados que jamais se arrependera.
E sem arrependimento, não há perdão.
Pela primeira vez, Narcissa sentiu que as idiotices que o povo dizia poderiam ter algum fundamento. Talvez existisse mesmo alguém superior que condenasse e perdoasse os pecadores. Mas ela nunca teria perdão. Não quando ela não conseguia ao menos se arrepender um pouco do que fizera. Do que sentira, do que vivera. Dos momentos inesquecíveis e maravilhosos ao lado de James. Ao lado daquele que podia considerar o verdadeiro homem da sua vida.
E aquele era o preço do seu pecado. Desfrutara dele, agora chegara a hora de sofrer por ele.
N/A - Risotto aux fruits de Mer é um prato francês, que eu suponho ser algo que aqui em Portugal chamamos de “Arroz de Marisco” ou algo parecido… O poema escrito na carta do James não fui eu que escrevi, apenas vi num blog e guardei. Depois de dar uma olhada nos poemas que tenho aqui, achei esse e não me lembro de que blog o tirei e muito menos o autor. Portanto, apenas não é meu.
Ah, e a fic não foi betada, por isso peço desculpa pelos erros^^
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