Sangue e Lágrimas



— CAPÍTULO UM —
Sangue e Lágrimas




Duas semanas tinham se passado desde que Hermione Granger chegara em casa para passar as férias escolares. Seus pais faziam tudo o que podiam para agradá-la, pois logo ela estaria voltando para a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, onde estudava desde o ano anterior. Ninguém na família tinha nascido bruxo antes dela, mas apesar da ausência de antepassados, Hermione tinha um talento nato para a mágica. Era também muito estudiosa e dedicada, características pelas quais muitas vezes era rotulada de “sabe-tudo”.
Até receber a carta da escola, no ano anterior, contando que ela tinha uma vaga, Hermione nunca nem suspeitara da existência de bruxos, muito menos que fazia parte daquele mundo. Foi, porém, a explicação perfeita para os fenômenos estranhos que acompanhavam suas emoções desde a infância. Ela apaixonou-se instantaneamente pelo mundo mágico e pela escola. Adorava as aulas, praticar feitiços e preparar poções.
Hermione fizera quatro amigos em Hogwarts. O primeiro que conhecera era o atrapalhado Neville Longbottom. Tivera a ajuda dele e de sua avó no ano anterior para conhecer as lojas onde deveria comprar os materiais escolares. Também ajudara Neville diversas vezes a encontrar seu sapo, que vivia fugindo e se escondendo do dono.
Depois conhecera e tivera, de início, uma relação conturbada com Harry Potter e Rony Weasley. Depois de lutarem contra um trasgo juntos, os três tornaram-se amigos. Harry era famoso por ter sobrevivido a um ataque mortal de Voldemort, o bruxo das trevas mais temido dos últimos tempos, ocasião em que perdera seus pais. No ano anterior, Voldemort tentara retornar e em um confronto com Harry e Dumbledore, diretor da escola, fora impedido. Harry vivia com um casal de tios e um primo trouxas que o tratavam mal.
Rony vinha de uma família tradicional de bruxos e tinha dois irmãos formados em Hogwarts e outros três que ainda estudavam lá além dele. Tinha ainda uma irmã mais nova, que entraria no primeiro ano no próximo semestre, quando eles começassem o segundo. Apesar da amizade, Rony e Hermione implicavam muito um com o outro e discutiam praticamente o tempo todo.
O quarto amigo era Rúbeo Hagrid, guarda-caça de Hogwarts. Era um homem enorme, de cerca de três metros de altura, mas o que tinha de tamanho tinha de doçura: era uma pessoa maravilhosa. Tinha uma verdadeira fascinação por criaturas mágicas grandes e perigosas, às quais ele tratava carinhosamente. No ano anterior emprestara a Dumbledore um cachorro de três cabeças chamado Fofo e por um período criara ilegalmente um dragão norueguês, para quem ser uma boa mãe era seu mais fervoroso desejo.
Hermione escreveu uma carta para Harry e outra para Rony, e naquela tarde iria ao Beco Diagonal enviá-las pelo serviço postal dos bruxos, que era feito através de corujas. Como ela não possuía um animal próprio, precisava recorrer a uma agência. Quando recebia uma carta de Rony, devolvia pela mesma coruja, mas como Rony tinha demorado a responder sua última carta, ela lhe escreveu outra. Harry também tinha uma coruja, mas ainda não tinha respondido nenhuma das cartas dela nem as de Rony, deixando os dois amigos preocupados.
Os pais de Hermione levaram-na de metrô até o Caldeirão Furado, e ficaram esperando por ela do lado de fora. Ela entrou no estabelecimento, um bar meio escuro onde bruxos bebiam, conversavam e jogavam cartas. Nos fundos, porém, era a passagem do mundo dos trouxas para o Beco Diagonal, e Hermione dirigiu-se diretamente para lá.
Já andando pelas ruas do Beco Diagonal, Hermione sentiu-se em casa. Andar perto de outros bruxos, ouvindo-os falar sobre assuntos de bruxos, ver nas vitrines artigos de bruxos... Era a sua natureza, era ali que se sentia confortável. Foi até a agência postal e enviou as cartas para os amigos. Depois de sair dali, comprou um sorvete e passeou ao redor das lojas. Em determinado momento, Hermione viu dois olhos enormes e verdes se destacando em uma esquina. Pertenciam a uma criaturinha pequena e cinzenta, que ela reconheceu como um elfo doméstico, segundo o que lera no Dicionário das Criaturas Mágicas. Sorriu para ele, era uma criatura simpática. Aproximou-se, mas ele não olhava para ela; parecia absorto na conversa de seu dono com alguém.
Hermione não pôde ver o dono do elfo, pois ele estava atrás da casa da esquina. Podia ver apenas a mão muito branca, coberta por uma manga negra, que segurava o elfo duramente pelo braço. Então ela ouviu trechos da conversa também. Entendeu apenas palavras soltas, mas algo chamou sua atenção: o termo “sangue-ruim”. No ano anterior, um aluno da Sonserina que a odiava e também odiava Harry e Rony chamara-a assim, mas ela não entendera por que aquilo era tão ofensivo. O garoto que a ofendera se chamava Draco Malfoy, e na ocasião o xingamento que ele fez quase tirou Rony do sério. Aproximou-se mais, curiosa, e com os olhos fixos no elfo e se escondendo de seu dono, pôs-se a ouvir.
— ... assim dois problemas serão solucionados de uma só vez. Os sangues-ruins serão eliminados de Hogwarts, talvez até sejam mortos como da outra vez. A vontade de Slytherin será feita; os trouxas serão banidos. Os malditos não merecem estudar junto aos sangues-puros. A incorporação deles na sociedade bruxa está criando uma imensa quantidade de bruxos mestiços, que são uma vergonha para as verdadeiras famílias bruxas, as tradicionais como a minha. Sangues-ruins não são bruxos, são aberrações, deveriam ser mantidos no mundo trouxa sem nunca saber de seus poderes. São uma ameaça à paz e ao sigilo da comunidade bruxa, podendo revelar detalhes à comunidade trouxa e assim acabar com a organização bruxa mundial.
Então o elfo fixou em Hermione seus olhos enormes e, com o susto, ela desatou a correr. Pelas lágrimas que lhe afloravam, ela julgou ter percebido exatamente o quão ofensivo era ser chamada de sangue-ruim.


Alguns dias depois, a coruja precária dos Weasley bateu-se na janela do quarto de Hermione, que correu para socorrê-la. Depois de tirar cuidadosamente o bilhete preso à perna de Errol, Hermione deitou a coruja em sua cama para que descansasse, pois o animal arfava em cansaço extremo. Desdobrou o papel e começou a ler.

“Mione

Desculpe por mandar Errol mais uma vez, mas Percy não quis me emprestar a coruja dele de jeito nenhum, disse que está precisando dela. Ele anda muito estranho nessas férias, aliás. Mas isso não vem ao caso... Desculpe também a demora em responder a sua carta, e não, ainda não tenho notícias de Harry. Eu, Fred e Jorge estamos pensando em um jeito de ir até a casa dele ver se está tudo bem, se os trouxas não fizeram nada de mal a ele. Esperamos também conseguir trazê-lo para a nossa casa, e estamos planejando isso ainda para esta semana. Mandaremos notícias a você assim que tivermos.
E você, o que anda fazendo? Sua preocupação com Harry foi tanta que você nem respondeu se gostaria de passar um dia aqui em casa.
(Hermione releu esta frase, lembrando que não respondera por receio. Será que deveria ir à casa dele? Será que não se sentiria deslocada? E se começassem a brigar como faziam na escola, o que a família pensaria dela? E se Rony surtasse e a mandasse para a casa mais cedo? Na ocasião, ela esperava que ele não percebesse que se abstivera do convite.) Deseje que tudo dê certo quanto ao plano de ajudar Harry.

Rony”


Hermione ainda releu a carta, depois lançou um olhar pesaroso a Errol; responderia no dia seguinte, já que naquela hora a coruja não poderia nem mesmo se erguer.

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