Dia das Bruxas
O flash verde... Um baque no chão... Mas o que poderia significar aquilo? Não conseguia entender. Tinha certeza que já sonhara com aquilo...
"- Eu não queria mostrar isso, mas é preciso. Mas não se preocupe, não deixarei que se lembre de nada."
Aquela voz... Tão suave e gentil... Há muito tempo atrás... Não, não fazia tanto tempo... Sonhara com aquilo antes de ver Thanatus. Antes de enfrentar Voldemort pela primeira vez.
- Não deixarei que se lembre de nada...
Quando Lílian se levantou da cama, naquela manhã, a janela estava entreaberta e um vento frio, prenúncio do inverno que se aproximava, fez com que ela se encolhesse enquanto vestia um roupão sobre a camisola. Não lembrava-se do sonho que tivera, apenas de uma grande escuridão. Ela virou-se, passando os olhos pelo quarto. Tiago não estava na cama e todo o andar parecia estranhamente silencioso.
Ela prendeu os cabelos num coque desleixado e deixou o aposento, encaminhando-se para o quarto do filho. A penumbra ainda reinava ali, cortada apenas pelas estrelas que faiscavam nas paredes azuis. Mas Harry não estava no berço.
Com um sorriso divertido, ela desceu as escadas que levavam ao térreo em silêncio, como aprendera com Tiago na época em que se esgueiravam sob a capa de invisibilidade dele. A porta da cozinha estava aberta e ela caminhou até lá, deparando-se com um inusitado espetáculo. Tiago estava com uma de suas cuecas samba-canção, roxa com abóboras, uma regata e um dos aventais dela, vermelho cheio de moranguinhos, fritando panquecas junto ao forno, enquanto Harry, sentado no chão, mexia alguma coisa que parecia mel numa panelinha de plástico.
Ela apoiou-se no umbral da porta, observando os dois sem que eles a notassem. Harry largou a tigela do melado e caminhou levemente trôpego até uma grande abóbora, que eles tinham esculpido no dia anterior para o Hallowen. Ela riu baixinho quando o filho caiu sentado diante da abóbora e começou a enfiar as pequenas mãzinhas nos buracos da casca oca.
Tiago virou-se quase que imediatamente, levantando as mãos como um criminoso após a ordem de prisão. Ela riu alto dessa vez e Harry também virou-se para ela, sorrindo.
- Tiago, você tem idéia de quão... sexy está com essa insólita combinação?
Ele riu.
- Tem crianças no recinto, sra. Potter. Além disso, eu não queria acordá-la fuçando o guarda-roupa atrás de alguma roupa.
Ela meneou a cabeça enquanto Harry se aproximava dela, levantando os braços.
- Mamãe?
Lílian sorriu, pegando o filho nos braços enquanto Tiago desligava o forno e a abraçava, roubando um beijo por cima da cabeça do filho.
- Hoje é dia de comemoração. Faz sete anos que começamos a namorar e dois que nos casamos. Sete anos de convivência... Quem diria, não, sra. Potter? Para quem dizia que não me suportava?
Ela meneou a cabeça.
- Você tem que me passar isso na cara todo ano?
- A vida não é feita apenas de boas lembranças. - ele piscou o olho - E eu ainda não me sinto devidamente recompensado por todos os foras que ouvi dessa sua boquinha.
Mais um beijo, e Harry deslizou do colo da mãe para o chão, balançando a cabeça e voltando para a abóbora, muito mais interessante que os pais, com toda a certeza. Aproveitando o espaço livre, Tiago enlaçou a esposa pela cintura. Quando finalmente se separaram, ela riu novamente.
- Você não presta.
- Eu tenho plena consciência disso. Nesses sete anos, você nunca me deixou esquecer disso.
- Mas eu te amo. - ela retrucou, divertida.
- Eu também. Quem não me amaria? - ele tirou o avental - Eu sou o máximo...
Ela rolou os olhos.
- Ai, Merlin, por que comigo?
Tiago voltou a abraçá-la.
- Porque se não fosse com você, não seria com mais ninguém.
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Começava a anoitecer. Sirius terminou de arquivar os relatórios e deixou o quartel-general dos aurores. Naquela noite, ele iria visitar Pedro no esconderijo do amigo, para saber se estava tudo bem com ele, e depois iriam juntos para a casa dos Potter, comemorar o aniversário de casamento dos amigos.
Ele saiu do ministério, ligando a velha e querida moto. Ao final das contas, não conseguiu se livrar dela. Adorava aquela moto. Logo ele pode sentir no rosto o vento frio e sorriu. Estaria com seu amigo, seu irmão, em poucos instantes. Tiago não fora trabalhar naquele dia, e ele podia entender perfeitamente porque. Quando se tem uma esposa como Lílian e um filho como Harry, deve-se aproveitar todo e qualquer instante.
Sirius suspirou, estacionando a moto diante do esconderijo de Rabicho. Ele deveria ter descoberto isso antes de Susan morrer. Agora era tarde demais para se dar conta de algo tão importante...
O rapaz entrou no casebre sujo em que Pedro decidira se esconder. Porque aquele lugar, Sirius jamais entenderia... Pedro dissera que era só por um tempo, para poder proteger a mãe. atitude louvável, sem dúvida alguma.
Ele percorreu os três aposentos, sem encontrar sombra de gente. Pedro não estava ali. Talvez tivesse ido comer alguma coisa, como sempre. Sirius sentou-se num pedaço de sofá menos rasgado para esperar.
Esperar... A mente do moreno começou a trabalhar a todo o vapor. Alguma coisa estava errada. Pedro sabia que ele vinha, teria comida à vontade na casa dos Potter... Alguma coisa... simplesmente não se encaixava.
Os olhos de Sirius se esbugalharam quando uma dúvida surgiu em meio a todos aqueles pensamentos confusos... E se Remo não fosse o traidor? E se... Céus, se aquilo fosse verdade, ele tinha entregue os melhores amigos nas mãos de Voldemort.
Sem pensar duas vezes, ele correu para a moto. Godric's Hollow era protegida por uma magia parecida com a de Hogwarts, não conseguiria aparatar como Dumbledore. Só podia rezar agora para que não fosse tarde demais...
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Tiago remexeu um pouco na lareira enquanto ela sentava no tapete. Harry acabara de dormir, passava das dez da noite. Sirius e Pedro tinham ficado de aparecer, mas até agora, não havia sombra dos dois. O moreno voltou para o lado dela, abraçando-a enquanto depositava um beijo no alto de sua cabeça.
- E então, está feliz?
Ela riu.
- Que tipo de pergunta é essa, Tiago?
Lílian fixou os olhos nos dele e percebeu o semblante sério do rapaz. Ele segurou uma mecha do cabelo ruivo e começou a brincar com ele, enrolando-o entre seus dedos.
- Estamos juntos há tanto tempo... Eu sempre me perguntei se você era feliz comigo. Mas nunca tive coragem de verbalizar esse pensamento. Mas eu queria saber...
Ela o calou colocando os dedos sobre seus lábios.
- É claro que eu sou feliz com você, Tiago. Eu te amo, e isso é suficiente para mim. Por toda a eternidade. Se eu morresse nesse exato instante, só me arrependeria de não ter aceitado o que sentia mais cedo. Mesmo nos momentos mais difíceis que tivemos de enfrentar... Eu fui feliz pelo simples fato de ter você ao meu lado.
Tiago puxou ela para seu colo, beijando a testa da ruiva ternamente.
- Eu sinto muito...
Ela levantou os olhos para ele.
- Do que está falando?
De repente, a temperatura pareceu abaixar. Mesmo o fogo na lareira parara de crepitar. Tiago segurou a mão dela, levantando-se e ela percebeu a aura dos dois se confundir. E as cenas do sonho que tivera naquela manhã voltaram a sua mente. Ele a puxou novamente para um abraço, num beijo urgente, antes de separar-se bruscamente, empurrando-a na direção da escada.
- Lílian, leve Harry e vá! É ele! Vá! Corra! Eu o atraso...
O moreno virou-se para a porta, já empunhando a varinha, enquanto Lílian segurava as lágrimas e tropeçava, subindo as escadarias. Tinha que obedecer, Tiago tinha razão, havia Harry. Ela lutou contra o impulso de permancer e lutar ao lado do marido.
- Isso não pode estar acontecendo... - ela balbuciou baixinho - Tiago... Harry...
Ela ouviu a porta escancarar-se no andar de baixo seguida de uma gargalhada aguda enquanto seu coração debatia-se descontroladamente. Abriu a porta do quarto do filho com os olhos embaçados. E lá estava ele, Harry, olhando-a com uma inocente curiosidade. Ela aproximou-se do berço e, nesse instante, ouviu um baque surdo. Lá embaixo, Tiago Potter acabara de cair, vítima de Voldemort. Ela não conseguiu mais segurar as lágrimas. Tiago. Tiago estava morto. E era tudo culpa dela. Se ela não fosse um maldita guardiã, uma...
- Ora, ora... Olá, pequena.
Os olhos dela alargaram-se em choque ao ver Voldemort no umbral da porta. Tiago estava morto, mas ainda havia Harry. Harry tinha que viver. Com esse pensamento, ela tirou a varinha do bolso.
- Dê-me o menino.
Ela se pôs diante do berço, protegendo-o com o próprio corpo.
- Por favor... o Harry não... - ela falou com a voz fraca, as lágrimas atrapalhando. A razão para viver já se fora, mas ela precisava lutar. Por Harry. E por Tiago.
- Afaste-se sua tola! Me entregue o garoto!
- O Harry não, por favor, por favor... Me leve, me mate no lugar dele...
Ele aproximou-se, segurando o braço dela com força. Lílian sentiu como se sua cabeça fosse explodir.
- Afaste-se, menina!
- Expelliarmus!
Voldemort foi pego de surpresa e com isso foi mandado para trás, batendo na parede. Lílian voltou-se para o berço, pegando Harry no colo. Ele sorriu para ela, alheio a toda a tristeza que a mãe sentia.
- Se quer tornar as coisas mais difíceis, que seja então do seu jeito. É uma pena que eu vá perder tão interessante aliada, mas...
Lílian começou a cantar baixinho para Harry, enquanto uma aura prateada bem fraquinha a envolvia. Voldemort riu.
- Sim, aproveite para niná-lo uma última vez. A última! - ele gargalhou antes de voltar a falar, dessa vez com a voz sussurrante, enquanto apontava a varinha para Lílian e Harry - Avada Kedavra.
Não muito longe dali, um vulto de negro assistiu a casa que pertencera aos Potter em Godric´s Hollow explodir. Pedro tremeu. Estava tudo acabado agora.
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