Fidelius
Quase um mês se passou após o aniversário de Harry. Enquanto as férias duraram, Lílian, Tiago e Harry estiveram em Hogwarts. O pequeno Harry andava por todo o castelo, sendo paparicado pelos professores, que rezavam para que a criança fosse tão inteligente quanto os pais, mas que causasse menos problemas...
Dumbledore pediu que eles se afastassem de suas funções. Embora relutantes, ambos concordaram. Mas agosto veio e passou, assim como o aniversário de Tiago, comemorado entre as velhas paredes da sala comunal vermelha e dourada. Era setembro.
O velho diretor providenciou para que eles não se distanciassem muito. O casal agora morava em Godric's Hollow. Tiago, apesar dos pedidos de Dumbledore, voltou ao trabalho. Lílian, por outro lado, teve que continuar em casa, já que Zoe estava muito velha para cuidar de Harry sozinho.
Era nisso que a jovem ruiva pensava absorta, deitada preguiçosamente na grande cama de casal. As folhas amareladas caíam das árvores, tornando o jardim um tapete macio. Um vento frio denunciava o início do outono. Através da janela de seu quarto, a paisagem nunca parecera tão bela a Lílian.
Ela virou-se na cama, encontrando um pequenino ser que dormia tranquilamente. Os cabelos, embora fossem poucos, já denunciavam a futura semelhança com o pai. Lílian fechou os olhos, sentindo uma presença nova invadir a casa. A porta do quarto se abriu e, com um sorriso, a ruiva levantou a cabeça.
Lá estava Tiago, com seus olhos brilhantes, cheios de entusiasmo. Ela se acalmou quase que instantaneamente ao vê-lo. Ele sobrevivera a mais um dia de trabalho. Quantas vezes mais ela teria que ficar esperando o marido com o coração na mão, sem saber se ele voltaria ou não? Tiago sentou-se na cama e o pequeno acordou, os pequeninos olhos incrivelmente verdes brilhando, exatamente como os da mãe.
- E então, como vai a família mais linda do mundo? - ele perguntou, roubando um beijo da ruiva.
- Muito bem. Só falta o papai deixar de ser teimoso e deixar a mamãe voltar a trabalhar. - Lílian respondeu com um olhar brincalhão.
Sabia que Tiago estava muito satisfeito com aquele atual arranjo. Porque não estaria? Ela estava ali, trancada sem nada poder fazer, enquanto ele podia se correr todo tipo de risco.
- Lily... Eu já disse que é mais seguro que fiquem aqui.
- E você pode se arriscar à vontade. Realmente...
- Não vamos discutir isso de novo agora, certo? - o moreno deu um beijo na fronte do filho e segurou firme a mão dela - Eu te amo, Lily. Não quero que nada aconteça a você.
Ela sorriu tristemente.
- Eu sei. Porque é exatamente assim que eu me sinto em relação a você... - ela voltou a beijá-lo e Tiago a abraçou, puxando-a para o colo dele.
Lílian fechou os olhos, achando aquela cena vagamente familiar. Vagamente? Tiago sentiu o corpo da esposa tremer com o riso e virou-se para ela curioso.
- O que é tão engraçado?
- O sonho... Nós já vivemos isso num sonho. Se tivessémos combinado, não sairia tão perfeito.
Ela viu uma sombra passar pelos olhos dele e soube no mesmo instante que ele se lembrara das circustâncias em que tinham tido aquela premonição. Tiago a estreitou mais nos braços, como se tivesse medo de perdê-la. Lílian afundou a cabeça na curva do pescoço dele.
- Dumbledore quer nos ver. - ele disse após um breve suspiro.
- Ele tem vindo aqui toda semana. Qual a novidade? - ela perguntou, procurando os olhos dele.
- Voldemort ainda não sabe onde estamos. - ele respondeu sem emoção.
Aquele "ainda" foi mais do que suficiente para que ela entendesse o que ele queria dizer.
- O que Dumbledore pretende?
- Ele quer usar da sua magia. Da Antiga Magia. O Fidelius.
Lílian fechou os olhos.
- E o fiel?
Tiago a observou surpreso.
- Pensei que não concordaria. Faz anos que não usa da sua magia.
Ela se lembrou da voz de Chaos."Nunca se esqueça que a Antiga Magia é uma magia de sacrifícios. Sempre que usá-la, estará sacrificando algo para ela. Talvez não tenha percebido... Ou só agora tenha entendido... Depois do que viu e ouviu essa noite, só use sua magia quando for estritamente necessário. Ela pode se voltar contra você."
- Eu não me importo mais comigo, Tiago. Mas eu quero que você e Harry sobrevivam. Eu sacrificarei o que for necessário para fazer o feitiço.
Novamente, ela deitou a cabeça no ombro de Tiago. Harry virou-se na cama, engatinhando até os dois e caindo sentado diante deles. Tiago deixou escapar um riso, e libertou uma mão para afagar o filho, enquanto com a outra segurava Lílian protetoramente pela cintura.
- Daqui a duas semanas vai ser nosso aniversário de casamento.
- O dia das bruxas... - ela riu - Só você mesmo para querer se casar no dia das bruxas... Entre os trouxas, isso provavelmente seria considerado um mau presságio.
- Nosso destino está ligado ao dia das bruxas, Lily. - ele respondeu - Começamos a namorar no dia das bruxas, casamos no dia das bruxas... Porque seria um mau presságio?
Ela deu de ombros e levantou-se. A campainha tocou nesse exato instante. Logo a voz de Sirius preencheu a casa alegremente.
- Eu estou subindo! Espero que estejam decentemente vestidos até eu chegar aí.
Tiago riu, balançando a cabeça e Lílian abriu a porta do quarto, recebendo o amigo com um sorriso.
- Você tem uma mente muito poluída, sabia?
- E você é uma santa?
Ela balançou a cabeça e Sirius entrou no quarto. Harry logo ergueu os braços, murmurando alguma coisa ininteligível. O rapaz abaixou-se, deixando o afilhado envolver seu pescoço com os bracinhos gordos.
- Vocês não querem me dar esse pirralho não?
Lílian estreitou os olhos.
- Você acha que meu filho é uma coisa para se dar de presente?
Sirius riu.
- Ele me adora, eu adoro ele. Fomos feitos um para o outro.
Tiago sorriu, mas logo esse sorriso foi substituído por uma expressão séria.
- Sirius, Dumbledore quer que façamos o Fidelius.
O outro rapaz imediatamente passou a prestar atenção.
- Eu concordo plenamente. Vocês estariam bem mais seguros.
- Eu quero que você seja nosso fiel de segredo. - Tiago disse olhando para a esposa. Lílian fez um sinal de concordância - Dumbledore queria que fosse ele, mas acho que nosso velho professor já tem muito com o que se preocupar.
O moreno pareceu pensativo por alguns instantes.
- Eu não tenho nada a perder. Ao contrário. Vocês sabem que sempre podem contar comigo.
Nesse momento, a cabeça de Zoe apareceu na porta.
- O Professor está aí embaixo.
Tiago e Sirius se levantaram, logo seguindo para a sala, onde Dumbledore se encontrava.
- Boa noite. - ele desejou com a voz suave, observando os três alunos com carinho - Vocês já se decidiram?
Lílian foi quem tomou a palavra.
- Nós aceitamos, professor. Sirius será nosso fiel. Amanhã mesmo poderemos fazer o feitiço.
Dumbledore assentiu.
- Acho que é só, então. Mas, quanto mais pessoas forem protegidas, mais magia você deverá consumir. Talvez fosse uma boa idéia mandar Zoe para a mansão Potter.
Tiago assentiu e o diretor se virou para ir embora. Já esperava por aquela resposta, nada mais havia a fazer ali. Mas antes que pudesse sair, uma mão pousou em seu ombro.
- Professor, eu queria deixar umas coisas com o senhor. - Tiago estendeu um pacote - Aqui está a minha capa de invisibilidade e a chave do gringotes. Eu não sei como isso vai acabar, mas querto que guarde para poder entregar a Harry quando ele chegar em Hogwarts.
Dumbledore assentiu e Lílian deixou uma lágrima escapar.
- Eu prometo, Tiago.
- E se... Se alguma coisa nos acontecer... - Tiago continuou - Eu nomeio Sirius tutor de Harry.
Os dois amigos trocaram um rápido olhar e Sirius sorriu. Não deixaria que nada acontecesse com o amigo.
- Como quiser então. - Dumbledore sorriu - Até logo.
Ele desapareceu e um silêncio pesado caiu no aposento. Zoe entrou na sala.
- A janta está pronta.
- Já estamos indo, Zoe. - Lílian respondeu, enquanto tirava Harry de Sirius - Já estamos indo...
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Pedro sorriu ao ver o amigo sentado numa mesa afastada. O Caldeirão Furado estava bem cheio para uma noite de domingo. Sabia que Sirius se acostumara, após a morte de Susan e a mudança dos Potter, a fazer suas refeições no bar. Aquela era uma das únicas ocasiões em que encontraria Sirius sozinho, e ele tinha que aproveitar. Tinha que usar a desconfiança em Remo ao seu favor. E, com alguma sorte, descobrir o esconderijo de Tiago.
- Boa noite, Almofadinhas.
Sirius sorriu, fazendo um sinal com a cabeça para o amigo se sentar. Pedro assentiu e logo eles estavam numa alegre conversa sobre os tempos de escola. Mas não era nesse rumo que Pedro queria que a conversa corresse. E assim que um silêncio mais prolongado surgiu enquanto Sirius pedia a conta, o rapaz decidiu introduzir o assunto que o trouxera ali.
- Eu estou preocupado... - ele falou sério, logo chamando a atenção de Sirius - Como estão Lílian e Tiago?
Sirius estreitou os olhos em desconfiança.
- Estão bem. Porque está perguntando?
Pedro olhou para os lados antes de se inclinar para falar em voz baixa.
- Sirius... Remo sabe onde eles estão?
- Porque... Porque está perguntando isso?
O comensal tentou fazer a cara mais inocente que conhecia.
- Na-nada não...
- Pedro? - Sirius cruzara os braços, numa posição clara de quem queria resposta.
O rapaz suspirou.
- Bem, é que o Aluado tem estado tão estranho... E eu pensei... Quer dizer, Dumbledore acha que... Ele acha que temos um traidor...
Essa última palavra saiu num murmúrio quase inaudível, mas Sirius entendeu perfeitamente bem o que Pedro estava dizendo. O moreno pareceu pensativo por algum tempo, antes de se levantar.
- Pedro, você aceitaria, se eu pedisse... Pelo bem de Tiago, Lílian e Harry...
- Sim? - o rapaz também levantou-se, os olhos ávidos.
- Vem comigo, Pedro. Eu tive uma excelente idéia.
- E para onde vamos?
- À casa dos Potter.
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Lílian suspirou contrafeita. Sirius conseguira convencer Tiago afinal. Ela levantou-se, enquanto acabava de desenhar com sal grosso no chão um antigo pentagrama. Pedro, Sirius e Tiago observavam seus movimentos, Harry nos braços de seu padrinho.
O segundo pentagrama se fechou e, em silêncio, Pedro caminhou para ele, enquanto Lílian entrava no outro com Tiago e Harry. A ruiva fechou os olhos e a aura prateada dela a envolveu. Um vento fino soprou do nada e, de algum lugar veio uma triste cantiga.
- Discérne nobis, ab hómine iníquo et dolóso érue nobis. Tu, quia es Dómine, fortitúdo... per ad fide hac hora. Core, anima, corpus. Fidelius...
Gritos, um raio verde e um corpo no chão. Os flashs vieram tão rápido quanto as batidas de seu coração. Com um murmúrio, Lílian escorregou para o chão, sem consciência. A magia já estava fazendo efeito. Logo alguma coisa seria sacrificada a ela pela sua utilização...
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