Suspeitas



Estava tudo acabado. Harry, em sua cama em um hotel do Beco Diagonal, pensava em como tudo seria diferente se, pelo menos, Dumbledore não estivesse agora sete palmos abaixo do chão. Jurou vingar sua morte, nem que causasse a sua própria.
Hogwarts fechara. Não havia como explicar para os pais que a escola não tivera culpa alguma cobre o ataque que ferira alguns dos alunos. Agora se sabia, através do Profeta Diário, que Durmstrang era a escola que mais recebia alunos novos, na esperança de terminar os estudos e conseguir um bom futuro – ou, pelo menos, um futuro melhor do que se teria.
Comensais da Morte eram vistos com cada vez mais freqüência, andando pelas ruas dos bairros mais afastados. Não os antigos; agora o crime era declarado e nada se podia fazer. Ou melhor: pouco se podia tentar. Os gigantes finalmente se recusaram a atender Voldemort, apesar das freqüentes tentativas de suborno. O Ministério não podia fazer mais que fazer ofertas maiores, porque, afinal, os gigantes eram muitos e grandes. Seria uma batalha perdida se eles se aliassem a Voldemort.
Harry se recusava a ficar de braços cruzados. Ia todo dia ao Ministério da Magia para se informar sobre todos os movimentos dos Comensais e para receber notícias – poucas e insuficientes, na maioria dos casos – sobre Voldemort. Não havia mais notícias sobre Horcruxes, apesar de que Harry tinha uma teoria diferente da explicada por Dumbledore – antes do ataque que vitimou o sábio.
Voldemort poderia realmente ter dividido sua alma em sete partes, apesar de Harry achar que não. Voldemort era inteligente – apesar de maligno - o suficiente para saber que o Ministério suspeitaria desse número de Horcruxes. Ele realmente não faria três, pois tinha certeza de que os aurores destruiriam uma a uma, eliminando-o antes do esperado. Ele teria se dividido em mais partes, talvez 666, na opinião de Harry.
Harry não suportava mais esperar. Eram sete horas da manhã, e ele não estava mais prestando atenção em mais nada além das notícias dadas pelo Ministério. Semana passada, o Ministério fez mais uma tentativa de prender um suspeito de ser Comensal, e mais cinco reforços malignos – incluindo elfos domésticos revoltados com seus senhores – aparataram para o local, matando os três aurores que cercavam o suspeito. Isso provava que era, com certeza, muito mais difícil vencer Voldemort, pois conseguira mais aliados e os organizara.
Juntou suas coisas – varinha, óculos, vestes de passeio e sua maleta de utilidades (com algumas “Gemialidades Weasley” e coisas para escrever) – e abriu a porta do quarto. Um homem estava em frente a ela, com as mãos prontas para bater na madeira.
— Sr. Harry Potter? — ele perguntou.
— Sim? — devolveu Harry.
O homem retirou uma carta de uma enorme bolsa que ele carregava.
— Correspondência para o sr.
O carteiro virou as costas e se foi pelo corredor, descendo as escadas logo em seguida.
Harry não resistiu à tentação de ler a carta ali mesmo, mas teve o cuidado de fechar a porta e trancá-la. O envelope era amarelo claro, e tinha uma faixa preta, onde se podia ler “AD”. O coração de Harry acelerou simplesmente ao lembrar daqueles tempos em que desafiara a “Alta Inquisidora” de Hogwarts, tendo aulas de Defesa Contra as Artes das Trevas escondido com seus amigos.
A carta dentro fez Harry se sentir melhor ainda.
“Caros amigos da AD:
Toquem sua varinha na carta para ler o restante.”
Harry tirou a varinha do grande bolso na veste de passeio e tocou o papel, que esquentou e, com um clarão amarelado, revelou mais palavras – e quem as escreveu. Aquele Feitiço da Varinha Amiga só poderia ter sido feito por Hermione.
“Vamos reabrir a AD, mas agora sim com a sigla que o Ministério tanto temia há dois anos: Armada de Dumbledore. Vingaremos sua morte nos unindo e procurando e destruindo todas as Horcruxes de Voldemort.
Precisamos nos reunir no Beco Diagonal sábado, às quatro horas da tarde, em frente a Gemialidades Weasley.
Conto com a presença de todos vocês, e levem quantos livros de feitiços conseguirem carregar. Harry será nosso líder. Não vamos nos aliar ao Ministério, vamos agir por conta própria. No nosso primeiro encontro, distribuirei as moedas marcando o dia e hora da próxima reunião.
Táticas, metas e estudo serão feitos nas madrugadas de sábado, na Gemialidades Weasley. Aliás, Fred e Jorge aliaram-se à gente.
Até lá.
Mione.”
Harry não conseguia acreditar. Seus amigos haviam se organizado e iriam com ele procurar as Horcruxes. Guardou a carta com carinho na veste e saiu do quarto. Seguiu pelo corredor estreito – após fechar e chavear a porta – e desceu as escadas que davam no saguão de entrada do Salão. Deixou a chave com o gerente do hotel e saiu.
Não sabia exatamente onde ficava o prédio do Ministério, mas foi simples perguntar e aparatar até lá. O Ministério havia dado permissão a todos os ex-alunos de Hogwarts que não podiam aparatar ainda a fazê-lo.
Harry estava em frente à fonte onde, dois anos atrás, assistira a luta entre Voldemort e Dumbledore.
Cinco minutos depois, estava no quartel general dos aurores do Ministério segurando um jornal, cujas notícias não eram boas.


— Como tudo saiu tão fora do controle assim? — Harry simplesmente não conseguia entender.
— Harry, acalme-se! São tempos difíceis, principalmente para o Ministério. Toda a culpa recai sobre a gente, entenda! — o novo ministro da magia estava diante de Harry, e a relação entre eles já começara com o pé esquerdo no ano passado.
— Eu posso entender que as coisas estejam difíceis. Mas isso aqui — Harry quase esfregou no rosto do Ministro o jornal — simplesmente poderia ser evitado! Como o Ministério pode se descuidar dessa forma?! Enviar cinco aurores para um local onde possivelmente acontecem as reuniões dos Comensais da Morte! Vocês têm noção de quantos e quão poderosos são os Comensais?
O Ministro se remexeu desconfortavelmente na cadeira almofadada escura em que estava sentado. Não parecia satisfeito em discutir o assunto que Harry, fosse qual fosse o motivo.
— Veja, Harry. Não foi uma tentativa totalmente desperdiçada. Afinal, a missão era simplesmente descobrir qual era o local das reuniões. Pois bem, eles des...
— Esse é o preço de uma descoberta? — interrompeu Harry, agora não conseguindo mais se conter. — Cinco vidas? — continuou, ao perceber que o Ministro não responderia àquela pergunta. — Se a missão era simplesmente espiar o depósito, mandasse uma pessoa comum Alguém disfarçado de mendigo, seria muito melhor e menos chamativo. Mas um homem com um distintivo de auror? Cinco, aliás.
— Harry, compreenda, por favor! Era uma questão de segurança!
— Segurança?! — Harry gargalhou nervosamente. Ainda buscava o argumento ideal para aquela colocação. Até que se lembrou de que acabara de usá-la. — Não há segurança em meio a mais de cem pessoas perigosas. Não faria diferença enviar uma ou vinte. Todos seriam mortos.
Aquele argumento simplesmente não podia ser rebatido. O ministro simplesmente abaixou a cabeça e falou baixo:
— Certo, Harry. Me desculpe. Eu realmente não pensei nas conseqüências.
— Não é a mim que o sr. tem de pedir desculpas. Peça isso para as cinco famílias que estão nesse exato momento velando os corpos. Duvido que saia vivo do cemitério.
Aparentemente sem paciência para falar qualquer outra coisa, o Ministro saiu da sala apertada em que se encontravam. Havia uma enorme pilha de jornais a um canto, sempre com uma foto animada de uma cena macabra recente na manchete. Harry atirou o exemplar do Profeta do dia na pilha e saiu. Não havia sentido em admirar a marca na parede – resultado de um atentado - que por pouco não selou o destino do novo Ministro, há apenas oito dias.


A terça-feira despontou tímida naquele verão. Não parecia que seria um dos dias avermelhados e quentes aos quais todos os moradores já estavam acostumados.
Harry seguiu sozinho pela rua. Não iria ao Ministério aquela manhã. Apenas leria o jornal para se informar sobre as notícias. Não levaria a sério o que o Profeta falaria sobre Voldemort, uma vez que o jornal se provara precipitado e exagerado mais de uma vez.
Chegou à banca mais próxima do hotel. Sabia que não era seguro andar pelo Beco Diagonal naqueles tempos, mas era necessário comprar o jornal. O Ministério perdera a credibilidade ao mentir que apenas dois aurores foram enviados ao local das reuniões dos Comensais da Morte. O resultado não foi nada agradável.
Pagou ao dono da banca de jornal alguns nuques e se dirigiu à loja de vassouras. Parecia ter aberto no Natal. Hoje já estava fechada. Ninguém se preocupara em tirar as vassouras do estoque nos fundos da loja. Na verdade, o que ninguém fizera era criar coragem para tal. A loja havia sido atacada e um senhor havia sido morto dentro dela. Corriam boatos de que alguns Comensais dormiam ali, apesar de isso ser ridículo. Porém, ninguém se sentia capaz de entra ali dentro.
Harry não se importava. Eram vassouras novas, bonitas. Já que não era mais de ninguém, poderia ficar com uma e dar as outras para alguém, ou entregá-las ao Ministério.
Sacou a varinha – só para garantir – e atravessou a porta de vidro. As poucas pessoas que passavam no Beco Diagonal pararam e observaram. Pareciam espantadas, e algumas demonstravam querer ajudar, mas a coragem não era tanta assim.
O coração de Harry acelerou. Alguma coisa se mexera suavemente lá dentro. Parecia estar agachado, ou de joelhos. Era pequeno demais para ser um humano, isso era fato. Mas não significava que não pudesse causar algum estrago.
Harry ouviu um barulho semelhante ao de uma respiração forte – que poderia muito bem ter vindo de seus próprios pulmões. Então, ouviu-se um alto latido e um cachorro grande e com pêlos marrons saiu das sombras da casa e veio até Harry.
Harry se assustou, mas acalmou-se ao constatar que o cachorro estava amarrado a uma grande corrente. Quase era curta o bastante para permitir que o cachorro alcançasse Harry, mas felizmente a corrente estava uma volta enrolada em torno de uma casinha para animais que estava a um canto.
As vassouras estavam na parte mais bem iluminada da loja, que recebia a luz que vinha das vitrines e de uma janelinha no fundo.
Harry poderia pegá-las sem nenhuma dificuldade e quase sem nada para atrapalhá-lo – havia os latidos altos do cão e também algumas aranhas nas caixas.
Haviam oito Firebolts do novo modelo. Além disso, haviam algumas das vassouras mais baratas de todas, as Wind Machines, e ainda outras vassouras não tão conhecidas nem populares, que recebiam muitas reclamações – antes da fábrica ser atacada, saqueada e fechada por falta de recursos.
Com um simples feitiço para mover objetos, Harry conseguiu fazer com que todas as vassouras o seguissem.
O cachorro parou bruscamente de latir quando um barulho de esmagado ecoou pelo lugar mal iluminado.
E foi só então que Harry soube do tamanho do problema.

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