I´m not a Barbie doll...



Capítulo I

I'm no Barbie doll, I'm not your baby girl
So I've done ugly things and I have made mistakes


Uma marca.
Mais uma marca, e ela completou mais uma série de sete. Mais uma semana havia se passado.
O ruído incômodo de pedra contra pedra quebrou o silêncio mórbido que se abatia sobre a cela.
Mais uma marca na parede de concreto frio. Ela estava ali havia anos, e toda a parede a sua volta era decorada com os traços tortos traçados na parede de sua cela.

Por que ainda continuava com aquilo?
Tinha certeza que sua contagem estava errada. Devia ter se perdido no meio. Podia jurar que ontem fora Halloween. Ou quem sabe fosse a Páscoa. Ela não sabia. Jamais saberia; estava confinada havia tanto tempo que não se lembrava do Sol. Não que houvesse meios de distinguir o dia da noite, ali, prisioneira de segurança máxima como ela era.

Bateu os olhos na parede novamente. Contou cinqüenta e dois grupos de sete traços. E treze grupos de doze traços cada. Treze anos, ela estava ali.

Deixou-se chafurdar um pouco em auto-piedade. Era bom sentir alguma coisa que os Dementadores não podiam roubar.

Depois, involuntariamente, seus pensamentos escorregaram para o limiar de sua consciência, onde costumava guardar os pensamentos e idéias imorais ou perigosos.

Onde está o Lorde das Trevas?

Esse era, no momento, o pensamento mais imoral e perigoso que rondava a mente perturbada de Belatriz Lestrange.
Teve de repreender-se. Não podia. Não podia duvidar por um momento que fosse de seu mestre.

Um rato passou por ali perto; o rabo nojento roçando em sua pele quase tão imunda.
Estendeu as mãos e pegou-o.

Sentiu o animal enfiando as presas em sua carne, e o sangue aflorou como uma rosa carmim brotando da terra.

Apertou-o com vontade; quase riu quando ouviu o estalo dos ossos dos rato se quebrando.

Mais sangue verteu no chão. O animal estava morto; Bella se arrependeu imediatamente. Demorariam dias para virem limpar sua cela e ela teria de suportar o fedor até lá.

Bem, já suportara coisas piores.

Seu estômago roncou alto, mas ela sequer percebeu que estava com fome. Não podia mais distinguir a sensação da agradável saciedade da fome opressiva com a qual convivia havia tanto tempo. Se de repente lhe empurrassem um prato farto de panquecas – seu prato favorito – Bella seria capaz de recusar.

Mas havia uma coisa da qual ela sentia mais falta do que comida. Sua varinha.
Vinte e nove centímetros, carvalho, pêlo de unicórnio, boa para maldições e azarações. Sorriu brevemente, e antes que os Dementadores pudessem distinguir esse pequeno arroubo de felicidade, lançou-o mente adentro de volta ao limiar escuro de sua mente.

Em lugar disso seus pensamentos voltaram a seu Mestre novamente.

Onde ele estaria?
Estaria bem?
Estaria vivo?

Bella teve de se dar um beliscão. Não devia duvidar de seu mestre. Nunca, jamais. Se o Lorde das Trevas sequer desconfiasse que sua lealdade balançara, Bella seria castigada. E com esse pensamento, Bella sentiu um arrepio lhe percorrendo a espinha de alto à baixo.

Mas quando achou que esse arrepio se devia ao temor de um possível castigo, ela se surpreendeu: não era. Era um arrepio de prazer misturado à ansiedade. Um prazer que havia muito não sentia; o prazer de ter o pleno poder em mãos. De sentir a magia correndo vivamente em suas veias.

Mas um novo arrepio a sacudiu. O prazer quase a enlouqueceu; Bellatrix teve de gargalhar – não pôde se controlar.

A Marca Negra voltou a arder com força em seu antebraço esquerdo.

Bella ergueu a manga das vestes esfarrapadas e fixou o olhar ávido no crânio fantasmagórico tatuado no braço.

Sim, a Marca Negra estava se acentuando visivelmente; era claro que o retorno do Lorde das Trevas não tardaria. Novamente sentiu-se envergonhada de suas dúvidas em relação ao seu Mestre.

Como pudera duvidar?

Uma felicidade sem igual a invadiu, sacudindo-a como o clímax de uma relação a dois. Uma nova gargalhada rachou sua garganta ao meio. Mas então estranhou: Os dementadores ainda não tinham aparecido para suga-la?

Sua pergunta foi respondida logo; um ruído alto de explosão soou do lado de fora perturbando o silêncio pesado de Azkaban. Os prisioneiros gritaram enlouquecidos – o que estava havendo?

“Ele voltou! O Lorde das Trevas voltou! Os infiéis pagarão caro, agora...” – Bella se ouviu gritando.

Uma nuvem de poeira, de repente, tapou toda a visão da entrada de sua cela. Um gesto displicente da varinha de alguém, e a névoa desapareceu, revelando quem estava prostrado à porta.

“Bem-vinda de volta, Bella.” – Seu mestre sussurrou da entrada.

Bella levantou-se num salto, mas logo estava de volta ao chão, ajoelhada humildemente diante de se Mestre, chorando desconsolada.

“Levante-se, Bella.” – Ele ordenou.

Mas ela não obedeceu; continuou a chorar e lamentar diante dele.
Voldemort agachou-se ao lado da Comensal arrasada. Assustou-se com a visão de seu rosto antes perturbadoramente belo, agora encovado e feio. O corpo curvilíneo agora era só ângulos e esquinas. Os cabelos outrora macios e brilhantes como cetim negro desciam até a cintura embolados em nós sujos. Bella estava frágil e precisava de cuidados urgentes.

“Venha. Você pertence a mim, agora.” – Ele ergueu o corpo desacordado em seus próprios braços, então conjurou uma maca e a depositou lá; em seguida saiu levitando-a pelos corredores frios de Azkaban até a saída.

Os outros fugitivos estavam em estados tão deploráveis quanto o dela, mas Voldemort pouco se importava com eles. Não eram, nem nunca foram, tão fiéis e competentes quanto sua Bella. Aquela a quem ele ensinara pessoalmente as Artes das Trevas. Aquela que estava logo abaixo dele próprio na hierarquia das Trevas.

Bella, tonta e desacordada tamanha era sua felicidade e surpresa, só pôde murmurar algo incompreensível antes de ser lançada dentro da sensação de compressão que sempre a incomodara tanto, mas que agora, poderia ser descrito como o Nirvana para ela.

Ele a deitou numa cama imaculadamente limpa de um dos vários quartos de hóspedes da Mansão Riddle. Pôde ver que ela retornava lentamente à consciência e sorriu.

Empurrou a porta do banheiro, deixando à mostra o vasto cômodo todo em mármore branco. Abriu as torneiras douradas da banheira e deixou que o vapor quente fluísse até o quarto e a acordasse de vez.

Bellatrix sentou-se na beira da cama, piscando confusa. Ainda achava que estava em dos sonhos desvairados que costumava ter, quando seu Mestre invadia sua cela e a carregava para longe daquele inferno, e cobria-a de honras e glória e todo aquele seu poder infinito...

Mas o Lorde das Trevas não estava mais ali em seu quarto; se retirara para cuidar de seus próprios afazeres. E então Bella viu, enquanto seu peito se enchia de um sentimento próximo à comoção, que ele havia deixado uma muda de roupas limpas, e que o luxuoso banheiro reluzente teve sua bancada da pia cheia de pequenos e variados frasquinhos perfumados.

Ela passou o dedo por cada um deles, abriu-os e cheirou-os todos. Reconheceu o cheiro inebriante de variadas poções e perfumes. A um aceno de sua varinha – sim, ele havia recuperado sua varinha também – a banheira encheu-se da densa espuma perfumada.

Lembrava muito a grande banheira do banheiro dos Monitores de Hogwarts.
Claro que ninguém em sã consciência a nomearia monitora – mas isso não significava que Bella nunca tivesse tido acesso a privilégios como aquele. Sorriu marotamente diante daquela lembrança, e finalmente, imergiu na água morna.

Um gemido rouco brotou de sua garganta conforme Bella sentiu a água quente a envolver. Era como se toda a dor e o sofrimento dos últimos treze anos estivesse indo embora junto com a sujeira.

Algumas horas depois, quando finalmente se sentiu satisfeita e limpa de verdade, pôde sair da banheira. O ar frio agrediu sua pele durante os poucos instantes em que Bella demorou a se envolver na toalha.

Encarou o grande espelho na parede que mostrava todo o seu corpo ainda nu. Bella não se sentiu satisfeita com o que viu; mais do que treze anos, parecia ter envelhecido no mínimo trinta.
Mais lágrimas brotaram de seus olhos quando desviou o rosto de sua imagem no espelho e se envolveu na toalha. Estava desfigurada. Não só por fora, mas por dentro.

Ainda assim, chorou ao sentir-se feia. Não sabia porque isso lhe parecia tão importante agora. Simplesmente se entregou a mais um fluxo de lágrimas.

As vestes, no entanto, eram bonitas. Sequer pareciam ter sido escolhidas por um homem. Havia decididamente o toque de outra mulher naquele gesto. Pensou em Narcisa, e então sorriu. Apenas sua irmã saberia que sua cor favorita era roxo.

Penteou cuidadosamente os cabelos que se mantiveram, apesar de tudo, brilhantes e imaculadamente negros.

Inspirou profundamente e fechou os olhos, sorrindo. Podia não estar em casa – mas aquele poder, aquela magia, lhe era velha conhecida.

Os degraus da velha escada rangeram sob o peso repentino. Bella viu a porta de um único cômodo aberta, e a luz elétrica artificial com a qual estava pouco acostumada, brilhava lá de dentro.

Se aproximou da porta; podia sentir um cheiro bom de algo sendo cozinhado. Esperou ver seu Mestre, e já estava preparada para desfiar inúmeros agradecimentos; mas, no entanto, não era o Lorde das Trevas quem se encontrava na cozinha.

Rabicho!” – Exclamou, indignada – “Ainda por aqui, seu verme nojento?”
“Eh... Bellatrix?!” – O animago sobressaltou-se e deixou cair uma panela de sopa quente no chão.
Bella nada disse, apenas sacudiu a varinha e limpou a sujeira.
“Então... Como vão as coisas?” – Perguntou Rabicho desconsertado.
“O que você acha?” – Perguntou Bellatrix rudemente.
“Eu... Bem...”

Uma outra pessoa entrou na cozinha, e dessa vez não houve confusão – apenas o poder que ele exalava, a aura de magia negra que o envolvia, foi suficiente para que Bella reconhecesse a figura de seu Mestre.

“Você. Fora. Agora!” – Ele sussurrou letal para Rabicho, que saiu da cozinha apavorado. – “Precisamos conversar, Bella.”

Ele puxou uma cadeira, ficando de frente para a Comensal. Mas antes que falasse qualquer coisa, acenou a varinha e as lâmpadas elétricas se apagaram, envolvendo os dois na profunda escuridão da noite sem lua. Um segundo depois, uma dezena de velas se acenderam atrás, iluminando novamente a cozinha.

“Muito melhor.” – Voldemort
comentou – “Então, estava dizendo que nós precisamos conversar.”
Bella assentiu.
“Antes de tudo, espero que tenha gostado das instalações. É uma casa trouxa, mas foi o melhor que pude arranjar. Talvez devamos conversar sobre a possibilidade de utilizarmos a velha mansão dos Black como quartel-general. Achei que também fosse gostar de saber que seu marido, Rodolfo, está bem, mas preferiu se hospedar em sua antiga casa. Sua irmã Narcisa lhe manda lembranças...” – Ele falou tudo aquilo expressando um tédio absoluto. Parou por um instante, observando atentamente a bruxa. E continuou:
“O Ministério da Magia está ignorando meu retorno muito gentilmente. Acho que isso facilita nosso trabalho. Por enquanto, estamos apenas recrutando o antigo exército, convocando alguns novatos, libertando prisioneiros e contatando antigos aliados. Punindo os traidores... E recompensando os servos leais.” – Voldemort sorriu, e pela primeira vez, viu Bella sorrir de volta. – “Seus colegas me contaram, Bella. Você nunca deixou a lealdade de lado. Nunca balançou. Nunca duvidou sequer por um momento. Mesmo que todos a tivessem como louca, você não baixou a cabeça. Estou muito orgulhoso. Certamente, seus esforços serão recompensados. Você pode pensar em qualquer coisa, e a terá. Qualquer coisa.”

Bella tornou a baixar a cabeça, desejando que seu Mestre fosse capaz de lhe restituir sua beleza e juventude. Não desejava uma alma intacta, não desejava alívio para os traumas de Azkaban. Já o tivera no momento em que sentiu novamente todo o poder e a magia do Lorde das Trevas. Estar novamente em sua presença era como um bálsamo para sua alma destroçada. A magia negra também a agredia, mas era o tipo de agressão que Bella gostava. Era o tipo de dor que a fazia sentir-se mais viva do que nunca.
Bellatrix Lestrange nunca fora uma mulher delicada e sensível.

Mas nem mesmo o lorde das Trevas tinha tal poder.
Ela tornou a vasculhar a mente em busca de algo que pudesse pedir como recompensa.
Então chegou na penumbra de seus desejos inconscientes mais secretos...
Havia, sim, algo que ela queria...
Mas não ousou sequer completar o pensamento. Por um instante fugaz, sentiu medo de si mesma. Medo do que poderia acontecer se esse desejo inconsciente, por hora trancado a sete chaves em seu cérebro, se esse desejo escapasse de seu controle.
Subitamente, entendeu o porquê de tanto lamentar a perda de sua beleza.
Sentiu uma profunda vergonha de si mesma.

“Agora, coma, Bella, você está muito fraca. Se precisar de algo, chame Rabicho.” – E o Lorde das Trevas deixou a cozinha, e dentro dela uma Bellatrix muito pensativa.

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