As Revelações de Susana



Capítulo 12

As Revelações de Susana

No dia posterior á detenção dos três, Susana cumpriu uma parte da detenção que o professor de Defesa contra as Artes das Trevas havia lhe passado, que era listar na biblioteca uma quantidade feitiços e contra feitiços contra pragas, além de estudar métodos contra artefatos das trevas para explicar em uma aula dedicada ao 4º da Phortgrum. Pedro teve aulas duplas de Feitiços junto com a Realex onde estudava a Cláudia, os dois nem se olhavam direito. Robson teve aula de Tradições Arcaicas com o velho, misterioso e cruel Heródoto Wenceslau, que nesse dia se apresentava com uma roupa furada, um casaco imenso e cinza com riscas de giz, o cabelo oleoso cobrindo-lhe as faces e o mesmo aspecto de malícia no olhar. Sua matéria era uma tentativa de sucesso da Academia Magfia em manter e melhorar as tradições mágicas dos povos da América. O professor havia se atrasado em chegar na sua pequena, desconfortável e antiquada sala.
- Desculpem o atraso, isso não vai acontecer novamente. - disse o professor com um sorriso nada simpático no rosto. - Pois então vocês querem aprender as Tradições Arcaicas? Desconfio que mais da metade de vocês tenham a mínima capacidade de compreender a grandeza dos povos dessa terra, porém o diretor quer que eu ensine a todos, tanto os com talento quanto os sem, sendo assim ensinarei. Mas não esperem que eu seja um professor caridoso e não me demoro em temas, vocês devem praticar e estudar, é claro que como eu disse muitos de vocês não chegarão muito bem até o fim do meu curso. - disse isso com um olhar mais específico para Robson que continuava com o chapéu rendado, o qual lhe deu uma pontada de leve e esta sendo uma aula com a Phortgrum, Susana estava próxima e percebeu a aflição do amigo, foi quando fez uma pergunta.
- Desculpe senhor, mas o livro segundo eu li não nos dá nenhuma informação específica dos feitiços práticos que nós teremos. Como vamos praticar? - perguntou a garota imediatamente.
- Ah, sim, senhora... Coelho, não? Mas seguiremos ele mesmo assim. - respondeu o professor de pronto.
- Mas, senhor, como teremos aula prática então? - perguntou a garota entre o interesse e o ainda persistente medo.
- Não teremos, minha aula é teórica e pronto. - retrucou o professor impaciente.
- Então como o senhor pediu que pratiquemos? - respondeu a arguta aluna.
- Essa é minha aula e eu decido o que dizer garota. Se tiver algo contra reclame com a direção ou retire-se, e pela sua petulância eu vou tirar 10 pontos da sua casa. - disse por fim o professor. - Abram o livro na página 25, o capítulo é Das Forças Indígenas e a Feitiçaria. Leiam e façam o resumo. - e irrompeu pela sala passando fileira por fileira até chegar a Robson. - Como está o chapéu sr. Albuquerque, dói? Acho que sim, mas para um senhor da minha idade a dor já não é mais nada. Tomara que a lição esteja sendo aprendida. - disse o professor entre os dentes e foi sentar-se em sua mesa. Os alunos liam, liam e não compreendiam o extenso e chato livro de Miranda Verón, mas depois daquela apresentação de aula ninguém se dispôs a fazer qualquer pergunta ao professor. A aula prossegia tão chata quanto ás páginas do livro, o professor estava sentado em sua mesa escrevendo com tinta em pergaminho, vidrado no texto e Robson não podia deixar de notar com estranheza a voracidade com que o professor escrevia e os movimentos bruscos que um calombo fazia em suas costas, é claro ele era corcunda. Ao mesmo tempo as dores chatas vieram e Susana que já havia terminado com extrema rapidez o resumo olhava para o amigo com seus olhos escuros e via a dor que ele sentia com remorsos por não poder fazer nada. “Por que esse professor tinha que ser tão cruel?” - pensava ela. Enfim, terminou a aula, o professor se preparou para recolher os trabalhos dos alunos e percebeu que poucos alunos haviam feito.
- Que terrível, primeira aula e isso. Tsc. Tsc. Mas eu não tenho dó, quero que façam o resumo desse e dos dois próximos capítulos para a próxima aula, no mínimo 30 centímetros de pergaminho. E vocês que conseguiram concluir o trabalho não se sintam felizes nem satisfeitos, muito menos esperem que eu dê pontos para vocês, não fizeram mais que a obrigação de vocês.
Os alunos saíram descontentes da sala do chato professor Heródoto, alguns chegaram a xingar o professor sem se preocupar com a sala do mesmo. Por fim a Phortgrum se direcionou para a estufa de Herbologia para ter aula com a Anangangala enquanto a Gainea se direcionava para a sala subterrânea de História da Magia da professora Dagoberta dos Santos. Na porta havia um aviso fixo em que a professora dizia que aguardava os alunos no lado externo da escola. Quando lá chegaram a professora lhes aguardava dentro de um salão de vidro em que o sol brihava intensamente, o chão tinha um piso vermelho simples e as paredes e o teto refletiam a luz solar. Os alunos entraram olhando todo o salão, mas o que mais chamou atenção porém foi a professora e sua estranha roupa que parecia feita de elástico e cobria todo seu corpo em preto que contrastava incrivelmente com o cenário que era repleto de luz e um céu incrivelmente azul nesse verão que até aquele momento não havia tido um dia sequer tão claro.
- Entrem, entrem meus queridos. E sentem em círculo por favor no chão, meu nome é Dagoberta dos Santos e eu leciono História da Magia. - disse a professora com uma voz aguda, porém não irritante. - Hoje temos nossa primeira aula e será uma aula prática, esse salão aliás é o Salão de Aulas Expositivas. A História da Magia é algo difícil de compreender porque não vivemos e nem vemos a história acontecendo, não temos como entender perfeitamente, por isso vou sempre buscar demonstrar os eventos mágicos que colidiram para essa realidade que vivemos. A história geralmente começa em qualquer ramo do conhecimento humano quando o ser humano é capaz de descrever os eventos da sua época, contudo com a magia é diferente, pois a história da magia é posterior a qualquer evento, ela estava lá antes do dia primordial e para contá-la não foi necessária a descrição de qualquer ser vivo, pois a magia deixa rastros e se explica por si só, sendo assim os estudiosos investigaram e descobriram o que nós vamos demonstrar. UMBRA!!! - gritou a professora apontando para o alto sua varinha e um raio negro cortou o céu e seguiu em direção ao espaço como se não fosse parar, numa velocidade incrível e de repente como se tivessem furado o sol ou como se estivessem quebrando a casca de um ovo e escorresse o líquido o céu começou a escurecer profundamente não restando nem as estrelas, não era possível ver nada nem ninguém como se tivessem apagado a luz do Universo. E finalmente saiu um som da boca da professora: UNUS VERSUS! - um pequeno e mínimo ponto de luz surgiu onde seria o centro da sala e piscava intensamente, o ponto aos poucos se expandiu até atingir o tamanho de um grão de feijão, depois surgiram diversos pontos na sala que foram se expandindo lentamente, surgiam onde os alunos estavam, flutuavam levando os alunos juntos pelo espaço da sala e cresciam enchendo-os de luz como se fossem bechigas sendo infladas, eles rodopiavam pelo espaço á sua volta dando uma intensa sensação de liberdade, contudo os movimentos eram cada vez mais bruscos e firmes, alguns alunos se chocavam no ar com outros e com a professora que ficava no centro de uma coisa que parecia perder o controle. - Segurem-se, segurem o braço do colega ao lado, não deixem se chocar! - disse a professora com os olhos brilhando em vermelho de preocupação enquanto os alunos rodopiavam cada vez mais rápido pelo escuro salão, alguns se agarravam pelas mãos formando uma espiral em torno da professora, contudo alguns alunos não conseguiam se agarrar a outros para se proteger e no final Robson e Cláudia que rodopiavam intensamente ficaram á deriva e precisavam se agarrar, se unir ao grupo dos outros alunos antes que o movimento fosse incontrolável. - Se ajudem Robson e Cláudia, senão não haverá como salvá-los. - disse a professora aos berros com os olhos brilhando em amarelo flamejante. Robson estava num conflito interno entre ajudar a ex-amiga ou tentar somente se salvar - “Ela dedurou todo mundo, vou deixá-la!” - pensou o garoto rodopiando no ar, mas percebia que ela não teria chances e sentiu pena dela e num giro pelo qual ela passou próxima dele, ele esticou o braço o máximo que pôde e conseguiu agarrar firmemente a mão dela que tremia, os dois se segurando ficaram em movimentos cada vez mais prolongados até que conseguiram chegar na espiral principal de alunos de mãos dadas no ar como se praticassem a queda de um avião no alto céu. Foi nesse momento que os movimentos os aproximaram rapidamente da professora que era um balão ao centro e geraram luz, som e calor numa enorme explosão que lançou os alunos para longe e logo depois os alunos viam em volta de si incontáveis estrelas e bem mais próximo um movimento como se fosse um enorme furacão luminoso que abosrvia com grande intensidade tudo que havia a sua volta e gerou uma segunda explosão que separou diversos pontos onde era possível ver o Sistema Solar onde o Sol e os planetas estavam se alinhando depois da explosão. - Vejam que beleza, acabos de ser a formação do Universo. - A Terra foi ficando mais em foco e maior descrevendo rotações em torno de si mesma, primeiro como uma bola de fogo e depois mais fria e mais fria até poder se ver os mares se formando e as primeiras tempestades e a terra em formação. Depois disso os primeiros seres microscópicos até que a professora falou: Aqui precisamos dar uma olhada mais atenciosa crianças, percebam que aqui teremos a primeira criatura mágica, ao mesmo tempo em que surge a primeira criatura não mágica. Os humanos falam dos aminoácidos e nós temos os aminomágicos que tem capacidades pequenas e arcaicas de magia, podiam flutuar e voar levemente sem o auxílio de asas, podiam se transfigurar em outras formas para se proteger e podiam conjurar uma pequena quantidade de fogo mesmo vivendo em água. - Toque Carla nessa pequena nuvem que está diante de você para continuarmos. - disse a professora falando para uma aluna gordinha de cabelos lisos da Realex. - Foi nesse momento que a vida se expandiu e os seres mágicos e não mágicos viviam em determinada harmonia, sem tomar conhecimento das suas diferenças, afinal ainda não se tinha consciência, apenas a vida. Por fim esse tempo passou e com ele terminou o período em que os dois grupos de seres viveram sem o conhecimento um do outro e começaram as primeiras agressões entre os dois grupos. - os olhos da professora ficaram visíveis sobre a planície que se demonstrava a criação de diversos seres. Os olhos dela brilhavam num tom de azul claro e olhava a reação de admiração dos alunos diante dela. - Foi nesse cenário que tivemos a Primeira Cisão á qual separou os seres mágicos dos seres não mágicos numa Terra longe da ideal, foram aí que surgiram os ancestrais dos Centauros, Minotauros e Quimeras que tinham uma organização social já bem definida, tinham como líder Brontes, o Ciclope, que era cruel com os seres não mágicos e explorava e escravizava-os. Vejam essa trilha formada por escravos de animais, todos sendo chicoteados pelas feras mágicas. - e apontou para um caminho que era seguido por um grupo. - Seus poderes chegaram a tal tamanho que sugavam toda a energia que havia e atraíam grandes forças para a Terra. Eram feitos grandes rituais de absorção de poder, em que se sacrificava uma quantidade incrível de seres não mágicos para se obster energia. Num desses rituais Brontes exigiu uma quantidade de poder tão grande, mas tão grande que acabou atraindo um enorme asteróide á Terra e destruiu grande parte da vida e os seres mágicos e não mágicos não tiveram contato até o surgimento dos seres humanos. Acho que é muito por hoje, não sei se gostaram da aula, certamente essa é a aula mais chata que vocês terão, pois aqui só estudamos o que está muito longe da gente, mas explica algumas coisas que estão acontecendo hoje. Prestem bastante atenção á separação entre os seres não mágicos e os seres mágicos. Na próxima aula que será na sala de aula novamente vamos ver a formação do primeiro bruxo e a evolução dos seres mágicos. Ah, sim. LUMUS SOLEM! - gritou a professora novamente levantando a varinha em direção ao sol que sugou toda a escuridão a sua volta e tornou a deixar novamente visível todos os olhos e rostos dos presentes. - O trabalho para casa que vocês tem que fazer para a próxima aula é descrever tudo que vocês viram na demonstração de hoje da forma que vocês quiserem.
Os alunos saíram do salão atônitos com a aula em que participaram e viram a formação de tudo, era incrível. A professora tinha umas esquisitices e falava demais, contudo a aula fora muito produtiva. Antes de sair a professora chamou Robson e Cláudia de canto e falou com eles.
- Parabéns a vocês dois, parecia que o campo de energia de vocês antes da explosão estava muito forte, impulsionado por algo que eu não compreendo, mas mesmo assim vocês agiram muito bem, se ajudaram e é isso que importa. - disse olhando com um olhar sem nenhum brilho em especial, mas com muito significado para os dois ex-amigos. Os dois saíram sem se falar, contudo o sentimento que eles compartilhavam era de reflexão sobre tudo que havia acontecido desde que chegaram a Magfia.
Depois da aula todos os alunos se direcionaram para o Grande Salão para almoçar e descansar. Pedro e Susana tinham arrumado um lugar na mesa da Phortgrum que eles haviam descoberto depois de todo esse tempo que durante o almoço e o café da manhã era liberado sentar em qualquer mesa de qualquer casa para uma maior interação entre os alunos.
- Oi gente, tudo bem? - perguntou Robson quando se aproximou deles ainda com o chapéu rendado.
- Tudo, então você teve aula de quê? - perguntou Pedro.
- De história da magia, foi a aula mais diferente que eu tive, e vocês? - perguntou Robson.
- De Herbologia, a Efigênia até que é legal, mas se não tá falando de plantas tá falando de si mesma. - respondeu Susana. - E você, não tá livre desse chapéu ainda? - perguntou.
- Ainda não, acho que já tô me acostumando, aliás hoje de manhã acordei com uma vontade de arrumar o quarto. - respondeu Robson.
- Ah, meu elfo doméstico, já que você tá com tanta boa vontade, arruma lá meu quarto na caverna da Anangangala, eu tô precisando. - disse Pedro zombando.
- Pedro, fica quieto, eu vou procurar uma solução pra isso Robson. - disse Susana enfaticamente.
- Não, pode deixar Susana, eu já aceitei essa situação. - disse Robson cabisbaixo. - Eu já vou, não estou com fome, ainda tenho que arrumar minhas coisas, fazer a lição e ir na biblioteca fazer o trabalho do Juscelino com o Leandro. Ah, é Pedro, você também tem que ir.
- Vou sim, até mais. - disse Pedro vendo o amigo sair.
- Eu vou pra biblioteca agora Pedro, você quer ir comigo. - disse Susana de supetão.
- Ah, não posso, ainda tenho a detenção da Efigênia, “borrifar e molhar as plantinhas com carinho” - disse imitando a voz sedosa da professora.
- Então tá, até mais tarde. - disse a garota indo correndo para a biblioteca.
- Robson, me espera. - disse Pedro acompanhando o amigo. - Eu vou com você.
- Mas pode? - perguntou Robson ao amigo.
- Pode, a Susana deu uma pesquisada e descobriu que todas as casas são livres durante o dia para os alunos. Então eu aproveito e já conheço seu dormitório. E não deixo você arrumar lá. - disse com um sorriso e caminharam até lá. Passaram a tarde completando alguns deveres que já tinham. Robson que tinha levado um xadrez de bruxo para Magfia ensinou o amigo a jogar e disputaram algumas partidas muito boas depois de um tempo. Mais tarde foram até o segundo andar do subterrâneo onde ficava a biblioteca, bem do lado da estranha aula de Adivinhação. Havia um silêncio modorrento na sala onde fileiras e fileiras de estantes se intercalavam com diversos assuntos. Geomagia. Quiromancia. Estudo dos trouxas. Lendas e mitos. Necromancia. Teleporte. Artes das Trevas. História. Maldições. E milhares de outros que os dois não deram muita atenção visto que tinha uma pilha enorme sobre uma das mesas centrais em que uma garota se debruçava pelos livros fazendo anotações e falando sozinha. Aproximando-se mais perceberam que era Susana que se dedicava a alguma tarefa importantíssima pelo jeito, pois não havia percebido a presença dos garotos.
- Oi Susana, o que você está fazendo? - perguntou Robson coçando a cabeça sob o chapéu de bolinhas em meio aos risinhos dos alunos que também estavam na biblioteca.
- Ah, eu? - disse a garota com olhar e voz de culpa. - Não, eu estou fazendo...
- Fazendo o que menina, fala. - disse Pedro impaciente.
- Tô cumprindo a detenção do Juscelino. - disse a garota cobrindo alguns exemplares que estavam sobre a mesa.
- E precisa de tanto livro? - perguntava Pedro, contudo foi interrompido pelo seu colega de casa, Leandro.
- Oi Pedro, oi Robson. - olhou para Susana que estava atrás da pilha de livros, mas por não saber o nome dela não a cumprimentou.
- Oi Leandro, essa é a Susana. Susana esse é o Pedro. - apresentou Robson e os dois disseram “Oi” mutuamente.
- Vamos? Eu ainda tenho que passar na Realex antes de anoitecer. - disse o garoto sem muita urgência.
- Ok. - disseram os outros dois seguindo para uma outra mesa onde retiraram os livros de Defesa contra as Artes das Trevas das mochilas e começaram a fazer o trabalho. Enquanto isso Susana se aprofundava nos livros de que nada tinham a ver com a sua detenção.
A tarde ia acabando, os garotos tinham terminado o trabalho com certo esforço, mas por fim concluíram muito bem. Leandro se despediu deles e foi para onde tinha que ir. Contudo Susana passara a tarde toda lá fazendo seus apontamentos e anotações e mesmo assim não tinha terminado.
- Então Susana, isso é pra hoje? - disse Pedro tentando descobrir o que tanto ela fazia.
- Ah, eu acho que não, mas já tô perto de uma solução. - disse a garota com o cabelo armado e os olhos lívidos.
- Você não acha melhor deixar isso para depois e vir jantar com a gente, daqui a pouco já tá na hora. - disse Robson preocupado com a amiga.
- Ah, só mais um pouco, depois eu vou, podem ir indo. - disse a garota baixando novamente os olhos. Os dois saíram lentamente da bilbioteca e perceberam que não havia já mais tanta gente lá e que a bilbiotecária de óculos fundo de garrafa e cabelos em coque olhava em direção á Susana com uma perceptível curiosidade.
- Acho que a Susana ficou doida pela quantidade de pontos que ela ganhou pela Phortgrum. - disse Pedro para Robson.
- Eu tenho mais medo do que a bibliotecária possa fazer com ela se ela não contar o que tanto ela procura naqueles livros. - disse Robson olhando para trás antes de saírem da biblioteca e percebendo a voracidade nos olhos da bibliotecária.
- Imagina a cena das duas brigando por um livro de Defesa contra as Artes das Trevas. - disse Pedro e os dois foram cada um para o seu dormitório se arrumar para ir jantar.
A noite foi rápida. Jantaram, conversaram brevemente, mal perceberam a presença de Susana que chegou quase no fim da refeição e não aparentava nenhum sinal de luta ou agressão. Foram dormir, e Robson novamente teve um sonho estranho em que apareciam alguns professores, o diretor, o zelador e a secretária do diretor, que ele vira apenas uma vez e ele salvando Cláudia da bibliotecária que lhe puxava o cabelo vermelho por ela ter pego alguns livros sem o conhecimento da mesma. Depois entrou em sono profundo e adormeceu finalmente.
A semana prosseguiu com as aulas de Alquimia, em que Wilson Wandré se atrapalhara umas duas ou três vezes com os ingredientes das poções, mas dera uma aula muito boa. A aula de Feitiços de Gadelha Galatéia, a qual parecia já ter perdoado o filho e o tratava normalmente e demonstrava os feitiços com extrema perfeição. Pedro e Robson sempre que podiam e tinham aulas juntos faziam os grupos entre si para facilitar a conclusão dos trabalhos. Logo perberam que não eram alunos excelentes e modelo, mas podiam cumprir grande parte dos deveres. Já Susana era uma extrema surpresa, ela em uma semana havia ganhado sozinha 150 pontos para a sua casa, o que havia compensado os perdidos no primeiro dia e havia dado a liderança a Phortgrum. Os professores eram só elogios para a tímida aluna negra que demonstrara um interesse por todas as matérias. Juscelino Zambak que geralmente não dava muitos elogios e pontos aos seus alunos, principalmente aos da sua casa teve que dar o braço a torcer e admirava a aluna fielmente, ajudando-a na detenção e percebendo o progresso da jovem. O único que não fez a aluna cair no seu agrado foi o antiquado e intratável professor de Tradições Arcaicas, Heródoto Wenceslau, o qual criara um clima de confronto durante uma de suas aulas posteriores com a aluna, pois ela estando em curiosidade e querendo a ajuda do professor se atrevera a perguntar. E, ah, a pergunta era algo intolerável na aula de Heródoto, pois a verdade do professor era única e imaculável e ela insistiu na pergunta fazendo-se perder mais alguns pontos. A partir desse momento a aluna nunca mais deu um passo sem que o professor a perdesse de vista.
Além de todas as tarefas na sala, os três tinham as atividades e práticas extrasalas, os trabalhos, lições, que não eram simples por mais que se esforçassem. Além disso tinham as detenções. Pedro estava cada vez ficando mais tempo na estufa ouvindo a professora falar sobre a beleza no regar de uma planta, conversando com as plantas, ou ainda falando sobre sua beleza incrível e ainda de como as matizes do verde eram imensamente belas. O garoto chegava cada vez mais tarde e a cada dia cheirando um tipo de planta. Alecrim, boldo... Havia alguns dias que era indistingüível o cheiro. Robson continuava sofrendo com o chapéu, de noite quando alguns sonhos chegavam a sua mente ele acordava com uma forte dor de cabeça e quando a dor não era noturna era o estranho aspecto maquinal que ele tinha, demonstrado em frases como as que ele dizia aos amigos, “Sim senhor Pedro” ou “É uma honra servi-lo”. Mesmo assim isso não era tudo, o pior era ouvir risinhos e caçoadas dos alunos de todas as idades por todo o colégio. Susana ao ver tudo isso se via muito culpada e mais preocupada, mesmo assim não saía da biblioteca e ia periodicamente todos os dias havendo alguns dias em que cenas como as que pairaram na imaginação de Pedro e Robson da bibliotecária e a aluna disputando o último livro quase aconteceram.
Finalmente chegara a sexta-feira e com ela uma chuva que durara a manhã inteira e impediu que os alunos pudessem ficar na estufa de Herbologia, o barulho era demais. Entretanto mais a noite eles teriam a primeira aula de Astronomia com a professora Magali Kate. Susana, visto a chuva foi para a biblioteca dizendo consigo mesma pelos cantos. “Quase lá, quase lá...” Robson que iria ter a mesma aula ficou em seu dormitório fazendo as atividades e comendo a nova sensação do verão brasileiro, o “Ad Infinictum Sabores”, que era um sorvete que praticamente não tinha fim e que tinha diversos sabores que se substituíam assim que estava acabando. O problema era que a incidência de cáries naquele verão subiu incrivelmente o que segundo a empresa que criava os sorvetes tinha uma causa desconhecida e que seus técnicos iam verificar o caso. Problemas técnicos, é claro. Pedro por sua vez não teve como fugir de mais uma entediante aula de Tradições Arcaicas em que eles tiveram uma chamada oral em que tinham que falar as 12 tribos toltecas antes da invasão espanhola. A manhã acabou e os dois garotos foram almoçar, a Susana como sempre não aparecia.
- Está cada vez mais difícil as aulas. Principalmente as do Heródoto, ele hoje pediu pra nós decorarmos e dizermos um monte de nomes de tribos, eu não lembro da metade, fui mal. - disse Pedro comendo um naco de carne.
- Concordo. Mas a gente acaba indo bem. Eu tô preocupado mesmo é com a Susana, ela some sempre e além disso não tem comido direito. Que será que tá acontecendo com ela? - inquiriu Robson ao amigo.
- Eu já disse, ela tá chapada de pontos. Ganhou muitos pontos essa semana e tá achando que pode ganhar mais, já já passa essa onda. - disse Pedro abocanhando uma coxa de frango.
- Pronto! Consegui. Finalmente terminei. - disse Susana ao chegar animada.
- Seus deveres da detenção? - perguntou Robson.
- Digamos que sim. - disse a garota com um sorriso e se sentando para comer.
- Você não tá com fome né Robson? Então me passa essa sua coxa de frango. Você não sabe o que tá perdendo. - disse Pedro esfomeado.
- Eu não tô com fome mesmo, deixa eu ir pro quarto arrumar lá. Até mais. - disse Robson levantando.
- De novo Robson? Você já tinha arrumado mais cedo, não é? - perguntou Pedro preocupado.
- É, mas tem mais algumas coisas para arrumar. - disse o garoto com o rosto triste e foi.
- Pedro, eu preciso que você me ajude em um negócio. - disse Susana olhando nos olhos do amigo e falou algumas palavras bem baixinho para ele.
- Não, de jeito nenhum, eu não vou fazer isso. - disse o menino depois que ela falou com ele.
- Pise no seu orgulho e faça isso. É para um bem maior, você sabe. - disse a garota séria.
- Está bem. - disse Pedro meio a contragosto, mas aceitando. A tarde passou com Susana desaparecida, segundo Robson havia perguntado ela tinha passado a tarde na Realex enquanto ele e Pedro estavam na Gainea e Pedro tentava distraí-lo com xadrez de bruxo e perdia algumas vezes de propósito, porque agora ele tinha aprendido bastante, mas perder não deu tanto efeito. Foi então que a tarde terminava, o sol descia sob a abobada celeste lá em cima e pelo efeito mágico lançado nas janelas era possível ver o belo pôr-do-sol deixando o céu num laranja com vários tons até o sol finalmente desaparecer e deixar a noite.
- Robson, vamos caminhar? - perguntou Pedro de repente.
- Mas nós não podemos sair e eu tenho que arrumar aqui de novo. - respondeu Robson maquinalmente.
- De novo não! E além do mais a parte subterrânea do colégio é enorme, da pra caminhar aqui, eu nunca andei muito no 3º sub-solo, que você acha? - disse Pedro confiante.
- Ah, não sei... - disse Robson indeciso.
- Vamos.
- Está bem. - e os dois saíram da sala comunal da Gainea em direção ao sub-solo abaixo. Era um caminho um pouco longo por corredores escuros que tinham apenas archotes iluminando. A luz bruxuleava pelo caminho, até que chegaram a escada circular. O terceiro sub-solo tinha salas das matérias mais avançadas que eles teriam somente depois do quarto ano e no centro havia uma praça que tinha um chafariz que não era visitado a muito tempo, pois nem a serpente, nem a pantera, nem a águia, muito menos a arara que eram símbolos das quatro casas de Magfia jorravam água nem mexiam. Haviam duas pessoas conversando animadamente do lado do chafariz, eram imperceptíveis áquela luz, então os dois se aproximaram e perceberam a presença de Susana e Cláudia.
- Quê? Que é isso? - disse Robson pasmo com a cena. - Como você pode conversar com ela? Ela nos traiu.
- Não Rob, me escute, entenda. - disse Cláudia calmamente.
- Escutar? Entender? Não, vamos embora Pedro. - disse Robson com pressa.
- Não cara, escuta a Claúdia. - disse Pedro sem olhar para o amigo.
- O que é isso? Vocês tão armando o que? - disse Robson impaciente.
- Fica quieto que eu vou te explicar tudo. - disse Susana se aproximando de Robson. - Sente-se. Tudo começou na terça-feira quando eu vi você com esse chapéu ridículo que o idiota do Heródoto colocou em você. Eu fiquei muito preocupada, mas percebi que não podia fazer nada. Ao mesmo tempo tinha tudo o que aconteceu com a Cláudia, será mesmo que ela tinha denunciado a gente ou ela tinha ficado preocupada com a gente? Isso me pertubou o dia inteiro e eu ainda tinha a detenção do Juscelino. Mas tudo parecia estar unido. Você, a Cláudia e a detenção. E realmente estava. Nos livros que o Juscelino tinha me passado haviam feitiços muito complicados, mas também outros simples contra maldições e impropérios, dentre eles tinha um que dizia claramente: “Contra Artefatos Mágicos das Trevas”, nesse livro aqui. Mas você vai pensar é claro, esse chapéu não tem nada a ver com as artes das trevas. Realmente, mas durante a Idade Média era comum usar artigos das artes das trevas contra seres que eram considerados de raças inferiores, como os elfos domésticos, que ainda são, mas teve algo que mudou isso seriamente. Durante a Revolução Francesa foi decretada uma emenda á Carta dos Direitos Universais dos Seres Mágicos á qual dizia que não se podia utilizar objetos das artes das trevas nos seres que não fossem bruxos e também contra os bruxos menores de idade. Contudo essa é uma lei que nem todos conhecem, e esse é um dos poucos livros que cita isso e diz como se livrar de alguns desses artigos.
- E esse chapéu é um desses? - perguntou o garoto sentindo uma leve pontada.
- Sim. É aí que entra a Cláudia. Segundo o livro o feitiço para se livrar do Chapéu da Dominação é simples e foi criado para a libertação de todos os que o continham. É tão simples que qualquer bruxo desde que tenha uma varinha é capaz de fazer.
- Mas ainda não entendi o que ela está fazendo aqui. - disse o garoto olhando para Cláudia com desprezo.
- O único problema que nos impede de fazer esse feitiço é que somos menores de idade e é necessária a presença de três pessoas que tiveram contato por determinado tempo com a pessoa em dominação em caso de menoridade para livrar a pessoa.
- Mas tinha que ser ela? - disse apontando para a menina.
- Tinha, por dois motivos. Primeiro, ela foi uma das três pessoas que tiveram maior contato com você e que nos ajudariam sem contar para ninguém. - dizia Susana, mas foi interrompida por Robson.
- Sem contar para ninguém, pelo que ela já fez uma vez a escola inteira deve já estar sabendo que estão tentando me livrar desse chapéu. - disse o garoto sentindo nova dor de cabeça.
- Você não deixou eu terminar. O segundo motivo explica também porque eu fiquei hoje desaparecida e durante a semana inteira. Eu perguntei a alguns alunos o que tinha acontecido na nossa ausência segunda-feira e descobri que a Cláudia quis ir atrás da gente na própria floresta, mas foi impedida pelos colegas de casa dela. Ela chorou muito e quanto percebeu que a noite chegava foi aos prantos contar para a sua mãe. Se não fosse ela, sua mãe não teria aberto um caminho para nós chegarmos aqui, mesmo que tivéssemos a ajuda do Velho Tronco Homem. Nós merecemos desculpas a ela, vocês não acham? Mas antes vamos fazer o feitiço e te livrar dessa praga. - disse Susana quase sem fôlego de tantas palavras. Reuniu os três em volta de Robson, deram as mãos e prestaram atenção no que Susana dizia. - Basta dizer a palavra Reducto e apontar a varinha para ele, é simples. - disse a garota e os três apontaram ao mesmo tempo a varinha dizendo a palavra. O chapéu num último instante deu uma tremenda dor na cabeça de Robson que fez o garoto ajoelhar-se e voou no ar sem movimento nenhum mais. Robson levantou-se, deu um olhar agradecido á Cláudia, Susana e Pedro e abraçou Cláudia pedindo desculpas por tudo. Agradeceu aos outros dois e deu um chute no chapéu.
- Mas ainda não acabou Robson, tenho mais algumas revelações. - disse Susana com a sombrancelha levantada. - O professor Heródoto Wenceslau fez uma coisa terrível. Ele subjugou um aluno a uma tormenta proibida em lei internacional, no momento em que o Zacarias souber disso certamente vai demiti-lo. Temos que falar com o diretor.
- Graças á Deus esse palhaço vai sair daqui, não agüentava mais. A dor de vê-lo todos os dias era pior do que ter o chapéu. - disse Robson feliz como não se via a muito tempo. Os quatro caminharam juntos pelos corredores e escadas até o andar superior como no primeiro dia em que estiveram em Magfia. Mas quando chegaram á escada que levava á sala do diretor viram a mesma mulher loira que tinha olheiras profundas (que pareciam cada vez maiores) e que tinha entregue uma carta ao diretor.
- O que vocês desejam? - disse a mulher com um olhar intimidador.
- Queremos falar com o diretor imediatamente.- disse Susana sem retirar o olhar da mulher.
- Ele está ocupado no momento, posso ajudá-los? - disse a mulher reparando no volume que Robson segurava em um saco escuro.
- Não, não pode. É só com ele. Quem é a senhora? - disse Robson olhando para ela.
- Eu sou a secretária do diretor. Vocês vão ter que esperar se querem somente falar com ele. - disse a mulher ajeitando os óculos redondos.
- Luana, já terminei minha conversa com o professor Heródoto, deixe as crianças entrarem. - disse o diretor com a sua voz idosa dando caminho para o professor corcunda descer a escada. As crianças passaram pelo professor olhando com espanto e percebendo que ele não olhava para cima e caminhava com dificuldade. A secretária deixou-os passar e eles subiram a escada junto com o diretor até a sua sala circular. O diretor andou pela sala e ficou atrás de sua escrivaninha.
- Sentem-se crianças, eu já sei o que vocês tem a me contar, mas mesmo assim prefiro ouvir de vocês. - e deu um olhar penetrante pelos óculos ás quatro crianças.

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