Um instante para ser eterno



Capítulo 7 – Um instante para ser eterno

No dia seguinte ao retorno dos rapazes, apesar do que acontecera, as coisas pareciam estar voltando relativamente ao normal na Toca dos Gatos. Os Weasley ainda estavam chocados com o que havia acontecido a Rony, mas estavam radiantes de felicidade pelo rapaz ainda estar vivo. Harry perdeu a conta das vezes que a Sra. Weasley abraçou-o, em prantos, agradecendo-o por ter salvo a vida do amigo. Rony também lhe deu um abraço forte, agradecendo ao amigo por ter salvo a sua vida.

Harry também recebeu abraços apertados de Hermione e Gina, esta última deixando-o com o rosto vermelho e quente depois de lhe aplicar um beijo no rosto, estrategicamente colocado próximo ao canto dos lábios e lhe deixando com um gostinho de “quero mais”. Isso contribuiu para o humor de Harry melhorar o suficiente para deixar pra lá o estranho reaparecimento de Lothian na mansão. Harry achou muito suspeito o fato do rapaz ainda estar vivo e, aparentemente, tê-lo considerado morto sem ao menos procurá-lo. Como a própria Hermione lhe disse no dia seguinte, o rapaz de cabelos brancos apareceu contando uma história muito esquisita.

Segundo a versão de Lothian do que acontecera, ele havia comentado com o bruxo a respeito do Sinistro e que Harry havia obrigado o bruxo a levá-lo para o Reino das Sombras através de magia. Lá chegando, os dois foram atacados por monstros alados que haviam-no separado de Harry. Presumindo que o rapaz também fora levado, considerou-o morto e retornou para casa para avisar os outros.

– Bom, é mais ou menos isso que aconteceu mesmo, Hermione – disse Harry, que estivera escutando a história sentado na cadeira de espaldar do lado de fora da mansão de Morgan – Mas acho que ele poderia ter tentado procurar um pouco mais, sabe. E também não engoli essa história dele ter escapado do monstro alado.

– Eu acho que ele deve ter te deixado lá de propósito, Harry – disse Rony enfaticamente, enquanto tomava um enorme copo de suco de abóbora preparado pela Sra. Weasley – Sabe, esse cara é muito estranho. Como é que ele sabia de tudo isso, pra começo de conversa? E que raio de poder é esse que permite a ele entrar nessa tal “Dimensão de Sombras”.

– Bom, pra falar bem a verdade, ninguém sabe muito a respeito disso – respondeu Gina, que estivera ouvindo a conversa, sentada ao lado de Rony – Eu andei perguntando para o Carlinhos, e ele disse que não sabe muito a respeito da família de Lothian, exceto pelo fato de que eles parecem ter descendência escocesa, vindos de uma região ao norte da Grã-Bretanha, mas nada mais além disso.

– Bom, parece que a família dele estava ligada com aqueles tais “Cavaleiros das Sombras”, pelo visto, não – disse Harry, pensativo – Não é qualquer bruxo que é capaz de usar uma entrada para uma dimensão das sombras e sai ileso. Além disso, ele conhecia uma porção de feitiços das sombras, o que me faz pensar se ele já não conhecia aquela dimensão. Nada me tira da cabeça que ele me levou para me largar lá. Ele sabia que eu não conseguiria voltar sozinho, ele mesmo me disse que era impossível

– Bom, mas você voltou, não? – disse Hermione, olhando o rapaz com uma expressão amável – Parece que não era tão impossível assim.

– Bom, não é bem assim – disse Rony – Nós realmente voltamos, mas não foi sem alguma ajuda, não é mesmo Harry?

Harry ficou mudo. Ainda não tinha contado às amigas que recebera a ajuda do cão negro que parecia Sirius. Depois de ter confundido o Sinistro com o padrinho, Harry não sabia mais no que confiar. Sentira o olhar bondoso do padrinho no cão negro, mas poderia ser um truque, uma enganação, não sabia mais. E também não tivera tempo para conversar com ele para confirmar suas suspeitas, ele sumira antes que pudesse fazer alguma coisa.

Nesse momento, a porta da sala se abriu e Harry viu Lothian saindo, acompanhado por Carlinhos. O rapaz se aprumou na cadeira e fechou a cara para o bruxo que se aproximava com um sorriso simpático no rosto. O que diabo acontecia com esse cara, afinal?

– Olá, garotos – disse Lothian, se aproximando da mesa – Vim me despedir de vocês. Agora que tudo parece ter se arrumado, o Sr. Weasley, Carlinhos e eu estaremos indo atrás dos negócios da Ordem.

– Como é que é? - disse Rony revoltado, se levantando de súbito – Porque é que ele pode ir com vocês resolver os assuntos da Ordem e nós não podemos?

– Em primeiro lugar, você tem que descansar, Rony – disse Carlinhos, olhando para o irmão com compaixão – Você ainda não se recuperou completamente, e é melhor não se arriscar mais. Além disso, vocês ainda tem acompanhar a mamãe ao Beco Diagonal fazer as compras desse semestre para a escola.

– É, mas o Lothian também ainda não se formou – revoltou-se o rapaz – porque ele, que ainda é um bruxo menor de idade, pode acompanhar vocês e eu não posso?

– Estou indo porque conheço melhor a região, Rony – disse Lothian com um olhar estranhamente compassivo para o ruivo – Minha família morou naquele lugar por várias gerações, e conheço aquelas terras como nenhum outro. Apesar de estar acompanhando o grupo que vai para lá, tenho tanta permissão de usar magia fora da escola quanto você, e não poderei fazer nada além de ficar assistindo.

– Enquanto isso, aproveitem a estadia aqui na casa de Morgan – concluiu Carlinhos, dando um tapinha no ombro de Lothian para indicar que deveriam ir – Esse passeio foi planejado para ser divertido, e até agora essa foi a última coisa que vocês tiveram. Ouvi dizer que existe aqui por perto, para os lados das montanhas, um bosque bem legal. A Sra. Morgan ainda esses dias estava comentando com a mamãe que achou ter visto um unicórnio passeando por ali.

Com isso, os dois rapazes se despediram deles e entraram novamente na mansão. Rony tornou a se sentar, bufando de raiva pela sorte de Lothian. Harry também não estava com uma cara de muitos amigos, e refletia sobre o bruxo de cabelos prateados.

Lothian agira estranhamente durante a incursão ao Vale das Sombras. Parecia de certa forma febrilmente atraído ao lugar, parecia ter uma familiaridade àquele lugar sombrio e seus habitantes. Até mesmo quando fora propor a ele ajuda para salvar a alma de Rony, raptada pelo Sinistro, o rapaz estava estranho. Parecera ansioso, como se estivesse aguardando por aquele momento. Entretanto, os dois estavam sozinhos numa região que aparentemente Lothian conhecia muito bem. Se o rapaz trabalhava para Voldemort, ou se quisesse matá-lo, a oportunidade era aquela. Porque então não a aproveitara?

Rony levantou-se e caminhou para a sebe alta que separava a mansão do gramado. Realmente, Harry percebeu, o rapaz ainda demonstrava sinais de fraqueza, o rosto estava mais pálido que o habitual e ele ainda se agasalhava mais do que devia, sentindo calafrios de vez em quando. O bruxo ficou se perguntando se aquilo era o resultado do ataque que o amigo recebera do Sinistro no seu corpo espiritual, enquanto estavam no Vale das Sombras. Talvez demorasse um pouco para o amigo se recuperar completamente de ter sido ferido espiritualmente.

E Lothian também havia se comovido com a “morte” de Rony, a ponto de ajudá-lo a salvar o amigo. A cabeça de Harry dava um nó em si mesma. Aquilo não fazia sentido. Porque às vezes sentia que o bruxo desejava o seu mal, porque tinha tanta convicção de que o rapaz lhe traria problemas? Seria porque seu coração fervera de raiva quando ele se aproximou de Gina? Seria ciúmes isso que estaria sentindo, a ponto de nublar sua visão e acusar um bruxo inocente de atentar contra sua vida? E principalmente, aquela forma nebulosa do cão negro que encontrara no Vale das Sombras seria realmente seu padrinho? Harry desejou mais do que nunca ter estas respostas, e meditou sobre essas perguntas por vários dias enquanto ficou na mansão.

Os dias foram se passando lentamente na Toca dos Gatos depois que o Sr. Weasley e os rapazes foram embora. Morgan e a Sra. Weasley passavam a tarde conversando a respeito de assuntos tão triviais que era impossível ficar perto delas. Dessa forma, tornou-se um hábito de Harry sair sozinho pela propriedade, alternando entre o gramado próximo da mansão e o tablado de madeira onde haviam sido atacados pelo Sinistro. Harry sentia como se uma estranha força o levasse àquele lugar, e passava várias horas sentado ali, com o olhar perdido na escuridão do bosque.

Uma tarde, depois de ter passado todo o dia sentado observando o céu e pensando sobre todos os problemas que andavam tirando o seu sono, Harry notou três figuras se aproximando pela estrada de pedra que levava à mansão. Sabendo de antemão o que iria acontecer, Harry se levantou e evitou olhar na direção dos três amigos. Gina foi a primeira que falou, com um tom preocupado na voz.

– Harry, estamos preocupados com você – disse ela, se sentando ao lado dele no tablado de madeira – Faz dias que você está evitando a gente, não está comendo direito, e fica aqui sozinho. O que está havendo com você?

Harry se levantou e deu alguns passos na direção do bosque. Nem ele mesmo sabia muito bem o que é que estava acontecendo. Só tinha essa vontade imensa de ficar só, sem ninguém por perto. Sabia que não era justo com seus amigos, que eles queriam ajudá-lo, mas não queria ficar sozinho absorto em seus pensamentos.

– Não é nada com vocês – disse Harry, olhando para os três amigos que o observavam, apreensivos – Só tenho vontade de estar sozinho nesses últimos dias. Sabe, com tudo isso que aconteceu, com a morte do Rony e tudo mais.

– Não é só por isso, não é Harry – disse Hermione, com uma expressão de que sabe mais do que devia – O Rony nos contou como vocês conseguiram escapar do Vale das Sombras. Vocês tiveram a ajuda de alguém, não é?

– Bom, é – confirmou Harry, baixando os olhos – Não posso negar que parecia o Sirius. Eu podia jurar que era ele, mas por alguma razão eu não consigo acreditar!

– Com certeza você ainda está abalado pelo que aconteceu a ele, Harry – disse Hermione – Podia ser outro Sinistro, quem vai saber?

– Mas porque ele teria nos ajudado, Hermione? – pergunto Rony à amiga – Provavelmente teria tentado nos devorar ou nos levar pro fundo daquele abismo. Tinha que ser ele, não tem outra explicação.

– Além disso, Mione, não quis falar pra vocês mas já que tocaram no assunto, estou estranhando a atitude do Lothian com relação a mim – disse Harry, olhando para a amiga – Ele parecia saber muito sobre o lugar, e além do mais, ele estava meio alterado quando me convidou para ir até lá. É quase como se ele estivesse sobre o efeito da Maldição Imperius.

– Ah, eu acho que não, Harry – disse Gina, entrando na conversa novamente – Não teria sido mais fácil para ele ter te matado ali mesmo, então? Estavam só vocês dois naquele lugar.

– Também acho, Gina, e isso é o que torna tudo mais estranho. Porque esse cara às vezes é tão simpático com a gente, mas de repente ele fica esquisito, agindo como se estivesse nervoso ou ansioso? E quem era aquela forma que nós vimos no Vale, Rony? Teria sido mesmo o Sirius?

– Bom, acho que seria possível uma dimensão de sombras ser conectada a essa dimensão onde o Sirius foi aprisionado – disse Hermione, refletindo sobre o assunto – mas se essas Chaves do Abismo são utilizadas para entrar, será possível que elas poderiam ser utilizadas para sair?

– Todos dizem que é impossível escapar de lá, mas será mesmo? - indagou Rony, olhando para o bosque negro à frente deles – mas fico me perguntando se, já que conseguimos entrar e sair desta dimensão de sombras, se não é possível sair desse Abismo para onde ele foi mandado.

– É, mas não temos como saber isso, não é? É isso que está tirando o meu sono ultimamente. Todas estas perguntas e nenhuma resposta – concluiu, desgostoso. Depois gracejou – É nessas horas que gostaria de ter uma daquelas bolas de cristal da Sibila.

Rony riu com gosto de piada do amigo, enquanto Hermione fechou a cara para eles, pois sabia-se muito bem que ele achava a Adivinhação completamente furada. Mas o rosto de Gina se iluminou de repente, como se tivesse acabado de se lembrar de algo.

– É verdade, eu não me lembrava disso – disse ela para si mesma, atraindo a atenção de todos – Pode ser verdade, mas nunca pensei...

– O que, você tem uma bola de cristal aí na manga? – gracejou Rony.

– Não, seu bocó, mas você não lembra do que a mamãe comentou a respeito de Morgan, hein?

– Que ela é uma velha gagá? - respondeu Rony, sem entender – Francamente, como é que elas conseguem ficar falando dessas bobagens o dia inteiro?

– Não, que a mãe dela era uma Pítia!

– Era o que?

– Uma Pítia, Rony – explicou calmamente Hermione – Uma sacerdotisa de Apolo que supostamente possui dons divinatórios. Você nunca prestou atenção às aulas de História da Magia, hein?

– Você acha que eu não tenho nada melhor pra fazer do que prestar atenção às aulas do Prof. Binns? E que raio de pergunta é essa onde já se sabe a resposta? – acrescentou com um sorriso.

Harry se lembrou vagamente de ter feito um trabalho sobre fontes de adivinhação na aula de História da Magia, mas não se lembrava precisamente do que significava aquele termo. Sabia que as Pitonisas (também conhecidas como sibilas, que era de onde vinha o nome de sua professora de adivinhação) eram mulheres gregas que possuíam um dom de se comunicar com o deus Apolo. Pertenciam a um oráculo em Delfos, uma cidade grega muito famosa em sua época, mas haviam desaparecido há muitos anos. Na verdade, haviam mudado o oráculo para uma outra cidade, para evitar problemas com a comunidade trouxa. Atendiam com hora marcada, e a fila de espera era de várias décadas.

– Mas no que isso pode nos ajudar – disse Rony a Gina, intrigado após a explicação de Harry – você pretende ir até lá perguntar pra ela? Se tivermos sorte, talvez sejamos atendidos ainda nesse século.

– Não, seu burro – disse Gina a Rony, sem paciência – Segundo a mamãe, a avó de Morgan viveu nesta mesma casa, há muitos anos atrás, e a mãe dela depois disso. A casa já está na família há várias gerações, e se eu estiver certa, este lugar onde estamos era um altar de sacrifícios para Apolo. Está vendo as manchas ali e ali – disse, apontando as manchas na pedra – provavelmente é sangue. Se pudermos encontrar algum livro ou algo assim que indique como é que fazemos para entrar nesse transe divinatório, talvez possamos descobrir a respostas para estas coisas que o estão preocupando, Harry. Talvez possamos descobrir se esse cão negro que você encontrou no Vale das Sombras é realmente o Sirius.

– Que é isso, vocês realmente acreditam nessa palhaçada de Adivinhação? Quantas vezes já lhes disse que isso não passa de papo furado de charlatões e gente sem ter o que fazer da vida – disse Hermione, irritada – Eu me recuso a participar de uma bobagem dessas!

– Bom, se você não está interessada, tudo bem. Podemos fazer isso sozinhos, Harry – disse Gina para o rapaz, que sorriu – o que é que você acha?

Harry pensou um pouco na proposta, e achou que talvez fosse interessante arriscar. Na pior das hipóteses, sairiam da experiência com as mesmas dúvidas que já tinham, e nada mudaria. É claro, poderiam receber a resposta para suas dúvidas, e isso seria realmente bom. Além disso, isso provavelmente acabaria com o tédio que estavam sentindo ultimamente, sem nada de interessante para fazer naquele lugar. Sem contar que poderia passar um tempo com Gina, o que seria ótimo.

– Bom, eu acho ótimo e estou dentro! – disse Rony, entusiasmado – Não que eu acredite nisso tudo, entendam, mas acho que isso no mínimo vai manter a gente entretido pelo resto da semana. Lembrem-se que daqui há duas semanas a gente vai voltar pra escola, e lá com certeza não teremos como fazer nada.

– Então está combinado – disse Gina, se levantando de um salto, empolgada – vamos nos dividir e dar uma vasculhada na casa. Temos que encontrar algum livro, alguma anotação, qualquer coisa que nos dê uma dica de como executar este ritual.

– Ainda acho que tudo isso é besteira – disse Hermione mais uma vez, tentando desencorajar os amigos da bobagem que estavam aprontando – mesmo que isso nos dê alguma resposta, como é que vamos saber se há algum fundo de verdade nisso tudo?

– Bom, não custa nada arriscar – disse Rony, esfregando as mãos – vamos colocar as mãos à obra.

Combinaram então de se dividir para começar a procurar. Obviamente, tinham o problema de que os empregados de Morgan provavelmente não os deixariam ficar fuçando na casa, apesar dela ter dado ordens para que eles pudessem vagar livremente pela propriedade. Morgan não era do tipo que parecia muito preocupada com a sua descendência de Pítia, então deduziram que talvez ela tivesse pego todas as coisas de sua mãe e guardado em algum lugar longe de vista. O porão e o sótão, portanto, pareciam as duas primeiras alternativas para procurar. Os rapazes ficariam encarregados de procurar no porão, e as garotas vasculhariam o sótão.

A busca pelo ritual não demorou muito, na verdade. Como haviam imaginado, Morgan amontoou os pertences de sua mãe no porão, incluindo aí livros, caldeirões, bolas de cristal e mais uma porção de badulaques divinatórios que obviamente não pareciam autênticos. Selecionaram, por fim, uma pequena pilha de livros que parecia promissora, além de alguns apetrechos que pareciam ter sido bastante utilizados – uma grande cuba circular de prata e um punhal do mesmo material. Ambos tinham sinais de bastante uso, e folheando os livros viram algumas imagens dos dois, o que indicava que eram necessários para os rituais descritos.

Naquela mesma noite, depois que a Sra. Weasley e Morgan se retiraram da mesa para a sala de estar, o quarteto retornou ao deck de madeira que se tornara o seu ponto de encontro, tomando o cuidado de evitar que alguém os visse carregando a cuba de prata e o punhal. Cada um deles se sentou numa das cadeiras confortáveis e começou a ler os livros, em busca de alguma coisa interessante. Após alguns minutos, foi Hermione quem falou primeiro.

– Francamente – disse, fechando o livro com um estalo – ainda não acredito que vocês me convenceram a participar desta bobagem.

– Ei, ninguém está te obrigando, Hermione – disse Rony, estranhamente absorto em seu livro. Parecia até outra pessoa – se quiser desistir, vá em frente. Só nos faça um favor, não dedure a gente.

– Não vou dedurar ninguém, mas essas coisas são propriedade de outra pessoa, Rony. Deveríamos pelo menos ter pedido permissão para Morgan para usar as coisas dela.

– Relaxa, Mione – disse Gina, marcando a página de seu livro com o dedo e folheando para trás – ninguém vai nem perceber que essas coisas saíram de lá. Estavam debaixo de uma pilha de sucata, não é mesmo?

– Ei, olhem isso, pessoal – disse Harry, colocando seu livro em cima da mesa e chamando a atenção de todos para um parágrafo no meio do livro – acho que isso aqui pode funcionar.

Todos se curvaram para ver o que Harry havia descoberto. Realmente, era uma espécie de ritual de divinação que deveria ser executado pela Pítia e que usava exatamente os dois objetos que eles haviam separado. O ritual não era muito complicado, mas exigia, além do punhal e da bacia que tinham encontrado, alguns materiais difíceis de serem encontrados. Ele basicamente consistia na queima de um preparado de ervas raras que Harry nunca tinha ouvido falar.

– Vixe, que raio é isso aqui – perguntou Rony, apontando para um nome particularmente difícil da lista de ervas a serem utilizadas – Nunca ouvi falar disso na minha vida inteira! Como é que vamos arrumar esse negócio aí?

– É isso é que dá não se dedicar nem um pouco aos estudos – disse Hermione, de cara feia para o amigo – Isso aí é uma minbus florida, e nem é tão difícil assim de se encontrar. O problema é que não é uma flor muito comum aqui na Inglaterra, acho que só vamos encontrá-las em uma loja especializada em ingredientes de poções. Acho melhor desistirmos, não vamos encontrar algo assim aqui por perto.

– Ei, espera só um minutinho – disse Gina, animada – o Lupin chegou a comentar que havia uma vila bruxa aqui por perto, não é mesmo? Portville ou algo assim, não é?

– É verdade – concordou Harry – É bem provável que não tenhamos tanta dificuldade assim, lá provavelmente deve haver uma loja de ingredientes para poções. O Lupin chegou a comentar que havia todo tipo de lojas lá, como em Hogsmeade.

– Mas como é que vamos para lá – perguntou Hermione, percebendo que o tiro saíra pela culatra – a vila deve ser a quilômetros de distância, e além disso, sua mãe provavelmente vai nos proibir, Rony.

– Puxa vida, Hermione, você não dá descanso mesmo, não é? – disse Rony, irritado – É só a gente sair escondido que não tem problema. A gente diz que vamos passear pela propriedade, eles provavelmente nem vão se dar conta que a gente não está aqui.

– Eu vou lá amanhã de manhã – disse Harry decidido, fitando os amigos – quem quiser ir comigo será bem-vindo, mas não quero ninguém dedurando a gente se a gente for – concluiu, lançando um olhar penetrante a Hermione, que entendeu o recado na hora.

– Ah, Harry – disse ela, encabulada – não vou dedurar você. Só não quero que a gente se arrisque demais, Você-Sabe-Quem voltou, não é mesmo? O Lupin mesmo disse que é uma vila não tão protegida, pode ser perigoso.

– Já estou cansado de todo mundo me tratando que nem criança, Mione. Eu acabei de voltar de um reino das sombras sozinho, escapei da morte mais de uma vez e acho que pelo menos uma vez na vida você podia me dar um voto de confiança. Não sou idiota, não estou nem um pouco a fim de morrer, mas já me decidi a ir até lá buscar essa erva. Se você quiser ir, tudo bem, mas não tente nos impedir, por favor.

– É claro que eu vou, Harry – disse Hermione, baixando os olhos – Só estou preocupada conosco.

– Tudo bem, Mione – disse Rony, colocando a mão no ombro da amiga – sabemos que você se preocupa, mas é a nossa única chance de saber se nossas suspeitas são verdadeiras. Vamos, temos que descobrir onde fica esta vila.

Combinado o passeio para a manhã seguinte, o grupo se levantou e voltou para a mansão de Morgan. Enquanto caminhava pela estrada de pedra apreciando o canteiro de flores bem cuidado de Morgan, Harry ficou imaginando que tipo de aventuras o aguardava na vila de Portville. Não sabia o porque, mas pensar em ir para a vila na manhã seguinte lhe dava calafrios de empolgação. Sentia que algo emocionante aconteceria na manhã seguinte, mas primeiro tinham que descobrir onde a vila ficava e como chegar até lá sem que uma horda de bruxos os perseguisse.

Na noite deste dia, enquanto se reuniam na sala de jantar para a refeição noturna, Harry teve uma idéia. Sentado ao lado de Rony, Harry deu um cutucão no amigo e deu-lhe uma piscadela, indicando que tinha um plano. O bruxo se virou na direção de Morgan e puxou conversa, enquanto esticava a mão para alcançar uma terrina fumegante de sopa de feijão.

– Ei, Sra. Morgan – começou, virando-se para a ponta da mesa – a Gina aqui estava me dizendo ainda hoje que a propriedade da senhora é muito vasta. Dizem que há até mesmo unicórnios vagando por aqui, é verdade?

– Pode acreditar que sim, Harry querido – confirmou a Sra. Morgan, abrindo um sorriso para o rapaz – ainda ontem estava comentando com a Sra. Weasley aqui, que esta é uma ótima época para se ver os unicórnios. Parece que nesse mês eles ficam menos ariscos, e podem chegar até mesmo a deixar rapazes montá-los.

– Puxa vida, verdade? - perguntou Rony com um rosto tão empolgado que Harry quase não conseguiu conter o riso – Nossa, eu sempre quis montar num unicórnio de verdade! Será que na gente consegue mesmo encontrar alguns por aqui?

– Bom, os unicórnios gostam de beber água numa fonte que fica num bosque meio distante daqui da mansão – comentou Morgan para o rapaz, pensativa – eu não costumo ir muito para aqueles lados desde que a minha mãe faleceu, ela adorava aquele lugar, mas fica muito longe. Se vocês quiserem ir, eu posso pedir para um dos empregados acompanhá-los até lá.

– Acho que não há necessidade disso, Sra. Morgan – disse Gina, entrando na conversa – Até agora a gente só conheceu as terras próximas aqui da casa, e acho que seria ótimo passear um pouco mais longe desta vez. Eu achei ter visto mesmo um bosque à distância, para o lado das montanhas.

– É esse mesmo – disse Morgan – mas vocês não acham que vão se perder no caminho, vai levar algumas horas para vocês chegarem até lá.

– Pode ficar tranqüila, senhora – disse Hermione, sorrindo – é só nós sairmos bem cedo amanhã, e levarmos alguns biscoitos e petiscos para comer no caminho. Não temos pressa, vamos admirando a paisagem durante o passeio.

– Bom, se é assim, podem ficar à vontade para ir conhecer o bosque. Se querem saber, vou até mesmo mandar Charles a Portville para comprar alguns biscoitos e guloseimas para vocês levarem ao passeio amanhã – acrescentou com uma piscadela marota para os rapazes.

– Portville? - perguntou Harry com um espanto encenado, aproveitando a oportunidade de ouro que havia surgido – Está falando daquela vila mágica que fica na região?

– Lupin falou a eles sobre a vila enquanto estávamos em Londres – acrescentou a Sra. Weasley, olhando para os garotos com desconfiança – Mas deixou bem claro que é uma vila perigosa demais nesses tempos tão difíceis que estamos enfrentando, não é mesmo rapazes?

– Claro, mamãe – disse Gina séria concordando com a mãe, acrescentando depois a Morgan – Mas não é perigoso demais deixar o empregado ir até lá assim, no meio da noite? Deve ser bem longe, e pode haver perigos no caminho, sem contar a escuridão, que deve ser terrível para se perder.

– Não se preocupe, querida – disse Morgan carinhosamente a Gina – Charles consegue se defender muito bem, ele já foi terceiro lugar no Campeonato Regional de Duelos. Além disso, a vila fica apenas há meia hora daqui e o caminho até lá é bem sinalizado. Estamos numa estrada bem movimentada, sabem.

Harry sorriu, satisfeito com os resultados de seu plano. Descobrir onde ficava a vila fora mais fácil do que havia imaginado. Apesar de ficar com um certo peso na consciência por enganar a pobre Sra. Morgan, que se mostrara tão solícita em ajudá-los a explorar a propriedade, sabia que não podia voltar atrás agora. Tinha que descobrir o que esta acontecendo, precisava saber a resposta para as perguntas que tanto o assombravam.

Quando foi para o seu quarto dormir naquela noite, ao invés de se deitar Harry ficou debruçado no parapeito da janela, olhando o céu estrelado. Era uma noite maravilhosa, como ele não via já há algum tempo. A empolgação da ida à vila no dia seguinte não o deixava dormir, mas ele sentiu que não era só aquilo que estava tirando o seu sono. Havia algo mais, ele não sabia dizer o que era, mas sentia como se precisasse sair para uma caminhada noturna.

Harry olhou para o amigo Rony roncando alto na cama ao lado, e decidiu-se por sair dali. Desceu as escadas silenciosamente, passando pela sala de estar, e abriu lentamente as portas de vidro que davam acesso ao deck de madeira. Caminhou descalço pelo gramado molhado por  orvalho, afastando-se da casa o suficiente para não ser visto, e quando estava longe o suficiente parou e olhou ao seu redor. Constatou, com alívio, que não havia ninguém por perto.

Ele se sentou na grama e ficou olhando para o céu estrelado, pensando nas coisas que estavam acontecendo nos últimos dias. Como se sentia sobre seus amigos, sobre a escola, sobre seu padrinho. Havia uma pergunta específica que no rapaz queria descobrir a resposta através do oráculo, mas sentia-se encabulado até mesmo de pensar nela.

Ele se inclinou para trás, apoiado nos próprios braços, e fechou os olhos para o céu acima. Por mais que tentasse evitar, não conseguia tirar Gina de seus pensamentos. Não sabia ao certo o que sentia pela garota ruiva que invadira seus pensamentos e seus sonhos, mas sabia que o que sentia era forte o suficiente para mexer com sua cabeça. O que tinha sentido quando Lothian havia se aproximado dela era por demais forte para negar que era ciúme. Havia sentido como se seu mundo estivesse desabando quando pensara na possibilidade do seu rival levar a melhor sobre o coração dela. Mesmo que por um breve momento, pensar nisso o fazia ter vontade de estrangular o rival.

– Que babaca apaixonado – Harry pensou consigo mesmo, sorrindo de olhos fechados – Estou até mesmo imaginando sentir o perfume dela, aqui sentado com essa cara de bobo.

– Esse lugar está ocupado? – perguntou baixinho uma voz familiar.

Harry caiu de costas com a surpresa, e abriu os olhos. Bem atrás dele estava Gina, olhando para ele com seus belos olhos castanhos. Parecia ter acabado de se levantar da cama, pois seu cabelo ainda estava ligeiramente bagunçado na parte de cima. A luz da lua refletia em sua pele clara, dando a ela uma aparência surreal que Harry achou maravilhosa. Nunca a tinha visto assim, tão linda, em toda a sua vida.

– Posso sentar aqui? – perguntou a garota, apontando para a grama ao lado de Harry.

– Claro... senta aí – disse Harry, sem jeito, sentando-se novamente.

Gina se sentou ao lado dele, tão perto que o rapaz podia sentir o perfume delicioso que vinha dos cabelos dela. Podia sentir o calor que emanava de seu corpo tão intensamente que desejou tocar aquela pele macia com seus dedos só para sentir a textura de sua pele. A garota olhou para o céu estrelado, suspirando levemente, e recomeçou a falar.

– Eu estava na janela e vi você saindo – explicou-se a garota, corando – Não estava conseguindo dormir, então resolvi te seguir. Espero que você não se importe, estava precisando de companhia.

Harry limitou-se a concordar com a cabeça. Os olhos de Gina estavam tirando ele do sério, não conseguia pensar direito. Só conseguia se imaginar beijando a garota e a segurando em seus braços. Ficaram ali um tempo, com o olhar perdido, sem saber o que fazer ou dizer um para o outro, até que Gina quebrou o silêncio olhando para Harry nos olhos.

– Harry – começou ela, com um tom de incerteza na voz – tem uma coisa que eu preciso falar com você. Nesses últimos dias, enquanto estávamos aqui com o Lothian, percebi que você estava agindo meio esquisito. Sempre que nós ficávamos sozinhos ou saíamos juntos, eu via você parado, com um olhar estranho para nós dois. O que está havendo, Harry? Está sentindo alguma coisa por mim?

Harry corou. Então Gina havia percebido seu ciúmes, mesmo ele tentando esconder o que sentia. Ele sorriu para ela, percebendo o quão esperta era a amiga.

– Gina, eu... eu não sei o que dizer – disse, olhando a garota nos olhos – Sempre que estou perto de você, eu me sinto estranho. Sinto um calor no peito, uma vontade de estar ao seu lado, mas não sei ao certo o que fazer. Não sei ao certo o que sinto.

Harry se levantou, caminhando alguns passos para longe da garota e evitando o seu olhar inquisitivo. Ele parou ao lado dela, tentando encontrar as palavras certas para definir o que sentia, mas não foi capaz.

– Estar ao seu lado me causa tantos sentimentos diferentes que eu não sei ao certo como descrevê-los – disse, olhando para Gina, que também se levantara da grama e se aproximava, sustentando o olhar para evitar que o rapaz se afastasse – Sinto o seu perfume me embriagando, sua voz doce me tirando do sério. É como se estar ao seu lado fizesse tudo isso valer a pena, mesmo estando longe de você. E ver aquele idiota próximo de você me tirava do sério, você me entende?

– Acho que entendo o que você está sentindo, Harry– disse Gina, segurando a mão de Harry com as suas – Pois era desta forma que eu me sentia quando entrei para Hogwarts, ou você não se lembra? Não lembra o quanto eu queria estar ao seu lado, o cartão que eu lhe mandei?

Harry sentia-se extasiado. Como era macio e sedoso o toque daqueles dedos tão pequenos e delicados, como era suave o toque da mão dela sobre a sua. Harry não conseguiu e nem queria mais se controlar. Virou-se lentamente na direção da garota, encarando-a naqueles olhos castanhos tão lindos.

– Sim, eu me lembro – disse Harry, aproximando o seu rosto lentamente do rosto dela, os olhos fixos em seus olhos – hoje eu vejo o quanto fui idiota ignorando o sentimento que você tinha por mim naquela época, e que hoje eu desejo tão desesperadamente.

Ele se aproximou cada vez mais dela, levando a mão até o seu rosto e afastando os cabelos ruivos que haviam coberto os seus olhos. Ele acariciou aquele rosto macio lentamente com as costas da mão, sentindo aquela pele aveludada enquanto aproximava seus lábios dos dela.

– Harry... eu... – disse a garota conforme seu rosto se aproximava perigosamente do rosto dele. Ela também, há muito desejara aquela oportunidade, e agora estavam ali, os dois desejando aquele momento com todo o seu coração. Ela foi fechando os olhos lentamente, se entregando àquele que fora o amor de sua vida por anos a fio, sentindo seu coração pulsar com toda a emoção que jamais imaginara que poderia sentir.

Seus lábios se tocaram ternamente num beijo apaixonado, e Harry soube que nunca sentira algo tão delicioso em toda a sua vida. Os lábios da garota tinham um sabor ao mesmo tempo meigo e suave que fizeram Harry se apaixonar naquele mesmo instante. Ele passou a mão pelos cabelos da nuca dela puxando-a levemente para si, enquanto com o outro braço enlaçou a cintura dela e segurou-a junto ao próprio corpo.

A garota também nunca havia se entregado tanto num beijo em toda a sua vida, nem dera um beijo tão sincero. Ela colocou seus braços sobre os ombros de Harry e se entregou ao abraço apertado que se seguiu, enquanto se deliciava nos lábios sedosos daquele rapaz que amara tanto tempo sem ser correspondida. Ela se entregou ao seu abraço apertado, desejando que aquele momento durasse para sempre.

Os dois se abraçaram com mais força, beijando os lábios um do outro mais intensamente como se um rio represado há muito tempo tivesse se libertado, ganhando força a cada segundo que se passava. Harry sentia seu peito prestes a explodir, tal era a emoção que sentia emanando de seu corpo, e apertava a garota ao próprio corpo como se quisesse que nunca mais se separassem. Ela também, acariciava aqueles cabelos negros macios e desalinhados, deixando extravasar todo o amor que sentiam um pelo outro.

E os dois apaixonados ali ficaram a noite toda, entregues aos beijos apaixonados um do outro, trocando carícias e juras de amor como só aqueles que já amaram são capazes. Para os dois, a noite durou apenas tempo suficiente para que sentissem que suas almas haviam nascido uma para a outra, esquecidos do tempo e das responsabilidades. Quando os primeiros raios da manhã começaram a tingir o céu de uma coloração azulada e ameaçaram encontrá-los abraçados na relva, eles retornaram para seus quartos para sonhar com aquela noite inesquecível.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.