CAPÍTULO 10



CAPÍTULO 10


 


- Ligue o gravador, Hermione. - Gina fez sinal para o guarda, mandando-o se afastar da porta, e usou o cartão mestre para destrancar a fechadura. Viu-se em uma sala luxuosa e muito espaçosa, com um arranjo imenso de flores naturais em tons de branco e azul sob o peitoril das janelas largas.


As torres e lanças de concreto da cidade de Nova York podiam ser vistas lá fora e o tráfego aéreo ainda fluía com tranqüilidade àquela hora. Os cartazes e anúncios luminosos gigantescos e frenéticos, tão comuns no lado oeste da cidade, haviam sido banidos ali, no lado leste.


Como era típico da maioria dos imóveis de Harry, a suíte do hotel era lindamente decorada. Estofados convidativos cobertos por brocados, piso muito brilhante em madeira e tapetes de fios tão altos que os pés desapareciam dentro deles. Sobre a mesinha de centro, muito grande, havia uma cesta de frutas e uma garrafa de Sauvignon blanc, provavelmente cortesia do Palace.


Alguém mexera nas frutas e abrira o vinho. Jennie teve alguns momentos para aproveitar todo aquele luxo, pensou Gina, antes de ser atraída para a morte.


Pelo visto, nada mais fora mexido. O centro de comunicações e entretenimento do quarto continuava discretamente escondido por trás de uma tela de seda cheia de pássaros tropicais, e o telão para relaxamento, que cobria quase toda a parede, estava desligado.


- Aqui fala a tenente Gina Weasley, acompanhada pela policial Hermione Granger. Estamos dando início à busca na suíte do Hotel Palace, ocupada pela vítima Jennie O’Leary. Vamos começar pelo quarto, Hermione.


Gina atravessou a sala e entrou em um aposento onde a luz do sol entrava com abundância, através de uma janela com três folhas. A colcha azul-pavão que cobria a imensa cama colocada sobre uma plataforma no meio do quarto estava com uma das pontas virada em diagonal, de forma elegante, em sinal de convite para uma noite agradável. Sobre os travesseiros rechonchudos havia balas de menta embrulhadas em papel dourado.


- Lembre-se de pesquisar o nome da camareira que esteve de serviço aqui ontem, Hermione. Pergunte o que ela tocou e o que reparou de diferente. - Enquanto falava, Gina foi em direção ao closet. Lá dentro viu três blusas, duas calças, um vestido leve azul de algodão e um conjunto de noite, creme, em tecido não muito caro. Dois pares de sapatos estavam cuidadosamente expostos na parte de baixo.


Seguindo a rotina, Gina verificou os bolsos, olhou dentro dos sapatos e passou a mão sobre a prateleira superior.


- Não há nada aqui. O que achou nas gavetas da cômoda?


- Roupa de baixo, meias de náilon, uma camisola de algodão e uma bolsinha de noite, preta, feita de contas.


- Ela trouxe a sua melhor roupa de noite, - comentou Gina enquanto passava a mão pela ponta da saia rodada do conjunto - e nem conseguiu uma chance de usá-la. Teve o trabalho de desfazer a mala, que guardou no closet, e trouxe roupas para passar três ou quatro dias. Alguma jóia?


- Até agora não encontrei nenhuma.


- Talvez tenha levado com ela. Deve ter trazido algo especial para sair à noite. Veja no tele-link todas as ligações que ela fez e recebeu. Vou vistoriar o banheiro.


Lá dentro havia uma banheira de hidromassagem grande o bastante para várias pessoas. Um frasco de espuma para banho, cortesia do hotel, estava aberto ao lado da banheira. Então ela tomara um banho, refletiu Gina. Deve ter sido difícil de resistir, e Jennie estava esperando pelo contato de alguém.


Será que estava nervosa? Perguntou-se. Sim, talvez estivesse, pelo menos um pouco. Já não via Harry há algum tempo. Deve ter se preocupado com a sua aparência, o quanto mudara com o passar dos anos, o quanto envelhecera e o que ele veria ao reencontrá-la.


Uma mulher sempre se preocuparia com o que um homem como Harry notaria ao olhá-la. Eles haviam sido amantes, lembrou, analisando os artigos de toalete e cosméticos cuidadosamente arrumados sobre a pia em mármore rosa. Jennie deve ter ficado ali se lembrando de como ele a tocara e do gosto dele. Uma mulher dificilmente esqueceria o poder de um amante como Harry.


E, como era humana, deve ter fantasiado, com esperança de que ele voltasse a tocá-la. Será que ela se deixara submergir na água perfumada e cheia de espuma imaginando a cena?


Claro que sim.


Eles haviam sido amigos também. Haviam compartilhado bons momentos, risos, talvez segredos e sonhos. Foram jovens e tolos juntos. Esse era um laço que nunca desaparecia de todo.


Ele a chamara, pedindo para que atravessasse o oceano para vê-lo.


Ela não hesitara.


Sabia que estava em apuros, mas largara tudo para vir. Ficara à espera. E morrera.


- Weasley!


- Que foi? - Gina, forçando-se a voltar à realidade, olhou para Hermione.


- Não encontrei nada no tele-link, mas pesquisei tudo o que chegou por fax. Venha ver isso...


O mini-fax estava sobre uma pequena prateleira em um canto do aposento. Zumbia suavemente, aguardando o próximo comando. Hermione pegou a folha de papel que a máquina acabara de liberar e entregou-a a Gina.


 


Minha querida Jennie,


Harry planeja lhe agradecer por você ter concordado em fazer essa viagem tão inesperada. Gostaríamos de não estar causando nenhum transtorno à sua vida. Esperamos que as acomodações estejam do seu agrado. Se precisar de algo especial, basta ligar para a recepção.


Como sabe, Harry está preocupado com a sua segurança. Precisa muito falar com você em particular, e sem o conhecimento da mulher que escolheu para ser sua esposa. Ele possui informações que deseja passar para você o mais breve possível. É muito importante que você vá se encontrar com ele, sem dizer a ninguém onde vai, nem mesmo às pessoas em quem mais confia. Por favor, vá à esquina da Quinta Avenida com a rua 62, às cinco da tarde. Um automóvel preto com placa de Nova York e motorista uniformizado irá apanhá-la no local. Ele deverá acompanhá-la e já tem todas as instruções.


Desculpe o sigilo, Jennie. Um homem na posição de Harry precisa ser discreto. Pedimos que destrua este contato.


Do seu amigo,


Moody.


 


- Muito esperto. - murmurou Gina. - Ele informou-a apenas do suficiente para atraí-la. Mandou que se livrasse da cópia do fax, mas não a mandou apagar a memória da máquina. Sabia que íamos verificar e queria que encontrássemos a mensagem.


- De qualquer modo, as provas continuam sendo circunstanciais. - comentou Hermione, franzindo as sobrancelhas diante do texto. - Qualquer um pode enviar um fax e assinar com nome de outra pessoa. Ele bloqueou o código de retorno e não dá para saber de onde a mensagem foi enviada.


- Sim, por aqui não dá para saber, mas eu aposto um ano de salário como na hora em que Rony decodificar o bloqueio vai descobrir que a origem da mensagem foi uma das linhas de Harry. Registre como prova. - ordenou, passando a folha para Hermione. - Nosso homem colocou um uniforme e a levou como uma ovelhinha direto para o lado oeste da cidade. Ao chegar lá, derrubou-a fisicamente ou com o uso de drogas. O legista vai nos informar ao certo. Depois, montou a cena com toda a calma. Tudo o que precisava já estava no carro. Talvez o veículo pertença a ele, mas também pode ser que seja alugado. A chance de o automóvel ter sido roubado é muito pequena, mas vamos ter que verificar a lista de carros pretos desaparecidos.


Gina parou de falar e olhou tudo em volta com cuidado uma última vez.


- Chamar a perícia aqui é um desperdício de dinheiro público, mas temos que seguir as normas. Vou chamar os técnicos enquanto você pesquisa os carros roubados, só para nos livrarmos disso. Leve o mini-fax para Rony, no escritório lá de casa. Encontro-me com você lá assim que puder.


- Para onde vai agora, Weasley?


- Pedir mais um favor. - disse Gina, já saindo.


 


Começou a chover, e o ar tornou-se úmido e frio, com um vento forte. Alguns crisântemos teimavam em florescer, acrescentando tons coloridos e aromas inesperados à paisagem. Havia uma fonte, de onde água escorria sobre as pétalas de lírios-d’água feitas de cobre e latão. Do outro lado da passarela gramada que se estendia à sua frente, e onde se lançavam as sombras de altas árvores, ficava a grande casa de pedra, brilhando sob a luz indistinta do sol vespertino.


A Dra. Minerva suspirou. Um lugar como aquele fora construído para paz e poder, pensou. Perguntou-se com que freqüência Gina conseguia aquela paz e o quanto se permitia desfrutá-la.


- Estava esperando pela sua ligação. - disse, observando Gina, que olhava para a casa. - Soube do terceiro assassinato.


- Seu nome era Jennie O’Leary. Há música nesse nome, não acha? - Surpresa por ter falado uma coisa dessas, Gina balançou a cabeça. - Ela e Harry eram amigos. Mais que amigos, por algum tempo.


- Entendo. E as outras duas vítimas também eram irlandesas?


- Harry as conhecia. Todas elas. - Gina obrigou-se a olhar para a psiquiatra.


Minerva estava bem arrumada, como sempre, embora o vento estivesse despenteando seus cabelos castanho-claros muito lisos. Usava um conjunto verde-escuro, o que era uma mudança, pois geralmente a doutora usava tons pastéis. Seus olhos pacientes estavam cheios de compaixão. E compreensão.


Gina achou que a Dra. Minerva aparentava tanta competência ali, sentada em um banco de pedra sob os galhos despidos de um carvalho, quanto em seu elegante consultório. Ela era a melhor profissional de Nova York na área de estudos comportamentais e psiquiatria forense, provavelmente a melhor de todo o país.


- Obrigada por ter concordado em vir conversar comigo aqui.


- Lembro-me destes jardins, do dia em que vim ao seu casamento. - Minerva sorriu. Foi difícil fazer Gina transpor várias barreiras antes de adquirir confiança nela. - Este é um espaço magnífico. Planejado com cuidado, tratado com carinho.


- Lamento não ter muito tempo para vir aqui fora. - Sentindo-se esquisita, Gina enfiou as mãos nos bolsos. - Esqueço até de olhar pela janela quando trabalho em casa.


- Você é muito focada, Gina. É isso que a torna uma excelente policial. Não costuma muito vir aqui fora, mas tenho certeza de que consegue descrever estes jardins com impressionante riqueza de detalhes. Você observa as coisas de maneira instintiva.


- Olhos de tira. - Gina encolheu os ombros. - Bênção ou maldição, quem sabe?...


- Você está preocupada. - Os sentimentos de Minerva por Gina sempre ultrapassaram o nível profissional e a deixavam comovida. - Vai me deixar ajudá-la?


- Não sou eu. Não se trata de mim.


Mas Minerva achava que, em parte, o problema era com ela. A mulher por trás da policial sentia-se abalada por enfrentar pessoas que morreram e que, no passado, haviam sido íntimas de Harry.


- E como anda dormindo, Gina? Está tudo bem? Seu sono está calmo?


- Quase sempre. - Gina tornou a desviar o olhar. Não queria se aprofundar nessa área. Minerva era uma das poucas pessoas que sabiam dos detalhes do seu passado, das lembranças que surgiam inesperadamente e dos pesadelos que tanto a atormentavam e aterrorizavam. - Vamos deixar esse assunto de lado, está bem?


- Certo.


- Estou preocupada com Harry. - Na mesma hora, Gina se arrependeu de ter dito isso. - É uma coisa pessoal. - continuou, voltando a olhar para a médica. - Não pedi que viesse para discutir esse assunto.


Tem certeza? Pensou Minerva, mas simplesmente assentiu com a cabeça, perguntando:


- Por que me pediu para vir aqui, então?


- Preciso de um parecer profissional a respeito do caso. Preciso de um perfil. Preciso de ajuda. - O desconforto de sua posição transpareceu em seus olhos sob a forma de raiva. - Não queria fazer isso em local de trabalho porque o que vou lhe pedir transgride, de certa forma, algumas normas. Não há obrigação nenhuma, de sua parte, de me atender. Compreenderei perfeitamente se você se recusar a isso e resolver citar o meu pedido em seu relatório.


- Por que não me explica toda a situação, Gina, e deixa que eu mesma tome essa decisão? - perguntou Minerva. Sua expressão de educado interesse não se alterou em nada.


- Os três assassinatos estão conectados, e a probabilidade de estarem ligados a uma... série de eventos que aconteceram há vários anos é grande. O motivo é vingança. Na minha opinião, Harry é o alvo principal, e Moody está sendo usado para chegar a ele. Existem provas circunstanciais ligadas a cada um dos assassinatos e todas apontam para Moody. O pior é que elas estão aumentando na mesma velocidade dos corpos. Se eu achasse que o assassino é ele, já o teria colocado atrás das grades pessoalmente, sem um instante sequer de remorso, por mais que eu saiba o quanto ele significa para Harry. Mas são apenas armadilhas que apontam para Moody. Armadilhas muito bem planejadas e executadas, mas óbvias o bastante para insultarem a minha inteligência.


- Você gostaria, então, que eu traçasse um perfil do assassino e examinasse Moody em busca de tendências à violência, de forma extra-oficial?


- Não, quero tudo isso de forma oficial, preto no branco, dentro das normas. Quero levar as suas avaliações ao comandante Lupin. Não lhe apresentei nada sólido até agora.


- Ficarei feliz em ajudar nas duas coisas. Tudo o que precisa fazer é solicitar os meus serviços ao seu comandante e me passar os dados. Posso fazer isso para você em caráter de urgência.


- Eu agradeceria muito.


- E quanto ao resto?


As palmas das mãos de Gina ficaram úmidas na mesma hora. Com impaciência, ela as secou na parte da frente das calças.


- Possuo informações que são fundamentais para a investigação e para o perfil do assassino, mas não posso e não vou registrar isso oficialmente. Vou compartilhá-las neste momento com você, doutora, de forma confidencial, como informação sigilosa entre médico e paciente. Isso a protegerá de possíveis problemas, não?


- Qualquer coisa que você me contar como paciente é informação privilegiada. - afirmou Minerva, levantando as mãos e cruzando os dedos. - Não posso colocar no relatório oficial.


- E você fica protegida? Pessoal e profissionalmente? – insistiu Gina.


- Sim, fico. Quantas pessoas você está determinada a proteger nessa sua cruzada, Gina?


- Todas as que importam.


- Obrigada pela parte que me toca. - Minerva abriu um sorriso largo e estendeu a mão. - Sente-se e conte-me tudo.


Depois de hesitar por um segundo, Gina tomou a mão que Minerva oferecia.


- Você... - começou ela - Quando eu consegui me lembrar do que aconteceu comigo naquele quarto imundo em Dallas, quando consegui me lembrar de meu pai chegando bêbado mais uma vez, estuprando-me mais uma vez, machucando-me mais uma vez, quando me lembrei de tê-lo matado naquela noite e lhe contei tudo, você me disse que não havia sentido, e era até mesmo errado punir aquela menina. Você disse... - nesse ponto Gina teve de pigarrear para poder continuar -... você disse que eu matara um monstro e que me transformara em algo valioso, algo que eu não tinha o direito de destruir por causa do que fizera no passado.


- E você não tem dúvidas a respeito disso, tem?


Gina balançou a cabeça para os lados, embora de vez em quando ainda tivesse dúvidas, sim. Perguntou então:


- Você falou a sério, doutora? Realmente acredita que existem momentos e circunstâncias em que tirar a vida de um monstro é justificável?


- O próprio Estado acreditava nisso até há menos de duas décadas, quando a pena capital foi novamente abolida.


- Estou querendo saber a sua opinião, como pessoa, como médica e como mulher.


- Sim, acredito. Quando o ato é feito em nome da sobrevivência, para proteger a sua vida ou a vida de alguém.


- Só em casos de legítima defesa, então? - Os olhos de Gina se focaram nos de Minerva, tentando absorver as mínimas centelhas. - Acha que essa é a única forma justificável?


- Não dá para generalizar em um assunto como esse, Gina. Cada circunstância e cada pessoa pesam para definir a situação.


- Antigamente era preto no branco para mim. - disse Gina baixinho. - A lei. - Levantou um punho. - A violação da lei. - Levantou o outro. Então, com um longo suspiro, ela uniu os dois punhos, mantendo-os colados um ao outro. - Agora eu preciso lhe contar a história de Marlena.


Minerva não interrompeu a narrativa de Gina. Não fez perguntas nem comentários. Gina levou vinte minutos para contar tudo. Foi minuciosa e fez um esforço para parecer impessoal. Restringiu-se apenas aos fatos, sem emitir opiniões. Ao acabar, sentiu-se esgotada.


As duas permaneceram em silêncio, ouvindo alguns pássaros que gorjeavam, a fonte que gorgolejava, e vendo as nuvens escuras que passavam, de vez em quando, na frente do sol.


- Perder uma filha dessa maneira. - comentou Minerva finalmente. - Não há nada pior na vida. Não posso lhe dizer que os homens que fizeram isso com a menina mereciam morrer, Gina. O que posso lhe dizer, como mulher e como mãe, é que se a filha fosse minha eu celebraria suas mortes e demonstraria minha eterna gratidão ao executor. Pode não ser científico, pode não ser a lei. Mas é humano.


- Já não sei se estou defendendo a posição de Harry por acreditar que ele fez justiça ou porque o amo.


- E por que não pode ser pelos dois motivos? Você complica muito as coisas, Gina.


- Complico as coisas. - Ela quase riu e se levantou do banco. - Estou com três assassinatos que não posso investigar de forma aberta e lógica, a não ser que esteja disposta a ver o meu marido trancafiado pelo resto da vida. Nessa salada envolvi a minha auxiliar, um detetive eletrônico que mal conheço e agora você; estou cortando um dobrado para manter o idiota do Moody fora do xadrez. E eu é que complico as coisas?


- Não estou dizendo que as circunstâncias não são complicadas, mas também não há motivos para você absorver tudo do jeito que faz. Não há por que desligar o coração do intelecto.


Minerva limpou uma partícula de poeira de sua blusa e falou mais depressa:


- Agora, de minha parte, acho melhor você fazer uma requisição oficial para que Moody seja examinado. No meu consultório e amanhã mesmo, se possível. Vou realizar uma bateria completa de testes e enviar cópias do relatório para você e para o comandante Lupin. Se puder me passar os dados que reuniu sobre o assassino, começo a traçar o perfil dele hoje mesmo.


- Os dados extra-oficiais não vão poder entrar no seu laudo.


- Gina... - Agora era Minerva quem estava rindo, com um som musical e leve tão charmoso quanto a fonte. - Se eu não tiver a capacidade de apresentar um laudo psiquiátrico sem ser específica, é melhor devolver a minha licença. Pode acreditar, você vai ter o seu perfil e, se me permite garantir, é muito pouco provável que o meu trabalho seja questionado por alguém.


- Preciso disso com urgência. O assassino não espera muito entre um ataque e outro.


- Vou lhe entregar tudo o mais rápido possível, mas a precisão é tão importante quanto a rapidez. Agora, em nível pessoal, você gostaria que eu conversasse com Harry?


- Harry?


- Dá para ler através de suas defesas, Gina. Você está preocupada com ele. Preocupada com o seu estado emocional. Acha que ele está se culpando.


- Não sei se ele aceitaria conversar com você profissionalmente. Nem sei o que vai achar de eu ter lhe contado tudo isso. Quanto ao lado emocional, ele agüenta. - Começou a girar a aliança de casada. - Minha preocupação mais imediata é com a segurança dele. Não posso prever quando o próximo golpe vai chegar. O que sei é que Harry é o alvo final.


Gina tentou tirar aquela imagem da cabeça, sabendo que o medo ia acabar atrapalhando seu fluxo de pensamentos.


- Se puder entrar em casa comigo, doutora, eu lhe passo tudo o que tenho e marcamos os testes com Moody para amanhã.


- Certo. - Minerva se levantou e, para surpresa de Gina, enlaçou o braço com o dela enquanto caminhavam. - Adoraria uma xícara de chá.


- Desculpe, eu devia ter pensado nisso. Sou uma negação como anfitriã.


- Eu achava que já tínhamos passado do nível de anfitriã e convidada e entráramos no campo da amizade. Olhe ali, aquela não é Luna e seu simpático gigante saindo de um táxi na porta de sua casa?


Gina olhou na direção indicada. Quem mais, a não ser Luna Lovegood, podia vestir couro rosa enfeitado com penas verdes em pleno meio de semana? Ao seu lado Leonardo parecia imenso e magnífico, envergando um manto bordo que lhe descia até os calcanhares. Embora gostasse muito dos dois, Gina soltou um suspiro.


- Que diabos vou fazer com essas visitas?


- Acho que o melhor é tirar alguns momentos de folga e se divertir. - Com uma risada, Minerva levantou a mão e acenou para os recém-chegados. - Garanto que é o que eu vou fazer.


 


- Então vocês entendem, acho todo esse lance muito bizarro. Não tem nada a ver! - Luna se serviu de um cálice de vinho, gesticulando com ele para todos os lados enquanto circulava pela sala sobre plataformas de dez centímetros de altura. Minúsculos peixes dourados nadavam dentro de seus saltos transparentes. - Leonardo e eu estamos acompanhando todos os lances pelos noticiários. Já devíamos ter vindo até aqui, - bebeu mais um gole, gesticulando novamente - mas estou cheia de apresentações marcadas, agenda cheia, e ainda por cima ensaiando para as gravações que vão começar no mês que vem.


- Ela é magnífica! - Leonardo sorriu para Luna, com o rosto dourado e redondo brilhando de amor.


- Ah, Leonardo... - Luna jogou os braços em volta dele, apertando-o tanto quanto conseguiu. - Você sempre fala isso.


- E é verdade, minha pombinha.


Ela deu uma risadinha e afastou-se dele, girando e agitando as penas que lhe cobriam os seios e ombros.


- Enfim, - explicou ela - viemos aqui para dar o nosso apoio moral a Moody.


- Estou certa de que ele vai adorar a gentileza. - Já que não havia escapatória, Gina serviu-se de um pouco de vinho. - Aceita um cálice, Dra. Minerva?


- Não, obrigada, vou esperar pelo chá. Luna, essa roupa que está usando é um dos modelos de Leonardo?


- Sim. É mais que demais, não acha, doutora? - Ela girou o corpo de forma graciosa, balançando a cabeça e fazendo ondular seus cachos azul-arroxeados. - Precisa ver os modelos que ele está preparando para a coleção de primavera. O lançamento vai ser em Milão.


- Ficaria feliz em lhe mostrar uma prévia da minha linha voltada para as executivas modernas. - ofereceu Leonardo.


- Bem... - Minerva passou a língua sobre os dentes, observando as penas de Luna e reparando em seguida na virada de olhos de Gina. Aquilo a fez rir. - Não creio que eu seja uma modelo tão criativa quanto Luna.


- Creio que a senhora tem um estilo diferente, apenas. - O sorriso de Leonardo era doce e sincero. - Uma dama como a senhora prefere linhas clássicas, cores discretas. Tenho roupas de puro linho em um tom de rosa-acinzentado que ficaria perfeito para o seu tipo de mulher.


- Rosa-acinzentado. - repetiu Minerva pensativa.


- Leonardo faz roupas em estilo conservador muito bem. - comentou Luna. - Tipo senhora da mansão, só que com um apelo sexy, entende?


- Talvez eu deva dar uma olhada. - Uma sexy senhora da mansão, imaginou Minerva sorrindo.


- Olhem, aqui está ele! - Luna deu um pulo ao ver Moody que chegava, empurrando um carrinho de chá com generosas fatias de torta de maça e pedaços de bolo confeitado. Ficou vermelho quando Luna e suas penas o abraçaram com força. - Estamos do seu lado, Moody. Não se preocupe com nada. Gina é a melhor! Ela cuidou de tudo quando eu estive em apuros com a polícia. Agora ela vai tomar conta de você.


- Tenho certeza de que a tenente vai resolver o caso - disse, e desviou o olhar para Gina - de um jeito ou de outro.


- Ora, vamos lá, anime-se! - Luna o apertou com carinho. - Tome um drinque conosco. Quer um pouco de vinho?


Os olhos de Moody se suavizaram ao se voltar para o rosto agitado de Luna, e ele recusou, respondendo:


- Obrigado, mas tenho tarefas a cumprir.


- Ele ainda não decidiu se gostaria de dar palmadinhas paternais na cabeça de Luna ou pular em cima dela como um tarado. - murmurou Gina para Minerva, fazendo com que a médica tivesse que disfarçar uma gargalhada inesperada, fingindo que estava com tosse.


- Harry virá em seguida. - continuou Moody. - Está atendendo a uma ligação inter-estelar.


Luna seguiu atrás de Moody e o alcançou antes que saísse da sala, dizendo:


- Olhe, eu sei exatamente o que está sentindo. Já estive nessa situação, lembra? - Exibiu um sorriso torto. - Fiquei apavorada quando eles me prenderam, e em parte eu achava que iam me deixar esquecida ali para sempre. Só consegui superar o sufoco porque sabia que Gina jamais permitiria que isso acontecesse. Sabia que ela ia fazer tudo por mim, não importa o quanto custasse.


- A afeição que a tenente demonstra por você é uma de suas melhores qualidades.


- E você acha que só pelo fato de vocês não se darem muito bem ela vai deixar a peteca cair? - Seus olhos, que exibiam a mesma cor dos cabelos, ficaram redondos e tristes. - Nem pense uma coisa dessas, Moody. Gina vai correr atrás do assassino até cair durinha, e vai ficar do seu lado. Acho que você sabe disso. Se alguém o atacasse, ela se colocaria na frente só para receber o golpe em seu lugar, porque é desse jeito que ela é. Você sabe disso também.


- Não cometi crime algum. - disse ele, com dignidade, recusando-se a deixar transparecer qualquer vestígio de vergonha. - Esperava que uma detetive competente fosse capaz de deduzir isso, independentemente de seus sentimentos pessoais.


- Você está pra baixo... – disse Luna, com carinho. - Se quiser desabafar um pouco, ligue pra mim que eu venho correndo. - Colocando-se na ponta dos pés, beijou-lhe a bochecha. - E pode deixar que eu trago as bebidas quando vier.


- Aquele rapaz tem muita sorte de ter você ao seu lado. - Foi tudo o que Moody conseguiu dizer, antes de sair apressado pelo corredor e desaparecer por uma porta.


- Que belo gesto, Luna. - elogiou Harry, descendo a escada, indo em sua direção e pegando suas mãos de forma educada.


- Ele está arrasado, mas quem pode culpá-lo por isso?


- Quem consegue ficar arrasado por muito tempo quando você está por perto?


- Acho que minha missão é levantar o astral das pessoas. Vamos ver o que podemos fazer pelo grupo reunido na sala. - Lançou um sorriso para ele. - Quer que eu fique para jantar?


- Não aceitaria que fosse de outro modo.


Apesar das visitas, Gina conseguiu escapar por algum tempo e foi dispensar Rony e Hermione. Pegou seus relatórios e os arquivou para analisá-los mais tarde. Chamou Moody em um canto e, depois de uma conversa desagradável, convenceu-o de que era interesse dele se apresentar no consultório da Dra. Minerva às onze da manhã do dia seguinte, para se submeter a testes psiquiátricos.


Depois que todos saíram, sua cabeça latejava tanto que ela acabou recorrendo a um analgésico. Harry encontrou-a no banheiro, olhando com cara feia para as pílulas que colocara na palma da mão.


- A dor deve estar realmente insuportável para você pensar em tomar um remédio.


- Foi um dia longo. - disse ela, levantando os ombros e recolocando os comprimidos de volta no frasco. - Mas dá para agüentar.


- Podemos tomar um banho. Você precisa relaxar.


- Tenho trabalho.


- Gina... - Com firmeza, ele a segurou pelos braços e a virou de frente para ele. - Essa é a parte do seu trabalho que eu mais detesto. O ar sombrio e as olheiras que ele coloca sob suas pálpebras.


- Não estou conseguindo muito tempo livre neste caso.


- Dá para tirar uma horinha só para você. - Ainda olhando para ela, começou a massagear seus ombros, desfazendo os nós rígidos que encontrou na musculatura.


- Preciso ler tudo o que tenho para ver se pesco alguma coisa que possa usar no relatório oficial. Estou entrando em becos sem saída. - Sentiu que sua voz estava nervosa, e perceber isso a deixou ainda mais irritada. - Não consegui rastrear os medalhões com os trevos, e ainda temos o problema das imagens. Milhares delas estão à venda em lojas de artigos religiosos por todo o universo conhecido. Mesmo ao preço de quinhentas fichas de crédito por peça, ela é uma senhora muito popular.


Nesse momento tentou se afastar dele, mas suas mãos a seguraram.


- Tenho que levar alguma coisa para Lupin até amanhã. Contei toda a história à dra. Minerva.


- Sim. - Suas mãos fizeram uma pausa imperceptível, mas continuaram a massagear-lhe os ombros em seguida.


- Talvez devesse ter perguntado a você, antes de agir dessa forma, mas fiz o que achei necessário.


- Não precisa se desculpar.


- Não estou me desculpando. - E dessa vez conseguiu se desvencilhar dele. - Estou apenas informando. - Foi caminhando na direção do quarto. Até mesmo café de excelente qualidade era capaz de lhe causar um buraco no estômago. Apesar dessa possibilidade, Gina digitou instruções no painel do AutoChef, programando uma xícara. - Estou fazendo tudo o que precisa ser feito, e uma dessas tarefas é aconselhar você a aumentar o nível de sua segurança pessoal até este caso estar encerrado.


- Creio que a minha segurança é perfeitamente adequada.


- Se fosse assim, esse filho-da-mãe não conseguiria penetrar nos sistemas desta casa para enviar mensagens como se estivessem partindo daqui, nem reservar quartos de hotel e debitá-los de uma de suas contas de crédito, e muito menos atrair uma mulher, convencendo-a a vir da Irlanda até aqui em seu nome.


- Reconheço que tem razão. - Harry virou a cabeça, pensativo, e concordou. - Vou dar uma olhada pessoalmente na minha segurança eletrônica.


- Ótimo, é um bom começo. - Servindo o café em uma xícara, avisou: - Vou botar Moody na coleira.


- Como é que é?!


- Vou colocar um bracelete de segurança nele. - A fúria estava borbulhando e Gina já não conseguia impedi-la. - É para o próprio bem dele. Da próxima vez que eu encontrar um corpo, quero que ele tenha um álibi sustentável. Ou faço isso ou o levo preso. Acho que o bracelete de segurança é a escolha mais fácil.


- Talvez seja. - Harry chegou à conclusão de que conhaque ia descer melhor do que café. - Pretende me colocar na coleira também, tenente?


- Se eu tivesse certeza de que ia funcionar com você, pode estar certo de que era o que eu faria. Já que sei muito bem que você ia arrancá-la em menos de uma hora, seria uma perda de tempo.


- Bem. - Levantou o cálice de conhaque, fazendo um brinde. - Parece que conhecemos um ao outro de forma satisfatória.


- Acho que sim. - Gina respirou fundo. - Entrei em contato com o legista. Havia traços de tranqüilizante no organismo de Jennie.


- Ela foi estuprada? - perguntou Harry, olhando fixamente para o conhaque.


- Não, não há sinais de ataque sexual nem indicações de luta. Ela ainda estava desacordada quando ele prendeu a corda nela. Um outro medalhão, porém, foi encontrado pelo legista dentro de sua vagina. Também não houve sinais de emprego de força ou luta. Ele deve ter colocado o medalhão enquanto ela ainda estava inconsciente. Desculpe, mas estou contando essas coisas porque imagino que você está querendo saber dos detalhes.


- E estou mesmo.


- O relatório do legista indica que você requisitou o corpo assim que for liberado, já que a vítima não tinha nenhum parente direto.


- Sei que ela gostaria de voltar para a Irlanda.


- E imagino que você vai querer levar o corpo para lá, pessoalmente.


- Vou.


- Agradeceria muito se me avisasse quando seus planos para a viagem estiverem prontos. - A queimação no estômago pareceu lhe subir para o coração.


- E você achou que eu poderia simplesmente mandá-la de volta sozinha? - Ele olhou para Gina e as emoções que se misturavam em seus olhos lindos apunhalaram-lhe o coração. - Você achou que eu ia resolver tudo, lavar as mãos e seguir em frente com os meus negócios?


- Não. Agora tenho muito trabalho.


- Pelo amor de Deus!


Foi o tom de impaciência, frustração e uma pontada de deboche na voz dele que a fez girar o corpo, explodindo:


- Não me venha com esse papo não, meu chapa. Não tente fazer com que eu me sinta uma idiota. Você a amou. Tudo bem. Faça o que tem que fazer, pois eu vou fazer também.


Harry já estava xingando baixinho e com fúria no momento em que a agarrou. Até mesmo a pontada de deboche na voz desaparecera quando ele disse:


- Sim, eu a amava e as lembranças do que compartilhamos no passado são muito importantes para mim. Apesar disso, não são nem uma sombra perto do que sinto por você. Era isso o que estava querendo ouvir?


- Não sei o que há de errado comigo. - justificou-se Gina, sentindo um rubor de vergonha que tomou conta de seu rosto e acalmou-lhe a raiva. - Está tudo pressionando a minha cabeça. - Sentindo-se indefesa, levantou os dedos e os apertou sobre as têmporas. - Nenhuma das outras jamais me incomodou porque... não sei, simplesmente eu não me interessava por elas. Com Jennie eu me importo, e odeio estar sentindo ciúme, mesmo que por um instante, de uma mulher que está morta.


- Gina... - Harry colocou a mão no rosto dela, acariciando-o. - Desde a primeira vez em que coloquei os olhos em você, todas as outras mulheres deixaram de ter importância.


Isso só a fez se sentir ainda mais tola.


- Não falei aquilo para conseguir declarações de amor, Harry, eu simplesmente...


- Você é tudo. - murmurou ele, tocando com os lábios as duas têmporas que latejavam. - Você é a única.


A queimação que Gina sentia no peito voltou a arder, de forma doce e forte.


- Preciso de você. - Os braços dela o envolveram com força e sua boca se fundiu com a dele. - Por tantos motivos...


- Graças a Deus. - Aprofundou ainda mais o beijo, com cuidado e gentileza, até ouvi-la suspirar. - Vamos tirar aquela horinha agora. Juntos.


 


 


 


Agradecimentos especiais:


 


Bianca: O Harry fez mesmo justiça, mesmo que a lei não concorde muito com isso, mas as vezes é necessário algo mais efetivo do que a lei. O assassino está matando as vitimas de maneira muito parecida com o que Harry fez, embora ajam detalhes diferentes, mas na essência seu raciocínio está correto. O cúmplice do assassino tem laços com uma das vitimas do Harry e com o próprio assassino, e devo dizer que esse cúmplice encontra-se mais perto do que todo imaginam... Não, o garotinho encontrou-se com o assassino mesmo, o cúmplice oferece apoio e um local onde ele se estabelece antes de cometer os assassinatos... quanto ao garoto de Cerimônia mortal, que se chama Jamie se não me engano, aparece sim em pelo menos um dos volumes futuros... O Moody ainda vai cometer varias gafes no decorrer da história, fatos que apenas o incriminarão cada vez mais.. É, realmente os professores de faculdade são bem cruéis as vezes, eu mesmo tenho dois trabalhos para entregar quando retomar as aulas. Minha virada de ano também foi interessante, fiquei apenas cinco dias fora, mas foi o bastante para espairecer um pouco... Beijos e até o próximo capitulo.


 


Luisa Lima: Que bom que está gostando das minhas adaptações garota, espero que goste desse capitulo. Beijos.


 


 

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