Capitulo 4



Ela já estava no vestíbulo quando a campainha soou. Ensaiou uma máscara de fria indiferença e abriu a porta para os dois recém-chegados.
Contrastando com a palidez e o desinteresse de Gina, Margot parecia animada e cheia de vida. Cuidadosamente maquiada, não aparentava mais que trinta e cinco anos. Claro que a luz do sol não tinha piedade, e revelava as linhas indiscretas de seu rosto; mesmo assim, sua expressão revelava uma certa graça feminina que a fazia parecer muito mais jovem do que realmente era.
Mas foi o homem parado um pouco atrás de Margot que chamou a atenção de Gina. Já tinha visto a fotografia dele nos livros da mãe, mas não estava preparada para a poderosa presença física do escritor, muito mais perturbadora do que qualquer retrato poderia revelar. Por exemplo: na foto, o cabelo dele parecia mais claro; mas não daquele negro másculo. A pele era mais morena e contrastava com o verde profundo dos olhos. Não era de uma beleza extrema, mas sutilmente atraente, e parecia saber disso. Foi Margot quem quebrou o silencio.
— A sra. Weasley está nos esperando. Quer dizer a ela que estamos aqui, srta...
— Sou Gina – explicou, mesmo achando que Margot já sabia.
— Gina!- a surpresa foi sincera. — Santo Deus! Mas você era uma menininha da última vez que a vi.
— Faz só três anos, tia Margot – respondeu Gina, delicada, procurando aparentar maturidade. —Tenho vinte e um anos.
“Tia” Margot não gostou muito do tratamento, mas fingiu ignorar. — Pensei que fosse uma convidada de Molly. – olhou para Harry, embaraçada. — Querido, esta é Gina, a filha de Molly. Gina, este é o sr. Harry Potter.
— Como vai?
Gina foi forçada a apertar a mão que ele estendeu. Era uma mão firme, masculina, e Gina retirou a sua, depois de um breve cumprimento. Convidou-os a entrar.
— Que vestíbulo! – exclamou Margot, dramática, examinando o vestíbulo iluminado por duas janelas amplas. — Não é lindo, Harry? O corrimão esculpido é de Grinling Gibbons.
— É mesmo?
Gina sentiu uma profunda irritação. O que ela estava tentando fazer? Vender a casa para ele? Será que Margot achava que ele precisava dos conselhos dela? Que humilhante!
— Mamãe está na sala – disse Gina, que seguiu na frente dos outros. Pela primeira vez se arrependeu de não ter seguido o conselho da mãe e trocado de roupa. Sentia o olhar de Harry Potter preso nela, cheio de admiração, provavelmente imaginando que ela estava usando aquela calça comprida tão justa de propósito.
A sra. Weasley apareceu na porta da sala e Margot correu para abraçá-la.
— Molly, minha querida! – exclamou com sua efusidade natural. — Que bom ver você de novo. Parece cada vez mais jovem.
— Também estou contente em ver você de novo, Margot – a sra. Weasley retribuiu com sinceridade. — Bom dia, sr. Potter. Espero que Margot tenha dito que sou uma grande admiradora sua.
Gina deu um passo para trás, sentindo vontade de desaparecer. Pelas palavras da mãe, ela aparentemente havia esquecido a preocupação com os Hetherington. Era revoltante a maneira das duas adularem Harry Potter. Desesperada, virou-se para sair.
— Onde vai, Gina?
— Ia subir para me trocar, mamãe. – ao ouvir a voz severa da mãe, Gina parou, resignada. — Eu...eu...tenho certeza de que a senhora e o sr. Potter tem muitas coisas para conversar. Não vou demorar.
— Não demore – ordenou, seca, mostrando a desaprovação no olhar. — Vamos tomar um drinque e depois quero que você mostre a casa ao sr. Potter. Você conhece melhor que eu a história da fazenda. Gina ouviu em silêncio, mas não deixou de notar que a idéia também não tinha agradado a Margot. Harry Potter parecia indiferente a elas todas, examinando um quadro pendurado sobre a lareira com uma displicência que enfureceu Gina. Era como se King’s Green já pertencesse a ele.
Harry se virou de repente e encontrou o olhar de Gina preso nele. Sorriu com ironia, como se soubesse exatamente o que ela estava pensando e sentisse prazer em irritá-la. Harry Potter era tudo que ela detestava num homem: seguro, autoconfiante, cônscio do poder que exercia sobre as mulheres e indiferente aos sentimentos que despertava nelas. Sobre todas as mulheres não, pensou Gina com desprezo. Se ele pensava que ia fasciná-la, estava muito enganado. Virou-se sem baixar a cabeça e subiu a escada com toda a dignidade que conseguiu reunir.
Correu os olhos pelo guarda-roupa e escolheu um vestido leve, em que se combinavam o azul e o violeta, cores que realçavam seus olhos azuis. Calçou sandálias de saltos bem altos, deu algumas escovadas no cabelo macio e brilhante e deixou-o solto, caindo naturalmente sobre os ombros. Satisfeita com a imagem que via no espelho, desceu para enfrentar o desafio.
Ao se aproximar do grupo, ouviu Margot elogiando os quadros da coleção organizada por seu bisavô.
— Havia tantos artistas maravilhosos naquela época – ela dizia com entusiasmo. — Constable, Turner, Millet! E Gainsborough, claro.
— Sem mencionar Hogarth, Lawrence e Reynolds – acrescentou Harry Potter. — Está querendo me ensinar alguma coisa, Margot? Posso garantir que tive uma educação excelente.
— Claro que teve, querido – disse Margot, desconcertada.
A sra. Weasley falou qualquer coisa sobre o tempo para amenizar o ambiente.
— Há tanta paz nos verões de King’s Green... temo que sejam até pacíficos demais, sr. Potter.
— Pode parecer estranho, sra. Weasley, mas é exatamente essa paz que estou procurando – respondeu Harry Potter, se defendendo. — Ao contrario de Margot, não acho Londres estimulante, e espero o próximo verão com mais ansiedade do que imagina.
— O próximo verão? – repetiu a sra. Weasley, ansiosa. — Mas... eu... – calou-se ao ver a filha e pareceu aliviada por poder mudar de assunto. — Gina! – exclamou, satisfeita. — Já ia mandar chamá-la.
— Desculpem – forçou um sorriso para a mãe e para Margot, mal olhando para Harry, que se levantou da cadeira onde estava. — O almoço já está pronto?
— Não... Só depois que você mostrar a casa ao sr. Potter, querida – disse a sra. Weasley com firmeza, enviando uma mensagem muda com o olhar que só a filha entendeu. — Acho que seria melhor começar pelo andar de cima. Enquanto isso, Margot e eu vamos dar uma volta no jardim. Está de acordo, sr. Potter?
— Se sua filha não faz objeção – concordou Harry, sério.
Em silêncio, Gina o acompanhou até o andar de cima. Sentia o olhar dele e a irritação de Margot por ter sido excluída, mas ignorou todas as reações e começou a explicação:
— A construção da casa foi iniciada no reinado da rainha Anne, mas só terminou muito mais tarde. Desde essa época foram feitas várias alterações, inclusive algumas modificações na estrutura, no fim do século XIX. O projeto é atribuído a um homem chamado Nicholas Hawksmoor, um contemporâneo de Vanbrugh, mas não acreditamos muito nisso. O nome, King’s Green, deve-se a suposição de que o príncipe regente esteve hospedado aqui no inicio do século XIX, enquanto meu tataravô era vivo, mas...

Continua...

Comentem

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.