A Última Profecia



I



Gina sorriu. Haviam aparatado em algum lugar muito longe de alguma coisa. Não havia nada ao redor a não ser neve, grama e colinas. O lugar lhe pareceu um tanto familiar. Talvez fosse perto d'A Toca, pensou a garota.

- Pensei que fossemos para B. Hall - disse ela, divertida, olhando ao redor.

Tom ainda tinha os braços passados pela sua cintura.

- Não... Ainda temos vinte minutos da meia hora que eu falei - respondeu ele. - E então, achou divertido?

- Ah, demais - respondeu Gina.

- Graças à você, agora temos o pentagrama - disse ele calmamente, abraçando-a. - Sou muito grato.

Ela desvencilhou-se e virou para olhá-lo.

- Estamos do mesmo lado. Era meu dever - disse ela, sorrindo.

Beijaram-se brevemente.

- Está com fome? - perguntou ele.

- Um pouco, talvez - ela pensou em voz alta. - Não comi nada antes de sair.

- Ótimo. Vamos ao Beco Diagonal comer alguma coisa? - perguntou ele, como se sugerisse dar uma volta nos jardins de Basilisk Hall.

Ela piscou.

- Está maluco?! Devem estar nos procurando...

- Ah, ninguém está procurando duas pessoas que estão passeando pelo Beco Diagonal dois minutos depois de uma invasão à Hogwarts... - esclareceu Tom, sorrindo.

Ela pensou, depois sorriu também.

- Eu adoraria.

Ele colocou a mão no bolso.

- Mas primeiro... - ele tirou o pentagrama do bolso - vamos ver o que acontece se eu usar isto...

- Tom - chamou ela, em tom de aviso. Ele olhou-a.

"Cuidado", murmurou ela, os olhos fixos nele.

Ele fez um gesto com a cabeça para mostrar que tinha entendido, mirou a estrela dourada de cinco pontas na sua mão por um momento, depois fez sinal para ela afastar-se. Gina obedeceu, receosa.

Ele prendeu a respiração por um momento. Então levantou a corrente para cima da cabeça e colocou. Por um momento, Gina viu, não aconteceu nada, então...

O pingente começou a brilhar tanto que ofuscou os olhos dela. Ela não viu o que aconteceu, só sabe que no instante em que abriu os olhos, ainda não podia ver nada, mas aos poucos tudo foi entrando em foco novamente e ela viu.

Gina soltou uma exclamação em voz alta.

Parecia que os dois tempos dele haviam se fundido. Ainda continuava pálido e dono de cabelos negros e lisos, mesmo que agora estes batessem na altura dos ombros, mas quando abriu os olhos, Gina viu que eram de um vermelho intenso e de pupilas verticais. As vestes dele pareciam mais magníficas que nunca e a neve ao redor dele derretera.

Ele observou-a, com aqueles ameaçadores olhos vermelhos.

- O que foi? - perguntou ele. Sua voz continha agora um estranho tom grave que não havia antes, e parecia fazer um pequeno eco sobrenatural. Os pêlos da nuca dela arrepiaram-se.

- Você está diferente - murmurou ela, aproximando-se cautelosamente.

Olhando atentamente no rosto dele, percebia-se que não mudara muito - as sobrancelhas ainda eram as mesmas, assim como a boca e o nariz... Ele ainda era o Tom Riddle de sempre.

- Isso é incrível - sussurrou ele, estupefato, olhando para as próprias mãos.

- O quê? - perguntou Gina, mais perto agora.

- Nunca me senti mais poderoso em toda a minha vida - falou ele, ainda mirando as mãos. - Acho que nem precisaria usar a varinha, se tentasse.

- Bem, você já fazia isso, não? - perguntou ela, sem entender.

- Mas é diferente; sinto que pode ser mais fácil agora - disse ele em voz baixa, parecendo assombrado, mas feliz.

Ele olhou para ela. Gina sorria.

- Muito bem - disse ela, aproximando o rosto. - As coisas serão mais fáceis agora...

Eles se beijaram de novo. O beijo dele não parecia diferente de algum modo, mas foi mais excitante. Quando se afastaram um pouco, ele a segurou pelo ombro com uma mão e ergueu a outra para sua direita.

- Veja isso - disse ele ao seu ouvido.

Ele pareceu se concentrar por um momento, depois uma energia estranha e poderosa de desprendeu de sua mão estendida e varreu toda a neve até dez metro adiante em linha reta. Gina boquiabriu-se.

- Puxa! Isso foi interessante. Acha que eu também conseguiria fazer isso se estivesse usando o pentagrama? - perguntou ela, interessada, observando além da nuvem que a neve levantada deixou.

- Talvez - respondeu ele, inexpressivamente. - Então, vamos?

- Claro.


II



Eles voltaram bem uns quarenta minutos depois. Um bando de aurores adentraram o restaurante em que estavam e ficaram olhando insistentemente para os dois, embora não se pudesse dizer que tinham realmente reconhecido-os. Passado um tempo saíram. Pela janela, Gina não parava de ver bandos deles andando de um lado para o outro, deixando-a nervosa. Voldemort parecia irritantemente indiferente com toda essa movimentação. Então, passado um tempo, os aurores tornaram a entrar onde estavam e fizeram menção de ir até eles, talvez pensando que podiam pedir os documentos ou apenas chegar mais perto para se certificarem que eram mesmo eles. Mas antes que avançassem duas mesas, todas as outras já estavam virando para cima deles. Voldemort não se levantara nem fizera nenhum movimento exagerado. Apenas riu dos assustados aurores, virou-se para ela e disse que era hora de ir, então ambos desaparataram.

Fora a cena ridícula no restaurante, também tiveram que ver a reação dos Comensais da Morte em Basilisk Hall, assim que aparataram, que estavam pensando que ambos tinham sido pegos pela Ordem da Fênix e que depois começaram a reparar no novo visual de seu mestre. Bellatrix parecia bem aliviada em vê-los.

Passado uma semana, tudo já parecia ter caído na rotina. Embora todos ainda a cumprimentassem pelo esplêndido planejamento do caso Hogwarts, parecia ter acalmado um pouco, baixado a poeira.

Tom ainda estava pegando o jeito dos seus novos poderes. Inúmeras vezes Gina o vira tocar fogo em pergaminhos sem querer, explodir coisas como tinteiros e lanternas quando ficava muito tempo olhando para eles ou fazer coisas (e pessoas) voarem longe, sem saber como fizera aquilo.

Talvez fosse em conseqüência disso, mas Gina sempre pedia para que Tom retirasse o pentagrama quando cruzava a soleira do quarto dele. Não tinha vontade de ver o colchão pegando fogo ou qualquer outra coisa do gênero enquanto "brincavam".

Fora esse tipo de "imprevisto", tudo estava correndo perfeitamente bem. Ela pensava no futuro excitante que vinha pela frente, quando finalmente pudesse ter seu filho e ela e Tom pudessem criá-lo juntos.

Se pegou comentando isso com ele ao começo de uma noite, no quarto dela.

- Imagina como vai ser, Tom? - disse ela em voz baixa e feliz, enquanto afagava os cabelos dele com as pontas dos dedos, abraçados sob o endredon quente ao mesmo tempo que caía uma tempestade de neve lá fora. - Seremos eu, você e nosso filho. Finalmente, uma família de verdade. - Dissera isso com uma voz bastante sonhadora.

Ele acariciou delicadamente as costas dela, por dentro do pijama.

- Família - resmungou Tom, numa voz baixinha. - As famílias não são boas. Fazem a gente sofrer...

Gina não sabia se ele tinha consciência de que dissera aquilo. Olhou-o demoradamente.

- Não são do jeito que você está falando - respondeu ela, numa voz tão baixa quanto a dele. - Você é que não teve uma família o suficientemente boa.

Ele não ergueu os olhos para ela, mas deu ombros.

- Que família? - perguntou-lhe ele, ainda em voz baixa.

Fez-se um pouco de silêncio. Depois ela disse:

- Dessa vez vai ser diferente, prometo - falou Gina, tirando a mão do peito dele e passando por trás de suas costas, envolvendo-o num abraço apertado e caloroso. - Vamos ser uma família de verdade.

Ninguém falou nada por um momento. Gina começara a sentir pela primeira vez que talvez a vida dele fosse mais difícil do que a dela. Ela tivera uma família, não do jeito que ela queria, não tão compreensiva quanto gostaria, mas que cuidara dela, que a impedia de ser totalmente sozinha no mundo. Ele não. Ele não teve absolutamente ninguém, teve que se virar sozinho esse tempo todo. Ela não o culpava pelo rumo que tomara na vida. Qualquer um que vivesse a mesma coisa que ele fora obrigado a viver acharia tentador o lugar que ele chegara, mas somente ele tivera coragem o suficiente para tentar.

E conseguira.

Depois de algum tempo, ele disse:

- Sabe, Gina... Eu acho... É menino; digo, o nosso filho - completou ele, numa voz um pouco diferente da anterior.

- Como é que você sabe? - perguntou ela, franzindo a testa.

- Não sei - disse simplesmente. - Intuição.

Ela sorriu.

- Certo... Espero que você esteja certo.

Passado um tempo, suas mãos não conseguiam mais afagar-lhe os cabelos. Ela fechou os olhos serenamente e, sem mais nem ter consciência do que poderia estar fazendo, adormeceu.



O sinal batera. Tinha que fazer o que um monitor-chefe fazia e sair antes do que os outros para evitar confusões nos corredores - mas acima de tudo sair daquela sala de aula.

- Riddle, você fica. Quero dar uma palavrinha com você.

Maldição! Eu não quero falar com você, seu velho intrometido!

Olhou para os lados, depois no relógio. Não tinha como fugir.

- Certo, Prof. Dumbledore, se não for demorar muito. Tenho que estar na aula de Herbologia, sabe...

- A Srta. Jefferson pode dizer ao Prof. Trevers que você vai se atrasar.

Henrica olhou de relance para ele com um sorriso sarcástico, depois virou-se para o professor e disse que sim.

Enquanto guardava o material, a garota passou por ele em direção à porta, cantarolando baixinho de modo que apenas ele escutasse.

"...será que o meio-sangue vai ficar "tristinho" se levar uma detenção do Prof. Trevers?"

Fechou as mãos com raiva quando ela lançou um olhar de profundo divertimento antes de sair da sala. Ela não diria, sabia disso. Como odiava aquela garota!

Procurou acalmar-se. Voltou-se para o professor. Este esperou a turma toda sair e disse para sentar-se numa das carteiras da frente.

- O que é, professor?

Dumbledore encarou-o. Foi direto ao assunto.

- Você sabe que Hagrid não abriu a Câmara Secreta.

Ele piscou.

- Bem... Todos viram o monstro que ele estava criando, professor, ele...

- O monstro não
é uma acromântula - disse Dumbledore um pouco mais alto.

Tentou parecer intrigado, mas não disse nada.

- E Hagrid não é o Herdeiro de Slytherin - concluiu o professor.

- Por que não? - deixou escapar.

Dumbledore sorriu.

- Hagrid é da Grifinória, gosta de animais um pouco
diferentes , mas nunca faria mal à ninguém.

- Comovente - comentou baixinho, com ironia.

- Mas não é Hagrid que me interessa - continuou o professor como se não tivesse escutado, embora seus olhos faiscassem perigosamente. - O que me interessa é, como você, que sempre tirou notas realmente muito boas desde que chegou aqui, tenha tido uma notável queda de rendimento em todas as matérias no último trimestre do ano letivo passado. Suponho que tenha uma explicação para as notas horríveis.

Sentindo que se não se controlasse seria capaz de virar a mesa, fez força para ficar onde estava. Dumbledore tinha a desagradável mania de colocá-lo em situações apertadas; parecia saber que tinha estado ocupado demais para estudar no final do último ano.

Mais uma vez, não respondeu.

Dumbledore pareceu encantado com o silêncio dele, porque deu outro sorrisinho.

- E talvez você possa me explicar também porque é que um meio-sangue comum como você conseguiu entrar para a Sonserina, que é a casa mais rigorosa nesse assunto - disse o outro, ainda encarando-o insistentemente.

- Eu não posso responder isso, professor - respondeu, indiferente, mas cerrando os punhos com força.

- Claro que não, Tom. Seria confessar que você é descendente de Salazar Slytherin...

Então Dumbledore sabia. Era surpreendente, contudo... Foi a vez de ele sorrir.

- O que foi? - perguntou Dumbledore.

Seu sorriso ficou ainda maior.

- Você não tem provas contra mim - disse calma e ferozmente.

- Não, não tenho.

- E o que é que o senhor espera fazer? Me reprovar? - perguntou ironicamente.

- Não - respondeu o outro -, mas vou ficar de olho em você, Tom.

- Certo... Posso ir agora?

- Pode.

Levantou-se, pegou sua mochila e antes de sair, virou-se na porta.

- À propósito, à quanto tempo sabe disso? - falou, ligeiramente curioso.

- Ah, eu nem sonharia que sabia - respondeu o professor calmamente, parecendo encantado que ele ousasse lhe perguntar. - Mas, naturalmente, você acabou de me dar certeza... Eu apenas disse algumas coisas que andavam se tornando um pouco insistentes em minha cabeça depois que você deixou escapar que seu segundo nome era em homenagem ao seu avô, tendo eu estudado com Marvolo Slytherin quando tinha a sua idade e, bem, não posso fingir que ele era um santo. Mas, é claro, que se você negasse, teria se tornado claro demais para mim que eu estava errado, mas... Tenha um bom dia, Tom.

Totalmente perplexo, virou-se e saiu. Tinha tanta raiva que jurou para si mesmo que...




No dia seguinte, Gina acordou ainda nos braços dele. Sorriu confortavelmente, tendo-o ali, junto dela. Talvez a presença dele poderia significar que ele não dormira à noite, mas não lhe importava. Era raro acordar e ainda encontrá-lo na cama.

Ela espreguiçou-se e tocou de leve o rosto dele com a mão. Parecia preocupado, ou estava tendo um sonho muito ruim ainda à pouco. Ela aproximou-se mais. Ele se mexeu de um jeito vagamente estranho. Então, subitamente, abriu os olhos. Gina observou-os atentamente; tão escuros e ao mesmo tempo transparentes que chegavam a arrepiar.

- Oi, Gina - murmurou numa voz rouca.

Ela continuou encarando-o.

- Sonho ruim? - Gina perguntou, um pouco preocupada.

- Nada de mais - respondeu ele instantaneamente.

Ela se aconchegou em seus braços.

- A tempestade passou - disse ela.

- Verdade - confirmou distraído, passando a mão do mesmo jeito pelos longos cabelos dela.

Ficaram assim por algum tempo, até que ele parou de fazer-lhe a carícia. Deu-lhe um longo beijo no rosto, desvencilhou-se do calor do endredon e do corpo dela e levantou-se. Ela viu-o estremecer de frio.

- Não seja ridículo. Ainda temos quase uma hora até o café da manhã - censurou ela, mirando-o com desagrado.

Ele usava uma camisa preta de amarrar larga e as cordinhas estavam soltas. As calças também eram pretas e largas. A roupa sempre lhe dera um ar mais pálido do que realmente era - não que lhe ficasse mal; pelo contrário: dava-lhe um charme especialmente exótico - e agora mais do que nunca. Através dos cordões negros cuidadosamente cruzados, a camisa estava entreaberta e a pele dele contrastava violentamente com a cor da roupa, assim como seu rosto se contrastava com o negro dos cabelos. A única coisa que não combinava nem contrastava com nada em sua aparência eram os olhos. Seus olhos eram como Gina jamais vira em nenhuma outra pessoa. Eram de um cinza escuro e gélido, astutos e penetrantes. Quando ele ficava furioso, podia ver que seus olhos ficavam negros; completamente negros.

- Ah... O que foi? - perguntou ele, olhando de esguelha para ela enquanto se trocava. Ela estivera observando-o se trocar de um jeito um tanto quanto insistente e desconcertante.

- Nada - Gina respondeu sem rodeios, com um sorriso.

Quantas não querem ter um homem desse, ela pensou, correndo os olhos pelo corpo dele, indiferente ao olhar de censura dele sobre ela. Por fim este acabou se virando para terminar de se vestir, fazendo-a sorrir com mais vontade do que nunca.

Ela sentou-se na cama e ficou olhando. Com uma pontada de susto lembrara-se da profecia. Talvez estivesse para perdê-lo para sempre; talvez em breve não o teria mais... nunca mais...

Tom terminara de vestir-se e virou-se para ela. Cerrou as sobrancelhas, intrigado.

- Você está muito estranha, Gina - disse ele.

Por um momento Gina ficou olhando, aturdida, para ele, sem dizer nada, enquanto via-o virar-se e desaparecer na porta do banheiro. Se fosse isso que a esperava... Viver sem ele... Essa idéia a assustava mais do que qualquer coisa... Já se acostumara a ser a garota dele, a ser a mulher dele...

Ele saiu do banheiro, parou defronte ela e beijou-lhe atenciosamente. Depois, como Gina não dissera nada, endireitou-se e saiu, deixando-a sozinha no quarto.


III



Estava na sala de planejamentos. Uma única vela ardia na sala, na ponta da mesa grande, em meio à escuridão. Já era tarde da noite.

Quem me dera terminar isso logo, pensou, reprimindo um bocejo. Olhou no relógio - meia-noite.

Esfregou os olhos. Tornou a olhar para o pedaço de carta inacabada. No pálido do pergaminho, letras negras e borradas tremeluziam à chama da vela.

Com resignação, molhou a pena na tinta e pousou no papel, retornando a desenhar letras forçadas. Foi quando ouviu um barulho.

Parou abruptamente o que estava fazendo, escutando. Então, procurando a fonte do ruído, viu recortado contra uma das vidraças e soube o que era. Instantes depois, uma coruja branca pousava na mesa defronte de si.

- Como foi que você me achou? - perguntou instintivamente, levando mão até a carta que ela trazia amarrada na perna.

Abriu a correspondência e estendeu na mesa para ler à luz. Achou que seus olhos não estavam vendo direito. Talvez seja o sono, pensou. Piscou e leu novamente.

Sentiu o sono abandonar-lhe na hora. Leu e releu a carta novamente. O que vinha escrito não era uma coisa comum, era...

A porta da sala se abriu lentamente com um ruído abafado. Viu recortado contra a luz dos archotes do corredor a silhueta de alguém jovem com longos cabelos lisos. Este parou, a mão na maçaneta, olhando para a direção onde estava e falou:

- O que faz aqui à essa hora da noite? Venha dormir... Você não parece muito bem, sabia?

De repente parou de falar. No escuro, não conseguia discernir o que olhava. Fechou a porta e encaminhou-se no escuro em sua direção.

- Edwiges - disse ela, parecendo perplexa. - O que faz aqui?

A coruja piou baixinho, piscou os grandes olhos âmbar e voou para ela.

Tornou a abaixar os olhos para a carta. Cerrou as sobrancelhas e fechou os olhos, lívido. Não podia dar a resposta agora.

Abriu os olhos.

- Eu estou falando com você!

Aturdido, levantou os olhos.

Na sua frente, Gina Weasley mirava-o, meio assustada, meio curiosa.

- Ele quer uma resposta? - perguntou, mas não olhava para a garota, e sim para a coruja em seu ombro. Edwiges deu um pio baixo.

Tornou a olhar para a carta por um momento. Precisava decidir... Precisava de tempo.

Pegou um pergaminho em branco, dobrou-o e escreveu:




Dê-me uma semana.



Observando a resposta vagamente, fez sinal para a coruja, e ela voou de volta para a mesa. Amarrou o papel na perna da coruja e soltou-a. A coruja branca sacudiu as penas e levantou vôo, diretamente para a vidraça entreaberta no alto.

- Vai me dizer o que está acontecendo? - perguntou Gina, a voz hesitante.

Ele não levantou os olhos para ela.

- O que Harry quer com você? - perguntou ela novamente.

Respirou fundo e continuou mirando a carta, sem lê-la.

- Me deixe sozinho por um instante - disse a ela.

Ela parecia relutante a obedecer. Ficou parada, olhando-o por um tempo.

- Estarei te esperando, tudo bem?

Ele deu aceno com a cabeça. Ela virou-se para sair.

- Gina - chamou em voz baixa e ela virou-se. Observou-a longamente, desde o topo de sua cabeça ruiva até seus pés com chinelos pretos. Desejou que não tivesse que decidir. Ela abriu a boca para perguntar. Ele fitou-a nos olhos, pouco antes de desviá-los rapidamente. - Feche a porta quando sair.

Se ela ficou desapontada com a resposta, ele não viu. Passado alguns segundos, escutou a porta bater suavemente. Olhou novamente para a carta.

- Uma semana, Harry Potter - disse para a carta. - Uma semana...

Suspirou, levantou a carta nas chamas da vela e tocou-a com o pergaminho. Observou lentamente o fogo consumi-la, até que só restava as cinzas escuras.

Lá fora, um relâmpago iluminou as vidraças no alto. Ao mesmo tempo, as cinzas eram varridas de cima da mesa com uma repentina rajada de vento.

As chamas da vela extinguiram-se com um sopro.


IV



Gina estava quase sozinha no castelo. Tom e o restante do grupo cinco haviam saído à serviço, juntamente com o grupo quatro e seis. Não havia mais nada para se fazer. Foi dar uma volta nos jardins.





Sete horas mais tarde, ele aparatava em Basilisk Hall. Tão cansado que estava que seguiu direto para seu quarto.

Bosta de neve, pensava com irritação, enquanto atirava as botas longe.

Despiu a roupa molhada e entrou no banheiro para tomar um banho quente. A água que caía na banheira fazia tanto barulho quando ele entrou que não escutou a batida na porta. Fechou os olhos e tentou relaxar o máximo possível.

Meia hora depois já conseguira esquecer todos os seus problemas, o que era uma grande coisa. Mas já ficara tempo suficiente no banho; tinha assuntos à tratar. Passou a mão na toalha e levantou-se.

Enquanto enxugava os cabelos, pela terceira vez aquela tarde, bateram na porta.

Vestiu o robe e foi atendê-la.

Sua surpresa foi ocultada rapidamente quando viu Grabby, o elfo-doméstico à porta.

- O que foi? - perguntou rispidamente.

O elfo parecia aterrorizado com a idéia de falar com ele. Fez uma grande reverência e logo olhou temeroso para ele.

- Grabby veio trazer uma carta para o senhor, meu senhor - disse a criaturinha com sua voz aguda e irritante. Grabby adiantou-lhe um envelope amarrotado. - Grabby ia entregar à Srta. G.W. quando chegou, meu senhor, mas Grabby não achou ela.

Ele apanhou a carta. Imediatamente soube de onde vinha.

- Muito bem - falou, tirando os olhos do envelope e detendo-os no elfo. - Agora volte para a cozinha.

O elfo fez outra reverência, mas ele não esperou para ver tudo. Fechou a porta, sentou-se à mesa perto da lareira e rasgou o envelope.

Uma lida rápida na carta mudou sua expressão.

Isso não... Não agora, pensou, desesperado, enquanto terminava de ler.

Com um sobressalto, houve outra batida na porta.

Ele atirou a carta na mesa e olhou para a fechadura, como se desejasse estraçalhá-la em mil pedacinhos.

- O que é agora? - gritou para a porta.

- É Joe Groover - respondeu uma voz sarcástica à porta. - Foi pego por um dos nossos mandando uma carta para o Ministério da Magia.

Sentindo uma grande fúria, enfiou a carta no envelope de qualquer jeito, levantou-se e vestiu-se às pressas. Dois minutos depois, saía do quarto pensando "Por que tudo isso agora?".



Por que parece que tudo está saindo de sua rota agora?, se perguntava Gina Weasley na sua cadeira na mesa comprida da escura sala de planejamentos, enquanto Lúcio e Rodolphus discutiam em altas vozes às suas costas. Bellatrix roçava a ponta do nariz com a pena distraída, sentada na sua frente. Athena Evrard, Narcissa e Lutiannis estavam entretidas em uma conversa séria ao seu lado e Romulus Challanger e Jack Miller cochichavam alguma coisa na ponta mais escura da mesa. Apenas mais uma pessoa além dela mesma e de Bellatrix estava calada: Tom.

Estava em uma das pontas da mesa e olhava para um ponto fixo na mesa, perto do castiçal da vela mais próxima. Tinha uma expressão desolada no rosto e não estava encostado na cadeira, como o de costume.

Ela levantou-se e foi sentar-se duas cadeiras adiante, perto dele. Só o que fez foi pegar sua mão.

Ele não olhou de imediato, mas então seus olhos se moveram de onde estavam e se deteram nas duas mãos entrelaçadas, o que ficou mirando por algum tempo.

- O que está acontecendo? - perguntou à Tom em voz baixa. Os olhos dele não se moveram.

- Nada - respondeu, numa voz ainda mais baixa do que a dela.

- É claro que está acontecendo - disse Gina, com preocupação. - Você está estranho, Tom. Nem lançou uma Cruciatus no Groover antes de matá-lo. É claro que está acontecendo algum coisa.

Pela primeira vez aquela noite, ele olhou-a no rosto. Então sorriu.

- Impressão sua, Gina - disse-lhe com um sorriso forçado. Então olhou para o outro lado da sala e gritou - Calem a boca, vocês dois.

Lúcio Malfoy e Rodolphus Lestrange pararam de falar abruptamente.

- Pode levar esses papéis no meu quarto, Gina? - perguntou ele, tornando-a virar-se para ela.

Ela mirou-o por um instante, depois concordou com a cabeça.

Levantou-se, deu-lhe um beijo carinhoso e se virou para pegar os papéis. Pouco depois saía da sala, mascarada.

Era impressão dela ou ele estava agindo de modo estranho desde que Edwiges lhe trouxera a carta, no começo da semana? E o que estava lá escrito que ele não quisera lhe contar? Por que Harry entrara em contato com ele?

Essas perguntas ela não podia responder. Harry lhe escrevera algo à ponto de deixar Lord Voldemort preocupado, e isso não era comum; muito pelo contrário, Gina nunca o vira tão preocupado à ponto de calar-se, ao invés de explodir com mais facilidade do que o normal. Era a coisa mais estranha que ela podia presenciar.

Chegara na porta do quarto quinze do segundo andar da Ala Oeste. Papou, mirou a superfície lisa e escura da madeira e disse:

- "Lugribluby". - A porta se abriu com um rangido.

Entrou no quarto cantarolando e se imaginando de onde raios ele tirara idéia para aquela senha ridícula. Despejou a braçada de papéis na mesa e virou o porta-penas, arrumando. Ia saindo quando algo prendeu sua atenção.

Dobrada e enfiada no envelope de qualquer jeito, estava uma carta amarelada atirada no meio da escrivaninha. Por algum motivo Gina não conseguia desviar os olhos do envelope; tinha no lacre de cera verde, a marca de duas serpentes circundando um "R".

Ela apanhou-a: a não ser que muito se enganasse, era o emblema do Ordem na Romênia.



Afundou o rosto nas mãos. Problemas, problemas e mais problemas. Por que agora, quando parecia que tudo estava indo bem? Certamente que não estava se sentindo bem. Aquele sonho, aquelas cartas... À qualquer momento agora... Faltava apenas um dia do prazo que requisitara para responder... Á qualquer momento agora... Ela teria que saber; não conseguiria ocultar por muito tempo, e já faziam dois dias.

Ele prometera à ela que nada aconteceria... E quebrar promessa que fizera à ela não era a mesma coisa que seria se fosse com outra pessoa. Ele realmente gostava dela...



Sua perplexidade se afunda de acordo com que ia lendo a carta. Seus olhos percorriam rapidamente pelas letras rápidas e descuidadas na superfície meio amassada do papel amarelado. Algumas frases se destacavam no meio do recado quase ilegível com a pressa da caligrafia.


"Mestre, apesar de todas as precauções que tomamos, não foi possível..." "...houve um imprevisto..." "...aconteceu um erro no plano, não era para acontecer..." "...o prédio inteiro desabou..." "...tinha um monte de gente lá dentro, dois dos nossos já eram..." "...Carlos Weasley está morto..."




Ela perdeu o fio do pensamento; ficou ali, com a carta na mão, parada em pé, mirando-a sem sequer lê-la. Carlos Weasley... morto?. Não era possível.

Mas a verdade parecia invadi-la, contra a vontade.

Ela não veria Carlinhos de novo.



Era quase insuportável o sentimento que o atormentava. Era culpa. Culpa e raiva. Raiva dos incompetentes que deixaram que aquilo acontecesse; raiva dos seus malditos e estúpidos seguidores que estavam na Romênia. Sentia vontade de matá-los também.

Como iria contar a ela? Como iria dizer que falharam?, que seu império, seu magnífico império, não era perfeito? Como iria dizer à ela que o irmão que ela tanto gostava fora morto devido um erro idiota, uma falha, um acidente inescrupuloso? Sentia um ódio violento.

Um tinteiro sobre a mesa explodiu, salpicando a madeira de tinta preta e estilhaços de vidro. As chamas das velas que entravam em seu campo de visão cresceram, esticando-se para cima ameaçadoramente. O vidro de um retrato na parede oposta aos seus olhos trincou e desprendeu, espatifando-se no chão. Ouviu os rolos de pergaminho na estante às suas costas desabarem. Suas mãos fortemente fechadas sobre a mesa agora estavam abertas, e deixavam uma profunda marca incandescente na superfície do móvel.

Mas não tinha consciência de nada disso.

As pessoas ao redor gritavam. Gritos de medo, de pavor. Isso o agradava. Queria que todos eles sofressem, que sentissem dores horríveis, que suplicassem piedade... Odiava à todos eles.

Ele não via que estava demolindo a sala de planejamentos - estava ocupado demais saboreando os gritos dos Comensais da Morte. Ah, se soubessem o que ele estava sentindo...

Comensais da Morte?, pensou ele, de repente. Não, não eram os Comensais da Morte que ele queria castigar. Era o infeliz que tomava conta deles. Quem era esse idiota? Quem era esse cretino que deixa essas aberrações soltas por aí? Quem era a criatura tola que deixava que essas imitações de seres humanos entrassem na casa dos outros e matassem os irmãos delas? Esses sou eu, pensou, com desgosto; Esse canalha sou eu.

Então ouviu a porta, que se abrira com violência, e virou os olhos.

Se havia mais uma pessoa naquela sala que não tinha consciência do que acontecia ao redor, era a pessoa que acabava de entrar. No momento me que fixou os olhos nela, sentiu sua raiva ir desaparecendo rapidamente e sendo substituída por pavor. Algo no olhar dela dizia: ela descobrira.

Levantou-se sem ver. Ainda encarava-a, sem saber o que dizer. Gina ainda olhava-o com raiva, próxima à porta.

- Seu filho da mãe - grunhiu ela, os olhos faiscando, a voz trêmula de ódio ou dor, ele não saberia dizer.

Não conseguiu dizer nada.

Gina cruzou a sala com passos duros e rápidos, e parou na sua frente, atirou um envelope na mesa, como se quisesse que o mesmo se estraçalhasse. Não precisava olhar, sabia qual era.

- Como me explica isso? - disse ela com a voz ainda muito trêmula e brava. - Você mentiu para mim!

Tinha que falar, que explicar que não fora sua culpa, que acontecera..., mas não conseguia, não podia, não acreditava...

- É TUDO SUA CULPA! - explodiu a garota, furiosa, apontando para ele, seu rosto exprimindo mais ódio do que ele jamais vira. - VOCÊ PROMETEU QUE NADA ACONTECERIA COM ELES, SEU COVARDE, VOCÊ PROMETEU!

Ele não conseguia mais encará-la. Chegava à ser insuportável.

- É TUDO SUA CULPA! É TUDO SUA CULPA! SUA CULPA! - gritava ele, fora de si.

Sua cabeça latejava estranhamente e os gritos dele machucavam mais do que qualquer coisa. Queria dizer "foi tudo minha culpa", mas não conseguiu. Não conseguia falar nada.

- OLHE PARA MIM! POR QUE FINGE QUE NÃO ME OUVE? OLHE PARA MIM, SEU DESGRAÇADO! - berrou, e, com um tapa estridente no rosto, fê-lo olhar para ela. Agora haviam lágrimas em seus grandes olhos castanhos.

Ficou parado, mais confuso do que nunca. Ninguém nunca ousara lhe bater antes. Parecia um tanto obtuso, parado ali, deixando que ela o humilhasse.

- ELE ESTÁ MORTO, TOM! VOCÊ PROMETEU QUE NADA ACONTECERIA À ELES! VOCÊ ESTÁ ME OUVINDO, SEU CRETINO? ELE ESTÁ MORTO!

Demorou um tempo para perceber que ela estava lhe batendo. Segurou seus pulsos instintivamente, embora ela não estivesse lhe machucando, realmente.

De repente, ela parou de fazer força, de resistir contra ele, da tentativa de impedi-la de esmurrá-lo. Ela caiu em um choro desesperado, desabando sobre ele. Depois de mais um momento de confusão, compreendeu. Compreendeu o que ela sentia e quis confortá-la. Abraçou-a. Sabia que ela só queria uma palavra de consolo.

Por cima da cabeça dela, olhou tristemente a parede.

- Me desculpe, Gina. Eu não pude impedir.

Ela já sabia de tudo. Agora, embora Voldemort soubesse que não pudera evitar, ainda sentia-se culpado. Que importava que os outros estivessem olhando? Que importava que estivesse mais envolvido com Gina Weasley do que devia? Ele quebrara a promessa, tinha que pagar...

Mas, além disso, outra coisa se tornou mais clara do que nunca em sua mente. Estava na hora - ele decidira.


Nota: Valew, Raisa, pelo comentario! ^^ Como eu disse antes, estarei postando na medida do possivel... COMENTÁRIOS, PLEASE!!!!!!!!

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