O sétimo elemento
Rony, Hermione e Harry estavam debruçados sobre livros na biblioteca. A garota conseguira arrastar os dois amigos para um período de leitura reforçada já que os exames se aproximavam. Até então, os três trocavam constantes comentários a respeito das notícias da guerra, uma luta mais de desgaste de nervos do que de ataques. Voldemort e os Comensais pareciam estar bem quietos e eles tentavam entender a razão disso. Mas agora não havia mais tempo para se dedicar a palpites. “O momento é de estudos”, martelava a garota. O problema é que a vontade de ler os capítulos separados por Mione era zero. Harry fazia algumas anotações num pergaminho.
- Já sei por que poucos bruxos viram aurores. É porque eles têm de se matar de estudar. Francamente, acho que não vou precisar de metade disto.
- Não reclame, Harry. Você pode ir muito bem na parte prática, mas a teoria também é importante.
- É claro que é. Pegue um livro desses e arremesse na cabeça de um Comensal. Aposto que ele desmaia na hora – tripudiou Rony.
Harry riu da piada, porém Hermione manteve a seriedade. Então, o rapaz lembrou-se de que tinha um compromisso.
- Está na minha hora. Tenho uma reunião com o professor McKinley.
A sala do professor de Defesa Contra a Arte das Trevas estava repleta de pergaminhos, mapas e livros muito velhos. Quem entrava no recinto poderia se imaginar num museu. McKinley era um homem curvado, magro e com uma barba branca cortada bem rente à pele. Tinha olhos vivos e cinzentos. E seus cabelos armavam-se em caracóis semelhantes a flocos de algodão. Quando Harry chegou, ele lhe entregou um pesado volume que devia ser centenário.
- O que é isto, professor?
- Uma obra tão antiga que nem mesmo os velhos conseguem se lembrar dela direito. Traz informações de todas as criaturas que habitam o submundo.
- Submundo?
- Sim, Harry. Submundo. Uma terra habitada por criaturas tão antigas quanto a Terra. Quer dizer, não são tão antigas. Mas posso garantir que elas chegaram primeiro que os homens.
- Nunca ouvi falar nada disso.
- Acredito. Muita gente não fala mais nisso. É um assunto velho, para gente velha. Ou vira assunto para amedrontar criancinhas sapecas. Algumas mães bruxas ainda dizem para os filhos que uma criatura do submundo virá buscá-los se não se comportarem. Não é um absurdo – riu o professor.
- Que tipo de criatura? Um dragão?
- Não. São mais terríveis do que dragões. Mas algumas até que se parecem com os dragões. Veja no livro...
- E essas criaturas existem? Ou sumiram como os dinossauros? – interrompeu Harry.
- Quem pode ter certeza? Quando eu tinha a sua idade, sempre circulava um boato de que uma ou outra tinha sido vista. Iam verificar e não era nenhum ser do submundo. Normalmente, era uma criatura mágica como o monstro do lago Ness... Oh, pobre Nessie, tão meiga e tímida. Mas está vendo? Naquela época já confundiam alhos com bugalhos – riu McKinley, que tinha uma notória mania de repetir expressões trouxas, como ele mesmo gostava de alardear.
- E por que o senhor está me dando este livro? Acho que eu já tenho material suficiente para estudar neste ano – disse num tom aborrecido.
- Conversando com Alvo sobre a carta de Ingrid Fulton, pensei nos velhos boatos da minha infância sobre as criaturas do submundo. Diziam que havia uma passagem para o submundo. Talvez, Harry, talvez Voldemort esteja procurando essa passagem para abri-la e se associar a esses seres antigos, se é que eles existem.
Os olhos de Harry brilharam. Ao menos, uma pista para seguir. O jovem segurou com mais firmeza o pesado livro entregue por McKinley. No rosto de professor, porém, se formou uma forte ruga na testa, sinal de preocupação.
- Mas temos um problema, rapaz. Nós não sabemos como localizar a tal passagem. Estúrgio Podmore e Mundungo Fletcher tentaram descobrir alguma coisa. Não tivemos sucesso, infelizmente. As histórias são muito antigas e ninguém se recorda de muitas referências. Investigamos todas as possíveis e não encontramos nada.
O garoto bufou, irritado. A todo instante experimentava essas sensações. Estava com a paciência no limite. Esperava ansiosamente por um movimento do inimigo, que não vinha. E isso só o deixava mais nervoso. Encontrar primeiro a tal passagem seria um trunfo e tanto para ele e para a Ordem. Pensou que o “segredo” citado na carta de Ingrid deveria ser a chave para localizá-la. Voldemort já o teria em mãos? E se o tivesse, teria libertado alguma criatura? E se houvesse algum ser maligno pronto para atacá-los, o que fariam? Voltou sua atenção para o livro.
- Que diferença faz ter este livro? Se eu me encontrar com algum ser do submundo devo matá-lo sufocado pelo pó que cobre estas páginas? – disse, incorporando o estilo de Rony.
- Leia esse material. Ele traz informações valiosas. Eu já conheço o que preciso. Para você, pode ser útil - e sorriu. - Ótimo que possa fazer piada do perigo.
Harry não estava achando sua vida muito engraçada ultimamente. Se não fosse pelo desejo de se tornar auror, abandonaria imediatamente os estudos para se juntar aos membros da Ordem que procuravam pistas de Voldemort.
- Desculpe a ironia, professor. Mas é que não é fácil ter de estudar e ao mesmo tempo me preocupar com a guerra. Eu sei que preciso terminar Hogwarts. Sinto que é minha única obrigação no momento. Só que eu também sei que uma hora eu terei de me confrontar com Voldemort. Essa espera está acabando comigo – desabafou.
McKinley retirou o livro das mãos do bruxo e começou a limpar o grosso volume.
- Para nós também está muito difícil - suspirou. - É possível que Molly Weasley esteja certa. Ela sempre foi contrária à idéia de te informarmos os rumos da Ordem. E da guerra. Não comece a fazer essa cara. O objetivo dela é te aliviar dessa carga que você carrega nos ombros. Molly é uma boa mulher, embora exagere no instinto maternal – e piscou um olho.
- Detesto quando dizem isso. Alívio de carga?! Por pensarem desse jeito é que... Bom... Se eu soubesse de tudo... ahn... Eu não teria... você sabe. Eu não me deixaria enganar e... Sirius... – engoliu em seco e prosseguiu, fazendo força para não se emocionar. - Ele poderia... acho que ele poderia... Eu não me deixaria enganar.
O professor apenas ajeitou os óculos sobre o nariz. Percebia que Harry estava absolutamente vulnerável naquele momento. O rapaz continha ao máximo a emoção. Suas mãos trêmulas e os olhos brilhantes davam sinais disso. Qualquer palavra a respeito do episódio poderia derrubá-lo. McKinley decidiu falar mais a respeito do conteúdo do livro.
- Sei que já tem bastante coisa para estudar. Mas dê um jeito para folhear um pouco este livro. Além de falar das criaturas do submundo, ele esclarece uma série de pontos da magia antiga. São lições que os bruxos adultos de hoje estão esquecendo e os novos desconhecem.
- Talvez a Hermione conheça.
- Duvido. Este livro estava intocado na biblioteca havia décadas. Recentemente, uma pessoa pediu que eu o liberasse para leitura e não foi a senhorita Granger.
-Não? Quem mais pediria um livro dessesi?
- A senhorita Weasley.
- Gina? – espantou-se. – Mas por que?
- Oh, é verdade. Você a conhece. Ela é irmã de seu amigo, não é?!
- Ela é minha amiga também. O que a Gina queria com esse livro?
- Você deve saber que ela é a sétima criança da família.
- E daí?
- Certo. Por si só, esse fato não representa grande coisa, mas não se esqueça da mística que envolve o número sete. Ainda mais quando se trata do nascimento de uma mulher em muitas gerações. É exatamente o caso de Gina.
- Mística de um número? Acredito tanto nisso quanto acredito em adivinhação.
- Não deve mesmo acreditar em qualquer mística e nem em qualquer adivinho. O interessante em relação à sua amiga é que ser o sétimo filho e ser a primeira mulher são combinações que podem resultar em algo mágico. A gente só precisa saber para que isso servirá – riu.
- E como saberemos? – perguntou intrigado.
- Só saberemos na hora certa. É impossível obter essa resposta agora. Tive essa conversa com a Gina antes de entregar o livro. Acho que por essa razão ela preferiu deixá-lo para trás. Ou será que o tamanho dele a assustou? – perguntou enquanto examinava o tomo que deveria ser carregado com as duas mãos por ser muito pesado.
O rapaz não se importou com a pergunta.
- Que bobagem essa história do sete – impacientou-se. – O mundo não pode ser regido por um número.
- Harry, não é o número. É a mística. Vou tentar explicar. Sempre falamos dos quatro elementos água, fogo, terra e ar. Não falamos? Eles são realmente poderosos quando empregados na forma correta. São fundamentais para poções. Mas não são os únicos elementos da magia. Conhece outros, Harry?
- Isso é algum teste?
- Não, claro que não. Se olhar no livro, porém, você terá a resposta. Oh, está bem. Eu digo agora. Sangue é muito importante. Você sabe disso. E o correspondente dele no reino vegetal, a seiva, também. Não é difícil de entender, não é?!
Harry apenas sacudiu a cabeça. McKinley ergueu uma sobrancelha, instigando-o a falar.
- Certo. Agora, qual é o sétimo elemento?
- Eu esperava que você arriscasse um palpite.
O jovem bruxo chutou “cinzas”, apenas por chutar. O velho professor negou. “A cinza é o produto do fogo”. Ouro foi o palpite seguinte. “Não. Trata-se de um minério. E o minério está representado pela terra”.
- Unha de dragão – ironizou o estudante.
- A parte pelo todo, Harry! O sangue é o todo. Ele representa o reino animal. Mas unha de dragão é uma parte do organismo que serve bem para fazer um ungüento contra dor nas costas. Se você tivesse dito folhas ou raízes, mais uma vez seria a parte pelo todo. O que interessa aí é a seiva. Vamos. Tente de novo.
- Energia elétrica!
- Hum, bela tentativa. A energia elétrica não faz diferença para o nosso mundo, embora seja vital para os trouxas. Mas você pode vê-la como fruto da ação da água. Pense no homem, Harry. O que nos torna diferentes perante os demais seres da natureza?
- A inteligência.
- Também. Mas ela é representada pelo sangue. É esse líquido que transporta ingredientes que fazem nosso corpo funcionar. Sem sangue, não há inteligência. Sem sangue, não existimos. Mas por causa de um outro elemento, Harry, podemos existir de uma outra forma, como se estivéssemos em uma dimensão diferente. É o que acontece com...
- Nick Quase-Sem-Cabeça. Ele é um fantasma. É um espectro... um...
- Espírito? Sim, ele é. Esse é o sétimo elemento do nosso mundo. Lembre-se, rapaz, dentro de nós há um espírito, uma alma, uma essência, qualquer nome que queira dar. Na magia antiga, isso é chamado de espírito. Outros podem dizer que é amor. Mas eu prefiro a velha forma porque o ser humano tem espírito, mas nem todos têm o amor como nós o compreendemos. Voldemort, por exemplo, tem um espírito maligno. Duvido que tenha amor. Para mim, amor é algo sublime, nem sempre atingível.
Harry se agitou um pouco e ficou matutando por dois segundos.
- Esse livro ensina a usar o sétimo elemento?
McKinley fez uma careta de desânimo.
- Não é algo que se ensina. Não há uma lição. O que existe é a compreensão do fenômeno. Sabendo que ele existe, é possível invocá-lo em momentos realmente especiais. Mas não é qualquer um que consegue. É preciso que surja um poder superior para controlá-lo. Porque a força do espírito se manifesta rapidamente. E também se esvai do mesmo modo que veio. Se o bruxo não estiver preparado ou não for talentoso o suficiente para utilizar esse elemento, ele não terá efeito.
- Entendi, professor. E estou convencido da força do sétimo elemento. Mas é uma pena que não dê para aprender a utilizá-lo. Esse livro seria mais útil se tivesse essa lição.
- Oh-ho, não subestime esta obra. O livro pode te ensinar os pontos fracos de algumas criaturas realmente terríveis. Dê uma olhada no índice.
Harry levou as mãos à cabeça.
- É a minha sina. Nunca vou me livrar desses livros. Se não é a Mione, surge outra pessoa. Tenho de ler mesmo ou posso usar essa coisa como escudo? – perguntou com ar desolado.
O velho professor voltou a rir.
- Pergunto-me por que eu não consegui ser tão espontâneo aos 17 anos como você é. Eu teria sido mais feliz.
- Se a gente não estivesse em guerra contra Voldemort, eu diria que o senhor aparenta estar bem satisfeito com a vida.
- O certo seria dizer que estou conformado com a vida. Já trabalhei bastante, vivi aventuras demais, conheci muita gente. Mas veja como sou um sujeito solitário. Dumbledore não é assim. Ele é completamente devotado à escola. Casou-se com Hogwarts, entende?
- O senhor nunca se casou?
McKinley ergueu as sobrancelhas. Era uma pergunta bastante íntima e não tinha certeza se poderia respondê-la. Sorriu mais uma vez. Podia ser bom. Afinal, poucos se mostraram interessados em saber a história da tradicional família McKinley, mais uma que estava desaparecendo por falta de herdeiros.
- Ah, Harry, não me casei porque a mulher que sonhei para mim não me aceitou como marido. É triste, mas hoje posso perfeitamente falar disso. Vou te contar, rapaz. Apaixonei-me por uma moça maravilhosa quando ela ainda tinha 16 anos. Até aí nada demais. O detalhe é que eu tinha quase o dobro da idade dela. Sei, sei, um escândalo. No meu tempo de jovem, as pessoas viam com maus olhos relacionamentos com tanta diferença de idade. Por isso, tratei de negar meu sentimento por ela. Neguei para mim, não para os outros porque não revelei para ninguém o que sentia por essa moça. Tentei me iludir, afastei-me dela, busquei outras pessoas. E nada adiantava. Ela era filha de vizinhos dos meus pais. Com isso, ficava realmente difícil ficar longe daquele anjo. Eu aprendi essa expressão com os trouxas. Eles têm palavras interessantes, não é?! Bem, fiz de tudo para apagar o amor que sentia. Viajei pelos quatro cantos do mundo e até fiz a bobagem de tomar poções. Quando se trata de sentimentos, essas coisas não ajudam. Enfim, depois de me angustiar por décadas, um dia percebi que não podia mais viver daquele jeito. Ela não tinha se casado, o que me alimentou as esperanças de conquistá-la. Eu já estava um pouco velho, mas, sabe, tinha meu charme. Sim, pode rir. Eu mesmo não acredito nisso. Um dia, procurei por ela. Flores na mão, declarei-me. O que acha que aconteceu?
- Não tenho idéia.
- Meu anjo empalideceu, perdeu a fala, tremeu. Tudo isso e eu pensei que podia ser amor. Mas não era. A moça, já não tão moça assim, reconheceu que não havia melhor homem do que eu. Isso me envaideceu. Só que ela não me amava. Suspeito que amasse outro. Ah, quase morri de tristeza. Tanto tempo neguei para mim que a amava, tanto tempo me iludi, que percebi que tinha feito uma grande burrada. Não se deve negar a realidade. Tivesse assumido meus sentimentos poderia tê-la procurado antes. Provavelmente, ela não me aceitaria. Só que eu não teria me consumido na incerteza por tantos anos. Não teria ficado tanto tempo perdido nesse labirinto que criei para mim. Creio que a dor teria sido mais facilmente assimilada.
Dito isso, McKinley sorriu tristemente. E perguntou se Harry já amava alguém. O rapaz negou com a cabeça. Pensou em Gina. Mas tratou de afastar a imagem da garota de sua mente.
- Meu jovem, infelizmente os tempos de hoje não te permitem ver o mundo como eu via na sua idade. Vocês foram obrigados a endurecer, a criar couraças. Não podem ver uma flor desabrochando com a ameaça de Voldemort sobre suas cabeças. É uma pena.
- O senhor está retomando a pieguice ou é impressão minha? – perguntou em tom de brincadeira.
- É verdade. Eu sou um velho piegas. Mas tenho a impressão de que você é uma daquelas pessoas que só poderá devotar o coração a uma pessoa. Aposto que você tem a mesma essência que eu. Para nós, os amores são eternos. Pense nisso. Alguém para amar por toda a vida. Com quem ter filhos, criar uma família. Pode ser muito bom, não é?
Até aquele momento, Harry se dividira entre o deboche e a diversão. Apreciava, de fato, tudo o que McKinley procurava lhe transmitir. Mas falar de amor só o amargurava.
- De que me vale um amor eterno? Eu não posso... não tenho como pensar nisso. Não enquanto a profecia não se cumprir, seja para o bem ou para o mal. Como poderia me envolver com alguém se não tenho certeza de estar vivo amanhã?
McKinley já não sorria. Com a varinha, executou um feitiço para terminar a limpeza do velho livro e o entregou a Harry. Pediu que não pensasse mais na profecia e lhe desejou uma boa noite. “Que lástima que alguém tão jovem tenha de carregar tamanha responsabilidade”, lamentou no silêncio da sala. Harry se apressou para chegar até seu quarto. Perdera a fome e não desceria para jantar. Sentia-se vazio. Era horrível não ter o direito de sonhar o futuro.
Demorou para postar este capítulo porque eu não podia usar meu computer. Agora que tudo voltou ao normal, espero atualizar a história a cada final de semana. Não sei se gostaram do professor McKinley, mas aviso que ele será realmente importante nesta fic. Obrigada pela leitura e pelos comentários. Valeu. ;-)
K.
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