Capítulo único



brinquedo torto


 



"E eu me vendo, como um brinquedo torto


Eu me vendo como uma estátua"



Cansara... estava cansada daquilo tudo. De ter que agüentar todos os dias
esperar horas seu marido, enquanto lágrimas quentes saltavam do rosto. Ela não
estudara tanto e se dedicara tanto, para se apaixonar por olhos azuis e cabelos
loiro-prateados e perder toda uma vida de alegrias, realizações e sucessos.
Ela se deixara enganar... como ela fora idiota. Correu os dedos pálidos
pela face, tentando afastar as lágrimas que teimavam em rolar e caminhou com
passos fortes pelo corredor, tentando esquecer tudo e concentrar-se apenas na
arrumação de casa... apenas nisso...



- O que está acontecendo entre vocês dois? - perguntou Gina, com a voz
embargada, como se estivesse estressada.


- Nada, Gina... quantas vezes vou ter que repetir? - exclamou Hermione,
irritada, fechando com força um livro e abrindo outro precipitadamente. - Draco
e eu não temos nada em comum... ele só veio conversar comigo. E mais nada.
Quantas vezes terei que repetir?


- Você está dizendo as mesmas coisas muitas vezes, Hermione - disse Gina,
calmamente. - e inclusive está chamando-o pelo primeiro nome. Esses são
sintomas explícitos da paixão.


Hermione segurou-se no espaldar da cadeira para não voar sobre a amiga e
simplesmente folheou o livro com mais agressividade, sentindo as maçãs do
rosto escaldarem.


- Você por acaso é algum tipo de psicóloga que super-entende dos
sentimentos alheios?


- Então existe de fato algum sentimento!


- Gina... ahn... você está me confundindo - murmurou Hermione. -, então
vamos parar por aqui, sim? E continue procurando a resposta aí porque eu não
estou conseguindo achar...


- É a primeira vez que você não sabe a resposta de algo - disse Gina, com
a voz aveludada, como se quisesse que o seu veneno fosse menos doloroso. - isso
está ficando sério mesmo.


Hermione levantou-se de sua cadeira, jogando-a quase a um metro e, reunindo
todos os livros que pudese, cambeleou pelos corredores de estantes lotadas de
livros em direção à saída, deixando Virgínia sozinha em uma das estreitas
mesas; sabia que a amiga tinha razão, porém, sentir aquilo e ver que estava
cada vez mais forte, como uma ferida aberta dentro de si, era muito estranho...
ainda mais por quem era aquele sentimento.


Depois de anos seguidos em que ela procurava achar alguma espécie de amor
dentro dos olhos de Rony, ela falhara, vendo apenas seu reflexo frio. Mas
então, um dia, ela andava precipitada pelos corredores de Hogwarts, o suor
deslizando suavemente por sua testa e, então, esbarrou em Draco Malfoy,
estatelando-se no chão, os livros, mochila, tinteiro, caldeirão, rolando pelo
piso.


- Ah - fez Malfoy, levantando-se em um salto e estendendo a mão para
ajudá-la a se levantar -, desculpe...
Granger! O que fazia aqui a essa
hora? Deve estar atrasada para as aulas... matando? Sinto que teremos que
entregar para a profª McGonagall e...


- Cala a boca, Malfoy - vociferou Hermione, levantando-se irritada. -, porque
você não tem moral nenhuma para falar nada aqui, sendo que também estava
matando, não? E mais... a profª McGonagall nunca acreditará em uma história
dessa. Eu sou a querida e aplicada aluna... e não um cara tão pixado quanto
você... ninguém acredita mais em uma única palavra sua.


- Você fala demais, Granger - disse Malfoy, com desprezo transparecendo na
voz rouca.


- E você não tem cérebro para pensar no que fala, não é? - exclamou
Hermione. - Por isso deve achar que eu falo demais e... - Ela parou; seus
lábios estavam presos.


Tentou desvencilhar-se mas não conseguiu; estava nos braços de Malfoy,
sentindo os músculos dele segurarem-na com força e lábios hábeis massageando
os seus; o garoto introduziu com suavidade a língua em sua boca e ela, então,
entregou-se ao beijo cálido, sentindo que todo o corpo estremecia sob o toque
de Malfoy.


Envolveu-o com seus braços, arranhando-lhe as costas e deixando com que os
únicos livros que ela não deixara cair, rolassem para o chão, causando um
ruído metálico quando eles caíram no caldeirão, que ecoou por todo o piso de
pedra do corredor.


Eles permaneceram alguns segundos unidos e, então, Hermione desvencilhou-se
calmamente, erguendo os olhos castanhos para Malfoy e repreendendo-o com o
olhar.


- O que foi isso? - perguntou a garota, tentando controlar-se.


- Uma demonstração de amor? - arriscou Malfoy, com a voz embargada.


- Que amor? - berrou Hermione, os dedos tremendo de nervosismo. - Se nós
quase não nos falamos? Eu não sou a sangue-ruim? - Lágrimas rolaram por seu
rosto e ela inclinou-se para pegar os livros que caíram no chão, reunindo tudo
em sua mochila e jogando-a sobre as costas. - Não brinque comigo, Malfoy.


- Não vá - disse o garoto, segurando-a quando ela começara a se distanciar
e puxando-a para outro beijo.


Foi então, que uma voz feminina entrecortou o ar, fazendo com que eles
estacassem e se devencilhassem.


Hermione sentiu que todo o corpo ganhara um peso extra e virou-se para o
lado, podendo ver a silhueta magra de Gina, caminhando pelos caixilhos que
deixavam luz derramar para o corredor.


A garota aproximou-se deles com um olhar de desprezo estampado no rosto e,
encarou-os em silêncio por alguns segundos.


- Vamos, Hermione... temos que ir para a aula - ela disse, calmamente. E as
duas afastaram-se em passos precipitados pelo corredor, deixando Malfoy
sozinho...



Hermione deixou que um prato caísse no chão, repartindo-se em vários
pedaços e, então, correu para o seu quarto e jogou-se na cama de casal.
Fartara-se daquilo tudo. Era tão doloroso relembrar daquele passado... e de
como as coisas haviam transformado-se.



Não me diga: "eu te disse"


Isso não vai resolver


Se eu explodo o meu violão


O que mais posso fazer?


Isso é tão desconfortável


Me ensinaram a fingir


E se eu for derrotado


Nem sei como me render


E eu me vendo como um brinquedo torto


E eu me vendo como uma estátua


 



 


•*-*•


 



- O que você estava fazendo ontem com o Harry naquele corredor? - berrou
Malfoy, segurando-a pelo braço. - Já não falei que não quero você com
aquele cara? Muito menos sozinha!


- Desculpa, Draco... desculpa mesmo - murmurou Hermione, sentindo que o
sangue começava a paralisar em seu braço. -, agora... me solte... por favor...


O garoto jogou-a no chão e começou a andar em círculos no aposento,
praguejando palavras obcenas.


Haviam se passado alguns meses e os dois estavam noivos. Tudo era perfeito...
até que Hermione começara a sentir a pressão do ciúme. Malfoy a proibia de
se aproximar de garotos sozinha; suas roupas tinham que permanecer sempre
fechadas, impossibilitando que qualquer faixa de pele ficar exposta. Era algo
quase doentio...


- Você é uma puta, sabia? Uma PUTA - ele saiu fechando a porta com força e
desapareceu de vista, deixando-a ali, caída no chão.


Claro que depois eles se reconciliaram, terminaram Hogwarts e se casaram,
indo morar em uma cidade próxima de Londres, uma antiga casa de dois andares,
porão e sótão, aposentos largos e arejados, com avenidas largas e ruas
arborizadas. Era tudo que qualquer pessoa sonhava... porém, a pressão
continuara. E ela estava em seu final... não agüentava mais...



 


•*-*•


 


As malas em mão, bem perto do corpo, ela caminhava por uma linha de trem, ao
redor, apenas árvores altas e pequenos musgos cercando-a... para onde iria? O
que faria? Não sabia... mas a esperança de que tudo mudaria a mantinha viva.


 



Caro Draco,


 


Eu não sei o que você fará quando não me encontrar em casa... e também
não quero pensar no assunto pois poderei acabar desistindo. E isso é o que
não pode acontecer... porque se eu continuar assim, acabarei me suicidando. Ou
você irá me matar... embora eu saiba que não é isso que você quer, é isso
que você está fazendo.


Eu o amo Draco... não acabe com esse amor... deixe que eu vá embora
pensando ainda na pessoa maravilhosa que você é...


Com amor,


 


Hermione Granger.


 


 



•*-*•




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