A Escuridão Chama



Antes do Amanhecer
Escrito por snarkyroxy
Traduzido por BastetAzazis
Betado por Ferporcel

Sumário: Dumbledore leva Hermione para ver Snape. Ela está determinada a encontrar uma maneira de salvá-lo, mas as forças da escuridão são mais fortes que qualquer um previa.

Disclaimer: Tudo que você reconhecer pertence ao gênio imensurável de J. K. Rowling; eu só gosto de pega-los emprestado e brincar com eles.

* * * * * * *
Capítulo 25: A Escuridão Chama


– Srta. Granger, Severo está morrendo.

Morrendo. A palavra ecoava na cabeça de Hermione enquanto ela encarava o Diretor, incrédula. Ela deu um passo para trás, afastando-se dele, e as mãos retorcidas caíram dos seus ombros.

– Eu sinto muitíssimo – ele disse brandamente, parecendo pela primeira vez como se ele tivesse vivido cada minuto dos seus cento e cinqüenta e quatro anos.

– Não – ela disse, balançando a cabeça. – Você está enganado. Deve haver alguma coisa que você possa fazer, alguma coisa que alguém possa fazer. Ele não pode... não agora... não depois... não agora...

– Srta. Granger.

– Qual o problema dele? Onde ele está? – ela continuou, olhando em volta da sala até que seus olhos caíram na porta fechada do quarto. – Ele está lá?

Ela se moveu em direção à porta, o coração batendo numa cadência frenética em seu peito. Ele estava apenas do outro lado da porta. Ela sabia; podia sentir... senti-lo.

– Srta. Granger, espere! – a voz de Dumbledore era firme, mas Hermione não prestou atenção nele, e ela fez pouco caso da mão cautelosa que ele colocou sobre seu ombro quando ela abriu a porta e entrou no quarto.

Ela parou logo depois da porta, entretanto, encarando o quadro à frente dela.

As cortinas pesadas de veludo foram fechadas sobre a janela, e a única luz no quarto emanava das tochas colocadas em dois candeeiros, as chamas jogando sombras contra as paredes rústicas de pedra e um brilho suave e acolhedor na cama onde o mestre de Poções estava deitado.

Fawkes, a fênix, estava empoleirada no canto da cabeceira da cama, e o pássaro levantou a cabeça de onde seu olhar estivera fixo no homem deitado para observar Hermione mover-se adiante no quarto.

Os olhos de Snape estavam fechados; os únicos sinais de vida eram o fraco levantar e cair do seu peito e a expressão de dor no rosto que entregava seu estado de consciência. Ele estava deitado por cima do acolchoado azul escuro, mas um lençol da mesma cor fora jogado livremente sobre suas pernas, que ainda pareciam estar vestidas com sua calça preta de sempre. Eram as únicas roupas que restavam no corpo dele.

Quando Hermione se moveu ao redor da cama, alguma coisa reluzindo na luz do fogo chamou sua atenção, e ela dirigiu seu olhar para o torso pálido e exposto de Snape. Ela ofegou brandamente quando viu o intricado punhal prateado de uma faca projetando-se cruelmente do inferior das costelas no lado direito do peito dele.

Não havia nenhum sangue em volta do ferimento, apenas uma contusão escura que parecia radiar da faca numa configuração em forma de veias sob a pele. Ela esticou uma mão involuntariamente para tocá-la, mas foi impedida por um som agudo do Diretor, que se movera para ficar do outro lado da cama.

– Por que ela ainda está nele? – ela perguntou nervosamente.

– Eu não posso removê-la – Dumbledore disse.

Com o som das vozes deles, Snape abriu os olhos e, depois de um momento, virou a cabeça levemente e focou no Diretor.

– Alvo – ele cumprimentou fracamente, o timbre usual da voz dele ficou mais áspero por causa da dor.

Dumbledore sorriu severamente para Snape e, então, lançou os olhos para Hermione. O mestre de Poções seguiu o olhar dele, seus olhos escuros encontrando os dela apenas por um momento antes de virar a cabeça novamente.

– Por que ela está aqui, Alvo? – ele disse resignadamente. – Ela não precisa ver isso.

– Você negaria a ela a chance de dizer adeus, Severo? – o Diretor disse calmamente.

Snape fechou os olhos novamente, de dor ou de vergonha, e Hermione foi incapaz de segurar o choro que vinha se formando em sua garganta assim que percebera por que Dumbledore a trouxera.

– Deve haver alguma coisa que nós possamos fazer – ela disse em lágrimas.

O Diretor balançou a cabeça tristemente.

– Você sabe que adaga é essa, Srta. Granger?

Ela lhe parecia mesmo familiar, agora que ela olhava novamente, mas balançou a cabeça.

– É chamada de Lâmina Consangüínea – Dumbledore disse gravemente. – Um implemento extremamente poderoso e criado apenas através de magia negra e perigosa.

– Consangüínea – ela repetiu vagarosamente. – Alguma coisa com... sangue?

– Lealdade ao sangue – o Diretor confirmou com um aceno da cabeça. – Somente um parente de sangue daquele que produziu o ferimento pode removê-la.

– Com sucesso – Snape ralhou e depois levantou a cabeça e tossiu rudemente, segurando um grito de dor quando a ação deslocou a lâmina dentro do seu corpo.

– O que você quer dizer? – Hermione perguntou, observando Snape afundar-se de volta nos travesseiros novamente, um reflexo do suor brilhando na testa.

– Se outra pessoa removê-la, a morte será instantânea – Dumbledore disse.

– E me livra desta espera inútil – Snape pôs para fora, apertando firmemente as mandíbulas quando outra onda de dor o atingiu. Num impulso, Hermione inclinou-se para frente e agarrou a mão dele, desejando futilmente que ela pudesse ajudar. Ele girou a mão para reverter suas posições, e foi a vez dela suprimir um grito enquanto ele apertava os dedos dela com força suficiente para esmagá-los.

Quando a dor atenuou novamente, ele a soltou e fechou os olhos, respirando com dificuldade.

Massageando sua mão levemente e temendo a resposta para a pergunta que ela sabia que tinha que fazer, ela disse:

– Quem fez isso? Quem esfaqueou você?

– Voldemort – Snape proferiu, e a estranheza de ouvi-lo pronunciar o nome do Lorde das Trevas pela primeira vez foi ofuscado quando ela entendeu a situação pavorosa que eles enfrentavam. O homem que uma vez fora Tom Riddle tinha sequer algum parente consangüíneo, ainda mais um que pudesse ajudá-los?

– Ele tem algum… – ela se interrompeu, uma vez que o Diretor já balançava a cabeça.

– Ninguém que eu saiba, e ficaria surpreso se tivesse deixado escapar alguém – disse o Diretor.

Hermione abaixou a cabeça e engoliu com dificuldade, o nó em sua garganta recusava-se a desfazer.

– Há, entretanto – Dumbledore continuou –, um lugar onde acharei a resposta desta questão de uma vez por todas. É a outra parte do motivo pelo qual eu a chamei aqui, Srta. Granger, para ficar com o Severo enquanto eu saio.

Snape bufou fracamente, e Hermione viu o fantasma de um sorriso cínico no rosto dele quando ele disse:

– Parece que o Alvo está com mais medo que eu morra sozinho que eu mesmo.

– Ele não deveria estar na Ala Hospitalar? – ela perguntou a Dumbledore, franzindo a testa para o senso de humor mórbido do mestre de Poções. – E se acontecer alguma coisa enquanto você não está? Eu não...

– Madame Pomfrey não pode fazer nada por ele – o Diretor disse. – A Ala Hospitalar é muito exposta. Eu preferiria que nenhuma palavra do que aconteceu aqui deixasse este quarto, embora isso possa estar fora do meu alcance. Eu realmente não sei se estamos a salvo de ouvidos curiosos, mesmo aqui.

Hermione franziu a testa, confusa.

– Quem poderia nos ouvir aqui?

– Pettigrew – Snape disse, o rosto contorcendo novamente numa careta de dor.

– Rabicho? – Hermione exclamou. – Mas o que… Espere… ele é o espião?

– Temo que sim – Dumbledore disse –, embora eu não tenho idéia de como ele se esquivou de nós. De alguma maneira, ele conseguiu acesso ao Largo Grimmauld e encontrou uma maneira de entrar aqui no laboratório do Severo para espioná-lo sob as ordens de Voldemort.

Os ruídos. Hermione se amaldiçoou silenciosamente por não ter mencionado aquilo ao Snape antes, por não ter insistido para que ele fizesse alguma coisa em relação àquilo, seja lá o que fosse.

– Eu não entendo – ela disse depois de um momento. – Eu vinha ouvindo estes sons há semanas. Por que ele esperou até agora para expor você?

– Rabicho vinha alimentando o Lorde das Trevas com histórias da minha traição há meses – Snape explicou, parando para respirar tão profundamente quanto a dor dilacerante da adaga permitia. – O Natal foi um teste, que eu consegui me safar. O ataque à escola trouxa foi meu teste final. Confundiu o Lorde das Trevas quando obtive sucesso, e ele exigiu que Rabicho levasse até ele uma prova absoluta e definitiva da minha traição.

– Que prova?

– As instruções para o antídoto da Cruciatus.

– Você não conseguia achar o caderno de anotações – Hermione disse, todas as peças repentinamente encaixando-se no lugar. – Aquela foi a primeira noite que eu não ouvi ruídos no laboratório depois que você saiu.

– Então agora – Snape continuou –, o Lorde das Trevas tem os meios para preparar a Cruciatus, a única descrição decente da poção preventiva, e a Ordem não tem nenhum espião para nos avisar de qualquer ataque.

– Isso não importa agora, Severo – o Diretor disse.

– É claro que isso importa, droga. Há... – ele se interrompeu quando um espasmo particularmente forte de dor assolou seu corpo, e ele ofegou, apertando os punhos no cobertor abaixo dele.

– Devo me apressar – Dumbledore disse, olhando de relance preocupadamente do mestre de Poções e de volta para Hermione. – Espero não me demorar.

Dumbledore levantou o braço e Fawkes voou graciosamente da cabeceira da cama para pousar na sua manga. O Diretor deixou o quarto rapidamente, fechando a porta atrás dele, e Hermione voltou-se para Snape.

Ele fechou os olhos novamente, uma careta fraca de dor ainda se estendia pelo seu rosto. A contusão estranha em forma de teia no peito parecia ter se espalhado, e a pele em volta estava morbidamente pálida, as antigas marcas de garras no outro lado do peito estavam completamente ressaltadas.

Ela não precisava de uma medibruxa para lhe dizer que ele não tinha muito tempo, e se Dumbledore falhasse em descobrir o que quer que fosse que ele estava procurando... Ela se afundou na cadeira colocada ao lado da cama e finalmente permitiu que as lágrimas caíssem, abaixando a cabeça enquanto elas rolavam silenciosamente pelo seu rosto.

– Hermione.

A voz dele era quase um suspiro. Ela levantou os olhos para encontrá-lo observando-a, e um olhar de desespero passou pelo rosto pálido dele quando ele viu as lágrimas dela.

– Eu sinto muito – ela soluçou. – Eu só... Eu não posso...

Como ela poderia dizer o que realmente sentia? Apenas o magoaria saber da dor que estava causando nela, perdendo-o agora, depois que ela finalmente viera a conhecê-lo... a gostar dele... a amá-lo.

Ela não podia dizer-lhe aquilo, entretanto. Não agora. Nunca, uma vozinha disse no fundo da sua mente, mesmo que ela soubesse que ele sentia alguma coisa semelhante.

Finalmente, limpando os olhos com as costas da mão, ela disse em voz alta:

– Não há realmente nenhuma esperança?

– Muito pequena – ele admitiu fracamente. – O destino parece estar fazendo uma brincadeira cruel. Eu nunca esperei sobreviver ao segundo reinado do Lorde das Trevas; eu tive sorte de sobreviver ao primeiro ileso, para falar a verdade. Agora, justamente quando percebi que talvez viver não seria um fardo tão terrível afinal, parece que as minhas decisões já foram feitas para mim.

Ela levantou os olhos para o rosto dele, e os olhos escuros dele prenderam-se nos dela. Ela se atreveria a sequer imaginar que desempenhara um papel na vontade dele de sobreviver, ou ela estava interpretando demais as palavras dele, ouvindo o que ela queria ouvir?

– Eu não pretendo ficar sentimental, mesmo que isso seja… e parece muito que será meu leito de morte – ele disse, os cantos da boca subindo momentaneamente no menor dos sorrisos –, mas seria um desserviço a você se eu não lhe dissesse o quanto agradeço por ter sua amizade nestes últimos meses.

– E você vai continuar a tê-la – ela disse com firmeza, sua determinação grifinória subitamente a empurrando. O Diretor podia ter simplesmente desistido, e Snape podia ter desistido, mas enquanto ele ainda estivesse vivo e respirando, ela não desistiria de ter esperança... ela não podia.

– Hermione, não se iluda – ele disse calmamente.

– Dumbledore disse que pode haver…

– Alvo não quer admitir o fato de que ele não pode proteger todo mundo, de que ele é impotente para impedir isto. É por isso que eu fui mandado de volta, para zombar da falha dele. O Lorde das Trevas teria se arriscado se houvesse a mínima chance de eu sobreviver?

– Ele já se enganou antes – Hermione insistiu. – Deve haver uma saída...

– Não seja tola – ele escarneceu. – Esta é uma magia antiga e poderosa. Não há saídas. Se a remoção da adaga não me matar, o veneno irá. Já está fazendo efeito; você pode ver.

Ela olhou para baixo de relance até o peito dele. O que ela considerara uma contusão tinha se espalhado novamente, os ramos mais longos esticavam-se até os ombros dele e desciam o braço esquerdo até o contorno avermelhado da Marca Negra. Não era uma contusão, afinal, ela percebeu surpresa, mas o veneno invadindo o corpo dele.

Ele tossiu novamente, e ofegou quando o movimento de arfar do seu peito trouxe uma nova onda de dor com ele. Hermione inclinou-se e apertou a mão fechada dele, separando os dedos firmemente apertados e permitindo, ao invés disso, que ele segurasse a mão dela novamente.

Desta vez, quando passou, ele manteve o aperto na mão dela, respirando com dificuldade.

– Eu preciso que você me escute, Hermione – ele disse urgentemente. – Alvo vai precisar da sua ajuda. A Poção Mata-Cão... você a preparou antes, e você terá que prepará-la novamente.

– Não se você ainda puder fazê-la – ela disse teimosamente.

– Droga, Hermione, acorde! – ele gritou asperamente. – Eu estou praticamente morto! Você tem que fazer isso.

Hermione estava pronta para gritar de volta que ele ainda não estava morto, mas se apiedou quando viu como o esforço das palavras ásperas parecia exauri-lo. Ele repousou a cabeça, fechando os olhos novamente, e Hermoine percebeu que a respiração dele havia tomado subitamente um ritmo irritante, como se ele tivesse que fazer um esforço consciente para forçar o ar para dentro dos pulmões.

– Diga-me o que eu tenho que fazer – ela suspirou, acrescentando silenciosamente um de qualquer forma.

– O antídoto. O Lorde das Trevas tem as instruções para a Poção Cruciatus, mas vocês ainda podem dar uso para o antídoto. Você consegue seguir minhas anotações originais para prepará-la? Elas ainda estão em algum lugar na escrivaninha do laboratório.

Ela assentiu.

– Ótimo – ele disse, respirando pesadamente. – Você vai precisar de mais excremento para a próxima leva. Visite a égua apaixonada; ela vai confiar em você.

– E quanto ao antídoto enfeitiçado, o preventivo? – ela perguntou. – Você ainda tem suas anotações antigas para ele também?

– Está tudo lá – ele disse –, mas está uma bagunça.

– Acho que posso fazê-la se tiver alguma ajuda – ela disse hesitante. – Não tão bem quanto você, é óbvio, mas acho que posso fazer se for preciso.

– Não tenho dúvida que você consegue, Hermione – ele disse, sua voz tomando um tom estranho subitamente quando ele abriu os olhos de novo, as chamas das tochas refletindo nos poços escuros. – Você é uma jovem extraordinariamente determinada.

Ela sentiu as lágrimas comichando no fundo dos seus olhos novamente, mas forçou um pequeno e triste sorriso no rosto e disse:

– É alguma surpresa, então, que eu não vou desistir de você?

– Isso, eu temo, é uma causa perdida – ele disse, limpando a garganta com alguma dificuldade. – Desculpe por fazer você presenciar isso.

– Você preferia que eu não estivesse aqui? – ela perguntou, magoada. – Você não acha que seria pior se eu... se eu não tivesse a chance de dizer... nada?

– E o que você diria? – ele inquiriu brandamente.

– Eu... – Ela o encarou nos olhos, e o quarto ficou em silêncio a não ser pelos leves estalidos das tochas na parede e pela respiração trabalhosa dele. – Eu não sei – ela admitiu brandamente depois de algum tempo. – Ou melhor, eu sei, mas não sei como dizê-lo.

– Então talvez seja melhor não dizer nada, para o nosso bem – ele disse, virando a cabeça para longe dela, uma dor nos olhos dele que ela suspeitava que não tinha nada a ver com a ferida dele.

Ficaram em silêncio novamente; Hermione observava o rosto de Snape enquanto ele olhava para o nada do outro lado do quarto, para longe dela. Ele mascarava bem sua dor, mas um fino brilho de suor atravessou sua testa nos últimos minutos, pequenas gotas escorrendo pelo lado do rosto até o cabelo.

Hermione sacou sua varinha do bolso das suas vestes da escola e conjurou um pano úmido e fresco. Ele sobressaltou-se levemente ao primeiro toque, mas depois relaxou e virou a cabeça na mão dela, observando-a enquanto ela gentilmente secava o suor da sua testa e empurrava as mechas úmidas de cabelo para trás das suas orelhas.

– Obrigado – ele disse brandamente quando ela terminou.

– Eu queria poder fazer mais – ela respondeu, dobrando o pano e colocando-o em cima da cômoda atrás dela.

– Eu sempre pensei – ele disse depois de algum tempo, os olhos abertos mas encarando o dossel acima da cama – que quando eu finalmente fosse descoberto seria num confronto... numa batalha, se você preferir. Pelo menos desta maneira, quando eu morresse, poderia levar alguns Comensais da Morte comigo.

– E todos o veriam como aquele que você realmente é – ela murmurou.

Se ele morresse agora, ele seria sempre conhecido como um traidor para ambos os lados, com poucos conhecedores da verdade do trabalho dele. A Ordem saberia, claro, mas se era para tomar o Moody como exemplo, havia pouca confiança no antigo Comensal da Morte, mesmo entre aqueles com quem ele trabalhara lado a lado.

Preocupava-a muito que ninguém nunca entenderia verdadeiramente os sacrifícios que ele fizera para que eles pudessem viver, e quem acreditaria nela se ela tentasse explicar isso a eles? A personagem que ele representava para o mundo exterior era tão incompatível com o homem brilhante e incansável que ela conhecia... Ela não teria acreditado também, seis meses atrás.

Ele deu um resmungo de desconforto, e ela se esticou para pegar a mão dele de novo, mas naquele momento a porta abriu e Dumbledore entrou novamente no quarto. Hermione se levantou da cadeira, observando-o esperançosamente. Snape parecia estar segurando a respiração.

Dumbledore caminhou até o pé da cama e parou olhando para baixo para o mestre de Poções, seus olhos obscurecidos pelo ângulo da cabeça.

– Eu sinto muito.

Hermione sentou-se rapidamente, o ar lhe faltou como se ela tivesse sido atingida por um balaço.

– Quanto tempo? – ela disse, incapaz de disfarçar o tremor em sua voz.

– Um dia, no máximo – Dumbledore disse duramente. – O veneno já está ativo.

Hermione piscou, tentando limpar seus olhos assim como sua mente. Engolindo para desfazer o nó abrigado firmemente em sua garganta, ela se agarrou à coisa menos emocional que cruzou sua mente.

– Onde você foi, professor – ela perguntou para Dumbledore.

– Aos Arquivos Bruxos Nacionais, no Ministério da Magia – ele disse. – Um registro de todas as pessoas mágicas e seus parentescos, datando desde o século XII. Eu tinha a esperança que pudesse haver uma linha dos ancestrais de Tom Riddle que eu tivesse deixado passar anteriormente nas minhas pesquisas. Infelizmente, não era para ser assim. Ele é, como nós temíamos, o último da sua família.

– Não há mais nada que possa ser feito? – Hermione insistiu. – Nenhuma maneira de... desfazer o feitiço, ou enganá-lo a achar que um de nós seja parente do Voldemort?

– Este não é um feitiço comum, Srta. Granger – o Diretor advertiu. – Magia sanguínea é uma das formas mais potentes de magia e, quando combinada com feitiços das trevas, tem forças desconhecidas.

– Há algum livro que fale sobre isso? – ela continuou. – Certamente como criar uma das adagas está documentado em algum lugar. Talvez isso nos dê uma pista de como...

– Isso é magia negra, Hermione – Snape disse. – Não uma coisa para crianças brincarem. Duvido que haja sequer alguma menção sobre isso na Seção Restrita.

– Eu dei ao Harry um livro sobre magia sanguínea no Natal – ela disse. – Talvez haja...

Os olhos dela se arregalaram e ela ofegou quando um pensamento repentino a atingiu. A mágica não estava relacionada a parentes de Tom Riddle, era a semelhança do sangue que ditava a relação entre eles. Sangue compartilhado.

– Harry! – ela exclamou. – Voldemort tem o sangue do Harry!

Dumbledore realmente empalideceu e agarrou a cabeceira da cama para se apoiar. Snape a encarou, e a esperança brincou momentaneamente em seus olhos antes de esvaecer quando ele disse:

– O Lorde das Trevas tirou apenas uma pequena quantidade do Potter. Duvido que seja o suficiente para sequer registrar uma semelhança.

– Pelo contrário, Severo – Dumbledore disse, seu rosto repentinamente vivo com a esperança. – Tom usou o sangue do Harry para trazer si mesmo de volta ao seu corpo. O sangue do Harry e do Rabicho, para ser exato. Por direito, o sangue no seu novo corpo foi criado a partir do sangue do Harry.

– Vai depender – Hermione disse vagarosamente, pensando – se a adaga foi criada antes ou depois que ele retornou ao seu corpo.

– Se foi antes – Snape disse, pegando sua linha de pensamento –, não vai funcionar, porque o sangue do Potter não estava presente nele naquela época.

– As chances são, entretanto, de que ele criou a adaga depois da sua volta – Dumbledore disse. – Severo, alguma vez você o viu usá-la antes?

– Não.

Dumbledore caminhou lentamente até o pé da cama, mergulhado em pensamentos. Os olhos de Hermione desviaram dele de volta para o Snape. A excitação repentina pareceu exaurir o mestre de Poções, e ele parecia mais pálido que nunca.

– Professor, nós não temos muito tempo – Hermione disse com urgência. – Como nós saberemos se vai funcionar?

Dumbledore parou de andar de um lado para o outro e olhou de relance para Snape, a preocupação entalhada em suas feições.

– Não há como saber – ele disse. – Nós podemos apenas tentar.

– Se não funcionar, eu estarei morto de qualquer forma – Snape murmurou. – Pelo menos desta maneira será rápido.

– O que você quer dizer?

Dumbledore suspirou:

– Se o Potter não for reconhecido pela mágica, a lâmina vai se desintegrar.

Hermione encarou horrorizada o Diretor e depois Snape, que parecia notavelmente calmo, dada a gravidade da situação.

– Vale a pena tentar – ele disse calmamente.

Ela assentiu, sentando-se novamente.

– Como vamos explicar isso ao Harry? Ele não vai fazer isso sem alguma explicação.

– Eu vou chamar o Sr. Potter agora – Dumbledore disse. – Talvez, Srta. Granger, você possa falar com ele quando ele chegar.

Hermione assentiu novamente, e o Diretor deixou o quarto. Quando a porta fechou atrás dele, Snape ofegou repentinamente e fechou a mão esquerda nos cobertores. Olhando para baixo no braço dele, Hermione viu o contorno da Marca Negra ficar preta de repente.

– Ele está chamando você? – ela perguntou incrédula.

– Não – Snape disse entre dentes cerrados. – Ele está checando se ainda pode me sentir... se eu ainda estou vivo.

O suor brotava do rosto dele novamente, e Hermione reaveu o pano, repetindo seu gesto anterior enquanto a dor da Marca Negra diminuía.

Quando ela se afastou, ele tomou o pulso dela em sua mão e puxou-a um pouco mais para baixo, de maneira que ela foi forçada a se sentar na beira da cama. Equilibrando-se cuidadosamente para não causar nenhuma dor desnecessária para ele com o movimento do colchão, ela encarou as mãos unidas dos dois, não querendo encontrar os olhos dele.

– Hermione.

Ele repetiu o nome dela mais uma vez, e ela levantou os olhos para ele então. Seus olhos escuros estavam solenes e sérios.

– Eu quero que você me escute – ele disse. – Não importa o que acontecer, você não pode se culpar se isso não funcionar. Você me deu uma chance, que é mais do que eu tinha antes, e nós estamos apenas prolongando o inevitável se não fizermos nada. Qualquer resultado será um alívio para mim, você sabe disso.

Ela assentiu, piscando rapidamente quando seus olhos se encheram novamente.

– Por favor, não – ele disse brandamente, apertando a mão dela enquanto um sorriso torto formava-se lentamente em seu rosto. – Vai funcionar, conhecendo a minha sorte, e eu terei uma dívida de vida com outro Potter.

Hermione soltou alguma coisa entre um soluço e uma risada, e disse:

– Valeria a pena uma centena de dívidas de vida para salvá-lo.

Ele levantou uma sobrancelha surpresa, e ela abaixou a cabeça, corando.

– Bem, eu acho que sim, de qualquer forma – ela murmurou brandamente.

Depois de um momento, ela sentiu a mão dele acariciar seu queixo, a ponta do polegar limpando distraidamente uma lágrima perdida enquanto traçava seu caminho descendo pelo rosto dela. Ela levantou o olhar para o rosto dele, e havia uma aparência estranha, distante nos olhos dele.

– Se ao menos você tivesse nascido vinte anos antes – ele murmurou –, como minha vida poderia ter sido diferente.

Os olhos dela se arregalaram, depois transbordaram com o pronunciamento dele, percebendo que era a coisa mais sincera que ela poderia esperar ouvir dele.

Ela levantou sua mão para cobrir a dele, pressionando-a contra seu rosto, sentindo o calor da pele dele e um leve tremor quando outro acesso de dor passou por ele. As lágrimas continuavam a cair, escorrendo entre seus dedos entrelaçados e por baixo das mangas do seu agasalho.

Ela não tinha resposta para a declaração dele, mesmo se conseguisse encontrar sua voz, então eles ficaram lá por algum tempo, apenas... juntos.

Hermione foi retirada dos seus devaneios quando o Diretor abriu a porta, e ela soltou a mão de Snape, deixando-a cair do seu rosto quando desenroscou seus dedos da outra mão dele, que ainda descansava sobre o cobertor.

Dumbledore, sem dizer nada embora ela soubesse que ele os vira se separarem, chamou Hermione para a porta. Ela levantou-se cuidadosamente da cama, e quando o alcançou, ele disse:

– Harry gostaria de falar com você.

Ela acenou com a cabeça e saiu do quarto para a sala de estar. O Diretor fechou a porta levemente atrás dela.

Harry estava virado para as enormes janelas, olhando fixamente para os jardins. Ele virou para encará-la quando ela andou até ele e compreendeu os olhos inchados dela e o rosto riscado pelas lágrimas.

– Hermione – ele disse, puxando-a para um abraço. Ela enlaçou seus braços ao redor do melhor amigo e finalmente soltou tudo o que estivera segurando no outro quarto, soluçando contra o tecido leve das vestes de escola do Harry.

A sensação era diferente que do tecido áspero do casaco de Snape, ela percebeu, e aquela comparação a fez chorar ainda mais, sabendo que ela poderia nunca mais ter a chance de abraçar seu outro amigo novamente.

– Deve ser grave – Harry brincou com indiferença –, se o Snape precisa da minha ajuda. O que está acontecendo?

Hermione soltou-se do amigo, ignorando a mancha úmida sobre o ombro das vestes dele.

– O Prof. Dumbledore não lhe contou?

Harry balançou a cabeça.

– Ele apenas disse que precisava da minha ajuda. Eu presumo que tem alguma coisa a ver com o Snape... estes são os aposentos dele, não são?

Hermione assentiu com a cabeça e atravessou a sala para se sentar na beira de uma das poltronas perto da lareira apagada.

Ela respirou fundo.

– Harry, o Prof. Snape foi descoberto por Voldemort.

Harry soltou um suspiro longo e baixo e moveu-se para se sentar em frente a ela. Hermione sabia que ainda havia uma grande animosidade entre seu amigo de olhos verdes e o mestre de Poções, mas Harry crescera imensamente nos dois últimos anos, e ele reconhecia a importância da posição de Snape entre os Comensais da Morte, seu valor para a Ordem, e as conseqüências dele ser descoberto.

– O quanto isso é ruim? – ele perguntou depois de um momento.

– Ele está morrendo – ela disse suavemente. – Dumbledore não pode fazer nada por ele; nenhum de nós pode, a não ser você.

– Eu? – Harry disse. – O que eu posso fazer que o Dumbledore não pode?

Tomando fôlego outra vez, ela explicou o mais brevemente que podia o que tinha acontecido. Harry empalideceu quando ela explicou o que sabia da Lâmina Consangüínea, e ele fez a ligação entre o sangue dele sem a ajuda dela.

– Será que vai reconhecer o meu sangue, mesmo eu não sendo realmente um... parente... do Voldemort?

– O Prof. Dumbledore parece achar que sim – ela disse. – É mágica consangüínea, afinal. Outras similaridades genéticas parecem não terem importância.

Harry assentiu, sua expressão era indecifrável.

– E se nós estivermos errados? – ele perguntou.

Ela baixou a cabeça e ouviu Harry murmurar:

– Entendo.

– Eu sei que você não gosta dele, Harry – ela disse desesperadamente. – Deus sabe que ele nunca foi justo com você, e eu não vou tentar inventar desculpas para isso. Ele é sarcástico e de temperamento curto, e não tem paciência com os imbecis ou indisciplinados, mas ele também é brilhante e espirituoso, determinado a concertar o que puder do seu passado, e dedicado a derrotar Voldemort... uma dedicação que pode ter custado sua própria vida.

Ela se interrompeu quando percebeu que Harry a encarava estranhamente.

– O que foi? – ela disse.

– Você realmente se preocupa com ele, não? – ele refletiu um pouco incrédulo.

– Ele é meu amigo, Harry – ela disse. – Assim como você e o Rony. Eu sei que é difícil conciliar isto com o homem que você conhece, mas aquele não é realmente ele; aquele é quem ele tem que ser. Você entende a diferença?

– Sim, entendo, na verdade – disse Harry, parecendo vagamente surpreso. – Algo como o... hã... Garoto-Que-Sobreviveu contra apenas o Harry, certo?

– Exatamente. – Ela sorriu para o amigo, mas então soluçou, acrescentando: – Você é a única esperança que ele tem, Harry, e nós já perdemos gente boa o bastante para esta guerra, não foi?

– Você está certa – Harry disse depois de um momento, fixando uma resolução firme em seu rosto. – Diga-me o que eu tenho que fazer.

– Obrigada. – Ela levantou e puxou o amigo da cadeira, envolvendo-o em outro abraço rápido antes de conduzi-lo até a porta do quarto.

Ela bateu levemente antes de abrir a porta, e Dumbledore levantou os olhos de relance quando ela entrou no quarto, Harry logo atrás dela. O Diretor levantou da cadeira onde estivera sentado ao lado da cama.

Ela se aproximou do lado esquerdo da cama e baixou os olhos para Snape. Os olhos dele estavam apertados, todo o fingimento de conforto se fora, e a respiração dele vinha em ofegos curtos e chiados. O veneno tinha se espalhado, o desenho púrpura das veias serpenteava por cada parte da pele exposta que Hermione podia ver, menos no rosto dele.

– Severo – ela disse brandamente, esticando o braço para tocar levemente o rosto pálido dele.

Ele abriu uma fração dos olhos, mas seu olhar passou dela para descansar no Harry, parado no pé da cama, observando a cena com a mesma expressão indecifrável de antes.

– Potter.

– Olá, professor – Harry devolveu. – Jamais pensei que veria esta parte do castelo.

– Dê uma boa olhada – Snape disse irritado entre ofegos doloridos. – É a primeira e última vez que você vai estar aqui.

– Severo – Dumbledore disse repreensivamente. Ele se moveu para ficar ao lado de Harry, depois disse seriamente: – Nós devemos ir logo com isso, se você estiver pronto.

– Claro, não quero manter o Ceifador esperando – Snape disse numa última tentativa de amenizar a situação. Quando olhou para Hermione, entretanto, as profundezas dos seus olhos estavam repletas apenas de aceitação e resignação.

– Eu... – De repente, tudo o que ela queria dizer submergiu em sua mente, e sua garganta apertou quando ela tentou falar.

Ele balançou a cabeça levemente, seu olhar enternecendo quando disse calmamente:

– Eu sei.

Ela esticou o braço para pegar a mão dele ao invés disso, apertando-a fortemente tanto para a sua confiança quanto a dele.

Harry moveu-se para o lado da cama mais próximo da adaga, olhando-a com um misto de repulsa e medo. Dumbledore, ainda no pé da cama, também parecia que estava prestes a falar, mas Snape novamente balançou a cabeça.

– Faça o seu pior, Potter – ele disse, seu olhar flutuando até Hermione uma última vez antes de fechar os olhos.

Harry olhou de relance para Dumbledore uma vez, e quando o Diretor acenou com a cabeça, ele esticou-se para frente, agarrou o punhal da adaga firmemente nas duas mãos e puxou.

Por um mero instante, Hermione achou que tinha funcionado.

Então, o rosto de Snape se contorceu numa careta de dor terrível, e a mão dele se soltou violentamente da dela para agarrar a ferida enquanto um urro de agonia explodiu de sua garganta.

Os cabelos atrás do pescoço de Hermione se eriçaram quando uma energia estranha e mágica estalou pelo quarto, e as tochas na parede subitamente pareciam obscurecidas quando um brilho estranho cresceu em volta da cama.

Onde a ponta da lamina deveria ter saído limpa, ramos do que Hermione podia apenas descrever como pura escuridão estavam presos a sua volta, retorcendo-se no caminho para o punhal da adaga.

Harry hesitou no seu movimento e lutou como se alguma força invisível estivesse atraindo a lâmina de volta para o corpo de Snape.

– Não quer sair! – ele gritou, puxando ainda mais forte enquanto os berros roucos de Snape alcançavam um ritmo crescente. A ponta da lâmina subitamente saltou livre do ferimento, e no mesmo instante Hermione foi cegada quando um vento repentino e uivante surgiu do nada para jogar seu cabelo contra o rosto.

Os ramos pretos alcançaram o cabo da adaga e rastejaram por cima do punhal, enlaçando os dedos de Harry.

– Tire-os de mim! – ele gritou, os olhos arregalados e aterrorizados enquanto ele lutava, jogando os braços violentamente para trás.

Snape gritou de novo, e todo o seu corpo convulsionava enquanto mais fios das trevas saltavam do ferimento.

– Ajude-o! – Dumbledore berrou sobre o uivo do vento sobrenatural, e Hermione, sem saber se ele se referia a Snape ou a Harry, inclinou-se para frente para segurar as mãos em garras do mestre de Poções.

Antes que ela pudesse tocá-lo, entretanto, ela se viu imobilizada, incapaz de mover seu corpo. Seus olhos ainda podiam se mexer, entretanto, e ela olhou para Dumbledore num apelo aterrorizado por socorro, mas ele, também, estava similarmente congelado.

– Que diabo é isso? – Harry gritou, inclinando-se para trás e usando o peso de todo o corpo para lutar contra a magia estranha da adaga.

– Continue puxando! – Dumbledore falou, e Hermione percebeu que ela ainda podia usar sua voz, também.

– Estou tentando! – Harry gritou, cambaleando alguns passos para trás pelo quarto num esforço renovado.

Os gritos uivantes do mestre de Poções estavam cada vez mais fracos, e Hermione podia ver rastros de sangue através do torso dele feitos pelas próprias unhas.

Abaixo da pele do peito, a estrutura em forma de veia que ela primeiramente julgara erroneamente como uma contusão, depois como veneno, estava se contorcendo, voltando vagarosamente para o ferimento. Cada vez que Harry ganhava terreno, ela se movia um pouco mais, e Hermione percebeu que era a magia da lâmina, que de alguma forma tinha se espalhado pelo corpo de Snape.

Se Harry pudesse extrair aquilo tudo, isso o salvaria?

– Vamos, Harry. Você consegue! – ela gritou, incapaz de oferecer qualquer outro tipo de ajuda, paralisada como estava.

A luz no quarto parecia escurecer ainda mais, ramos perdidos de escuridão soltavam-se do fio principal entre Harry e Snape para espiralarem-se pela cama. O vento se intensificou num uivo agudo, e lágrimas ardiam nos olhos de Hermione; até os gritos de dor do Snape eram abafados pelos barulho.

Hermione podia ver o último filamento de magia no corpo dele, retorcendo-se logo abaixo da superfície, perto do ferimento.

– Você está quase lá, Harry – ela gritou. – Só mais um pouquinho!

Harry já tinha se afastado até a metade do quarto, mantendo o cordel de magia negra esticado, com receio que ela o cobrisse e o consumisse. Um ramo da corda ainda estava preso a mão dele, enlaçando-se em volta do pulso, tentando fazê-lo soltar da adaga.

Endurecendo-se, ele deu um puxão súbito e violento, e a ponta em forma de chicote do cordel saltou do peito de Snape enquanto uma onda de choque de magia explodiu pelo quarto. Hermione teve apenas tempo de testemunhar a nuvem de escuridão formar uma caveira esfumaçada antes de uma mão invisível bater no seu peito e arremessá-la pelo quarto.

Quando ela abriu os olhos, o ar tinha clareado e ela se viu livre para se mover. Viu o Diretor levantando-se tremulamente perto da porta.

Pondo-se de pé, ela viu o Harry, também, levantando-se cautelosamente. Ele se recostou contra a parede, exausto.

A luz no quarto tinha voltado ao normal; não havia nenhum sinal de que alguma anomalia mágica tivesse acabado de acontecer, a não ser pela adaga firmemente segura na mão de Harry.

Aproximando-se da cama, ela fixou os olhos na forma inclinada do mestre de Poções, deitado completamente imóvel no centro da cama, as mãos ainda fechadas em punho.

O ferimento no peito tinha simplesmente desaparecido, uma linha fina e vermelha como uma cicatriz recentemente curada era o único sinal de que ele alguma vez existira. Era a sua imaginação, ou o peito dele estava subindo e descendo? Era tão fraco que ela não conseguia dizer se estava vendo coisas, movimentos fantasmas estimulados pela sua esperança desesperada de que ele ainda estivesse vivo.

No canto dos olhos, ela viu Harry e o Diretor aproximando-se da cama, também, e ela esticou a mão cautelosamente para tocar o rosto de Snape.

Estava quente e ensopado de suor, e seus dedos ficaram grudentos quando traçaram seu caminho para encontrar o pulso no pescoço dele. Mal ousando respirar, ela pressionou firmemente contra a pele pálida.

Um pulso rápido e fraco encontrou seus dedos, e ela desmoronou na beira da cama aliviada.

– Ele está vivo – ela soltou, sem remover os dedos do pescoço dele nenhum momento, reassegurando-se de que a batida não era simplesmente um produto da sua imaginação esperançosa.

Dumbledore apareceu do outro lado da cama e sacou sua varinha, murmurando um feitiço que Hermione ouvira Madame Pomfrey usar anteriormente. Uma esfera azul flexível saltou para fora da varinha e flutuou sobre o peito do mestre de Poções por um momento antes de tomar a forma de uma série estranha de runas. As figuras ficaram suspensas no ar por poucos segundos e depois esvaeceram.

Dumbledore abaixou a varinha, franzindo o cenho, e virou-se para Harry.

– Muito bem, Sr. Potter – ele disse. – Parece que você conseguiu.

– Consegui? – Harry disse, incrédulo. – Tudo que você disse que eu tinha que fazer era puxar a faca para fora. O que diabos era aquela... aquela coisa?

– Eu não sei – Dumbledore disse gravemente. – Eu nunca vi nada assim antes.

– Ele vai ficar bem? – Hermione perguntou, baixando os olhos para o homem ao lado dela. Ela podia vê-lo respirando mais claramente agora, mas ele não mostrava nenhum sinal de que acordaria.

– Espero que sim – o Diretor disse duramente. – Seja lá o que acabou de acontecer, eu não posso explicar nada além do fato de que havia alguma magia das trevas poderosa atuando; mais poderosa, talvez, que a magia sangüínea da adaga.

– Você está bem? – Hermione perguntou, olhando para Harry.

Seu amigo assentiu com a cabeça, olhando fixamente para baixo a adaga na mão dele.

– Acho que sim – ele disse de modo trêmulo. – Eu só... Aquilo foi... intenso.

– Humm – Dumbledore disse, avaliando Harry cuidadosamente. – Você deveria ver Madame Pomfrey, para uma Poção Reanimadora pelo menos, e me procure imediatamente se sentir algum sintoma estranho. Por enquanto, entretanto, acho que será melhor se você voltar para suas aulas, para não criarmos suspeitas sobre seu paradeiro.

Harry assentiu com a cabeça, mas Hermione disse:

– Diretor, eu não posso...

– Você não, Srta. Granger – ele disse. – Eu pediria que você permanecesse aqui. Há muitas coisas a serem feitas, mas eu estou relutante em deixar Severo sozinho.

Hermione assentiu agradecidamente.

– Eu o informarei quando ele acordar – ela disse.

O Diretor hesitou como se estivesse prestes a dizer alguma coisa, mas então pareceu mudar de idéia.

– Devo retornar quando puder, Srta. Granger. Harry, eu gostaria de ter uma palavra com você. Vou esperar na outra sala se você tiver um momento.

O ancião deixou o quarto, embora parecesse a Hermione que ele não estava tão feliz quanto deveria ter ficado, dado que eles acabaram de salvar a vida de Snape.

Harry deu a volta para o lado da cama onde Hermione estava sentada, colocou a adaga em cima da cômoda próxima, e então inclinou-se para abraçá-la.

– Muito obrigada, Harry – ela sussurrou, abraçando-o com força de volta.

– Não foi nada... eu acho – ele disse, olhando de relance sobre o ombro dela para o imóvel mestre de Poções. – Espero que ele esteja bem, e não estou dizendo apenas por dizer, também. Ele... Acho que eu nunca entendi o que ele enfrenta... – ele se interrompeu.

– Tenho certeza que ele ficará horrorizado ao ouvir sobre sua preocupação – ela tentou brincar, ganhando um sorriso indiferente do amigo.

Harry murmurou um leve adeus e deixou o quarto, puxando a porta atrás de si, mas sem fechá-la completamente.

Hermione voltou-se para Snape e tomou um fôlego profundo e trêmulo. A respiração dele ainda estava fraca e superficial, e enquanto ela o observava, viu um arrepio percorrer o corpo dele.

Ela esticou o lençol sobre as pernas dele onde tinha ficado amassado, puxando-o até a cintura de Snape. Então, arrumando-se mais seguramente na cama ao lado dele, com as pernas dobradas sob si mesma, ela se esticou para descansar as costas da mão na testa dele. Estava queimando, e manchas fracas vermelhas tinham aparecido no alto das bochechas.

Lá fora na sala de estar, ela podia ouvir Harry e Dumbledore falando em voz baixa antes de partirem. O Diretor estava provavelmente alertando-o – desnecessariamente – sobre a necessidade de discrição.

Hermione esticou-se para trás para recuperar o pano que tinha conjurado mais cedo, umedecendo-o com um gesto da sua varinha. Ela limpou o suor que tinha se formado em gotas no rosto de Snape novamente, antes de dobrar o pano cuidadosamente e dispô-lo sobre a testa dele, pressionando gentilmente.

Baixando os olhos, ela viu as mãos dele ainda fechadas em punho, um fiozinho de sangue correndo da mão esquerda onde as unhas tinham rasgado a pele.

Conjurando outro pano, ela tomou a mão esquerda dele na sua, franzindo o cenho quando abriu gentilmente os dedos dele com alguma dificuldade, a pele pegajosa de suor assim como a do rosto.

Assim que ela conseguiu expor a palma da mão, ela puxou o braço dele para descansar no colo dela, de maneira que ela pudesse curar as pequenas marcar de unha. Pegando sua varinha de novo de onde estava ao lado dela, seus olhos caíram na pele pálida da parte interna do antebraço dele.

Seu grito de surpresa trouxe o Diretor e Harry correndo para dentro, vindos da outra sala, Dumbledore com uma pitada de pó de Flu caindo de uma mão.

Ela os encarou, com os olhos arregalados, e então voltou-se para o braço do mestre de Poções, ainda aninhado no seu colo.

– A Marca Negra – ela sussurrou incrédula. – Ela se foi.


* * * * * * *

Continua

N.A.:Obrigada a todos que leram e revisaram o último capítulo. Muito bem para aqueles que adivinharam que Harry teria um papel importante neste capítulo. Imagino que a pergunta agora seja: foi o suficiente?


Além disso, obrigada a Potion Mistress, que sempre pega meus erros de digitação, e acaba comigo, er, com eles... :P

N.T.: Mais uma vez tenho que agradecer à Ferporcel e à Suviana pela ajuda inestimável na tradução. E claro, um agradecimento especial a todas as Snapetes, que estão sempre a postos para ajudar quando minhas anjinhas da guarda estão offline!

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