Compreensão
Disclaimer: Qualquer coisa que você reconheça pertence ao talento imensurável de J. K. Rowling; eu só os pego emprestado para brincar um pouco!
escrito por: Snarkyroxy
traduzido por BastetAzazis
beta-read por Ferporcel
* * * * * * *
Os corredores da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts estavam frios e silenciosos quando Hermione Granger parou para examinar um retrato que ela nunca vira antes. Depois de quase sete anos na escola, e muito mais explorações nos infinitos corredores do castelo que a maioria de seus colegas, ela nunca deixou de se surpreender com o quão pouco ela conhecia daquele lugar.
Depois de três meses como Monitora Chefe, suas rondas noturnas ainda a levavam para lugares do castelo que nunca vira antes. Apenas algumas noites atrás, ela descobriu uma pequena sala com um vitral que ocupava toda a parede, que intimidaria as mais belas catedrais trouxas. Ela ficara admirando-o por um bom tempo, desvendando suas formas e linhas na semi-escuridão. O desenho da janela mostrava a criação da escola e o subseqüente rompimento entre Salazar Slytherin e os outros três fundadores.
Os intricados detalhes da janela eram impressionantes, mesmo à noite. Assim, ela resolveu voltar no dia seguinte para admirar o vitral em toda a sua glória, iluminado pela luz do sol da tarde. Entretanto, no dia seguinte, ela ficou desanimada quando descobriu, depois de procurar durante o horário de almoço, que não só a sala, mas todo o corredor pareciam ter desaparecido. A estátua de Marcus, o Misericordioso, que previamente marcara o caminho para a sala, agora lhe franzia a testa, à frente de uma sólida parede de pedras.
Hermione deu um suspiro e bocejou, voltando até o saguão de entrada para uma última inspeção antes de subir para a torre da Grifinória. Ela não encontrara nenhum aluno fora das salas comunais naquela noite, o que não a surpreendeu. Embora fosse apenas novembro, o inverno havia chegado cedo e o interior do castelo ficava quase tão gelado quanto os jardins lá fora. Ela esfregou as mãos para se esquentar quando o enorme relógio do saguão de entrada começou a bater onze horas.
De repente, as portas principais se abriram e ela foi atingida por uma rajada de vento congelante. Com os cabelos batendo em seu rosto na súbita corrente de ar, viu uma figura vestida de preto da cabeça aos pés cambalear para dentro do saguão e bater as portas à sua passagem.
O silêncio repentino após o barulho do vento era insuportável. Assim que a figura a sua frente afastou o capuz da sua capa, ela o reconheceu instantaneamente.
– Professor Snape! – ela ofegou.
Ele levantou os olhos, surpreso com a presença dela. Seus olhos mostravam irritação enquanto limpava a neve e o gelo de suas vestes.
– Srta. Granger – disse bruscamente. – O que você está fazendo vagando pela escola a essa hora da noite?
– Eu estava justamente terminando minha ronda – ela respondeu, reprimindo o desejo de repetir a mesma pergunta para ele.
– Então acabe logo – retrucou rispidamente, e levantou a mão para tirar o cabelo preto do rosto. Uma mão trêmula, Hermione notou. Olhou fixamente e percebeu que não apenas as mãos dele, mas que todo o seu corpo estava tremendo. Olhando mais atentamente para o rosto do seu professor e percebeu uma gota de suor correndo pela testa.
– Professor, o senhor está bem? – perguntou.
– Dez pontos a menos para a Grifinória. Eu pensei ter acabado de dizer para ir embora – ele disse suavemente. Hermione já estivera nas aulas dele tempo suficiente para saber que, quanto mais suave o seu tom de voz, mais bravo ele estava; mas ela não se intimidaria desta vez. Alguma coisa estava errada. Então, ela deu um passo na direção dele.
– O senhor está tremendo – disse.
– Vinte pontos a menos para a Grifinória, Srta. Granger – ele urrou. – E se eu tiver que dizer mais uma vez para ir cuidar da própria vida, serão cinqüenta!
Sem esperar por uma resposta, ele virou-se e deslizou pelas escadas que conduziam às masmorras da Sonserina.
Hermione ficou parada em silêncio por um tempo antes de voltar para seu dormitório.
* * * * * * *
Na manhã seguinte, Hermione desceu para o café da manhã com Harry e Rony, sem mencionar nada do que ela testemunhara na noite anterior. Passou os olhos pela mesa dos professores e viu o Professor Snape sentando silenciosamente em uma das pontas, olhando fixamente através do Salão. Seus olhos se encontraram por um momento, mas um repentino bater de asas do correio matinal a distraiu. Uma coruja grande e escura largou uma cópia do Profeta Diário em seu colo. Desdobrando o jornal, quase perdeu a respiração quando viu a primeira página.
Uma agitada fotografia em preto-e-branco mostrava a Marca Negra flutuando no céu, sobre as ruínas do que deveria ter sido uma casa. A manchete acima da foto dizia: ‘COMENSAIS DA MORTE ATACAM: NASCISDOS TROUXA ASSASSINADOS’.
Por todo o Salão Principal, sons de espanto ecoavam a medida que os alunos que assinavam o jornal mostravam aos demais colegas a desagradável notícia. Harry e Rony, sentados um de cada lado, debruçaram-se para ler o artigo com ela. Comensais da Morte atacaram uma família de Kettering com crianças nascidas trouxa logo após o jantar na noite anterior.
– Droga – disse Rony – Eles não poupam nem mesmo crianças.
Hermione sentiu lágrimas em seus olhos enquanto lia a declaração de um oficial do Ministério, descrevendo os corpos que tiraram dos escombros da casa. As mortes da mãe e do pai foram confirmadas e, embora ainda a serem confirmados, os outros corpos eram indubitavelmente dos três filhos do casal, com quatro, seis e nove anos.
Harry apertou a mão de Hermione gentilmente, ela sentiu uma única lágrima escapar dos seus olhos e correr pelo seu rosto. Procurou pelo salão os rostos dos seus colegas. Os alunos que Hermione sabia que eram nascidos trouxa pareciam assustados, enquanto que os outros tentavam fingir indiferença, falhando miseravelmente. Apenas alguns poucos alunos na mesa da Sonserina pareciam verdadeiramente calmos.
O clima era o mesmo na mesa dos professores. Os professores Dumbledore e McGonagall conversavam em voz baixa, cabeça com cabeça, enquanto a maioria dos outros professores lia suas próprias cópias do Profeta, balançando as cabeças tristemente.
O olhar de Hermione seguiu para a ponta da mesa, onde o Professor Snape ainda estava sentado, quieto. Ele não parecia nem surpreso, nem perturbado pela notícia, e vigiava o Salão Principal com uma expressão indecifrável. Quando seus olhos se encontraram novamente, ela finalmente compreendeu.
Ela sabia que Snape havia retornado para Voldermort, desde o verão após o seu quarto ano, assumindo seu posto de Comensal da Morte enquanto espionava para a Ordem. Até aquele momento, entretanto, ela não dera mais do que uma rápida analisada sobre o que seus serviços de espião poderiam compreender.
– Meu Deus – ela exclamou em voz alta, seus olhos arregalaram-se de espanto.
– O que foi Hermione? – Harry perguntou, ele e Rony viravam-se para ela, preocupados.
Snape continuou a segurar seu olhar, e a sua súbita descoberta não passou despercebida por ele. Enquanto ela o encarava, podia jurar que ele havia balançando a cabeça. O gesto era quase imperceptível, mas o significado era claro.
– Hermione! – a voz imperativa de Rony a tirou de seu estupor e ela finalmente desviou seu olhar do mestre de Poções.
– Você está bem? – seu amigo perguntou de novo.
– Eu… eu… é… nada… é que... deixa para lá – finalmente conseguiu colocar para fora, enquanto se levantava. – Eu tenho que fazer uma coisa. Vejo vocês na aula.
Ela saiu rapidamente do Salão Principal, deixando os dois amigos confusos.
* * * * * * *
Hermione andava de um lado para o outro no seu quarto, perdida em seus pensamentos. Faltavam quinze minutos para a primeira aula do dia, que era justamente Poções. Ela não sabia se conseguiria simplesmente entrar na sala de aula e olhar nos olhos de seu professor depois das conclusões a que chegara.
Obviamente, ele estivera em uma reunião de Comensais da Morte na noite anterior, mas o que ele fizera? O Profeta dizia que apenas cinco ou seis Comensais da Morte foram vistos na vizinhança do ataque. Será que ele era um deles?
Ela estremeceu com essa hipótese.
Talvez ele não estivesse lá. Talvez ele não tivesse nada haver com isso.
Mas então, disse uma vozinha dentro da sua cabeça, por que ele estava tão agitado na noite passada?
As mãos trêmulas num homem normalmente tão calmo eram um forte indício para ela suspeitar que ele vira – ou fizera – alguma coisa terrível naquela noite.
Contenha-se, Granger, repreendeu-se. Controle essa sua imaginação hiperativa e não tire conclusões precipitadas. Organizando seus pensamentos, ela pegou seus livros e foi para a sala de aula nas masmorras, encontrando Harry no caminho. Rony havia desistido de Poções neste ano para se concentrar no quadribol, que ele esperava poder jogar profissionalmente no futuro. Tornar-se capitão do time fizera maravilhas para a confiança dele, e os jogos onde a Grifinória não era forte o suficiente para vencer na técnica, eles quase sempre venciam na estratégia.
Se o Harry achara seu comportamento estranho no café da manhã, não disse nada, apenas sentou-se no seu lugar em silêncio.
A porta da classe abriu violentamente assim que Snape entrou com passos largos na sala. Observando-o com interesse, Hermione não notou nenhum sinal das aflições da noite anterior quando ele se voltou para a classe, com o olhar de desdém fixo firme em seu rosto.
– Hoje vocês irão preparar uma Poção de Repor o Sangue – disse. – Alguém pode me dizer quais os perigos associados ao consumo dessa poção?
Hermione manteve a cabeça baixa, esperando desesperadamente que pelo menos algum outro aluno na sala tivesse feito mais do que apenas dar uma olhada na matéria.
– Srta. Granger – provocou. Ela finalmente levantou os olhos para encontrá-lo, parado em frente a sua carteira. – Não me diga que nossa atual sabe-tudo não fez sua leitura hoje? Que decepcionante.
Ela baixou os olhos para a carteira novamente, sem confiar em sua voz, mesmo sabendo perfeitamente qual era a resposta.
– Cinco pontos a menos para a Grifinória, Srta. Granger – disse com desdém, voltando para a frente da classe. – Se você não consegue levar seus estudos junto com seus deveres de Monitora Chefe, você não merece essa posição.
Com esse comentário severo, ele balançou sua varinha no quadro, e as instruções para o preparo da poção apareceram.
– Vocês têm duas horas.
Com isso, Snape sentou-se atrás da sua mesa e permaneceu lá durante toda a aula, corrigindo trabalhos, sem nem ao menos se preocupar em passear por entre as carteiras para fazer comentários sarcásticos sobre a qualidade do trabalho dos alunos. Quando Neville derreteu seu caldeirão depois de adicionar bile de tatu no lugar de heléboro, ele simplesmente levantou a sobrancelha e reprimiu friamente –, Limpe sua bagunça e poupe-me da sua presença, Longbottom.
Ao final da aula, Hermione ainda estava indignada com a insinuação dele a respeito de seu mérito como Monitora Chefe. Ela colocou seu frasco na mesa do Snape junto com os dos demais alunos e fez moção de seguir seus colegas para a próxima aula.
– Srta. Granger.
Droga, reclamou mentalmente. Depois do seu comentário afiado no início da aula, ela conseguiu passar toda a aula dupla sem encontrar os olhos dele uma só vez. Esperava que isso servisse como um sinal de que ela não queria falar a respeito da noite passada com ele. Fez sinal com a cabeça para Harry continuar sem ela, e voltou para a sala de aula de Poções.
Ele permaneceu sentado à sua mesa e gesticulou para que se sentasse a sua frente, fechando a porta da sala com um gesto de sua varinha.
– Eu não estou acostumado a ter que dar explicações aos meus alunos – disse com um olhar de desprezo –, mas nestas circunstâncias, eu acho que a verdade seria melhor que a especulação e as hipóteses que, sem dúvida, estão passando na sua cabeça.
Ela se arrumou com altivez na cadeira, fazendo a melhor imitação que podia do desdém dele em seu rosto.
– Não se sinta obrigado a me dar nenhuma explicação, professor – ela argumentou. – Suas atividades extracurriculares não me dizem respeito, assim como as minhas também não interessam ao senhor. Quanto às minhas especulações, não imagino que estejam longe da verdade.
– Dez pontos a menos para a Grifinória, Srta. Granger – disse seco. – Não use esse tom de voz comigo.
Ela não se desculpou, simplesmente segurou seu olhar e esperou até que ele continuasse. Ele se levantou e andou de um lado para o outro atrás da mesa, ia cruzar os braços no peito, mas pensou melhor e decidiu fechar as mãos em punho ao longo do corpo.
Ele está nervoso? Hermione pensou. Esse comportamento tão incomum fez com que ela suavizasse seu tom severo.
– Desculpe-me, professor – disse. – O senhor não me deve nada e não deveria ter que se explicar para mim.
Ele levantou a cabeça e a examinou curiosamente, o sinal de um sorriso sarcástico aparecendo em seu rosto.
– Estou vendo que você é mais perceptiva do que o seu amigo famoso – zombou. – Se ele imaginasse metade do que você deduziu, ele desceria até aqui exigindo um relato minucioso pela Penseira.
Hermione ignorou o menosprezo ao Harry, pois sabia que Snape nunca o perdoara por ter olhado suas lembranças na Penseira, mais de dois anos atrás. Se ela tivesse tais memórias, duvidava que teria sido muito clemente, também.
– Eu não disse nada a ninguém, professor – ela disse. – E nem planejo contar.
Ele assentiu.
– Sua discrição é... bem-vinda. – disse calmamente, levantando-se. – Se você é capaz de manter essa informação para si mesma, acredito que mais nenhuma explicação seja necessária.
Ela permaneceu sentada.
– Só uma coisa, professor – disse hesitante.
Ele levantou uma sobrancelha e sentou-se novamente atrás de sua mesa.
– Eu sei um pouco sobre o que o senhor tem que fazer pela Ordem – começou, tentando manter sua voz calma e uniforme. – Eu também sei um pouco sobre as coisas terríveis que os Comensais da Morte fazem, e se eles as fazem por vontade própria ou por obrigação, isso não torna as coisas mais fáceis.
Ela tomou fôlego, feliz ao perceber que o olhar dele estava fixo na superfície da mesa. Para falar a verdade, este ataque dos Comensais da Morte a afetara mais que os outros que ela ficara sabendo através de Harry ou da Ordem. Este foi o primeiro ataque a virar primeira página de jornal, tornando-o ainda mais real. E a dura verdade era que a família atacada não era muito diferente da sua própria família.
– Dez anos atrás, minha família era exatamente como a que morreu na noite passada – ela disse. – Eu já mostrava sinais de magia ainda muito nova, mas meus pais não os reconheciam pelo que eram. E matar toda uma família só porque as crianças são algo que eles não entendem, ou nem mesmo escolheram...
Ela parou subitamente, sua voz engasgada em sua garganta.
– Este ataque me atingiu muito de perto, e saber que poderia ter sido evitado... eu... só me diga que o senhor não estava em Kettering ontem a noite.
Pronto. Eu disse. Ela se recostou na cadeira e esperou pela explosão.
Mas não houve explosão.
– Eu disse que lhe contaria a verdade, Srta. Granger – ele respondeu calmamente. – Assim, temo que essa declaração esteja fora das minhas possibilidades.
Ela olhou fixamente para ele, ou melhor, para o topo da cabeça dele. Lembrou-se da expressão de indiferença no seu rosto, durante o café da manhã. As mãos dele tremendo na noite anterior.
Não era apenas a sua imaginação superativa inventando ilusões horríveis a partir de poucas informações.
Ele estivera lá. Ele presenciou tudo. Ele sabia o que aconteceria e não pôde fazer nada para impedir.
– Meu Deus – ela suspirou.
Ele deixou escapar uma risada áspera e desagradável. Ela ergueu seus olhos, espantada.
– Essa desculpa trouxa de salvador, não tem vez aqui, Srta. Granger – desdenhou. – Existem coisas neste mundo muito mais repugnantes do que qualquer entidade poderia sequer compreender, muito menos criar.
Ela o olhou por um momento, horrorizada, compreendendo, até que seus olhares se encontraram calmamente.
– Sim – ele disse cruelmente. – Eu estava lá. Eu fiquei sabendo do ataque com uma hora de antecedência e não fiz nada para salvá-los. Eu não lancei nenhuma Maldição de Morte, mas eu fiquei lá parado e assisti enquanto outros o fizeram.
Ela começou a se sentir mal. Levantou-se bruscamente, derrubando a cadeira, e dirigiu-se até a porta. Ele foi mais rápido, entretanto, e quando ela abriu somente uma fresta ele empurrou a porta com força, com a mão acima de sua cabeça, mantendo-a fechada.
– Deixe-me sair – ela teimou, ainda virada para a porta.
– Olhe para mim, Srta. Granger – ele ordenou.
Ela suspirou e virou-se para encará-lo. A mão dele estava acima do seu ombro, ainda mantendo a porta fechada.
– Eu fiz o que tinha que ser feito – ele sibilou, tão perto dela que ela podia ver seu reflexo nos impenetráveis olhos pretos –, como todos fazemos em tempos como esses. A maioria das coisas que temos que fazer é desagradável e nenhuma é fácil, mas eu faço o pouco que posso, e nessa guerra tudo conta, não importa o quão insignificante seja.
Ela assentiu, desviando seus olhos.
Ela pôde sentir o olhar dele por um momento, até que ele percebeu que essa era a única resposta que receberia dela. Suspirando, removeu a mão dele da porta e recuou, deixando-a passar.
Ela fugiu das masmorras o mais rápido que pôde, sem sequer parar nem para tirar pontos de dois alunos que tentavam enfeitiçar um ao outro no corredor principal.
* * * * * * *
Continua.
N/A: Comentários serão sempre bem-vindos.
N/T: Não posso deixar de agradecer a Ferporcel, minha beta-reader e sócia nessa aventura, pela imensurável ajuda e paciência para procurar cada palavrinha típica do mundo mágico! E também a Mi_Granger que faz a revisão final.
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