Capítulo IX
Capítulo IX – Porque vale a pena...
Mas o que aconteceu nos próximos dias era bem diferente do que qualquer um deles poderia imaginar. Era certo que vários artigos do Profeta insistiam em um perigo constante fora das paredes de pedra do castelo, e anunciavam o desaparecimento e mortes de aurores e pessoas com ligação à estes - mas o que ninguém podia esperar que acontecesse era o perigo ao lado. Literalmente ao lado.
- Sirius, acorde! - a voz de Thiago feriu-lhe os ouvidos pela manhã.
Ainda era muito cedo e o garoto contou dez segundos até levantar a cabeça para ver o que acontecia. Thiago levaria três chutes se fosse alguma inutilidade. Afinal, o que poderia acontecer uma hora daquelas, no dormitório masculino? A cortina da cama de Sirius já estava completamente aberta, e a da cama ao lado também. Rabicho, pensou. A cama estava vazia e os lençóis estavam completamente arrumados e intactos. Thiago e Remo estavam em pé, o primeiro trocava o pijama.
- O que aconteceu? - perguntou aos amigos.
- Seria bom se a gente soubesse. - Remo disse, andando de um lado para o outro, visivelmente impaciente. Ele, mais do que os três, suspeitava dessas fugas de Rabicho e certamente, agora, tinha vontade de explodí-lo - São quatro e quarenta da manhã! Aquele rato miserável vai ter que abrir a boca de uma vez por todas!
- Ninguém o viu ontem? - Sirius disse, sentando-se e arrumando os cabelos com as mãos.
- Ontem teve aula na torre de Astrologia. - lembrou Remo - e pra falar a verdade, não me lembro de tê-lo visto nem no jantar.
- A última vez que eu o vi foi ontem de manhã...
Os seus passos escoavam secos pelos corredores, e a professora McGonnagal fora bem clara ao avisar que em menos de dez minutos ele teria de voltar com o seu dever feito, ou suas médias em Adivinhação seriam um fracasso. Sirius correra na maior parte do caminho até o dormitório e estava retornando quando decidiu desacelerar os passos, cansado de subir as escadas e passar pelas passagens mais íngrimes nas passagens secretas que só os Marotos sabiam. McGonnagal certamente dissera aquilo sabendo que o garoto não conseguiria chegar a tempo, mas Sirius era esperto - e só pra enfatizar, esta é uma lembrança de Sirius. Qualquer um dos Marotos sabia o que ele iria fazer.
Então, ouviu sussurros. Era fácil ouvir vozes pelos corredores, mesmo que vazios, pois os quadros tinham o costume de 'sussurrar' invés de 'falar' quando conversaram, como se não pudessem ser percebidos. Mas não eram sussurros vindos de quadros.
- Eu simplesmente não posso!
Sirius parou de andar imediatamente. As vozes vinham de um corredor atrás de uma armadura velha com um brasão de um texugo. Então ele reconheceu a voz de Rabicho.
- Já disse que isso é impossível! Dê um jeito de mudar a mente del...
- Não me importa o que você pensa, seu sujo. Por mim você estaria morto! Só estou lhe passando uma ordem, e você não ouse desobedecer!
- Malfoy... - ele suplicou. Sirius agora se esgueirava muito próximo ao corredor, a fim de não perder nenhum detalhe. - ...não dá.
Malfoy? Ou Sirius estava delirando, ou estava. O que eram aquelas conversas? Rabicho andava muito estanho de uns dias para cá, e não foram só os Marotos que perceberam suas abusivas e freqüentes sumidas. Alguns professores comentaram com Rabicho nos corredores até mesmo do seu melhor empenho nas aulas e seu afastamento do 'grupinho Maroto', como eles denominavam. Mas daí andar com um sonserino e conversar coisas que poderiam ter várias interpretações...
- Fale você mesmo com ele.
- Como isso é possível?
- Chame-o. Você saberá onde ir. - falou o outro, que era Lúcio, e Sirius ouviu seus passos apressados para o outro lado do corredor.
Sirius encostou-se na parede e fez uma bolinha vermelha com a varinha, jogando-a no chão para voltar a sua mão e repetir o gesto várias vezes. Queria disfarçar que ouvira a conversa. Então, Rabicho voltou-se para o corredor na direção em que Sirius estava. Notou que Pedro ficou tremendamente pálido, os olhos arregalando-se exageradamente.
- Que susto hein. - riu Sirius - porque anda escondendo-se pelos corredores, seu fedorento?
Pedro pensou que ele não ouvira nada.
- E-eu...
- Está tendo aula de Adivinhação. McGonnagal está louca com você por causa do trabalho final que você não apresentou! - informou, em tom de brincadeira.
Sirius era tão bom em certos momentos com disfarce que gostaria de poder ser assim em todas situações. Mas se Sasha cruzasse agora mesmo aquele corredor, não resistiria e esqueceria o assunto do rato para ir acompanhá-la para onde quer que fosse.
- Então o que estamos esperando ? - Pedro tentou sorrir, retornando em direção à sala de aula de Adivinhação que não ficava longe dali, fazendo uma careta ao virar-se de costas à Almofadinhas.
- Ele ficou meio avoado na aula de Adivinhação - comentou Thiago após a narração de Sirius. - sabe, de uns dias para cá ele parece mais ligado nas coisas, mais atento. Mas ontem ele parecia preocupado e estava pensativo.
- Isso que você contou é muito estranho, Sirius - falou Remo. - E se ele foi atrás desse tal?
- Aí não vamos achá-lo nunca! - respondeu Sirius.
- Hey, calma. Não é porque ele não está na cama às quatro da manhã que significa que não vamos achá-lo nunca mais. - disse Thiago - Ele é burro, mas eu acho que pode se cuidar sozinho, onde quer que esteja.
- É... ou talvez não.
- Cale a boca, Sirius! - Remo falou com a voz mais elevada - não se esqueça que apesar de tudo ele é um maroto como nós!
- Sim, Aluado. Mas nem eu e nem você fazemos coisas que não compartilhamos. E o que eu contei foi realmente sério. - a voz do garoto era calma - os dois estavam conversando como se fossem colegas! Como se estivessem sujeitos a algo que os ligasse independente de suas vontades!
- Essa foi forte. - comentou Thiago com um sorriso.
- Não estou brincando, Pontas. O ar estava realmente pesado naquele corredor.
- Acho que vocês estão levando isso tudo à sério demais. - Thiago tinha terminado de se vestir e amarrava os calçados enquanto falava - vamos procurá-lo na cozinha, em algumas passagens e falar com Pirraça, você sabe que ele pode ajudar muito! Vamos nos jardins e depois na cabana de Hagrid. Se não o acharmos em lugar algum, aí comunicamos as autoridades. - brincou ele, rindo em seguida.
Os outros dois concordaram e terminaram de se vestir. Já eram quase cinco horas quando eles desceram as escadas rumo ao salão comunal, cujo silêncio era estarrecedor e fez Sirius estremecer. A lareira estava apagada e o recinto estava totalmente escuro, mas eles não acenderam nenhuma luz que pudesse chamar a atenção de terceiros. Thiago levava a capa da invisibilidade nos ombros e Sirius o canivete que ganhara de seu avô.
O primeiro lugar onde foram procurar foi a cozinha. O quadro das frutas parecia tão calmo e intocável que um dejá-vù passou por eles, embora nenhum deles quis comentar. Rabicho não estava lá. A grande mesa comprida e todos os equipamentos de cozinha estavam limpos, arrumados e misteriosamente imaculados. Alguns elfos acordavam e movimentavam-se no fundo da cozinha, mantendo o silêncio precioso da manhã.
- Ótimo. Aqui era o lugar mais provável. - foi Thiago quem quebrou o silêncio.
A tensão aumentou quando foram para a torre de Astrologia e não acharam nem rastros; também não acharam nada olhando através das janelas e nos corredores principais. Então, tomaram a passagem secreta para Hogsmeade.
Foi aí que começaram a ficar realmente preocupados. Não haviam nem pegadas na passagem, e nem sinais de que Rabicho estivera ali há algumas horas, nem mesmo quando chegaram acharam o garoto.
- Acho melhor voltarmos... - falou Aluado, coçando a cabeça preocupado - ... e contar à Dumbledore sobre isso.
Eles começaram a caminhar de volta, um silêncio se fazendo entre eles. Eram tempos difíceis, isso os pais de Thiago insistiam em sobressaltar em todas as cartas que mandavam ao filho. Certa vez, aconselharam que o garoto ficasse o máximo possível em seu dormitório e não falasse com quem ele nunca tivesse visto no castelo. ''Hogwarts é um lugar seguro'', ele pensara, e afinal não tinha todo esse medo do tal bruxo que saía ''aterrorizando as criancinhas''. Para Thiago, Você-Sabe-Quem não era homem suficiente - ele matava impiedosamente, e isso era o pior.
Remo agradecia por não ser lua cheia, ou daria mais preocupações aos Marotos que caminhavam com ele paralelamente, e podia-se perceber claramente que ambos estavam pensativos e preocupados. Não que também não estivesse, mas só agradecia por este detalhe. As notícias de desaparecimentos dentro do Ministério haviam aumentado de uns tempos para cá, e não havia um único bruxo que não estivesse alertado e receoso.
Sirius estava, acima de tudo, pensando em sua família. Ele não contou aos outros dois para não preocupá-los, mas sabia que os Malfoy eram seguidores assíduos do bruxo das trevas. Seus pais e os pais de Malfoy vez ou outra apareciam com reuniões ultra confidenciais e secretas na casa dele durante as férias, e com certeza apareciam também durante o Natal e outros feriados, mas isso ele não ficava interessado em saber, pois o quanto mais longe ficasse da casa nesses dias, melhor e menos desgastante. Uma semana que passava naquela casa, para ele, era um ano. Ía para a casa dos Potter sempre mais sério, e Thiago sempre conseguia animá-lo com suas brincadeiras, com o quadribol e os planos contra Snape e os sonserinos. Thiago era um porto-seguro nessas horas, pois seus parentes conseguiam enlouquecê-lo se ele deixasse! Mas ele sempre ligava para Thiago e este sabia o que fazer. Era difícil alguma vez em que nenhum dos marotos fosse na casa de Thiago nas férias, pois os pais dele gostavam muito deles e faziam de tudo para levá-los para lá, ainda mais de Sirius, que conheciam a história da sua família e o tratavam como se fosse um segundo filho. E Rabicho, sempre confiara os segredos de sua família a todos os marotos, e isso não tirava Pedro. Quietinho, ele sempre escutava tudo, ria das piadas sem graça de Thiago e apoiava os comentários sábios de Remo, mas nunca dizia nada que pudesse ser construtivo. Nunca confidenciara algo de sua família; e Sirius não se lembrava de alguma vez que tivesse visto seus pais.
- Thiago, você conhece os pais de Rabicho? – ele não se conteve em perguntar.
Por um momento, o moreno pensou, e concluiu:
- Faz muito tempo, eu os vi na plataforma, acho que foi no segundo ano. Fui correndo falar com eles e apresentar meus pais... vocês sabem, Rabicho foi o primeiro dos Marotos que eu conheci. – observou – mas o que me pareceu foi que ele afastou os pais e praticamente mandou-os embora, antes que eu os alcançasse.
- Estranho, não me lembro deles também. – falou Remo.
- Mas o que isso tem a ver? – perguntou Thiago – vamos escrever a eles se viram o filho por aí, pode dar certo! – ironizou.
- Cale a boca! Eu só estava pensando...
E novamente, eles caminharam em silêncio, e perceberam que já estavam nas propriedades do castelo.
- Talvez ele tenha saído para Hogsmeade, quer dizer, ter entrado lá. – profetizou Aluado.
- É. Talvez ele esteja bêbado na praça, se lamentando pela vida que leva... – riu Pontas.
- Talvez a gente esteja se preocupando demais! – quis esquecer Sirius.
- Vamos voltar para o dormitório e ir para as aulas, estou podre de cansado. – disse Remo, e assim fizeram.
Thiago cochilava levemente na carteira, os cabelos caindo-lhe sobre os olhos, a boca meio aberta. Lily riu ao vê-lo, da carteira ao lado, e olhou para o professor. Era o último dia de aula do professor Charlen, e todos os alunos estavam emocionados (ironicamente, é claro), mas o professor parecia realmente abatido, como se o que fosse acontecer a seguir em sua vida profissional não seria nada como um mar de rosas. Ele riscava lenta e tristemente o quadro negro à sua frente, sem a mínima vontade de fazê-lo.
Então, a ruiva pegou a própria varinha e aproximou-a do rosto de Thiago, sussurrando um feitiço de criar traços, e desenhou um bigodinho italiano no garoto. Sasha riu ao seu lado, o que chamou a atenção de Sirius, o qual, do lado de Thiago, estava com o cansaço estampado no rosto, escorado na carteira, os olhos piscando. Ele remexeu-se e olhou o amigo, dando um imenso sorriso à elas, seus olhos com um inconfundível brilho maroto. Por baixo da mesa, ele desamarrou os cadarços de Thiago e amarrou os do pé esquerdo com os da direita. Mordendo os lábios, ele observou enquanto Sasha inclinava-se por cima de Lily para transfigurar a camiseta de Thiago para uma mais apertada e sem mangas, com um decote em V. Remo, na carteira de trás sozinho (Rabicho costumava ser seu parceiro nas aulas de Defesa Contra as Artes das Trevas), quase não agüentou segurar a gargalhada, ao mesmo tempo em que copiava o que o professor escrevia.
E eles nem perceberam quando o professor virou-se para olhá-los, percebendo a agitação dos alunos.
- Black, Lupin, por favor. – então seus olhos foram parar em Thiago. - Senhor Potter! Quanta falta de consid... oh!
Thiago, com os olhos inchados de sono, levantou a cabeça lentamente, olhando à sua volta. Então, olhou para o professor. Não entendia porque todos olhavam para ele com aquele olhar hilariante. Quando o professor Charlen explodiu em uma gargalhada muito sonora que percebeu que havia algo de errado, e então olhou para si, dando um pequeno sorriso para Sirius. A sala explodiu em risos.
- Bela maneira de aproveitar o último dia! – bradou o professor, ainda rindo – obrigada, garotos, vocês conseguem! – e enxugou os olhos.
- Eu vou te matar Almofadinhas. – ele avisou, murmurando para o amigo.
- Alegre-se, Pontas! Você fez um homenzinho feliz. – ele falou apontando para o professor, e então riram.
Após desfeitos os feitiços, Thiago não saiu da sala sem dar um belo tombo pelos cadarços amarrados, e novamente ameaçou Sirius de morte.
- Não se trai um maroto sem sair completamente vingado! – ele falava, enquanto ria e amarrava corretamente os sapatos.
E esse episódio à lá Marotos amenizou a preocupação dos garotos com relação ao sumiço de Rabicho.
Em dezembro de 1977, completou-se três semanas do desaparecimento de Rabicho, e faltava apenas uma semana para o baile de Natal. A essa altura, os marotos e as meninas estavam cansados, abatidos e sem ânimo nenhum para a festa (e sim, fora desmentida a história de que a semana que antecedesse a festa seria de férias. ‘Por favor, depois do baile vocês irão para casa! Parem de me pedir férias!’, irritou-se Snape quando uma aluna da Sonserina atreveu-se a perguntar a ele.)
Após voltarem da busca particular por Rabicho, sem sucesso, os Marotos foram direto à sala da Profª McGonnagal, que os atendeu com uma expressão sonolenta e um roupão bordô, mas ficou subitamente agitada ao receber a notícia dos garotos. Foram então ver Dumbledore, e nenhum deles pôde deixar de notar a aparência desgastada e os olhos mais fundos do diretor, que antes costumavam irradiar mais vitalidade. A partir daí, os alunos e os pais foram avisados do desaparecimento – daí conheceram os pais de Pedro. Edgar e Alicia Pettigrew eram o tipo de gente que definitivamente não parecia simpática. O casal chegou na escola dias depois de avisado o desaparecimento, onde planejariam meios de encontrar o filho com o diretor – e isso demonstrou a falta de interesse de ambos. Alicia era vendedora de roupas bruxas que fabricava em casa, e Edgar trabalhava em uma loja distribuidora trouxa.
Thiago estranhou definitivamente os dois, e comentou com Sirius e Remo. ‘Eles são pais de Pedro’ , eles responderam, ‘queria que fossem normais?’. Mas alguma coisa intrigou os garotos com essa demora, essa falta que os dois fizeram em três dias de espera para atender ao filho. Não pareceram realmente preocupados. Pareciam estar ali para cumprir um compromisso simples.
Agora um mês, e Rabicho sem nem sinais. Sasha e Lily estavam cumprindo o papel de dar apoio aos garotos, pois entendiam como deveria ser difícil para os três, do nada, perder um amigo. Não que eles tivessem realmente perdido, sabe, mas era completamente revoltante.
Estavam no salão comunal e Sirius conferia pela trigésima vez o Mapa do Maroto para ver se os pezinhos de Pedro desenhavam sobre sua superfície.
- E se ele fugiu ? – Sirius de repente quebrou o silêncio.
- Pessoas que fogem deixam cartas. – respondeu Remo, que sentia-se mais cansado que os outros. Amanhã seria lua cheia.
- Pedro é idiota, ele não tem criatividade para cartas. – Thiago falou, espetando os cabelos.
- Vocês acabam com o coitado! – Lily bradou – ninguém sabe onde ele pode estar ou o que podem estar fazendo com ele!
- Aaaah, agora ele é o coitado – ironizou Pontas, os olhos brilhando – só agora que ele desaparece e vira notícia na escola inteira ele é o legal, o bonito, o gentil, o coitado! Tenha santa paciência, ruivinha...
- Cala essa boca estúpida, Potter! Eu não falei nada disso! – as bochechas dela começaram a avermelhar-se – estou tentando colocar na sua cabeça do tamanho de uma semente de mostarda que o que está acontecendo lá fora não está restrito à lá fora! Por Merlin! As pessoas estão desaparecendo todos os dias, estão sendo encontradas mortas! Não estou tendo piedade dele, Potter, estou tendo apenas consciência de sua situação!
- Enxerga o que você está fazendo, Evans! Você nem conhecia ele, nem ao menos conversava com ele, ignorava-o como uma batata assada que nos seguia e agora está querendo conscientizar-se da situação? – a voz dele começou a elevar-se, e todos na sala sabiam o que viria a seguir.
- Por favor, gente... – começou a pedir Sasha, sabendo que essa não seria das briguinhas casuais. O assunto discutido era sério e uma briga a mais não ajudaria em absolutamente nada no momento; mas Thiago e Lílian não eram pessoas de se deixar calar.
- Não gostava mesmo dele! Se você não percebeu, idiota, eu estou preocupada é com você!
E isso calou Thiago imediatamente, que levantou-se para correr atrás de uma ruiva muito furiosa que subiu as escadas do dormitório feminino. Nem precisa dizer que a escada virou escorregador, e lá se foi Thiago...
- Droga.
- Não sei o que acontece, parece que o ímã de vocês está ao contrário – comentou Sasha – se atraem muito, mas a mesma força é usada contra vocês mesmos! – ela terminou sorrindo.
- Aquela ruiva vai me escutar. – declarou Thiago.
E ele continuou falando mais para si mesmo do que para qualquer outro. Remo abaixou a cabeça para o mapa que Sirius lhe entregara, e Sasha foi até a janela. Encostando-se no batente, avistou a escuridão da Floresta Negra perder-se no horizonte guiado pelo luar, e o lago, de prata, estender-se e dobrar-se em ondas. Na margem, pensou ter visto um vulto negro. Tentou distingui-lo, mas sua respiração estancou-se no mesmo momento em que apertava as vistas: dois braços fortes e seguros abraçaram sua cintura levemente por trás, aconchegantes, e a cabeça de Sirius encostou-se em seu ombro, admirando a vista que tinham. E, como se não fosse de costume, o hálito do garoto encheu-lhe as narinas e embriagou-a. Foi o suficiente para esquecer do vulto na margem.
- E aí, garota? – ele falou com a voz macia, bem debaixo do seu ouvido, fazendo-a arrepiar-se. – já tem companhia para o baile ?
- Ninguém se importou de me chamar ainda... – ela amuou-se, cruzando os braços.
- Sabe... você é uma garota bonita, Sasha... não pode ir sozinha à esse baile... – e beijou levemente o ombro em que encostara a cabeça.
Sasha pensou por um instante. O que ele estava fazendo? Por Merlin, se queria conquistá-la por inteiro estava conseguindo. Por um instante, dedicou-se inteiramente à sentir o roçar do nariz de Sirius pelo seu pescoço, e ela observou que nunca recebera melhor convite na vida.
- Obrigada Sirius, mas... ninguém que me convidou até hoje valia realmente a pena.
Ele mordeu levemente seu ombro, e isso fez ela saber que ele entendera nas entrelinhas.
- E quem você acha que vale a pena?
- Alguém que mesmo preocupadíssimo, consegue pensar em bailes e garotas, e todas essas coisas... – ela virou-se de frente para ele, segurando seu abraço.
- Se está se referindo a mim, não é que eu não consiga parar de pensar em garotas... é que eu não consigo parar de pensar em você. – e prendeu seu olhar no dela.
E eles foram como um ímã. Ela aproximou seu rosto do dele lentamente, e quando seus lábios estavam a uma polegada de distância, ela sussurrou:
- Então vale a pena... – e beijou-o docemente.
Encostou-se na parede branca do quarto, sentando-se e tampando os ouvidos com as mãos. Não queria ouvir nada; repudiava todos os sons que se faziam nesse momento nas paredes da casa. Uma fina lágrima cortou-lhe o rosto muito branco e escorreu até a boca, umedecendo-a. Sasha mordeu os lábios. Respirou fundo e pôde sentir o cheiro da tinta das paredes recentemente pintadas, e também o cheiro das flores no jardim embaixo de sua janela. Embriagou-se com eles, qualquer coisa que a fizesse esquecer-se do que estava acontecendo.
Então, uma súbita onda de calor passou pelo próprio corpo: era uma mistura de raiva e coragem que a fez perceber que não adiantava se esconder de nada daquilo, e que aquele medo não mudaria nada do seu destino. Respirou fundo e desprendeu as mãos dos ouvidos lentamente, voltando a ouvir os sons. Ouviu um baque muito forte, seguido de um grito de sua mãe. Grudou na porta para ouvir melhor.
- Não preciso falar de novo! – aquela voz horrível que feriu-lhe os tímpanos.
- Acho melhor você desistir! – seu pai bradou, parecendo furioso – já avisamos! Não volte mais aqui!
- Vá embora! – gritou a mãe de Sasha.
- Se é assim que decidiram... então que assim seja! – a voz, agora parecendo terrivelmente revoltada e vingativa, terminou: - só que depois... NÃO RECLAMEM DAS CONSEQÜÊNCIAS! – e um baque se fez.
E o silêncio reinou. Sasha abriu a porta devagar, para garantir que não havia mais perigo; quando teve certeza, escancarou a porta e correu para a sala, chorando. Sua mãe e seu pai estavam meio em transe quando ela chegou, e a primeira chorava muito. Abraçou-a e ninou-a, dizendo: ‘Não fica assim, mamãe... a gente sabe que ele não teria coragem...’. A mãe respondeu o abraço e seu pai abraçou as duas.
No dormitório feminino da Grifinória, Sasha Mills levantou-se da cama com um susto, olhando atenta ao seu redor. A lembrança viera tão repentina em forma de sonho e, se não viesse, não se lembraria nunca daquilo. Acontecera quando devia ter uns 7 anos; e ao sonhar parecera reviver o momento com tanta clareza que quase chegou a sentir a angustia que sentira quando acontecera. Levou as mãos ao rosto e sentiu as próprias lágrimas molharem as pontas de seus dedos.
Tentou dormir de novo, mas não conseguiu. Colocou seu roupão, desceu as escadas e sentou-se de frente para a lareira, e começou a pensar em tudo o que sua mente trabalhara para esquecer naqueles dias...
O frio cortava e batia nas janelas quase como pedindo para entrar. Lá fora, a neve insistia em cair lentamente e fina, e os Marotos estavam cheios de blusas e cachecóis. Thiago e Sirius, perto da lareira, dividiam um cobertor muito grande e grosso, discutindo sobre times de quadribol. Remo cochilava no sofá cheio de almofadas, e Lily e Sasha desceram as escadas cheias de blusas, luvas e tocas. Pareciam animadas.
- Vocês duas não estão pensando em sair, estão? – quis saber Sirius.
As duas se entreolharam e pararam no caminho à saída pelo quadro. Lily sorriu:
- Na verdade, estamos sim.
- Vai querer nos impedir? – provocou Sasha.
- Não vou impedir vocês de nada – ele respondeu chateado – só estava me perguntando onde é que duas garotas como vocês fariam lá fora num dia como hoje, que a gente tem a tarde toda livre para fazer o que quiser...
Sasha sorriu, sabendo no que ele pensava.
- Se quiserem vir conosco... – convidou.
Lily pisou forte no pé de Sasha; ela sabia que, se chamasse-os, iriam os quatro. Sasha e Sirius, e ela e Thiago. Remo cochilava e nenhum deles o acordaria com certeza!
- Vamos à Hogsmeade. – a morena falou, sorrindo.
- Seria ótimo. – disse Thiago. – tenho que comprar umas coisas para o baile.
- Mas não é permitido que os alunos saiam hoje. – Lily falou automaticamente.
- Sim, gracinha, mas desde quando você e Sasha não são alunas? Por favor. – ele falou, abaixando a voz, para nenhum outro aluno que estivesse lá escutar – e eu e Sirius sabemos por onde ir sem que ninguém nos veja, além de ser muito mais rápido...
- Tentador. – Sasha falou.
- Então vamos logo! – apressou-se Sirius. – um minuto garotas, vamos nos vestir adequadamente... – levantaram de um pulo do cobertor, jogando-o em cima de Remo, e subiram para se trocar.
Quando terminaram, descendo as escadas e passando pelos corredores da escola até o seu destino, Sirius e Sasha foram um pouco mais à frente, deixando Lílian e Thiago atrás. Haviam passado dois dias desde que haviam discutido no salão comunal e desde então ela ignorara-o terminantemente, fingindo que ele nem ao menos existia quando se sentava do seu lado para discutir ou esclarecer-se.
- Olha, Lily... me desculpe por aquele dia. – ele rendeu-se – eu estava nervoso demais com o desaparecimento de Pedro e... acho que me exaltei com você. Você só queria ajudar. – ele fez um carinho em seu rosto, fazendo-a corar, mas ela não respondeu.
Após um minuto quase secular de silêncio, ele falou de novo:
- Você não precisa dizer nada mesmo. Eu sei que eu errei com você.
A sua honestidade transparecia e uma bondade incrível transbordava de seus olhos; bondade essa que a ruiva nunca havia se preocupado em notar, mas agora fixou seus olhos verdes muito profundamente. Ela sabia que ele podia jogar na cara dela as tantas vezes que ela fora grossa e estúpida com ele, sem ao menos se desculpar, mas ele não fez isso. Ele apenas se desculpou, e isso somou vários pontos...
- Tudo bem, Potter. – falou amigavelmente, sorrindo.
Thiago deu um de seus sorrisos encantadores.
- E isso não significa que o que estamos fazendo, é um encontro. – ela ralhou em seguida – Sirius e Sasha sim, mas nós estamos apenas fazendo compras! – determinou.
Ele deu um sorrisinho e calou-se.
E a tarde que passaram foi realmente divertida. Apesar do frio no caminho de ida, eles tinham calor humano suficiente para superá-lo facilmente. Ao chegarem no vilarejo, meio às escondidas, as garotas se dirigiram à loja de roupas de gala e os dois correram para a loja de sapatos. Depois, se encontraram na loja de doces. Sirius presenteou Sasha com um pirulito de coração que só tinha gosto quando duas línguas o saboreavam ao mesmo tempo, o que fez a garota rir muito. Lily, de início, andava em silêncio com Thiago, respondendo ocasionalmente suas perguntas quando ele tentava puxar assunto, mas depois cedeu e conversou com ele normalmente, deixando o assunto fluir e percebendo que não tinha fim.
Estavam caminhando até o alto de um morro coberto de neve, de onde Sirius prometeu às duas uma surpresa inesquecível. Sirius ia mais à frente, brincando e casualmente dando beijos no rosto de Sasha. Em um momento, na estradinha de terra, o silêncio reinou entre Lílian e Thiago, constrangendo a primeira.
- E aí, pronta para o baile depois de amanhã? – ele atreveu-se a perguntar.
- Ah... não vou acompanhada, mas estou achando que vai estar animado. – ela sorriu.
- Não quis aceitar a minha proposta... – ele cantarolou.
- Não quis mesmo, Potter, mas pra falar a verdade não estou muito preocupada em arrumar um par não. – falou casualmente.
- É... o desaparecimento daquele idiota causou muito mais que só a falta dele. – falou o moreno, tirando a neve do cabelo bagunçando-os ainda mais – não consigo me concentrar nas aulas, em mais nada. Ruivinha, você acredita que nem planos perversos os marotos estão tramando essa semana? – ao notar que ela não fizera nenhum comentário sobre o ‘ruivinha’, continuou – nesse baile muita coisa poderia acontecer... mas estamos preocupados demais.
- Vai ser bom... vocês esfriarem a cabeça. – ela sorriu – De uns dias para cá... não são só vocês que andam com a cabeça nas nuvens. Eu mesma vivo acordando no meio da noite com as vozes de Sasha. – falou, em voz baixa. – mas não fale para ninguém, Potter. Estou te contando pois estou preocupada com ela também.
- Preocupada com Sasha?
- Sim, ela diz coisas à noite como ‘’Não, não vai ser o melhor pra mim... mamãe, por favor... pare de chorar... vá embora... foi longe demais...’’, são só as coisas que eu lembro, mas ultimamente ela anda falando muito enquanto dorme. – disse; e em seguida quase não acreditou que confidenciara aquilo à ninguém menos que Thiago Potter... mas céus, ela precisava desabafar e ele parecia tão disponível! – não conte a Sirius, Potter... mas tem algo preocupando-a profundamente.
- Pode ser sobre Pedro... não pode? – ele arriscou.
- Seu retardado, ela nem gostava de Pedro. – ela riu – Não. – ficou séria de repente – acho que é algo muito mais sério que Pedro.
E olhou para a amiga em sua frente, juntando a neve que se acumulava na beira da estrada com as mãos em concha para jogar em Sirius, que ia na frente sorrindo e tentando ao mesmo tempo juntar neve com as mãos e olhar o que a morena fazia. Lily tentou imaginar o que poderia amedrontar Sasha; o que a fazia tão frágil e sensível em seus sonhos. Mas não conseguiu pensar em nada terrível ou forte o suficiente.
P.s: Ah, dá pra acreditar que eu voltei pra postar esse capítulo? Depois de quase dois anos sem escrever nadinha nadinha, to aqui arranhando e percebendo que eu precisava ter praticado mais! ;P ainda me lembro de tudo que eu tinha pensado para escrever para essa fic...
Mas não esperem muito de mim, de verdade! Amanhã eu posso decidir que não vale mais a pena continuar escrevendo ;] e novamente dois anos irão se passar... hahaha! Não sei quando sai o outro capítulo.. então, boa leitura e... até a próxima!
Beijos, Nah *
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