O medalhão estilhaçado
14. O medalhão estilhaçado
- Luna o quê? – disse Harry desesperado, olhando em volta e contando mentalmente quantos estavam ao seu redor. Dumbledore estava atrás dele, abaixando-se para medir a pulsação de Snape. Neville estava olhando para o horizonte com lágrimas nos olhos, provavelmente se perguntando onde estaria Luna a uma hora dessas – e se estava viva.
- Vamos entrar, venham – disse Dumbledore colocando sua mão sobre o ombro de Harry, que estava sem palavras. Apenas olhava desesperado para Hermione, que desviou o olhar como se não suportasse a culpa que estava sentindo. Ron a abraçou e eles entraram na escola, seguindo os outros.
Lá dentro, Snape fora levado para a ala hospitalar, onde precisou permanecer durante alguns dias. Hermione, Ron e Neville contaram tudo o que tinha acontecido a Harry, que continuava inconformado. Como puderam deixar Luna naquele lugar?, ele perguntava, mas depois de tantas explicações dos três sobre não poderem fazer nada, ele se calou.
- Tenho certeza que Dumbledore está pensando em um jeito – disse Rony.
Todos concordaram e tentaram dormir finalmente. Já passara das quatro horas da manhã e estavam exaustos. Hermione dormiu no sofá da sala comunal, pois não queria ficar em seu dormitório sozinha. Ron ficou observando-a pegar no sono e adormeceu ali mesmo na poltrona. Acordaram somente com os primeiros raios de sol entrando pela janela e o barulho da porta abrindo.
- Sr. Weasley. Srta. Granger – disse a profa. Minerva acordando-os – O prof. Dumbledore quer vê-los em sua sala. Poderiam levar Potter e Longbottom com vocês?
Hermione fez que sim com a cabeça e se levantou, tirando o xale vermelho da Grifinória que Rony havia colocado sobre seu corpo. Ela imediatamente levou as mãos aos cabelos, amarrando-os em um grande coque, de forma que não parecessem tão enormes e bagunçados, como sempre ficavam quando acordava.
- Não está tão ruim assim – disse Rony, e os dois sorriram um para o outro. Algo havia obviamente mudado entre eles. Talvez fosse porque não tinham mais a companhia constante de Harry e se obrigavam a estar mais tempo sozinhos um com o outro, se ajudando.
- Vai lá, chama o Harry e o Neville antes que a profa. McGonagall volte! – disse Hermione, voltando ao seu temperamento normal, e então Rony se levantou com um salto e subiu as escadas o mais rápido que pôde. Ela sorriu novamente, enquanto uma mecha castanho-dourado de seu cabelo caía sobre seu rosto, iluminado pelo fraco sol da manhã.
Em pouco mais de cinco minutos, Harry, Ron e Neville chegaram ao salão comunal, encontrando uma Hermione com cara de sono, assim como todos eles.
- Dormiram bem? – ela inutilmente perguntou. Tinham dormido somente umas poucas horas.
Harry e Neville responderam com um gesto qualquer de ombros e eles se dirigiram à porta, depois indo até a sala do diretor. Ao pararem em frente, as gárgulas automaticamente dançaram para os lados e eles subiram as escadas, encontrando a porta do diretor aberta.
Ao entrarem, deram de cara com a profa. McGonagall, que os aguardava de pé. Dumbledore estava como sempre em sua mesa, segurando suas próprias mãos sobre um monte de pergaminhos e o olhar sereno sobre os oclinhos meia-lua. De pé, à direita da mesa de Dumbledore, estavam Remo Lupin, Olho-Tonto Moody, Nymphadora Tonks e um homem esquisito que Harry deduziu como sendo o pai de Luna. Mas a surpresa maior não era a sua presença, mas o prof. Severo Snape sentado em uma das poltronas à frente de Dumbledore, encarando friamente o fogo na lareira. Tinhas os dedos cruzados sobre seu próprio colo e parecia sequer ter notado a presença dos garotos quando eles entraram na sala, tão absorto estava em seus pensamentos. Harry teve vontade de perguntar se ele se sentia bem, mas achou melhor guardar a pergunta para si.
A profa. Minerva conjurou mais algumas cadeiras para que todos pudessem se sentar, e a sala de Dumbledore agora estava cheia como um teatro bruxo, mas o que viria a seguir estava muito longe de ser uma encenação.
- Muito bem, então – disse Dumbledore, satisfeito por todos estarem acomodados – O sr. Lovegood já está a par dos recentes acontecimentos. Ele fora contatado imediatamente após o rapto de Luna. Estamos todos aqui hoje para discutirmos a melhor forma de resgatá-la.
- Professor? – disse Harry, levantando o braço, como se estivesse em aula. Dumbledore fez menção para que o abaixasse – Por que o senhor acha que ela foi raptada? O que Voldemort pretende?
O pai de Luna balançava o corpo para frente e para trás, perturbado demais para dizer qualquer palavra, porém olhando de Harry para Dumbledore atentamente. Este encarou Harry durante alguns segundos e prosseguiu.
- Ele quer você, Harry - disse Dumbledore calmamente – E sabe que mantendo-a prisioneira você irá buscá-la.
A objetividade de Dumbledore fez com que todos olhassem assustados para Harry, e depois para o bruxo mais velho novamente. Harry não sabia o que dizer, mas olhou para o sr. Lovegood, que o observava com expectativa, e não teve escolha.
- Eu vou – ele disse. Hermione abaixou a cabeça e começou a chorar baixinho, inclinando-se para o amigo ao lado. Rony segurou seu braço, enquanto Neville esperava uma alternativa diferente de Dumbledore. Todos os aurores cochicharam.
- Harry não pode ir! – vociferou Lupin – Dumbledore, você não pode deixar que...
- Minha filha não pode ficar nas mãos daquele louco! – disse o pai de Luna avançando sobre Lupin. Rapidamente, todos se mobilizaram para afastá-los, antes que acontecesse algo pior. Lupin levantou os braços, como se quisesse dizer que jamais faria alguma coisa, mas o sr. Lovegood continuava esperneando. Harry não pôde deixar de reparar nas suas excêntricas vestes, que iam de uma calça roxa a um pullôver quase verde musgo abaixo de um casaco cor de mostarda, marcado por um enorme cinto marrom. Seu chapéu coco tinha a pena de um pássaro, que Harry não conseguiu distinguir qual era no momento. Ele tinha óculos com aros arredondados e um nariz muito fino. Sua barba era loura como seus cabelos, que ficavam quase invisíveis sob o chapéu. Tonks conseguira acalmá-lo e ele se sentou bufando alto para Dumbledore, que apenas o observava atentamente, esperando o silêncio. O prof. Snape continuava imóvel desde a hora em que chegaram e não dissera uma só palavra. Harry chegou a pensar se ele tinha sido atingido por algum feitiço abafador.
A mão de Hermione Granger pairava no ar, como era tão comum ser visto em qualquer aula em que ela estivesse. A profa. Minerva fez um sonoro “shhhh” e olhou para a menina, esperando que falasse.
- Srta. Granger?
Hermione olhou para todos e, enxugando novamente os olhos, começou a falar.
- Prof. Dumbledore, talvez não seja necessário Harry ir até lá.
- O quê? – sussurrou Harry para a amiga – Não ouviu o que ele disse? Voldemort quer a mim, só a mim, não adianta...
- Eu sei muito bem o que ele disse, Harry – interrompeu Hermione – O que eu quis dizer é que alguém pode ir fingindo ser você. Professor – ela virou-se repentinamente para o prof. Snape, que continuava imóvel até então – Existe a possibilidade de Vol... ele ser enganado dessa forma? Achar que é mesmo o Harry quem está ali, quando na verdade é outra pessoa que tenha tomado a poção polissuco, por exemplo?
Todos olhavam surpresos para Hermione pelo ótimo raciocínio, então olharam apreensivos para Snape, esperando que ele respondesse. O ex-professor de Poções não se mexeu, apenas olhou para o rosto da garota, que aguardava ansiosamente sua resposta. Apertou os olhos. Não sabia porque existia aquela confiança por parte dela, mas isso parece ter-lhe dado segurança para falar o que realmente achava.
- O perigo é muito grande – ele respondeu – O Lorde das Trevas presta atenção aos detalhes, srta. Granger. Enviar o Potter assim de bandeja não será a atitude mais inteligente. Ele desconfiará de armação.
- Talvez – Hermione continuou, como se estivessem apenas os dois na sala – Não precisemos fazer isso. Vamos todos de forma que pareça um resgate normal. A pessoa que se passar por Harry pode apelar para esse recurso somente em último caso.
Dumbledore olhou atentamente para Snape, aguardando a resposta para aquela questão. Parecia muito satisfeito por ter seus dois alunos mais inteligentes ali, trocando idéias. Todos os outros ao redor esperavam a resposta de Snape, que pensou alguns segundos antes de voltar a falar.
- Apenas um bruxo excepcionalmente bom em transfiguração poderia exercer esse papel sem ser descoberto – disse – E suspeito que este não seja o caso de nenhum de vocês três, exceto por...
- Oras, mas quem disse que um dos garotos faria isso, Severo? – disse a profa. McGonagall de repente – Apesar de a srta. Granger ser uma excelente aluna em Transfiguração, não creio que seria prudente enviá-la para fingir ser o Potter! Você acha que Dumbledore permitiria que um aluno...
O prof. Dumbledore tossiu gentilmente, interrompendo a discussão. Todos olharam para ele, que se levantou, pronto para falar.
- De fato, Minerva, eu não arriscaria um aluno dessa forma – o pai de Luna bufou mais uma vez – Por isso mesmo, a srta. Luna Lovegood deve ser resgatada o mais rápido possível. O que a sra. sugere?
- Eu vou! – disse Harry finalmente – Não importa o que digam, tudo isso é por minha causa, então eu vou!
- Sente-se, Potter – vociferou Snape.
- Potter... – disse a profa. Minerva gentilmente – Sente-se, querido.
Harry estava começando a ficar irritado. Estavam, mais uma vez, tratando-o como se ele fosse uma criança intocável.
- Alvo – disse Minerva encarando-o nervosa – Eu vou no lugar do Potter.
Todos olharam surpresos para a vice-diretora, que sequer piscava, olhando para Dumbledore.
- Não! – gritou Harry, desta vez se levantando e olhando para todos ao seu redor – Estou cansado de ver as pessoas morrendo por minha causa, a sra. não vai! Se alguém tem que fazer isso sou eu! Ou então encontramos outra maneira, mas ninguém vai se arriscar outra vez!
- Sente-se, Potter – disse Snape, desta vez em um tom de voz muito mais ameno, que Harry percebeu. Ele suspirou profundamente e se sentou, mas o clima na sala estava visivelmente tenso.
- Alvo, eu vou, não importa o que Potter diga. Eu posso fazer isso.
Um silêncio pairou na sala do diretor, exceto pelo barulho da respiração forte de Harry, que agora balançava a cabeça dando-se por derrotado. Snape torcera os lábios em sinal de desprezo, olhando para o garoto.
- Obrigado, Minerva. Conversaremos sobre isso em alguns instantes. Antes – disse o prof. Dumbledore – Severo, poderia contar ao Harry e a todos nós o que me dissera pela manhã?
Todos olharam para o prof. Snape, que agora se arrumara de outra forma na cadeira, pronto para falar. Dumbledore fez um sinal com a cabeça e ele começou.
- Voldemort está produzindo um exército de Inferi – falou em sua habitual voz calma e fria – A srta. Lovegood não será morta enquanto Potter não estiver com Voldemort. É a arma dele e sua garantia de que também não faremos nada para destruir os seus planos.
- Então devemos fazer tudo o mais rápido possível na surdina – disse Moody, fazendo sua presença ser percebida depois de tanto tempo quieto – Devemos destruir os horcruxes o mais rápido possível, sem que ele saiba!
- Exatamente, Alastor – concluiu Dumbledore – Os planos de Voldemort são piores do que qualquer outra coisa horrível que já tenham ouvido falar. Um exército de Inferi... Bem, creio que todos aqui saibam o que significa ter... Sim, Neville? – o garoto tinha o braço levantado no ar.
- Eu não... sei o que significa Inferi, professor.
- Inferi – respondeu Dumbledore – São mortos-vivos. Voldemort está construindo um exército deles.
Harry sentiu uma pontada em sua cicatriz. Por um momento se lembrou do sumiço dos corpos de seus pais, e também dos Longbottom.
- Professor – ele perguntou, como se as palavras simplesmente pulassem de sua boca – Os meus pais... ele pode...
- Sim, Harry – disse Dumbledore – Ele pode.
Harry sentiu seu estômago se revirar como nunca sentira antes. Só de imaginar os corpos de seus pais sendo usados para experiências de Voldemort, sua vontade era a de sair correndo pela porta e acabar com ele pessoalmente, de qualquer jeito. Tentou se conter, e teve cuidado para não citar os Longbottom, visto que seu amigo estava ainda mais confuso do que ele e possivelmente estava pensando que sua avó, morta recentemente, tivera o mesmo fim. Neville ainda não sabia que os corpos de seus pais haviam sumido do hospital.
- Harry – disse Dumbledore, interrompendo os pensamentos do garoto – Onde está o medalhão?
Harry olhou para o professor, lembrando-se repentinamente do medalhão. Como pudera esquecê-lo?
- Está... no meu bolso, senhor - disse simplesmente.
- Você anda com esse negócio para cima e para baixo como se fosse...
- Alastor – interrompeu Dumbledore – Tenho certeza que está muito mais protegido no bolso de Harry que em qualquer lugar nesse castelo. Então – disse, virando-se para o garoto – Onde... Ah!
Harry tirara o artefato do bolso e se levantou, colocando o medalhão sobre a mesa do professor. Todos contemplaram absortos o objeto que continha o fragmento de alma de Voldemort perante seus olhos.
Dumbledore olhou para Harry atentamente, como se esperando que ele fizesse alguma coisa. O garoto olhou em volta e depois para Dumbledore.
- O-o quê? O que foi?
- Já está na hora de destruí-lo, Harry.
- E como... eu farei isso?
- De qualquer forma – respondeu Dumbledore – Destruindo o objeto, você libera o pedaço de alma que se encontra dentro dele. Você não se lembra quando destruiu o diário com a presa do basilisco?
- Sim, mas... o fantasma de Tom Riddle... a lembrança dele...
- Obviamente destruir um horcrux tem suas conseqüências, Harry – disse Dumbledore, sério – Mas acho que o que doeu mais foi tê-lo pego onde estava, não é?
Harry fez um sinal com as sobrancelhas, indicando que concordava.
- Utilize um feitiço qualquer, Harry – disse Dumbledore, fazendo menção com o olhar para que Harry pegasse sua varinha – Não se preocupe conosco, apesar de sugerir a todos que protejam suas cabeças.
Harry tirou lentamente a varinha de seu bolso e observou o medalhão reluzir à sua frente. Todos ao redor observavam atentamente. O sr. Lovegood até ajeitou os óculos, tentando compreender o que estava acontecendo. Harry não tirava seus olhos do medalhão, sobre a mesa de Dumbledore. Levantou sua varinha e, convicto, gritou:
- BOMBARDA!
Um raio azul saiu de sua varinha e explodiu o medalhão em mil pedacinhos, que pularam para todos os lados. Uma forte luz verde saiu de dentro dele e tomou toda a sala, em forma de uma enorme serpente que voava com violência circulando e tomando todo o espaço. Gritos ecoavam por toda a sala. A cabeça da serpente veio em sua direção e suas enormes presas ficaram à mostra de maneira apavorante. Foi a última coisa que Harry viu antes de sentir sua cicatriz latejar e desmaiar, deixando sua varinha cair no chão.
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