Gritos e recompensas



Depois de toda a discussão e busca por informações sobre o medalhão, Harry ainda tinha receio pelo fato de ter contado a todos sobre os horcruxes. Dumbledore havia lhe dito que apenas eles sabiam sobre o assunto, mas ele sentia que toda a Ordem deveria saber o que estava por trás de tudo, e por esse motivo resolveu contar. É claro que foi de grande valia - afinal, Lupin encontrara aquela nota no Profeta Diário sobre a morte de Regulus - e ficara bem claro que ele era, enfim, o tal R.A.B. do horcrux falso. Se ele não tivesse contado, provavelmente a nota passaria em branco.

Tudo o que Harry sabia sobre horcruxes era que se tratava de um feitiço terrível para colocar um pedaço de sua alma em um objeto qualquer, e para isso uma pessoa deveria ser morta. Se Regulus foi morto na mesma noite que Voldemort matou os seus pais, havia uma grande possibilidade de ele ter feito o último horcrux naquela noite. Mas o que poderia ter sido?

- O medalhão não foi feito naquela noite - disse Hermione.

- Por quê? - indagou Ron.

- Oras, então por qual motivo Voldemort queria matar Regulus senão porque ele destruiu o medalhão?

- É, faz sentido.

- Talvez - disse Harry - Ele tenha matado Regulus porque este não queria mais ser um Comensal da Morte. Sirius me disse isso uma vez.

- Como assim, Harry? - perguntou Hermione confusa - Sirius já tinha falado sobre Regulus antes?

- Ah, bem pouco. Apenas fez um comentário sobre o irmão covarde que queria desistir de ser Comensal e foi morto a mando de Voldemort por causa disso. Porém, ele também pode ter sido morto por causa do medalhão e Sirius não sabia. Não temos como saber. Ninguém sabia dos horcruxes.

- Temos sim - disse Ron - Se ele tivesse sido morto por causa do medalhão, então por que... Voldemort... deixou o medalhão falso na caverna protegido pela poção?

Todos pensaram. Realmente fazia sentido - Voldemort não deixaria o horcrux falso guardado lá, ou deixaria? Afinal, o medalhão verdadeiro fora deixado em outro lugar - na cova de seus pais. Qual o sentido então de deixar o medalhão falso na caverna?

- Já sei! - levantou Harry - Ele deixou o horcrux falso porque saberia que, cedo ou tarde, quem tomasse a poção iria morrer de qualquer jeito. Então, com ou sem horcrux, essa pessoa estaria perdida, ainda mais sabendo que se tratava do horcrux falso. Não havia com o que se preocupar.

- Tudo bem, Harry - disse Hermione - Mas então ele nem tocou no medalhão falso, senão o bilhete não estaria lá.

- Sei lá, é tudo tão esquisito! - disse Ron - Nada faz sentido.

- Quais os outros horcruxes que o Dumbledore disse existirem, Harry?

- Bom, com certeza, não sabemos de nenhum - disse Harry, percebendo de repente que tudo era ainda mais difícil do que parecia - Mas temos suspeitas. Se Voldemort usou o anel da Sonserina, é possível que também tenha usado a taça que pertencia à Lufa-Lufa, conforme a lembrança que vi na penseira de Dumbledore.

- É mesmo, a taça! - disse Hermione eufórica - E onde ela pode estar?

- Podemos perguntar à professora McGonaghall, ela pode ter alguma pista - disse Ron.

- Não acho que ela saiba qualquer coisa sobre os horcruxes. Precisamos pensar, mas não acho improvável que esteja em Hogwarts.

- Em Hogwarts?

- Sim, Mione. Por que não? Tom Riddle adorava a escola, era a sua casa. Não duvido que tenha guardado a taça lá, assim como existia a câmara secreta e tantos outros mistérios. O único problema é que realmente não podemos ter certeza, a não ser ir até lá e tentar descobrir.

- Bom, de qualquer forma - disse Hermione - É melhor irmos dormir agora. Esta noite quero dormir confortavelmente em minha cama. E sozinha.

Harry não entendeu o comentário, mas pareceu-lhe que Hermione tinha dito a última frase olhando de lado para Ron.



Enquanto isso, em um lugar obscuro, úmido e fétido, que mais parecia uma caverna, apesar de ser maior do que qualquer uma delas, ouvia-se a voz macabra e ímpeta de Voldemort, ecoando pelas paredes e cujo rosto era iluminado pelo fogo das tochas que flutuavam no ar.

- Traga o menino! - ordenou a Rabicho, que saiu correndo concordando ansioso.

- Você acha que ele realmente merece isso, milorde?

- É claro que sim, Severo. Ele pagará caro por ter nascido.

Voldemort estava sentado confortavelmente em sua poltrona, que parecia ter duzentos anos, ao lado de Snape, que tomava calmamente uma xícara de chá. A sala mal iluminada parecia feder como um pântano, o ar úmido, as paredes lodosas. Severo Snape continuava ali, mas fiel do que nunca a Voldemort, escutando atentamente as palavras de seu mestre.

- Eu poderia até sentir pena desses Malfoy - disse Voldemort - Mas seus belos cabelos não refletem o pingo de alma que possuem em seus corpos. São uns inúteis. Deveria ter acabado com isso logo, pois sempre me causaram problemas.

- Creio que o pequeno Malfoy seja apenas burro, milorde. Acha mesmo conveniente matá-lo? Poderia enviá-lo para Azkaban e...

- Você tem me sido extremamente fiel, Severo - interrompeu Voldemort - Mas há décadas deixei de ter pena de crianças. Desde a morte daqueles... Potter! Creio que não darei ouvidos a ninguém, muito menos a você. Ah! - disse, com prazer - Aqui está ele.

Rabicho vinha carregando Draco Malfoy nos braços. Estava desacordado e com uma aparência péssima. Os cabelos estavam ensebados, caídos sobre o rosto, misturados com terra e dejetos sabe-se lá de que animal. Rabicho o colocou no chão em frente a Voldemort e aguardou ansioso por novas ordens, mas saiu vagarosamente após o olhar mortal que seu mestre lhe lançou para que fosse embora. Snape olhava fixamente para o corpo de Draco, caído desacordado no chão.

- Talvez esteja certo, Severo - disse Voldemort - Esse aí conta tanto quanto o pai. Talvez seja menos exaustivo apenas brincarmos um pouco com ele.

- Sábia decisão, eu diria - disse Snape, colocando a xícara sobre a mesa e cruzando as mãos - E o que irá fazer?

Snape ficou esperando a resposta, que parecia não vir. Voldemort estava compenetrado em seus pensamentos, como se estivesse longe. Sua aparência já era quase humana, porém sua pele era absolutamente horrorosa, parecendo muito com o aspecto de pele de cobra. Snape fitou silenciosamente o rosto de seu mestre, pela primeira vez em tantos anos. Aguardava a resposta, mas parecia que algo estava acontecendo. Já estava quase quebrando o silêncio quando Voldemort gritou:

- Maldito Potter! - e virando bruscamente sua varinha para Draco no chão - CRUCIO!

O corpo de Draco começou a se retorcer freneticamente. Ele acordara, porém era óbvio que estava muito ferido e apenas semi-consciente. Voldemort já deveria ter dado ordens a Rabicho para que torturasse o mais jovem dos Malfoy anteriormente. Há quanto tempo ele estava resistindo à maldição Cruciatus?

- Vamos, leve-o daqui - ordenou a Rabicho, depois de alguns longos minutos - Já chega por hoje.

Snape olhava aterrorizado. Suas suspeitas se confirmaram: Voldemort vinha torturando Draco Malfoy há dias, semanas, sabe-se lá há quanto tempo. O destino do garoto estava selado. Se não morresse, se no mínimo seu corpo suportasse, teria uma semi-vida, não teria consciência de seu corpo, de sua vida, de nada. Por um instante, Snape teve medo do que Voldemort poderia fazer com ele, mas logo se recompôs em seus pensamentos, pois estava nada mais nada menos que ao lado do maior mestre em legilimência que existia no mundo bruxo. Apesar disso, Snape tinha consciência de que poucos sabiam fechar sua mente tão bem quanto ele e, no momento, lhe pareceu que Voldemort não desconfiou de nada. A pergunta era arriscada, mas a curiosidade foi maior:

- Por que citou o nome dos Potter, milorde?

Voldemort silenciou e, um segundo depois, encarou Snape, como se tentasse entender o porque da pergunta. Como se não a tivesse ouvido, começou a falar.

- Severo, você me deve informações importantes sobre o garoto.

- Harry Potter? Creio que já saiba o bastante sobre ele.

- Creio que eu dê ordens aqui, Severo – disse, encarando-o friamente - Não havia dito que o fedelho podia ver certas coisas?

- Muitas vezes sim - disse Snape - Em diversas ocasiões aquele moleque atormentava Dumbledore a respeito de visões que tinha a seu respeito e dores na cicatriz.

- A cicatriz! - disse sarcasticamente Voldemort, dando uma enorme gargalhada - E o que mais?

- Nada que o senhor já não saiba. Como já disse, ele também é ofidioglota.

- Não venha me dizer coisas que eu já sei, Snape! Eu quero informações novas!

- O senhor sabe que não tenho informações desde a morte de Dumbledore - disse calmamente Snape - Não tenho a menor idéia do que se passa na mente do garoto agora que não convivo com ele.

- Entendo... - disse, em língua de cobra - Eu me divirto com a ousadia desse garoto. Onde ele pensa que pode chegar?

Voldemort ria e balançava a cabeça enquanto bebia de sua xícara de chá. Snape olhava calmamente. Sabia que possuía uma posição privilegiada estando ao lado de Voldemort, sendo seu cúmplice e braço direito. Mas gostaria de ser mais: gostaria de arrancar confidências de seu mestre.

- O que pretende fazer com os pais do garoto?

Voldemort não respondeu, pois não sabia se Snape falava dos corpos de Lilian e Tiago ou do casal Malfoy. Por um instante, encarou Snape como se tentasse arrancar algo de seu olhar, mas nada descobriu, então simplesmente disse:

- Eles terão o que merecem.

- Milorde, me permita uma nova pergunta?

Apesar de Voldemort ficar sério, nada disse desta vez, o que levou Snape a pensar que poderia seguir adiante.

- Há anos me pediu que preparasse uma poção extremamente poderosa para proteger algo. Sei que Dumbledore ficara em tal estado na noite em que foi morto que, conhecendo os efeitos colaterais, me levaram a reconhecer na hora o fato de ter ingerido a poção que eu havia preparado - Voldemort continuava quieto, enquanto Snape prosseguia, já sabendo onde iria chegar - O que ele tentou capturar?

Voldemort bebeu mais um gole de sua xícara de chá. Snape aguardava ansiosamente, mas tentava parecer calmo, como se tivesse sido uma pergunta comum. Ele sabia que se tratava de algo muito importante. Voldemort simplesmente largou a xícara sobre o pires em seu colo e respondeu:

- Eu gostaria de não ter desconfianças de você, Snape.



Todos estavam dormindo na Ordem da Fênix, exceto por Tonks e Lupin, que continuavam conversando como faziam todas as noites. Hermione acordou em determinado momento e não conseguiu mais dormir, então resolveu se levantar e ler um pouco. No entanto, logo irritou-se por lembrar que esquecera seu livro no quarto de Harry, e só restava ir até lá e buscá-lo. Lentamente, ela caminhou pelo corredor e bateu na porta, já entrando, para se certificar de que Harry estava mesmo dormindo. No entanto, ao entrar, seu coração quase parou com a expressão de medo que tinha no rosto ao ver o amigo.

- HARRY!! - gritou, correndo em direção a ele.

Harry estava de pé na janela, com os braços abertos e a poucos instantes de se jogar e cair espatifado no chão do jardim. Hermione agarrou seu corpo e o puxou para a cama, e então Harry acordou, enquanto Tonks e Lupin entravam desesperados pela porta, por causa do grito de Hermione, seguidos pela sra. Weasley e os outros.

- O que está acontecendo?! - perguntou Lupin, correndo para o lado de Harry.

- Ele estava de pé na janela, parecia desacordado!

Sua cicatriz sangrava muito, fazendo agora uma mancha enorme nos lençóis brancos de sua cama.

- Molly, traga panos para estancar o sangue!

A ordem de Lupin foi seguida e rapidamente a sra. Weasley voltou com alguns panos úmidos para limpar o rosto de Harry, que já estava todo ensangüentado.

- É a segunda vez que acontece! - disse Hermione a Lupin.

- Como assim, a segunda vez? - perguntou desesperado - Quando foi a primeira? E por que vocês não contaram?

- Acho que esquecemos - disse Hermione, aflita - Mas não sabemos porque isso acontece. Quando entrei aqui há pouco, ele estava de pé na janela e parecia estar quase pulando!

- Harry, Harry, acorde, por favor, o que aconteceu? - Lupin batia levemente no rosto de Harry, que mal abria os olhos - O que aconteceu?

Ele abriu um pouco os olhos e falou com a voz muito fraca:

- Eu... Eu... Alguém... – mal conseguia pronunciar as palavras – Alguém... Queria que eu pulasse... Foi mais forte que eu...

- Schhhhhh, fique quieto! - disse Molly, colocando mais panos em sua cabeça - Deixe ele, Lupin, está atormentado! Depois conversamos sobre o que aconteceu!

- Molly - disse Lupin, se aproximando para que Harry não o ouvisse, mas Hermione estava perto - Ele pode ter sido atacado pela maldição Imperius enquanto dormia. Não é tão comum, mas...

- O quê? - disse Hermione, olhando para os lados para ver se mais alguém tinha ouvido, mas todos prestavam atenção em Harry - Alguém pode ser atacado por uma maldição enquanto dorme?

- É muito raro - explicou Lupin - Mas já sabemos que Harry possui uma ligação com Voldemort desde a morte de Lilian e Tiago. Não me surpreenderia se Voldemort tentasse matá-lo quando sua mente está desprotegida, à noite, enquanto dorme.

- Se isso for verdade, ele pode estar até mesmo sabendo o que Harry pensa ou planeja fazer - concluiu Hermione.

- Sim - disse Lupin - Foi por isso que Dumbledore fazia tanta questão de ter Harry aprendendo Oclumência com Snape há alguns anos. Snape é um dos maiores oclumentes do mundo bruxo e é uma pena que Harry tenha fracassado, pois Voldemort pode estar usando isso contra todos. Porém - disse, antes que Hermione começasse a chorar - Não creio que ele tenha conseguido. Pode ser que, inconscientemente, Harry tenha conseguido bloquear sua mente para a entrada de Voldemort, pois de certa forma ele acordou quando você o puxou, e isso não acontece quando alguém está sob o domínio da maldição Imperius. Talvez Voldemort tenha transferido esse poder a Harry também. Uma coisa boa, talvez, vinda de Voldemort!

Hermione tentou sorrir, assim como Lupin, mas ambos estavam obviamente preocupados. Só a hipótese de Harry poder ter a mente invadida por Voldemort já era motivo para desespero maior, mas eles resolveram se conter.

- Creio que Harry não deva saber de nossas suspeitas por enquanto - disse Lupin a Hermione - Vamos apenas ficar atentos.

Hermione concordou e ambos viraram para ver como Harry estava. Dormia novamente, então ela chamou Ron e os outros que estavam ao redor para contar o que Lupin acabara de lhe falar.

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