A ANTIGA E MUITO NOBRE FAMÍLIA




A Sra. Weasley os seguiu escada acima olhando desgostosa.

- Eu quero que todos vocês vão imediatamente para cama, sem conversa - disse ela quando eles chegaram ao primeiro andar. - Nós teremos um dia bem cansativo amanhã. Eu suponho que Gina está dormindo - disse para Hermione -, então tente não acordá-la.

- Dormindo, sim, tudo bem - disse Fred em voz baixa, depois que Hermione desejou boa noite e eles foram subindo para o andar seguinte. - Se Gina não estiver acordada esperando por Hermione para contar a ela tudo o que foi dito lá em baixo eu sou um verme-cego...

- Tudo bem, Rony, Harry - disse a Sra. Weasley no segundo andar, indicando o quarto deles e os fazendo entrar. - Já pra cama.

- Boa noite - Harry e Rony disseram aos gêmeos.

- Durma bem - disse Fred, piscando o olho.

A Sra. Weasley fechou a porta do quarto de Harry com uma batida forte. O quarto parecia, se é que poderia, ainda mais úmido e obscuro que à primeira vista. O retrato em branco na parede agora estava respirando bem lenta e profundamente, como se seus ocupantes invisíveis estivessem dormindo.

Harry vestiu seu pijama, tirou os óculos e subiu em sua cama fria enquanto Rony jogava comida para as corujas em cima do armário de roupas para acalmar Edwiges e Pichitinho, que estavam fazendo barulho e batendo suas asas friamente.

- Nós não podemos deixá-las sair para caçar todas as noites - Rony explicou enquanto vestia seu pijama marrom. - Dumbledore não quer muitas corujas descendo no quarteirão, ele acha que isso pode parecer suspeito. Ah, sim... Eu esqueci...

Ele foi até a porta e colocou o ferrolho.

- Por que você está fazendo isso?

- Kreacher - disse Rony enquanto apagava a luz. - Na primeira noite que eu estava aqui ele entrou vagando as três da manhã. Confie em mim, você não vai querer acordar e encontrá-lo rondando seu quarto. De qualquer forma... - ele subiu na cama, assentou-se sob as cobertas e voltou a olhar Harry na escuridão; Harry pôde ver seu contorno na luz da lua que entrava pela janela suja. - O que você acha?

Harry não precisou perguntar a Rony sobre o que queria dizer.

- Bem, eles não nos disseram mais do que nós poderíamos ter imaginado, não foi? - disse ele, pensando em tudo que havia sido dito lá em baixo. - Eu acho que tudo o que eles disseram foi que a Ordem está tentando evitar que mais gente se junte a Vol... - houve uma rápida alteração na respiração de Rony. - ...demort - disse Harry com firmeza. - Quando você vai começar a usar o nome dele? Sirius e Lupin usam.

Rony ignorou esse último comentário.

- Sim, você tem razão - disse ele -, nós já sabemos praticamente tudo o que eles nos contaram, por usarmos as Orelhas Extensíveis. A única coisa nova foi...

Crack.

- OUCH!

- Fale baixo, Rony, ou mamãe vai voltar aqui.

- Vocês dois acabaram de Aparatar nos meus joelhos!

- Sim, bem, é mais difícil no escuro.

Harry viu os contornos embaçados de Fred e Jorge descendo da cama de Rony. Houve um gemido das molas e o colchão de Harry desceu alguns centímetros quando Jorge sentou perto de seus pés.

- Então, já chegou lá? - disse Jorge avidamente.

- A arma que Sirius mencionou? - disse Harry.

- Digamos, mais ou menos assim - disse Fred com bastante gosto, agora sentado próximo a Rony. - Nós não ouvimos sobre isso nas velhas Extensíveis, não foi?

- O que você imagina que seja? - disse Harry.

- Pode ser qualquer coisa - disse Fred.

- Mas não poderia ser algo pior que a Maldição Avada Kedavra, não é? - disse

Rony. - O que é pior que a morte?

- Talvez seja algo que pode matar muitas pessoas de uma vez - sugeriu Jorge.

- Talvez seja um meio particularmente doloroso de matar pessoas - disse Rony.

- Ele tem a Maldição Cruciatus para causar sofrimento - disse Harry. - Não precisa de nada mais eficiente que isso.

Houve uma pausa e Harry percebeu que os outros, assim como ele, estavam imaginando que horrores essa arma poderia cometer.

- Então quem você acha que sabe sobre ela agora? - perguntou Jorge.

- Eu espero que esteja do nosso lado - disse Rony, soando levemente nervoso.

- Se estiver, Dumbledore provavelmente a está guardando - disse Fred.

- Onde? - disse Rony rapidamente. - Hogwarts?

- Aposto que sim! - disse Jorge. - Foi lá que ele escondeu a Pedra Filosofal.

- Uma arma é bem maior que a Pedra, no entanto! - disse Rony.

- Não necessariamente - disse Fred.

- É, tamanho não é garantia de poder - disse Jorge. - Olhe para Gina.

- O que você quer dizer? - disse Harry.

- Você nunca recebeu um de seus Feitiços de Morcego-Fantasma, recebeu?

- Shhh! - disse Fred, meio levantado da cama. - Ouçam!

Eles se calaram. Passos estavam subindo a escada.

- Mamãe - disse Jorge, sem mais cerimônias houve um alto barulho e Harry sentiu o peso sumir da ponta de sua cama. Alguns segundos depois ouviram a tábua do piso ranger do lado de fora da porta do quarto; a Sra. Weasley estava simplesmente ouvindo para verificar se eles não estavam conversando.

Edwiges e Pichitinho piaram tristemente. A tábua do piso rangeu novamente e eles a ouviram subindo as escadas para verificar Fred e Jorge.

- Ela não confia em nós, você sabe - disse Roney arrependido.

Harry tinha certeza que ele não seria capaz de dormir; o início da noite tinha sido tão cheio de coisas para se pensar que ele esperava ficar acordado por horas moendo tudo aquilo. Queria continuar falando com Rony, mas a Sra. Weasley agora estava fazendo as tábuas rangerem novamente no andar deles, e depois que ela se foi ele pôde ouvir os outros tomando seus caminhos escada acima...

De fato, muitas criaturas cheias de pernas estavam andando para cima e para baixo do lado de fora do quarto, e Hagrid, o Professor de Trato das Criaturas Mágicas, estava dizendo "Bonitinhas, não são, hein, Harry? Nós estudaremos armas nesse...", Harry viu que as criaturas tinham canhões no lugar das cabeças e que estavam virando e tentando acertá-lo... Ele se abaixou...

A última coisa que ele percebeu foi que estava enroscado numa bola quente por baixo da sua roupa de cama e a barulhenta voz de Jorge estava enchendo o quarto.

- Mamãe está mandando se levantar, seu café está na cozinha e ela precisa de você na sala de desenho, tem uma porção de Fadas Mordentes, muito mais do que ela pensava e encontrou um ninho de pelúcios embaixo do sofá.

Meia hora depois Harry e Rony, que tinham se vestido e tomado café rapidamente entraram na sala de desenho, uma comprida sala de teto alto no primeiro andar com paredes verde oliva cobertas de sujeira. O carpete exalava pequenas nuvens de poeira toda vez que alguém colocava o pé nele e as cortinas verde musgo estavam zumbindo como se fosse um enxame invisível de abelhas. E era ao redor dessas que a Sra. Weasley, Hermione, Gina, Fred e Jorge estavam reunidos, todos olhando de forma particularmente estranha enquanto cada um tinha amarrada uma peça de roupa cobrindo o nariz e a boca. Cada um deles também segurava uma grande garrafa de um líquido preto com o bocal na ponta.

- Cubram seus rostos e peguem um spray – a Sra. Weasley disse para Harry e Rony assim que os viu, apontando para duas outras garrafas de líquido que estavam sobre uma mesa de pernas finas. - É fadamordentecida. Eu nunca vi uma infestação tão grande como essa. O que aquele elfo-doméstico esteve fazendo nos últimos dez anos...

O rosto de Hermione estava meio escondido por uma toalha fina, mas Harry viu que ela jogou um olhar repreensivo a Sra. Weasley.

- Kreacher é realmente velho, provavelmente ele não conseguiu manter...

- Você ficaria surpresa em saber o que Kreacher é capaz de fazer quando ele quer, Hermione - disse Sirius, que tinha acabado de entrar na sala carregando uma sacola ensangüentada do que aparentavam ser ratos mortos. - Eu apenas estou alimentando Bicuço - acrescentou ele, em resposta ao olhar investigativo de Harry. - Eu o deixo lá em cima, no quarto da minha mãe. De qualquer forma... Essa escrivaninha...

Ele soltou a sacola de ratos sobre uma poltrona, então se inclinou para examinar a gaveta trancada, a qual, Harry acabara de perceber, estava sacudindo levemente.

- Bem, Molly, eu tenho quase certeza que isso é um bicho-papão - disse Sirius, olhando pelo buraco da fechadura, mas talvez convenha deixarmos Olho-Tonto dar uma espiada antes de deixá-lo sair. Conhecendo minha mãe isso pode ser algo bem pior.

- Você tem razão, Sirius - disse a Sra. Weasley.

Ambos estavam falando com cautela, com vozes delicadas que deram a Harry a certeza de que nenhum dos dois havia esquecido os desentendimentos que tiveram na noite anterior.

Um alto ressoar de sino tocou no andar de baixo, seguido pela dissonância de gritos e gemidos que haviam sido despertados na noite anterior por Tonks caindo por cima do guarda-chuva.

- Eu continuo dizendo a eles para não tocar o sino da porta! - disse Sirius, irritado, saindo apressado da sala. Eles o ouviram trovejando pelos degraus enquanto os gritos da Sra. Black ecoavam mais uma vez pela casa inteira: "Mancha de desonra, mestiço asqueroso, traidor..."

- Feche a porta, por favor, Harry - disse a Sra. Weasley.

Harry demorou mais tempo do que precisava para fechar a porta, queria ouvir o que estava acontecendo no andar de baixo. Sirius obviamente estaria fechando as cortinas sobre o retrato de sua mãe, porque ela havia parado de gritar. Ele ouviu o padrinho andando pelo salão, depois o barulho do cadeado da porta de entrada e então uma voz profunda que ele reconheceu como sendo Kingsley Shacklebolt.

- Héstia acabou de me ajudar, agora ela está com a capa do Moody, acredito que tenho que informar a Dumbledore...

Sentindo os olhos da Sra. Weasley atrás de sua cabeça, Harry fechou a porta arrependidamente e se juntou à festa das Fadas Mordentes.

A Sra. Weasley estava curvada para olhar a página sobre as Fadas Mordentes no Guia das Pestes Domésticas, de Gilderoy Lockhart, que estava aberto sobre o sofá.

- Certo, vocês todos, vocês precisam tomar muito cuidado, porque as Fadas Mordentes mordem e seus dentes são venenosos. Eu tenho um frasco de antídoto aqui, mas espero que ninguém precise usá-lo.

Ela se endireitou, posicionou-se bem em frente às cortinas e as puxou para frente.

- Quando eu der o sinal comecem a borrifar imediatamente - disse ela. – Elas virão voando para cima de nós, eu acho, mas no rótulo do spray diz que uma boa borrifada vai paralisá-las. Quando elas estiverem imobilizadas, apenas as joguem nesse balde.

Ela saiu cuidadosamente da linha de tiro e levantou seu próprio spray.

- Tudo pronto. Borrifem!

Harry tinha borrifado apenas alguns segundos quando uma Fada Mordente totalmente crescida veio voando de uma dobra no tecido, brilhante como um besouro com as asas zunindo, mostrando seus dentes afiados como agulhas, seu corpo de fada coberto de um grosso pêlo negro e seus quatro pequenos punhos cerrados com fúria. Harry a recebeu com uma borrifada de fadamordentecida bem no rosto. Ela ficou paralisada no meio do ar e caiu, com um surpreendente barulho, no velho carpete abaixo. Harry a pegou e jogou no balde.

- Fred, o que você está fazendo? - disse a Sra. Weasley com severidade. - Borrife de uma vez e jogue no balde!

Harry olhou ao redor. Fred estava segurando uma Fada Mordente que lutava entre seu dedo indicador e o polegar.

- Agora mesmo - disse Fred claramente, borrifando a Fada Mordente rapidamente no rosto para que ela desmaiasse, mas logo que a Sra. Weasley deu às costas ele colocou a fada no bolso, piscando um olho.

- Nós queremos fazer experiências com o veneno das fadas para nossas Caixinhas de Coceira - disse Jorge a Harry.

Borrifando duas Fadas Mordentes de uma vez só enquanto elas voavam bem em direção a seu nariz, Harry chegou mais perto de Jorge e murmurou pelo canto da boca.

- O que são Caixinhas de Coceira?

- Uma variedade de doces que deixam você doente - sussurrou Jorge, mantendo um olho atento nas costas da Sra Weasley. - Não doente de verdade, pense, apenas o suficiente para você não precisar ir a escola enquanto se sentir assim. Fred e eu temos trabalhado nisso durante o verão. Elas têm dois lados coloridos para mastigar. Se você comer a metade laranja das Pastilhas de Vômito você vomita tudo. Quando você for rapidamente retirado da sala de aula para ir a ala hospitalar, você engole a metade vermelha...

-...Que restaura sua saúde na hora, deixando que você continue suas atividades de lazer de sua própria escolha durante uma hora que de outra forma teria sido dedicada a um tédio nada proveitoso. É isso que nós estamos colocando nos anúncios - sussurrou Fred, que tinha desviado da linha de visão da Sra. Weasley e agora catando algumas Fadas Mordentes do chão e colocando em seu bolso. - Mas eles ainda precisam de um pouco de trabalho. No momento nossas cobaias estão tendo um pouco de dificuldade para parar de vomitar pelo tempo suficiente para engolir a metade vermelha.

- Cobaias?

- Nós - disse Fred. - Nós nos alternamos. Jorge testou os Desmaios Falsos e ambos tentamos os de Hemorragia Nasal...

- Mamãe pensou que nós estivéssemos duelando - disse Jorge.

- Então a loja de logros continua firme, não é? - murmurou Harry, fingindo estar ajustando o bocal de seu spray.

- Bem, nós não tivemos a chance de ter um local ainda - disse Fred, abaixando sua voz ainda mais enquanto a Sra. Weasley enxugava o suor do rosto com o cachecol antes de voltar ao ataque -, então nós estamos trabalhando com pedidos via correio por enquanto. Nós colocamos anúncios no Profeta Diário da semana passada.

- Tudo graças a você, companheiro - disse Jorge. - Mas não se preocupe... Mamãe não suspeita de nada. Ela não lê mais o Profeta Diário, porque eles continuam falando mentiras sobre você e Dumbledore.

Harry deu uma risadinha. Ele forçou os gêmeos Weasley a pegar o prêmio de dez mil galeões que ele tinha ganhado no Torneio Tribruxo para ajudá-los com sua ambição de abrir uma loja de logros, mas ainda estava grato por saber que sua parte em promover os planos deles era desconhecido pela Sra. Weasley. Ela não achava que ter uma loja de gozações era uma carreira adequada para dois de seus filhos.

A desfadamordentização das cortinas tomou a maior parte da manhã. Já era mais de meio dia quando a Sra. Weasley finalmente tirou seu cachecol protetor, afundou numa confortável poltrona e se levantou novamente com um grito de desgosto, ela havia sentado em cima da sacola de ratos mortos.

As cortinas não estavam mais zumbindo; estavam fracas e úmidas da intensa borrifação. Aos seus pés as Fadas Mordentes inconscientes estavam enfiadas no balde ao lado de uma vasilha com seus ovos pretos, a qual Bichento estava cheirando e Fred e Jorge estavam jogando olhares de cobiça.

- Eu acho que cuidaremos desses depois do almoço – a Sra. Weasley apontou para os gabinetes com portas de vidro muito empoeiradas que ficavam ao lado da lareira. Eles estavam estufados de estranhos objetos: uma seleção de adagas enferrujadas, garras, uma pele de cobra enrolada, uma quantidade de caixas de prata manchadas com escritas em línguas que Harry não podia entender e, o mais desconfortável, uma garrafa de cristal ornamentada com uma opala na tampa, cheia do que Harry tinha certeza ser sangue.

O sino da porta tocou novamente. Todos olharam para a Sra. Weasley.

- Fiquem aqui - disse ela com firmeza, agarrando a sacola de ratos enquanto os berros da Sra. Black começaram novamente lá em baixo. - Eu trarei alguns sanduíches.

Ela saiu da sala, fechando a porta cuidadosamente atrás de si. Rapidamente todos correram para a janela para olhar a porta de entrada. Puderam ver uma cabeça de cabelos ruivos despenteados e uma porção de velhos Caldeirões.

- Mundungus! - disse Hermione. – Por que será que ele trouxe todos esses caldeirões?

- Provavelmente está procurando um lugar seguro para guardá-los – disse Harry. - Não era isso que ele estava fazendo na noite em que deveria estar me vigiando? Roubando caldeirões?

- É mesmo, você tem razão! - disse Fred, quando a porta da frente se abriu; Mundungus entrou com os caldeirões e sumiu de vista. - Blimey, mamãe não vai gostar disso...

Ele e Jorge foram em direção à porta e ficaram ao lado dela, ouvindo de perto. Os gritos da Sra. Black haviam parado.

- Mundungus está falando com Sirius e Kingsley - murmurou Fred, franzindo a testa ao se concentrar. - Não consigo ouvir bem... Você acha que podemos arriscar usar as Orelhas Extensíveis?'

- Pode valer a pena - disse Jorge. - Eu posso me esquivar até o andar de cima e pegar um par delas...

Mas no exato momento houve uma explosão de sons vindo do andar de baixo que fez com que as Orelhas Extensíveis deixassem de ser necessárias. Todos puderam ouvir exatamente o que a Sra. Weasley estava gritando com toda a força de sua voz.

- VOCÊ NÃO VAI ESCONDER ESSAS COISAS ROUBADAS AQUI!

- Eu adoro ouvir mamãe gritando com outras pessoas - disse Fred, com um sorriso satisfeito no rosto enquanto abria a porta alguns centímetros para deixar a voz da Sra. Weasley entrar melhor na sala. - Isso faz uma bela diferença.

-...COMPLETAMENTE IRRESPONSÁVEL, COMO SE JÁ NÃO TIVESSEMOS COM O QUE NOS PREOCUPAR SEM OS SEUS CALDEIRÕES ROUBADOS DENTRO DESTA CASA...

- Os idiotas vão deixar que ela chegue ao limite - disse Jorge balançando a cabeça. - Você precisa despistá-la logo senão ela vai ficar com a cabeça fervendo por horas. E ela está se mordendo para ter um momento como esses com o Mundungus cada vez que ele escapa, quando deveria estar vigiando você, Harry. E aí vão Sirius e mamãe novamente.

A voz da Sra. Weasley se perdeu em meio a novos gritos vindos dos retratos do salão. Jorge tentou fechar a porta para diminuir um pouco o barulho mas antes que ele pudesse fazer isso um elfo-doméstico entrou na sala. Exceto pelo farrapo imundo amarrado como se fosse uma tanga ao redor de sua cintura, estava completamente nu. Parecia ser muito velho. A sua pele parecia ser muitas vezes maior que ele, apesar dele ser careca como todos os elfos-domésticos, havia uma certa quantidade de cabelos brancos crescendo e tinha orelhas de morcego. Seus olhos eram um pouco sangrentos e de um cinza aguacento, seu nariz mais parecia uma tromba.

O elfo não deu atenção a Harry e aos outros. Agindo como se não pudesse vê-los, andou com sua corcunda lentamente e com teimosia até o outro lado da sala, todo o tempo murmurando em seu rouco respirar, com uma voz profunda como o som de um sapo-boi.

-...Isso cheira mal, mas ela não é melhor, aquele traidor asqueroso com sua mal-criação estragando a casa de minha mestra, oh, minha pobre mestra, se ela soubesse, se ela soubesse a escória que eles deixam entrar em sua casa, o que ela diria ao velho Kreacher, oh, que vergonha, sangue-ruim e lobisomens e traidores e ladrões, pobre e velho Kreacher, o que ele pode fazer...

- Olá, Kreacher - disse Fred bem alto, fechando a porta com uma pancada.

O elfo-doméstico gelou em seu caminho, parou de murmurar e fez uma cara de surpresa que não conseguiu convencer ninguém.

- Kreacher não viu o jovem mestre - disse ele, virando-se e saudando Fred. Ainda batendo o carpete, ele adicionou de forma perfeitamente audível. - Asqueroso pirralho traidor é o que ele é.

- O quê? - disse Jorge. - Não entendi a última parte.

- Kreacher não disse nada - disse o elfo, com uma segunda ofensa para Jorge, falando num tom baixo, porém cálido. - E eles são idênticos, pequenas bestas não naturais eles são.

Harry não sabia se devia rir ou não. O elfo se endireitou, olhando todos eles com malevolência e aparentemente convencido que eles não podiam ouvi-lo enquanto continuava a murmurar.

-...E tem a sangue-ruim, ali de pé exibindo coragem, ah se minha mestra soubesse, oh, como ela choraria, e tem um novo garoto, Kreacher não sabe o nome dele. O que ele está fazendo aqui? Kreacher não sabe...

- Esse é Harry, Kreacher - disse Hermione. - Harry Potter.

Os pálidos olhos de Kreacher se abriram e ele murmurou mais rápido e mais furioso do que antes.

- A sangue-ruim está falando com Kreacher como se ela fosse minha amiga, se a mestra de Kreacher visse ele com essa desprezível companhia, oh, o que ela iria dizer...

- Não a chame de sangue-ruim! - disseram Rony e Gina juntos, com muita raiva.

- Não tem importância - sussurrou Hermione -, ele não está pensando direito, ele não sabe o que está...

- Não se engane, Hermione, ele sabe exatamente o que está dizendo – disse Fred, olhando Kreacher com grande desgosto.

Kreacher ainda murmurando e olhando para Harry, disse:

- Isso é verdade? Esse é Harry Potter? Kreacher pode ver a cicatriz, deve ser verdade, é o garoto que derrotou o Lord das Trevas, Kreacher gostaria de saber como ele fez...

- Nós todos gostaríamos, Kreacher - disse Fred.

- O que você está querendo aqui? - perguntou Jorge.

Os grandes olhos de Kreacher fitaram Jorge.

- Uma bela história - disse uma voz vinda de trás de Harry.

Sirius estava de volta; estava na porta olhando para o elfo. O barulho no salão tinha silenciado; talvez a Sra Weasley e Mundungus tivessem ido discutir na cozinha.

Ao ver Sirius, Kreacher se curvou numa ridícula corcunda que deixou seu nariz-tromba rente com o chão.

- Endireite-se - disse Sirius impaciente. - Agora, o que você quer?

- Kreacher está limpando - repetiu o elfo. - Kreacher vive para servir a Nobre Casa dos Black...

- E está ficando mais suja a cada dia, está imunda - disse Sirius.

- O mestre sempre gostou de fazer piadas - disse Kreacher, curvando-se novamente, e continuou em voz baixa. - O mestre é um porco asqueroso e ingrato que partiu o coração da sua mãe...

- Minha mãe não tinha coração, Kreacher - rebateu Sirius. - Ela se mantinha viva por pura maldade.

Kreacher se curvou novamente enquanto falava.

- O que quer que o mestre diga - murmurou furiosamente. - O mestre não é digno de limpar a lama dos sapatos de sua mãe, oh, minha pobre mestra, o que ela diria se visse Kreacher servindo ele, como ela o odiaria, que desapontamento ela teria...

- Eu perguntei o que você está querendo - disse Sirius com frieza. - Cada vez que você aparece fingindo estar limpando você rouba alguma coisa e esconde em seu quarto para que nós não joguemos fora.

- Kreacher nunca tirou nada de seu lugar na casa do mestre - disse o elfo, e murmurou bem rápido. - A mestra nunca perdoaria Kreacher se a tapeçaria fosse jogada fora, há sete séculos ela está na família, Kreacher precisa cuidar dela, Kreacher não vai deixar o Mestre e os traidores e os fedelhos a destruírem...

- Eu imaginei que fosse isso - disse Sirius, jogando um olhar desdenhoso para o outro lado. - Ela vai precisar colocar outro Feitiço de Fixação Permanente nela, eu não tenho dúvida, mas se eu puder me livrar dela certamente eu o farei. Agora vá embora, Kreacher.

Pareceu que Kreacher não desafiaria desobedecer a uma ordem direta, apesar disso o olhar que jogou para Sirius enquanto arrastava os pés ao passar por ele estava cheio do mais profundo ódio e murmurou por todo o caminho até sair da sala.

-...Volta de Azkaban mandando no Kreacher, oh, minha pobre mestra, o que ela diria se ela visse a casa agora, escória vivendo nela, seus tesouros jogados fora, ela jurou que ele não era mais filho dela e agora ele está de volta, eles disseram que ele era um assassino também...

- Continue murmurando e eu serei um assassino! - disse Sirius irritado enquanto batia a porta na cara do elfo.

- Sirius, ele não sabe o que está fazendo - alegou Hermione. - Eu não acho que ele saiba que nós podemos ouvi-lo.

- Ele esteve sozinho por muito tempo - disse Sirius -, recebendo ordens loucas do retrato de minha mãe e falando sozinho, mas ele sempre foi grosseiro assim...

- Se ao menos você o libertasse - disse Hermione esperançosa -, talvez...

Nós não podemos libertá-lo, ele sabe muito sobre a Ordem - disse Sirius de forma curta. - E de qualquer forma, o choque iria matá-lo. Sugira a ele deixar essa casa e veja o que ele faz.

Sirius atravessou a sala para onde a tapeçaria que Kreacher estava tentando proteger estava pendurada na extensão de toda a parede. Harry e os outros o seguiram.

A tapeçaria parecia imensamente velha; estava molhada e parecia que as Fadas Mordentes tinha mastigado em vários lugares. Apesar disso, os fios dourados com a qual foi bordada ainda cintilavam o suficiente para mostrá-los uma extensa árvore da família datada (até onde Harry podia dizer) até a Idade Média. Grandes palavras bem no alto da tapeçaria diziam:

A Nobre e Mais Antiga Casa dos Black

Toujours pur

- Você não está nela! - disse Harry, após verificar a parte baixa da árvore bem de perto.

- Eu costumava estar ali - disse Sirius, apontando para um pequeno detalhe arredondado, como um remendo que mais parecia uma queimadura de cigarro. - Minha doce mãe me expulsou após eu ter saído de casa. Kreacher é quem gosta de murmurar essas história por aí.

- Você saiu de casa?

- Quando eu tinha uns dezesseis anos - disse Sirius. - Eu não agüentava mais.

- E para onde você foi? - perguntou Harry, encarando-o.

- Para a casa do seu pai - disse Sirius. - Seus avós ficaram realmente satisfeitos com isso; eles praticamente me adotaram como um segundo filho. Sim, eu ia com o seu pai nos feriados da escola e quando eu tinha dezessete consegui um lugar só para mim. Meu tio Alphard me deixou uma boa quantidade de ouro. Ele também foi retirado da árvore, e provavelmente foi por ter feito isso. Em todo caso, depois disso eu fiquei por minha conta. Mas eu era sempre bem vindo na casa do Sr. e Sra. Potter para o almoço de domingo.

- Mas... Por que você...?

- Saí? - Sirius sorriu e correu seus dedos por seus longos cabelos despenteados. – Por que eu odiava todos eles: meus pais, com sua mania por puro-sangue, convencidos que ser um Black fazia de você praticamente da realeza... Meu irmão idiota, gentil o suficiente para acreditar neles... Aqui está ele.

Sirius apontou o dedo para a parte mais baixa da árvore, no nome "Regulus Black". Uma data de morte (por volta de quinze anos atrás) estava escrita ao lado da data de nascimento.

- Ele era mais novo que eu - disse Sirius - e um filho bem melhor, motivo pelo qual sempre me chamavam a atenção.

- Mas ele morreu - disse Harry.

- Sim - disse Sirius. - Estúpido e idiota... Ele se uniu aos Comensais da Morte.

- Você está brincando!

- Qual é, Harry, você não viu o suficiente nessa casa para dizer o tipo de bruxos que minha família era? - disse Sirius impaciente.

- Eram... Seus pais também eram Comensais da Morte?

- Não, não, mas acredite em mim, eles achavam que Voldemort tinha a idéia certa, eles eram a favor da purificação da raça dos bruxos, livrando-se dos nascidos trouxas e tendo apenas puros-sangues no lugar. Eles não estavam sozinhos, além deles havia algumas pessoas, antes de Voldemort mostrar sua verdadeira forma, que pensavam que ele tinha a idéia certa sobre as coisas... E vacilaram quando viram o que ele estava disposto a fazer para chegar ao poder. Mas eu aposto que meus pais achavam que Regulus era um herói por se unir a ele.

- Ele foi morto por um Auror? - perguntou Harry.

- Não, não - disse Sirius. - Não, ele foi assassinado por Voldemort. Ou por ordem dele, provavelmente; eu sempre duvidei que Regulus fosse importante o suficiente para ser morto por Voldemort em pessoa. Pelo que eu soube, depois que ele morreu, ele havia ido tão longe que entrou em pânico sobre o que estavam pedindo para ele fazer e então tentou sair. Bem, você não pode simplesmente pedir demissão a Voldemort. É um serviço para a vida inteira ou então a morte.

- Almoço - disse a voz da Sra. Weasley.

Ela estava segurando sua varinha erguida à sua frente, equilibrando uma gigantesca bandeja repleta de sanduíches e bolo na ponta da varinha. Ela estava com a cara vermelha e ainda parecia zangada. Os outros foram em sua direção, ansiosos por um pouco de comida, mas Harry ficou com Sirius, que ainda estava curvado próximo à tapeçaria.

- Há muito tempo eu não olhava isso. Tem o Phineas Nigelu; meu tataravô, está vendo?... O menos popular diretor que Hogwarts já teve... A Araminta Meliflua... Prima da minha mãe... Tentou fazer um projeto de lei para tornar a caça aos trouxas legal... E a querida tia Elladora... Ela começou a tradição da família de decapitar os elfos-domésticos quando eles ficavam velhos demais para carregar a bandeja de chá... É claro, qualquer um da família que produzisse algo que parecesse decente eles deserdavam. Estou vendo que Tonks não está aqui. Talvez seja por isso que Kreacher não aceita ordens dela. Ele supostamente faz qualquer coisa que alguém da família lhe peça...

- Você e Tonks são parentes? - perguntou Harry surpreso.

- Ah, sim, a mãe dela, Andrômeda, era minha prima favorita - disse Sirius, examinando a tapeçaria mais de perto. - Não, Andrômeda não está mais aqui, veja...

Ele apontou para outra marca de queimadura entre dois nomes, Bellatrix e Narcissa.

- As irmãs de Andrômeda ainda estão aqui porque tiveram um respeitável casamento puro-sangue, mas Andrômeda casou com um trouxa, Ted Tonks, então...

Sirius imitou disparar um feitiço com sua varinha contra a tapeçaria e sorriu com mau humor. Harry, entretanto, não sorriu; ele estava muito ocupado olhando os nomes à direita da queimadura sobre o nome de Andrômeda.

Uma linha dupla bordada ligando Narcissa Black e Lúcio Malfoy e uma linha simples vertical saindo de seus nomes e levando ao nome Draco.

- Você é parente dos Malfoy!

- As famílias de puro-sangue são todas parentes - disse Sirius. - Se você só vai deixar seus filhos e filhas casarem com puros-sangues as escolhas são bem limitadas; dificilmente há algum de nós sobrando. Molly e eu somos parentes por causa de um casamento e Arthur é um tipo de primo segundo meu. Mas nem tente encontrá-los aqui. Se alguma vez uma família teve um ramo de traidores do sangue eles são os Weasley.

Mas Harry agora estava olhando para o nome à esquerda da queimadura sobre o nome de Andrômeda: Bellatrix Black, que estava ligada por uma linha dupla a Rodolphus Lestrange.

- Lestrange... - disse Harry bem alto. O nome mexeu com algo em sua memória; ele o conhecia de algum lugar, mas por um momento não podia lembrar de onde, sentiu um estranho arrepio em seu estômago.

- Ele está em Azkaban - disse Sirius.

Harry o olhou com curiosidade.

-Bellatrix e seu marido Rodolphus vieram com Bartô Crouch Jr. - disse Sirius, com a mesma voz apressada. - O irmão de Rodolphus, Rabastan, estava com eles também.

Então Harry lembrou. Tinha visto Bellatrix Lestrange dentro da penseira de Dumbledore, um estranho aparelho em que pensamentos e memórias podiam ser guardados: uma mulher alta com olhos encobertos estava de pé em seu julgamento e proclamou sua fidelidade a Lord Voldemort, o orgulho que tinha em buscar a ele imaginando que mesmo depois de sua queda, ainda convencida de que um dia seria recompensada por sua lealdade.

- Você nunca se referiu a ela como sua...

- Faz alguma diferença ela ser minha prima? - rebateu Sirius. - Até onde eu considero, eles não são minha família. Ela certamente não é minha família. Eu não a vi desde que eu tinha sua idade, a menos que você conte um relance que tive dela vindo para Azkaban. Você acha que eu tenho orgulho de ter parentes como ela?

- Desculpe - disse Harry rapidamente. - Eu não queria... Eu apenas fiquei surpreso, só isso...

- Não importa, não se desculpe - murmurou Sirius. Ele ficou de costas para a tapeçaria, com as mãos enfiadas nos bolsos. - Eu não gosto de estar aqui - disse, olhando através da sala. - Eu nunca pensei que pudesse ficar preso nessa casa outra vez.

Harry compreendeu completamente. Sabia como ele se sentia, quando cresceu pensou que estivesse livre daquele lugar para sempre, para voltar e viver no número quatro da Rua dos Alfeneiros.

- É ideal para o Quartel-General, sem dúvida - disse Sirius. - Meu pai colocava todo tipo de medidas de segurança conhecidas nela enquanto viveu aqui. É praticamente invisível, então os trouxas nunca puderam vir e tocar a campainha. Se é que eles iriam querer isso. E agora Dumbledore adicionou sua proteção, será muito difícil encontrar uma casa tão segura como esta em qualquer outro lugar. Dumbledore é o Fiel do Segredo da Ordem, você sabe, ninguém pode encontrar o Quartel-General a menos que Dumbledore em pessoa diga onde ele está, aquele bilhete que Moody lhe mostrou a noite passada era de Dumbledore... - Sirius deu uma risadinha. - Se meus pais pudessem ver o uso que a casa está tendo agora... Bem, o retrato de minha mãe pode te dar uma idéia.

Ele fez uma cara feia por um momento e então suspirou.

- Eu não me importaria se pudesse sair ocasionalmente para fazer algo de útil. Eu pedi a Dumbledore para poder escoltar você, em sua audiência, como Snuffles, certamente, para poder te dar um pouco de apoio moral, o que você acha?

Harry sentiu como se seu estômago tivesse afundado através do carpete empoeirado. Ele não tinha pensado sobre a audiência nenhuma vez desde o jantar da noite anterior; na excitação de estar de volta com as pessoas que ele mais gostava e ouvindo tudo sobre o que estava acontecendo, aquilo tinha lhe fugido da mente. Com as palavras de Sirius, no entanto, a pressão e o medo voltaram a ele. Olhou Hermione e os Weasley, todos enfiados entre os sanduíches, e pensou como se sentiria se voltassem para Hogwarts sem ele.

- Não se preocupe - disse Sirius. Harry olhou e percebeu que Sirius o esteve observando. - Eu tenho certeza que eles vão limpar sua barra, sei que existe algo no Estatuto Internacional da Magia sobre ser permitido usar magia para salvar sua própria vida.

- Mas se eles me expulsarem - disse Harry calmamente - eu posso voltar aqui e viver com você?

Sirius sorriu tristemente.

- Nós veremos.

- Eu me sentiria bem melhor sobre a audiência se eu soubesse que não teria que voltar para os Dursley - Harry o pressionou.

- Eles devem ser realmente maus se você prefere um lugar como esse – disse Sirius com tristeza.

- Apressem-se, vocês dois, ou não vai sobrar nenhuma comida - disse a Sra. Weasley.

Sirius deu outro grande suspiro, lançou um olhar sombrio para a tapeçaria então ele e Harry foram se juntar aos outros.

Harry fez o possível para não pensar sobre a audiência enquanto esvaziava os armários com portas de vidro durante a tarde. Felizmente, para ele era um trabalho que necessitava de um bocado de concentração, já que muitos dos objetos estavam muito relutantes em deixar suas prateleiras empoeiradas. Sirius sofreu uma mordida de uma caixa de rapé prateada; em poucos segundos sua mão ferida tinha criado uma desagradável cobertura como se fosse uma luva marrom.

- Está tudo bem - disse ele, examinando a mão com interesse antes de bater levemente sua varinha e restaurar a pele ao normal -, deve ter polvilho de verruga nela.

Ele jogou a caixa de lado dentro de um saco onde estavam depositando as ruínas dos armários; Harry viu Jorge embrulhar a mão cuidadosamente em um pano e colocar a caixa dentro de seu bolso, que já estava cheio de Fadas Mordentes.

Encontraram um instrumento prateado de formato desagradável, algo como um par de pinças com muitas pernas, que correu pelo braço de Harry como se fosse uma aranha quando a pegou, e tentou picar sua pele. Sirius agarrou e bateu nela com um pesado livro com o título Nobreza da Natureza: Uma Genealogia de Bruxos. Havia uma caixinha de música que emitia um fraco e sinistro toque quando se dava corda e todos se viram curiosamente fracos e sonolentos, até Gina teve o senso de fechar a tampa; um pesado medalhão que nenhum deles conseguiu abrir; uma grande quantidade de selos antigos e, numa caixa empoeirada, uma Ordem de Merlin, Primeira Classe, que havia sido ganha pelo avô de Sirius por "serviços prestados ao Ministério".

- Isso significa que deu a eles uma boa quantidade de ouro - disse Sirius desdenhosamente jogando a medalhão dentro do saco de lixo.

Muitas vezes Kreacher andou pela sala e tentou furtar algumas coisas, escondendo-as embaixo de sua tanga, murmurando maldições horríveis cada vez que eles o viam fazendo isso. Quando Sirius arrebatou de sua mão um grande anel de ouro que tinha o emblema dos Black, Kreacher explodiu em lágrimas furiosas e saiu da sala chorando e chamando Sirius de nomes que Harry nunca tinha ouvido antes.

- Era do meu pai - disse Sirius, jogando o anel no saco. - Kreacher não era tão devoto a ele quanto era à minha mãe, mas eu ainda o peguei escondendo um par de velhas calças do meu pai na semana passada.

***

A Sra. Weasley manteve todos trabalhando duro durante os dias que seguiram. A sala de desenho demorou três dias para ser desinfetada. Finalmente, a única coisa indesejável que sobrou foi a tapeçaria com a árvore genealógica da família Black, que resistiu a todas as tentativas de remoção da parede, e as pancadas na gaveta da escrivaninha. Moody ainda não tinha aparecido pelo Quartel-General, então não puderam se certificar do que tinha dentro dela.

Foram da sala de desenho para uma sala de jantar no andar térreo onde encontraram aranhas tão grandes quanto os pratos do guarda-louça (Rony saiu da sala apressadamente para fazer uma xícara de chá e não voltou por uma hora e meia). A porcelana, que tinha o símbolo dos Black e o lema, foi toda jogada sem nenhuma cerimônia dentro do saco por Sirius, e o mesmo destino teve uma porção de velhas fotografias que estavam em molduras prateadas manchadas, todos os seus ocupantes gritaram quando o vidro que os cobria se partiu.

Snape poderia se referir ao trabalho deles como "uma limpeza", mas na opinião de Harry estavam realmente declarando guerra à casa, que estava resultando numa boa briga, sendo ajudada e apoiada por Kreacher. O elfo-doméstico continuava aparecendo onde quer que se reunissem, seu murmúrio se tornando mais e mais ofensivo quando ele tentava remover qualquer coisa que pudesse dos sacos de lixo. Sirius foi o mais longe que pôde, ameaçando-o com roupas, mas Kreacher olhava fixamente para ele com seus olhos lacrimejantes e disse "O Mestre deve fazer o que desejar", antes de se virar e murmurar bem alto: "mas o mestre não vai dispensar o Kreacher, não, porque Kreacher sabe o que eles querem fazer, ah sim, eles estão tramando contra o Lord das Trevas, sim, com esse sangue-ruim e traidores e escória...". Então Sirius, ignorando os protestos de Hermione, agarrou Kreacher por trás de sua tanga e o jogou pessoalmente para fora da sala.

O sino da porta tocou várias vezes por dia, que era a deixa para a mãe de Sirius começar a gritar novamente, e para Harry e os outros a tentativa de ouvir a conversa do visitante por detrás da porta, para poder colher qualquer informação que pudessem antes que a Sra Weasley os chamasse de volta às suas tarefas. Snape entrou e saiu da casa diversas vezes, embora para o alívio de Harry eles nunca tivessem ficado frente a frente; Harry também avistou sua professora de Transfiguração, McGonagall, parecendo bem estranha em roupas de trouxa, e também parecia muito ocupada para se demorar. Algumas vezes, entretanto, os visitantes ficavam para ajudar. Tonks se juntou a eles para uma tarde memorável na qual eles encontraram um velho fantasma assassino escondido no banheiro do primeiro andar, e Lupin, que estava na casa com Sirius, mas que tinha saído por longos períodos para fazer trabalhos misteriosos para a Ordem, ajudou-os a consertar um relógio de pêndulo que tinha desenvolvido um hábito desagradável de atirar pesados parafusos em quem passasse perto. Mundungus se redimiu aos olhos da Sra. Weasley ao salvar Rony de um antigo conjunto de barretes vermelhos que tinham tentado estrangulá-lo enquanto ele os tirava do armário.

Apesar do fato de que ele estava dormindo mal, ainda tendo sonhos sobre corredores e portas trancadas que faziam sua cicatriz doer, Harry estava conseguindo se divertir pela primeira vez em todo o verão. Enquanto estivesse ocupado estaria feliz; quando a ação diminuía, entretanto, toda vez que baixava a guarda ou se deitava exausto na cama observando as sombras embaçadas se moverem através do teto, o pensamento sobre a audiência do Ministério que estava se aproximando retornava a ele. O medo golpeava seu interior como agulhas quando imaginava o que aconteceria com ele se fosse expulso. A idéia era tão terrível que não se atrevia a comentar nem mesmo com Rony e Hermione, que via freqüentemente cochichando juntos e jogando olhares inquietos em sua direção, seguido por sua determinação em não mencioná-lo. Às vezes ele não podia impedir sua imaginação de mostrá-lo um oficial anônimo do Ministério que estava partindo sua varinha em duas e ordenando a ele que voltasse a casa dos Dursley... Mas ele não iria. Estava determinado. Voltaria para Grimmauld Place e viveria com Sirius.

Ele sentiu como se um tijolo tivesse caído sobre seu estômago quando a Sra. Weasley virou-se para ele durante o jantar na quarta-feira e disse calmamente.

- Eu passei suas melhores roupas para amanhã de manhã, Harry, e eu quero que você lave seu cabelo hoje a noite, também. Uma boa primeira impressão pode fazer maravilhas.

Rony, Hermione, Fred, Jorge e Gina, todos pararam e olharam para ele.

Harry balançou a cabeça e tentou continuar comendo seu pedaço de carne, mas sua boca tinha ficado tão seca que ele não conseguia mastigar.

- Como eu vou chegar lá? - perguntou ele à Sra. Weasley, tentando parecer indiferente.

- Arthur vai levar você para o trabalho com ele - disse a Sra. Weasley com gentileza.

O Sr. Weasley sorriu de modo encorajador para Harry.

- Você pode aguardar em meu escritório até chegar a hora da audiência - disse ele.

Harry olhou para Sirius, mas antes que pudesse perguntar a Sra. Weasley já havia respondido.

- O Professor Dumbledore não acha uma boa idéia Sirius ir com você, e eu devo dizer que eu...

-...Acho que ele está com a razão - disse Sirius com os dentes trincados.

- Ele veio noite passada, quando você estava dormindo - disse o Sr. Weasley.

Sirius, com muito mau humor apunhalou uma batata com seu garfo. Harry baixou os olhos para seu prato. O pensamento de que Dumbledore tinha estado na casa na véspera de sua audiência e que não tinha pedido para vê-lo o fez se sentir ainda pior, se é que isso era possível.

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