O Encontro Com Sírius
Harry tentou estudar o dia todo no lugar mais deserto possível e longe do alcance dos amigos para não ter que inventar desculpas. Já tinha a capa de invisibilidade consigo e a colocaria assim que achasse propício. Antes de ir para Hogsmead, passaria na cabana de Hagrid como Sírius pedira. Era comecinho de tarde quando Harry parou defronte a cabana de Hagrid e bateu forte na porta depois de esconder a capa de invisibilidade.
- Quem está aí? – perguntou Hagrid antes de abrir. Canino, seu fiel cão, pareceu adivinhar quem era e não manifestou preocupação.
- Olá Hagrid, sou eu! – respondeu-o Harry.
Hagrid abriu a porta vorazmente e deu um grande sorriso.
- Harry, mas que surpresa boa! Entre logo, estou preparando o chá com biscoitos que você tanto gosta, venha!
Harry sorriu sem graça e cruzou a porta pensando que deveria ter demorado um pouco mais pra não ter que provar os biscoitos de Hagrid. Ele adorava o amigo, mas tinha que admitir que ele tinha um péssimo dom para cozinhar. Ele deu uma espiada por toda cabana depois sentou-se na velha poltrona. Canino deu-lhe uma forte lambida nas mãos e Harry o acariciou amigavelmente.
- Desculpe não poder vir te visitar com mais freqüência nos últimos tempos Hagrid, mas é que os Testes Finais estão consumindo todo o meu tempo.
- Não se preocupe Harry, eu sei perfeitamente o quanto é importante pra você, Rony e Hermione terminar logo os seus estudos. – Hagrid colocou a chaleira sobre a mesa e parou um segundo.- E por falar nestes dois, não vieram com você?
- Não. O Rony está aproveitando o resto do feriado com Luna e Hermione, como não poderia ser diferente, está estudando o dia inteiro.
- Hum, isso é bom. Eu só fico triste por saber que não vou vê-los no próximo ano.
- E você acha mesmo que não vai mais nos ver? É claro que vou te visitar quando eu puder Hagrid.
Hagrid fez uma cara mais animada.
- Este é o jovem Harry Potter confirmando mais uma vez sua semelhança com os pais. – Harry sorriu orgulhoso e tímido. – Sabe, tanto Tiago quanto Lílian me disseram a mesma coisa antes de irem embora e foi realmente o que aconteceu.
- Quer dizer que meus pais vinham te visitar é Hagrid?
- Não tanto quanto desejavam, mas vinham. Quando eu soube que iam se casar fiz questão de preparar o melhor presente que conseguia. Procurei as melhores fotografias dos sete anos que passaram aqui com a ajuda do Prof. Lupin e montei um álbum exatamente como o que te dei no seu primeiro ano aqui. Você ainda se lembra?
Perguntou Hagrid servindo chá a Harry.
- Como eu poderia esquecer Hagrid se é uma das coisas que não abro mão de carregar comigo?
Harry percebeu os olhinhos do amigo, que mais pareciam dois besourinhos, brilharem. Hagrid ficara realmente emocionado com o comentário.
- Mas... – ele pigarreou limpando os olhos. – ... o que o trouxe aqui Harry? Ainda é cedo para se despedir de mim. Não está com algum problema, está?
- Não Hagrid, eu estou muito bem. É que na verdade eu precisava avisar a alguém que vou até Hogsmead, pra... apanhar umas lembranças.
- Hum... Hogsmead? Mas você e Mione não foram até lá há poucos dias?
- Sim, mas é que... eu gostaria de ir de novo, sozinho, pra... pra... arejar um pouco meus pensamentos. Sabe, é que eu também vou sentir muita falta daqui e já que McGonaghall tem andado muito ocupada achei melhor falar com você ao invés dela, afinal você é... responsável.
- Eu sou responsável? – perguntou Hagrid incerto. Harry sacudiu a cabeça freneticamente. – Sim! É claro! Sou responsável! – confirmou Hagrid todo cheio de si. - Você está certo Harry, não há porque incomodar a professora McGonaghall com algo que eu posso resolver, não é mesmo? – Harry abafou um riso. - Você pode ir, mas... procure não demorar está bem Harry?
- Eu prometo que estarei de volta antes do jantar Hagrid!
- Então...- Hagrid consultou seu relógio de bolso. - ...eu não estou expulsando você Harry, mas é melhor ir andando.
- Claro! – Harry levantou-se e Hagrid o acompanhou até a porta.
- É uma pena mesmo não ter dado tempo de você provar os meus biscoitos.
- É, é mesmo uma... pena. – respondeu Harry sentindo-se aliviado por não ter comido os tais biscoitos. - Até depois então!
- Tchau Harry e volte sempre que quiser!
Hagrid acenou para Harry até o mesmo sumir de suas vistas. Harry não viu necessidade de usar a capa, a não ser que acontecesse alguma coisa. Caminhou tranquilamente até Hogsmead onde avistou antes de tudo o bar de Madame Rosmerta, o Três Vassouras. Harry lembrava de ter entrado lá uma vez apenas no terceiro ano e mesmo assim escondido. No momento o que ele desejava era se concentrar apenas no que o aguardava lá dentro. Agora Harry era um bruxo maior de idade e já não podia ser barrado. O bar não estava cheio ainda, era bem cedo. Logo que o viu, Madame Rosmerta correu de encontro a ele.
- Olá Harry, que bom ver você novamente por aqui.
- É bom vê-la também.
- Você está ficando um rapaz bonito, sabia?
- Ehhh... obrigada! - agradeceu Harry coçando a nuca.
- E o que o traz aqui? – Harry ficou sem saber o que responder, afinal, segundo Sírius, ela sabia exatamente o que fazer.
- Bem, é que...
- Ah sim, é claro! Por favor, venha comigo! - ela o puxou pela mão enquanto olhos curiosos e esquisitos os observavam. Depois de subirem uma escadinha, ela parou de fronte a uma porta fechada. – Eu não queria falar sobre isso lá embaixo já que seu padrinho me pediu total sigilo. – ela destrancou a porta. - Espere aí dentro.
Harry achou melhor não questionar e entrou logo. Ela fechou a porta o deixando sozinho lá dentro. Era um quartinho bastante escuro e havia algumas velas iluminando muito humildemente o lugar. As paredes eram encarquilhadas e cheias de teias na divisa com o teto. Havia também uma lareira apagada. Será que Sírius iria usá-la como na noite anterior? Ou havia mandado algo importante através de Madame Rosmerta e por isso não queria que fosse diante de olhares curiosos? Harry caminhava de um lado para o outro inquieto até que um forte estalo o fez sentar-se forçadamente na poltrona.
- Embora eu já faça isso há bastante tempo, preciso dizer que aparatar não é a melhor coisa do mundo.
- Sírius?!
Harry boquiabriu-se olhando para o homem a sua frente. Não poderia haver surpresa melhor que essa. Ele esperava tudo, menos ver Sírius pessoalmente.
- Ora, e quem mais poderia ser?
Sírius abriu os braços esperando um abraço do afilhado que há algum tempo não via. Harry não hesitou em fazê-lo e abraçou o padrinho sentindo o mesmo lhe dar palmadas nas costas.
- Puxa! – Harry soltou-se dele. – Eu não imaginava que era você quem viria. Por onde... por onde esteve este tempo todo? E... que carta...
- Calma Harry, temos muito que conversar. - Sírius sorriu calmamente. No segundo seguinte alguém bateu na porta.
- Bem, achei que os cavalheiros iam gostar de um pouco do meu melhor hidromel.
Ela colocou a garrafa sobre a mesa de centro e com um aceno de varinha despejou o líquido em dois copinhos. Sírius tomou um para si e degustou a bebida.
- Hummm! Achei que tinha me esquecido do gosto bom que essa coisa tem, mas é quase impossível.
Ela sorriu satisfeita.
- Bem, eu vou deixá-los a sós. Devem ter muito que conversar. – ela rumou para a porta. - Se precisarem de alguma coisa estarei lá embaixo.
- Obrigada! – agradeceu-a Sírius. A bela mulher passou pela porta fechando-a as suas costas. Harry tinha uma expressão feliz e ansiosa. – Porque não se senta um pouco? – sugeriu Sírius indicando uma das duas poltronas a Harry e entregando um copinho de hidromel ao rapaz.
- Ela é confiável? – perguntou Harry depois de tomar um gole.
- Eu espero que seja. Pelo menos Dumbledore acredita que sim e pra nós... isso é o suficiente, não?
- É sim. – Harry parou um pouco pensativo. Sirius parecia mais concentrado em sua bebida e também bastante à vontade, como se não sentisse pressa. – Dumbledore sabe que está aqui? – perguntou Harry depois de alguns segundos em silêncio.
- Imagino que sim. Ele pediu que eu tratasse de alguns... assuntos para ele, e eu o estou fazendo. Desde então, eu não estive com ele novamente.
- Assuntos? Tem haver com sua preocupação na carta?
- Harry, Harry... – Sírius sorriu gostosamente, porém Harry permaneceu sério e atento. - ... se há uma coisa que Tiago soube deixar em você foi a percepção imediata das coisas. Não era possível enganá-lo, como também não é possível enganar você.
- Bom, é que... eu já recebi outras cartas suas e acho que sei quando alguma coisa te preocupa Sírius e aquela carta me pareceu assim.
- Sim Harry, eu sei disso.
- E o que está preocupando você?
Sírius levantou-se e começou a andar pela salinha enquanto falava.
- Na verdade Harry, ainda é cedo para alardes, mas Dumbledore acha que Snape está tramando alguma coisa.
- Snape? Mas eu pensei que ele estivesse preso.
- Preso Harry? – ele parou de fronte à Harry. - É claro que não! Snape podia ser o que fosse, mas não havia fatos suficientes para colocá-lo em Azkaban. Faz exatamente dois anos que desapareceu e antes de partir deixou claro qual era o partido que tomaria, tanto que Dumbledore não permitiu mais que ele ficasse em Hogwarts, não é mesmo?
- Sim, mas ele não pôde demonstrar muito sua lealdade à Voldemort, já que ele morreu algum tempo depois.
- A questão Harry, é que Dumbledore estranha a demora dos Comensais da Morte em se manifestarem. Se tinham tanta devoção pelo Lorde deles, como não tentaram fazer nada ainda? Somente alguém como Snape poderia pensar em algo engenhoso para reerguer sua doutrina e pensaria nisso minuciosamente, levasse o tempo que levasse.
- Então Dumbledore suspeita que Snape possa estar tramando alguma coisa?
- Não há mais ninguém em mente.
- E Lúcio Malfoy?
- Este sim ainda continua preso. – Sírius sentou-se esfregando as mãos. - Não descartamos a hipótese de alguma influência dele, mas em Azkaban tudo é muito mais difícil de arquitetar.
Os dois ficaram mais uma vez em silêncio. Sírius alisava o cavanhaque e engolia mais um pouco da sua bebida.
- Mas Dumbledore não tem nada em mente? Quero dizer, alguma pista do que possa ser?
- Eu acredito Harry que Dumbledore sabe de muitas coisas que não sabemos e que para o nosso próprio bem tenta sempre escolher a hora mais propícia para contar. Eu pedi o consentimento dele para alertar você, caso alguma coisa estranha estivesse acontecendo e ele disse pra eu fazê-lo imediatamente, afinal você já é bastante maduro. - Harry espremeu os lábios tendo uma ponta de orgulho dentro de si. Tanto Dumbledore quanto Sírius sempre confiaram nele e em sua maturidade. Sírius aproximou-se colocando uma das mãos sobre o ombro do rapaz. – A minha pergunta Harry, é se há algo neste exato momento que o esteja incomodando. Algo... estranho, como eu me referi na carta. - Harry manteve-se muito quieto e com o olhar disperso por alguns segundos. – Há alguma coisa?
Harry levantou-se dando às costas para o padrinho e indo até a janelinha de vidros embaçados pelo pó ali há muito acumulado. Ele pensava se deveria contar a Sirius sobre seus pesadelos amnésicos, mas não queria preocupá-lo à toa, já que tudo isso poderia ser passageiro. E se nas próximas noites nada disso acontecesse? E se tudo estivesse sendo causado pela sua ansiedade perante os Testes Finais se aproximando? Ele virou-se decidido para o padrinho.
- Não Sírius, não há nada que eu já não tenha contado e com certeza você será o primeiro, a saber, se algo estranho acontecer comigo.
Sírius pareceu respirar mais aliviado, embora ainda tivesse o ar desconfiado.
- Bem, fico feliz que esteja tudo bem com você Harry. – Harry sorriu fino ainda pensativo. Sírius se serviu com um pouco mais de hidromel e sentou-se novamente. Harry manteve-se de pé por mais alguns instantes, depois sentou-se. – E seus Testes Finais? Soube que falta menos de duas semanas, não?
- Sim, eles acontecem daqui a alguns dias.
- E como estão suas... expectativas?
- Bom, eu tenho estudado bastante pra isso!
- Sei. Aposto como Hermione - ... Harry sentiu o coração acelerar um pouco os batimentos, como era comum nos últimos dias. -... está dando uma ajuda, afinal, como eu já havia dito, das bruxas da idade dela é a melhor.
- Sim, ela é a melhor.
Harry concordou, absolutamente disperso em seus pensamentos sobre Hermione. Sentia necessidade de conversar sobre o episódio em Hogsmead com alguém, mas não sabia se devia fazer isso, afinal não estava certo sobre mais nada. Ela mesma o pedira para esquecer tudo e foi o que Harry fez. Tudo parecia ter voltado ao normal entre os dois, mas toda vez que ouvia falar nela ou quando ficava diante da mesma, sua cabeça se enchia de pensamentos indesejáveis. Harry estava tão distante que chamou a atenção de Sírius.
- Harry, desde que começamos a conversar eu estou notando você meio preocupado e já que me confirmou tão certamente que nada de estranho está acontecendo, então...
- Não é nada Sírius, não se preocupe.
Sírius o fitou por alguns instantes, enquanto Harry desviou o olhar inquieto.
- Certeza? - Harry levantou-se esfregando as mãos e pondo-se de costas para Sírius que o observava atento. Porque não contar a Sírius, pensou. – Harry?
- É que... eu queria saber como... como o meu pai era com...
- Com? – indagou-o Sírius.
- Com as garotas!
Soltou Harry depois de respirar fundo. Sírius apenas sorriu, o que só fez aumentar o embaraço de Harry. Definitivamente era constrangedor pra ele tratar de certos assuntos, por mais que considerasse Sírius a figura mais próxima de um pai que já tivera.
- Bom Harry, Tiago não costumava falar muito sobre isso, principalmente quando a garota em questão era Lílian Evans.
- Tá, mas ele... ele soube como conquista-la, afinal eles acabaram... se casando.
- Não aos dezessete anos.
- Então está me dizendo que foi difícil, é isso?
- Eu não disse isso. – Harry desviou o olhar concordando positivamente com a cabeça e mostrando seu entendimento. – Devo deduzir que essa era a causa do seu incômodo?
- Causa?
- Sim, uma... garota? - Harry corou ligeiramente denunciando sua resposta para a pergunta que Sírius lhe fizera. – Ok! Eu deveria mesmo imaginar isso, afinal você não tem mais onze anos e é normal que tenha dúvidas sobre... sobre certas coisas.
- Olha Sírius, eu sinceramente não quero te encher com isso e você nem tem a obrigação de...
- Escute Harry, eu sei que não sou seu pai e quem dera ter tido a honra de ser. No entanto, seu pai conferiu a mim a responsabilidade de apadrinhá-lo e provavelmente o que se espera de um padrinho é que ele sane qualquer... dúvida, se o seu pai infelizmente... não o pode fazer.
- Meu pai sabia bem o que estava fazendo quando lhe confiou isso Sírius, tenho certeza!
- É realmente muito bom saber que você pensa isso Harry. – Sírius parou alguns instantes feliz com o que acabara de escutar. – Quer... tentar me explicar melhor o que exatamente te perturba?
- Na verdade, nem eu sei bem o que está acontecendo comigo e tenho medo de saber. Não era exatamente o tipo de... coisa que estava planejando, sabe?
- Planejando? – perguntou-o Sírius num tom meio preocupado.
- É que não estava nos meus planos sentir o que eu estou sentindo e por quem estou sentindo.
- Ahhhh! – ele respirou mais aliviado. – Mas ninguém planeja se apaixonar Harry, isso simplesmente acontece.
- Mas não pela melhor amiga né?
- Hum... agora estou começando a perceber. Se eu bem o conheço se refere à Hermione, não é? – Harry concordou. – Não é difícil entender porque está assim afinal.
- Eu juro que nunca senti por ela o que estou sentindo agora. É bem complicado imaginar o que todos vão... pensar se...
- E você está ligando pra isso? Para o que os outros vão pensar? Isso não é do seu feitio.
- Na verdade estou ligando para o que Rony e Gina vão pensar. Bem, mais o Rony que a Gina porque... puxa, ele é o meu melhor amigo e há alguns meses atrás finalmente resolveu assumir o que sentia pela Hermione e andou saindo um tempo com ela. É certo que eles não estão mais juntos, mas Rony nunca vai entender uma coisa dessas. Vai pensar que eu sempre escondi isso dele.
- Eu não o culpo Harry e acho bastante nobre você pensar no que os dois vão achar quando souberem que seus sentimentos em relação à Hermione mudaram. Porém você mesmo acaba de me dizer que Rony e Hermione não estão mais namorando e quanto a Gina, presumo que faz tempo que me contou que ela mesma tinha decidido não ser mais sua namorada.
- Somos muito amigos ainda, mas faz mais de sete meses que terminamos.
- Então não há razão para se preocupar, sua consciência está plenamente limpa. - Harry ainda permaneceu mais um momento em silêncio. – A não ser que... Hermione... ela já sabe o que está sentindo?
- Não sei se ela sabe exatamente, quero dizer... para que distraíssemos um pouco depois de uma manhã inteira estudando, eu a convidei para um passeio até aqui, em Hogsmead.
Só que... nem eu e acho que nem ela fazíamos a mais remota idéia que isso levaria o fim que levou.
- E que fim levou?
- Começou a nevar e Hermione estava se sentindo incrivelmente feliz por causa de uma torta idiota que havia comido. Então ela começou a dançar e a girar e se desequilibrou e...bem... eu a segurei e...
- Sei... sei, não precisa me dizer mais nada! Você a beijou antes que pudesse evitar. Certo?
- É. – concordou Harry desanimado e corado.
- Você está se saindo melhor que o seu pai, então.
Harry sorriu irônico.
– Não mesmo! Quando eu fui procurá-la no dia seguinte ela disse que foi um grande erro e me pediu pra esquecermos tudo.
- E você a atendeu, mesmo não estando certo sobre isso?
- Não tive escolhas! Eu não podia correr o risco de perder a amizade dela dessa forma depois de tanto tempo. Definitivamente não estou pronto pra isso Sírius.
Harry pareceu mais aliviado por ter contado a história. Sírius colocou-se de pé caminhando ao redor de Harry com uma das mãos no bolso e outra ainda segurando o copo.
- Harry eu não posso opinar o que é certo ou errado porque é um problema que só você pode resolver, você entende isso?
- Sim. Claro que sim!
- Mas você me fez lembrar de uma história que aconteceu há muito tempo e que eu pensava ter esquecido de uma vez por todas! Mas estarei cometendo outro erro se não conta-la a você agora.
- História? Que história?
- Quando eu tinha uns oito anos de idade uma garota, também da mesma idade, foi morar bem ao lado da velha casa dos Black junto com a família. O nome dela era Allegra. Misturar-se com trouxas não era algo de que os Black gostassem, mas eu passava mais tempo com ela do que com qualquer outra criança igual a mim. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde eu viria para Hogwarts e que a veria muito pouco. Consequentemente ela acabaria se esquecendo de mim e eu dela. Acontece que todo este tempo longe só servia pra aumentar mais ainda o que sentíamos um pelo outro. À medida que fomos crescendo, a amizade foi sendo moldada e nós dois nos apaixonamos e logo começamos a sair juntos sem que ninguém soubesse. Porém Allegra já não entendia o porquê de eu passar tanto tempo fora e só vê-la nos verões. Eu tinha inventado uma história sobre um colégio interno só para garotos que serviu para enganá-la até certo tempo.
- Então ela nunca soube que você era um bruxo? – perguntou Harry incrédulo.
- Eu não tive coragem de contar a ela porque temia que ela não entendesse nunca uma história dessas. – explicou Sírius. - Certa noite eu e ela estávamos voltando para casa e houve um curto circuito na fiação de todo quarteirão nos deixando às escuras. Allegra adorava provar o quanto era corajosa, então soltou-se de mim antes que eu pudesse prever e começou a andar na minha frente de costas para o sentido em que estávamos indo. – Sírius bebeu mais um pouco. - No segundo seguinte tudo o que eu ouvi foi um grito e Allegra caindo. Estava muito escuro, não dava pra ver onde ela estava. Ela só me dizia que não conseguiria segurar por muito tempo e que o lugar parecia fundo, pois não conseguia tocar seus pés em nada firme. O meu medo foi tão grande que esqueci de tudo que tinha acobertado durante tanto tempo e saquei minha varinha. – Harry arregalou os olhos. – Primeiro iluminando o lugar e depois a fazendo levitar para fora do que na verdade era apenas um bueiro destampado, de comprimento um pouco maior do que o meu. – Sírius meio que sorriu. - Apesar de Allegra estar a salvo, ela tinha a expressão mais decepcionada que eu já vira. O pior era saber que ela não estava assustada por descobrir a verdade, mas magoada por eu ter mentido pra ela durante tanto tempo. Então ela olhou nos meus olhos chorando e disse que não queria me ver nunca mais e eu, eu apenas aceitei isso. Nos dias que se seguiram eu fiquei enclausurado dentro de casa com medo de que mais alguém pudesse saber de tudo. O verão já estava quase por acabar e novamente eu iria para Hogwarts. Não conseguia parar de pensar em Allegra e no quanto eu a magoara. Na época seu pai já estava junto com sua mãe e percebeu que eu não estava bem antes mesmo de eu contar. Eu contei e ele me encorajou a não desistir dela por causa de uma coisa dessas se era mesmo o que eu queria. Depois de concluir que ele tinha razão eu só esperava pelo feriado mais próximo, que seria três meses depois. Finalmente ia poder dizer que mesmo ela não tendo me perdoado, eu não desistira de ficar junto dela e que estava arrependido por tudo.
- E você... você conseguiu? Conseguiu dizer isso a ela?
- Quando eu voltei pra casa naquela terça chuvosa recebi a notícia de que Allegra havia se mudado com a família para bem longe, exatamente um mês antes de eu chegar. Eu fiquei maluco e fiz de tudo para tentar saber alguma coisa sobre ela, porém não deu certo. – Sírius deu um profundo suspiro. - Eu... nunca mais a vi desde então.
Harry não sabia o que dizer ao padrinho ali parado. Nunca vira este lado dele e nem imaginava que ele pudesse ter. Tantos anos confinados em Azkaban e não conseguira deixar sua sensibilidade corromper-se.
- Eu... sinto muito Sírius. Deve ter sido muito difícil pra você.
- Você nem faz idéia Harry! – ele olhou para Harry. - É exatamente por isso que digo para não perder seu tempo. Se tem certeza do que sente, então diga isso a Hermione antes que seja tarde demais.
Harry lembrou-se da aceitação de Hermione na Universidade de Magia de Paris por um momento e pensou que talvez um dia nunca mais tivesse a chance de falar com ela.
- Eu não sei como, mas é o que eu vou fazer! Vou procurar Hermione e tocar novamente no assunto. Por mais que ela não esteja sentindo o mesmo que eu, precisa me escutar! Pelo menos não vou me culpar por não ter tentado.
- Que bom Harry, que bom!
Houve alguns instantes de silêncio.
- Mas devia tentar encontra-la Sírius, Allegra poderia estar em qualquer lugar, até mesmo aqui.
- Não Harry, acho que não! Tudo isso aconteceu há muito tempo e talvez ela nem se lembre mais de mim ou tenha tentado esquecer. Não vou ser responsável por entristecê-la de novo.
- Como pode ter tanta certeza se você nem mesmo tentou? Está me dizendo que eu não devo perder meu tempo, mas você mesmo o está perdendo.
Sírius o encarou sem saber o que responder, embora soubesse que Harry estava certo.
- Eu prometo que... vou pensar no assunto, mas não agora. Primeiro tenho que descobrir o que pode estar por vir. – Sírius consultou o relógio. – É melhor eu ir, já está ficando tarde. Ficamos muito tempo aqui e não quero que você demore a voltar pra Hogwarts. Com certeza é o lugar mais seguro até que desvendemos tudo a respeito do sumiço de Snape e dos Comensais.
- Ok! – ambos se levantaram ajeitando suas vestes. - Mas você... vai me dar notícias não vai?
- Pode estar certo disso e quero que você também me escreva se precisar de qualquer coisa, está entendendo? – Harry fez que sim com a cabeça. - De qualquer forma acho que Dumbleodore não deve demorar a voltar para Hogwarts, ele definitivamente não é um homem completo longe de seus... pupilos, como ele mesmo os chama. – os dois sorriram. – Até logo Harry! – Depois de Sírius colocar seu casaco e suas luvas desaparatou deixando apenas uma poeira branda.
Harry tociu baixo e apanhou sua mochila antes de sair pela porta. Lá embaixo estavam Madame Rosmerta e dois fregueses apenas. Ele parou e sorriu para ela acenando com a mão.
- Harry querido, não quer comer alguma coisa?
- Não, obrigado Madame Rosmerta, prometi a Hagrid que estaria de volta para o jantar.
Ela enxugou suas mãos no avental e contornou o balcão.
- Neste caso então é melhor você ir mesmo. – Madame Rosmerta o acompanhou até a porta. - De qualquer forma sabe que pode voltar sempre que... – ela aproximou-se mais de Harry. – ... precisar!
- Com certeza! – respondeu Harry entendendo perfeitamente que ela se referia à Sírius. - E obrigada por emprestar um de seus quartos.
- De nada Harry, de nada!
Harry saiu lá fora e notou a noite começando a aparecer. Com certeza chegaria antes do jantar e apesar de não ter comido nada depois do almoço, não sentia a menor fome. Jamais imaginara que até mesmo Sírius se apaixonara na vida. Porém o que o preocupava agora não era a conversa que teria com Hermione, mas a preocupação de Sírius e de Dumbledore com o desaparecimento dos Comensais e principalmente de Snape. Será que ele pretendia mesmo tomar o lugar de Voldemort e reerguer tudo o que ele deixara? Como ele estaria arquitetando isso? Harry achou melhor vestir a capa de invisibilidade e continuou seu percurso com mais segurança.
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