Missão Cumprida
O estranho incidente ocorrido com Francis Finningham foi divulgado aos alunos como tendo ocorrido devido a uma estranha e rara doença ainda sem cura e que costumava acometer mulheres jovens de sangue puro. Obviamente o hospital St.Mungus pôde facilmente diagnosticar um aborto, mas o feitiço não deixara sinais de magia no corpo da garota e o caso ficou por isso mesmo, ainda que a família Finningham tivesse feito generosas doações ao hospital para evitar que a notícia vazasse e jogasse o nome da família na lama. Entretanto Francis fora proibida pelos pais de voltar a Hogwarts enquanto não revelasse o nome daquele que havia “maculado a honra da família”. O responsável seria devidamente castigado, dizia o Sr.Finningham. Mas Francis não abriu a boca e continuou a manter segredo. Então, como prometido, nunca mais voltou a Hogwarts, e para sua extrema infelicidade, foi mandada para a Academia de Beauxbatons.
Voldemort por sua vez sentia-se imensamente aliviado que tudo tivesse dado certo de acordo com seus planos. Embora o assunto ainda fosse comentado nas rodinhas de fofocas, nenhuma delas parecia chegar sequer perto da verdade.
Livre de preocupações com uma possível expulsão e casamento forçado, ocupava todo o seu tempo (pouco) livre pesquisando a respeito das Horcruxes, mas não encontrava nada, nem mesmo nos livros mais sinistros que retirava da Sessão Reservada (a que tinha livre acesso como Monitor). Era como se a coisa simplesmente não existisse. Seus amigos nada sabiam daquilo, nem de Francis. Ao mesmo tempo, planejava fazer uma visitinha a seu avô em Little Hangleton durante as férias que se aproximavam.
Mas a temporada de testes havia chegado e ele teve de abandonar as pesquisas por um tempo e mergulhar nos livros escolares – a matéria de Dumbledore e Slughorn, principalmente, estava ficando cada vez mais difícil. Estava absorto lendo um grosso livro intitulado “Uma história do uso das escrofulárias em antídotos medievais”, mas seus olhos apenas resvalavam pelas palavras, sem registrar uma única palavra. Ainda se perguntava qual seria a utilidade de conhecer os usos das escrofulárias em antídotos medievais, quando decidiu que era hora de parar. Como Lestrange sempre lhe dizia, começava a achar que perigava de um dia seu cérebro fugir da sua cabeça e pedir socorro.
No dia seguinte ocorreu o temido teste final de poções. Os alunos passavam suas penas freneticamente pelo pergaminho enquanto a grande ampulheta marcava o tempo, contra o qual corriam. Como sempre, Voldemort terminou seu teste primeiro que todos, e como Slughorn recusava-se a liberar os alunos antes de quarenta e cinco minutos de prova, pôs-se a observar a sala preguiçosamente.
Era um aposento nas masmorras, com paredes e chão de pedra bruta que o fazia lembrar sua saudosa Câmara Secreta e um cheiro engraçado das diversas poções que cozinhavam nos caldeirões. Slughorn andava entre as fileiras de carteiras observando os alunos, aparentemente em busca de alunos colando. De fato, Slughorn não era nada bom em busca de colas, porque Rookwood e Lestrange trocavam entre si respostas através de espelhos-duplos no canto mais escuro à direita da sala.
Riddle deitou a cabeça na mesa, fitando a nuca do colega à sua frente. Aparentemente seu colega estava tendo problemas com a escrita da palavra “necessidade”, e se perguntava quantos “s” haveria de escrever. Quando ele havia se decidido por um “ç”, Riddle finalmente se convenceu de que era melhor dormir do que analisar as dúvidas ortográficas dos colegas. Caiu num sono profundo e agitado, cheio de sonhos esquisitos.
Era um casebre imundo e caindo aos pedaços. Panelas cheias de comida mofada amontoavam-se na mesa e o chão estava coberto por uma grossa camada de poeira. Moscas voavam ao redor da sujeira e o corpo de um homem em trapos estava jogado de qualquer jeito numa cadeira. O homem seria dado por morto se não fosse pelo movimento lento de seu peito subindo e descendo quando respirava, e pelo ronco baixo e continuo que saía de sua boca desdentada. Numa mão segurava precariamente uma faca suja de sangue velho e pisado e uma varinha se equilibrava em seu colo apontando diretamente para a porta entreaberta que deixava entrar os ruídos da noite escura lá fora.
Pela janela meio encoberta por árvores e mais uma grossa camada de sujeira, era possível ver de longe um amontoado desordenado de casas, algumas pequenas e pobres, outras grandes e bonitas com jardins bem cuidados. Mas numa colina que surgia de repente no cenário, maculando o relevo impecavelmente plano do lugar, via-se encarrapitada no topo uma grande e bela casa senhorial cercada por um gramado verdejante e aveludado. As outras casas menores a rodeavam parecendo curvar-se diante de sua majestade.
Mas algo lhe chamou atenção, e não foram as casas do vilarejo de Little Hangleton. Na outra mão do homem em trapos no casebre, a mão solta que pendia para fora do encosto da cadeira, via-se um anel dourado feioso com uma grande pedra negra.
Um barulho do lado de fora particularmente intenso fez o homem saltar de sua cadeira e esconder a mão com o anel atrás das costas, enquanto brandia a faca e a varinha na outra.
“Quem está aí?” – Bradou o homem. Sua voz era rouca e áspera, como a de alguém com uma dor de garganta muito prolongada ou que não falasse com muita freqüência.
Mas o barulho havia silenciado. Ainda desconfiado, o homem apanhou um lampião empoeirado e o acendeu, iluminando o caminho.
Saiu do casebre olhando alucinadamente para os lados, a procura do que quer que tivesse causado aquele barulho.
Atravessou um denso trecho de bosque até uma cerca de arame farpado que delimitava o final da pequena propriedade.
Mas quando se preparava para voltar resignado ao seu casebre, duas figuras encapuzadas pularam sobre seu pescoço, derrubando-o no chão e fazendo o lampião se apagar. Uma escuridão intensa tomou o lugar, quebrada apenas pelo brilho distante das estrelas no céu e pela fina lua minguante.
“Pode passar tudo que tiver aí, ô pirado!” – Sussurrou a voz coberta pelo capuz. Porém não soou determinada – quem quer que estivesse tentando rouba-lo, não tinha muita experiência no assunto.
“Esquece o cara, Klaus! Vem dar uma olhada na casa...” – Sussurrou a outra figura encapuzada, indicando a porta aberta do casebre.
O primeiro encapuzado tomou a faca das mãos enfraquecidas do homem e a atirou longe, muito além da cerca de arame farpado. Depois disse:
“Você fica paradinho aí, e calado. A Polícia já anda atrás de você, não me custa nada fazer uma denuncia anônima...”
A ameaça pareceu funcionar, pois ele apenas encolheu-se sob a raiz de uma árvore, protegendo o anel de sua mão esquerda como sua própria vida.
Os dois encapuzados invadiram a casa e começaram a quebrar janelas e móveis. Suas risadas divertidas cortaram o silêncio da noite fazendo o bruxo contorcer-se raiva. Mas não podia ataca-los, não, era recém-saído de Azkaban, sua ficha estava muito suja, mesmo que alegasse legítima defesa...
Meia hora depois os trouxas cansaram de vandalizar o casebre e voltaram suas atenções para Morfino novamente.
“O que você tem aí atrás das costas?” – Interrogou Klaus ao perceber que o homem tentava esconder o anel.
Então puxou o braço do homem, ajudado pelo companheiro, e retirou o pesado anel de pedra, colocando-o em seu próprio dedo indicador.
“Olha que estranho, esse anel!” – Exclamou o mascarado. “O que é isso? Para que ele serve?”
Não respondeu, apenas cuspiu na cara do trouxa que apontava com o anel para o meio de sua testa. Furioso, o Trouxa chutou-lhe nas costelas fazendo a varinha em suas mãos rolar para longe.
“Eu te fiz uma pergunta, seu pirado!” – E seguiu-se mais uma série de chutes na costela, na virilha e no rosto do bruxo, fazendo-o cuspir sangue no chão e se contorcer.
“O anel com o brasão dos Peverell! Está na família Gaunt há séculos...” – Gemeu o homem.
“Peverell, eh?” – Resmungou o Trouxa, aplicando-lhe um novo pontapé nas costelas – “Isso deve valer uma fortuna...”
Mas ele já tivera o bastante. Nocauteou o trouxa quando este lhe deu as costas e fez menção de ir embora com seu anel e resgatou sua varinha, atingindo ambos com flashes de luz verde...
Quando Tom Riddle acordou sobressaltado, percebeu que todos na sala já tinham ido embora. Slughorn o observava preocupado e disse:
“Você está bem?”
Voldemort não respondeu, apenas atirou as coisas dentro da mochila e se retirou. Precisava encontrar Servolo e o anel. Algo lhe dizia que haviam coisas importantes em Little Hangleton...
[...]
As férias chegaram rapidamente. Ao contrário do que costumava fazer, Voldemort não ficou em Hogwarts, mas alegou ter assuntos a tratar no mundo trouxa – o que não deixava de ser verdade – e contrariando seu desejo, embarcou no trem de volta ao Orfanato.
A viagem foi longa e demorada. Poucos alunos de seu ano voltaram para casa naquelas férias. Rookwood resolvera ficar “estudando” (embora Tom suspeitasse que o que ele realmente queria era fugir do chamado de seu pai para reunir-se aos Darknights), Lestrange partira um pouco mais cedo para o casamento da irmã mais velha e Avery lhe confidenciara no dia anterior que não estava nem um pouco afim de enfrentar o pai, e que se olhasse na cara do velho seria capaz de lançar-lhe um cruciatus. Como não desejava ser deserdado, permaneceu em Hogwarts. Assim, as únicas companhias de Tom eram Evan Rosier e alguns alunos no sétimo ano, membros permanentes de seu próprio exército de puxa-sacos. Seus colegas conversavam despreocupadamente, enquanto Tom observava a paisagem pela vidraça, pensando em como executar seu plano. Little Hangleton não era longe de Londres...
“Eu estive me perguntando” – Falava um dos alunos do sétimo ano – “Se existem as três Imperdoáveis, para quê precisamos de outras Artes das trevas? Digo, não há nada mais eficiente do que a maldição Cruciatus quando se quer torturar alguém, por exemplo...”
Voldemort divertiu-se com a pergunta do colega. Então tomou o sapo de chocolate da mão dele e tirou um pedaço, antes de responder displicentemente:
“Ah, mas existem coisas muito piores do que a Maldição Cruciatus.”
O garotão louro arregalou os olhos, surpreso.
“Existe?”
“Claro” – E tirou mais um pedaço do chocolate. Realmente estava apreciando o sabor daquilo...
“E você conhece?”
“Conheço, claro.” – Respondeu, num divertimento frio. - “Temos a Augurosempra, que causa azar permanente à vítima, ou seja, nada que ela faça ou tente fazer dará certo, o que a médio prazo pode findar em suicídio. Temos a Maldição de Midas, que faz com que tudo que a pessoa toque se torne ouro, inclusive a própria comida. O famoso Voto Perpétuo, embora poucos saibam, também é Magia das Trevas, pois se utilizado corretamente pode até apreender a alma do jurado. E, claro” – falou mais baixo, pensando se deveria contar – “Tem a Mors Conceptio, que causa um aborto sem deixar sinal de magia e torna a enfeitiçada permanentemente estéril. Existem inúmeros feitiços, alguns eu já ensinei a vocês, outros ainda não foram testados, mas... Quem sabe num futuro próximo...” – Disse, mais para si mesmo; seus pensamentos migrando para a promessa feita a Avery.
Um silêncio constrangedor pesou sobre os ocupantes da cabine, que se entreolharam misteriosamente.
Voldemort captou que o contingente de admiração dos colegas por si, que já não era pequeno, aumentou consideravelmente diante da pequena demonstração de conhecimento e poder. Ele sorriu, satisfeito.
[...]
Para seu imenso desgosto, viu-se encarando os portões de ferro do Orfanato mais uma vez, dessa vez desacompanhado. Arrastou o malão lentamente, e não pôde evitar de assoviar uma lenta marcha fúnebre quando atravessou o portal.
Também não havia ninguém à sua espera. Era tarde; todos deviam estar em suas camas dormindo. Suspirou tristemente e chutou o malão três degraus acima, soltando uma exclamação de dor e raiva.
Quando enfim se viu sozinho em seu quarto, percebeu o quão exausto estava, embora sua exaustão fosse mais causada pelo efeito do ódio intenso em seu corpo do que pela viagem. Mas não conseguia dormir; sua mente estava presa ao estranho sonho que tivera dias antes durante seu teste de Poções. Estranhamente, sentiu vontade de possuir aquele anel para si. O estranho objeto emanava uma aura de poder que lhe era irresistível...
Acabou adormecendo horas mais tarde, enquanto sua mente sonolenta tramava os planos mais mirabolantes de roubar o anel.
Acordou sobressaltado, tarde da manhã. Percebeu frustrado que já era quase hora do almoço e que perdera todo o dia dormindo. Uma coruja preta batia insistentemente contra a vidraça, aumentando a sua irritação.
“O que você quer?” – Perguntou, abrindo a janela permitindo a entrada do pássaro.
A coruja piou atrevida e estendeu a pata onde havia um curto bilhete amarrado.
O bilhete fora escrito numa espécie de pergaminho de má qualidade que lembrava papel higiênico, mas estava selado com um brasão de cera muito formal; um “G” gótico coroado com uma coroa de espinhos e labaredas de fogo cercando-o. O selo de Grindewald e o papel que se dissolvia facilmente em água caso precisassem livrar-se de provas.
Voldemort abriu a carta com cuidado, tentando não esfrangalhar o papel delicado.
Riddle,
Encontre-se comigo às dez no mesmo local de sempre.
G.
Pensou animado que aquela seria sua chance de arrancar mais informações sobre Horcruxes, aquelas que ele se negava a dar e talvez, quem sabe, cumprir sua promessa a Avery. É claro que teria que agir com cautela, afinal um bruxo poderoso como Grindewald não sucumbiria facilmente, e ele não desejava atrair para si a ira do exército de Darknights.
Mas não conseguia parar de imaginar a cena de Grindewald e seu cálice de absinto envenenado. Sabia que era besteira tentar envenena-lo – era óbvio demais. De qualquer maneira, Grindewald devia ter antídotos para todo tipo de veneno guardados.
[...]
Eram exatamente dez horas da noite quando Voldemort empurrou a porta de madeira úmida do pub, dando de cara com o conhecido balcão onde homens mal-encarados o analisaram de cima a baixo.
No canto mais escuro a figura de capa roxa bebericava de sua taça prateada e mantinha a cabeça baixa, escondendo o rosto. Ainda assim, Tom pôde reconhecer o homem. Imediatamente sentiu a raiva o tomando, raiva por Grindewald negar-se a dar as tão preciosas informações sobre Horcruxes... Mas lembrou-se de fechar a mente na presença do velho; não queria que ele soubesse de suas intenções de mata-lo de jeito nenhum... Grindewald era uma fonte preciosa de informação.
“Sente-se, Riddle” – Disse o velho, indicando-lhe o banco. Tom sentou-se.
“O que queria falar comigo?” – Perguntou, pressuroso, encarando os olhos amarelados do bruxo mais velho.
Grindewald devolveu o olhar cortante por cima da taça, enquanto balançava-a lentamente. Voldemort sentia-se levemente incomodado com o esforço que tinha de fazer para manter Grindewald longe de seus pensamentos.
“Uma proposta” – Ele respondeu, soturno.
Tom desviou o olhar e ocupou-se em tirar as luvas de couro dedo por dedo.
“Que tipo de proposta?”
Grindewald falou medindo palavra por palavra.
“Veja bem... Estou tendo muitas baixas em meus exércitos, ultimamente. Dumbledore tem lutado bem com seus aliados. Mas... Acho que há um traidor entre os Darknights...”
“E...?”
“Achei que seria útil se houvesse um...ah, informante entre as forças de Dumbledore.”
Será mesmo que ele estava querendo dizer o que Tom achava que ele estava querendo dizer?
“Deixe-me ver se entendi” – Disse Riddle – “Você quer que eu espione Dumbledore?”
Grindewald pareceu ligeiramente constrangido.
“Não, espião, não... Seria mais um informante, sabe...”
“Não precisa usar de eufemismos inúteis comigo. Eu sei o que é um espião.” – Falou, rispidamente. – “Mas você se esqueceu de com quem está falando...” – Acrescentou, com um sorriso – “Quero saber o que eu ganharia com isso.”
Grindewald tomou mais um gole de sua taça de prata e então disse:
“Que tal sua preciosa informação sobre Horcruxes?”
Tom engasgou-se com sua bebida. Surpreso, perguntou:
“Você sabe? Você poderia me dizer...?”
Grindewald riu horrivelmente.
“Calma, meu rapaz, calma... Quid pro quo… Primeiro vou querer minhas informações, depois lhe darei as suas…”
Tom retesou-se na cadeira ao ouvir o velho bruxo contar-lhe o que queria:
“Veja bem, eu descobri que Dumbledore está trabalhando junto com o Ministro da Magia italiano em algum projeto secreto. Sua missão é simples; você tem que descobrir sobre o que se trata esse projeto. Tenho minhas suspeitas de que eles dizem respeito a assuntos que podem interessar-me”.
Mas como, pelas barbas de Merlin, Grindewald esperava que ele se infiltrasse nos arquivos secretos do Ministro da Magia italiano?
“Sinto muito. Você está falando com a pessoa errada. Não vejo como poderia conseguir essas informações...”
Mas Grindewald parecia realmente sequioso de obter o dossiê. Agarrou as mangas do casaco de Tom e com um puxão brusco aproximou o rosto do bruxo mais jovem até que estivessem a trinta centímetros de distância e seus perturbadores olhos amarelados encarassem fixamente os olhos escuros de Voldemort.
“Não se subestime, Riddle. Eu sei do que você é capaz de fazer quando realmente quer uma coisa... Use Dumbledore, aproxime-se dele. Eu poderia pedir para qualquer um, mas escolhi você, por que te conheço melhor do que você sabe...”
Voldemort teve de admitir a si mesmo que Grindewald estava certo. Ele era realmente capaz de qualquer coisa para atingir suas metas... Era um Sonserino dos mais legítimos, não era? Mas o problema era realmente Dumbledore... Velho maldito, como era difícil conquistá-lo!
Saiu do pub bastante atordoado. O ideal seria penetrar de alguma maneira nos arquivos secretos, dá-los a Grindewald, conseguir suas informações sobre Horcruxes e depois matar Grindewald, cumprindo sua promessa a Avery e deixando o caminho livre para pegar o poder para si. Nesse momento, riu baixinho. Tinha consciência de que era meio megalomaníaco, mas o que importava? Tudo o que queria era livrar o mundo da ralé trouxa, a mesma ralé a qual pertencia seu maldito pai que abandonara sua mãe, e claro, vencer a morte, a mesma morte que havia lhe tirado dos braços de sua mãe, a mesma morte que o fazia pensar que por mais poder que tivesse em mãos, tudo seria inútil, pois um dia ele sucumbiria à suprema indignidade da morte... E isso tudo só o fazia desejar mais a informação sobre as Horcruxes. E, claro, levava-o a Little Hangleton, para onde partiria no dia seguinte.
[...]
Caminhava por uma estrada pedregosa cheia de curvas que descia a encosta de um morro rodeado de cercas vivas. Parou por um momento e leu a placa:
Great Hangleton: 8km
Little Hangleton: 1,6km
Ansioso, continuou andando. Era noite, então levava consigo uma lamparina acesa e a varinha empunhada na outra mão.
Algum tempo depois reconheceu a entrada do bosque que tinha visto em seu sonho e entrou, lutando contra os galhos secos das árvores que arranhavam seus braços e prendiam os fios de sua capa.
Era uma noite escura e fria. Logo viu o casebre de pedra, arruinado como em seu sonho. Aliás, tudo era idêntico aos seus sonhos...
A porta não tinha tranca; estava aberta e escancarada. Os olhos de Voldemort olharam por dentro da casa até que viu o homem na poltrona. Por alguns segundos, ambos se olharam, o homem se levantou derrubando garrafas vazias que se encontravam a seus pés.
“VOCÊ!” gritou. “VOCÊ!”.
E correu em direção a Riddle, varinha e faca prontas para atacar.
“Pare”.
Riddle falou em língua de cobra. O homem escorregou e bateu na mesa, derrubando as panelas. Olhou assustado para Riddle. Houve um grande momento de silêncio enquanto se olhavam. Até que o homem falou:
“Você também fala?”
“Sim, eu falo”, disse Riddle. Ele entrou na casa, batendo a porta por atrás de si.
“Onde está Servolo?” - perguntou.
“Morto”, disse o outro. “Morreu há alguns anos atrás.”
Riddle franziu a testa.
“Quem é você, então?”
“Sou Morfino, não sou?”
“Filho de Servolo?”
“Claro que sou, então...”
Morfino tirou o cabelo de seu rosto para poder ver Riddle melhor. Ele usava em sua mão direita o anel contendo a jóia negra que pertencera a Servolo.
“Pensei que você fosse aquele Trouxa”, sussurrou Morfino. “Você se parece muito com ele.”
“Que trouxa?” Perguntou Riddle asperamente.
“O Trouxa que minha irmã gostava, o Trouxa que morava na mansão do outro lado”, disse Morfino, e cuspiu inesperadamente no chão. “Você se parece exatamente com ele. Riddle. Mas ele está mais velho agora, não está? Ele é mais velho que você, agora vejo...”
Morfino olhava fixamente e chegou pro lado um pouco, ainda se apoiando na quina da mesa.
“Ele voltou, percebe...” acrescentou.
Voldemort olhava para Morfino, pensando em suas possibilidades. Moveu-se um pouco mais perto de Morfino e disse:
“Riddle voltou?”
“Er, ele a largou, e que isso sirva de lição a ela, casamento imundo”, disse Morfino, mais uma vês cuspindo no chão. “Nos roubou, antes de fugir. Onde está o colar, o colar de Slytherin?”.
Voldemort não respondeu. Morfino estava ficando irado novamente, sacudiu a faca e gritou “Ela nos desonrou, sim, ela nos desonrou, vadia imunda! E você, vindo aqui e perguntando coisas a respeito disso tudo? Acabou.... acabou...”
Ele virou o rosto, e Voldemort andou em sua direção.
Morfino lhe causava um certo asco, mas sua figura não lhe surpreendia. Talvez porque o tivesse visto nos sonhos. Deu mais um passo ficando a menos de um metro de Morfino. Então antes que o bruxo maltrapilho pudesse esboçar qualquer reação, Tom gritou:
“Expelliarmus!” – E ambas, faca e varinha voaram para longe de Morfino.
“Espere” – Disse Morfino, caído no chão. Recuava contra a parede em direção à lareira, abrindo no chão empoeirado uma trilha com as mãos. “Quem é você?”
“Eu sou o filho de sua querida irmã... E você vai pagar pelo que fez a ela, Morfino, oh, vai... Todos vão... Estupefaça...”
Morfino caiu desmaiado no chão. Voldemort apanhou a varinha do tio e abandonou o lampião ao seu lado, usando a luz da varinha de Morfino para iluminar o caminho até a aldeia de trouxas.
Não foi difícil localizar a casa dos Riddle; de fato, era a maior e melhor cuidada casa, no alto da colina, parecendo reger as outras.
Caminhou por mais uma trilha pedregosa e íngreme aberta no meio do mato do outro lado do vale, acessando a casa pela porta da frente. Um simples “alohomorra” foi suficiente para abrir a porta.
Risadas ecoavam da sala de jantar e os barulhos e cheiros de uma refeição sendo servida fizeram o nojo de Voldemort crescer mais ainda. Maldito trouxa, não vale nem a comida que come...
Andou silenciosamente até a grande sala, onde um velho e uma velha extremamente gordos e um homem jovem jantavam. Os trouxas pararam de repente para olhar a figura pálida e alta de Tom Riddle filho, lívido de raiva. Seus avós não tiveram tempo de emitir um único som antes de tombarem mortos com a luz verde emitida pela varinha de Morfino, agora empunhada por seu sobrinho. Voldemort parou e avaliou o trouxa sentado no chão, chorando horrorizado.
“É, realmente, nós somos bastante parecidos.” – Concluiu, com uma nota de desgosto na voz. “Mas apenas fisicamente. Você não passa de um trouxa nojento, imundo. Não sei o que minha mãe viu em você... Uma pura descendente de Slytherin, casando com um trouxa como você!” – Voldemort cuspiu na cara do trouxa, enojado. O homem continuava tremendo e chorando. – “Eu devia te torturar até enlouquecer, fazer você sentir um pouquinho da dor que foi crescer como um enjeitado, sem ninguém para chamar de pai... Não que eu quisesse ter uma imundice de pai como você, mas faz falta, eu admito que faz...”
Continuava apontando a varinha diretamente no coração do Trouxa. Quando parou para finalmente respirar, o homem encolhido falou finalmente na voz fraquinha:
“Você... Você é o filho de Mérope?”
“COMO SE ATREVE A DIZER O NOME DELA, SEU DESGRAÇADO?” – Urrou Riddle, chutando o pai com força no estômago repetidas vezes.
“Desculpe... Desculpe, eu não sabia... Quando Mérope me contou que era bruxa, eu tive medo... Você não perdoaria o erro de um homem tolo?” – Disse Tom Riddle pai, sorrindo com a boca ensangüentada para o filho.
Mas a resposta de Tom foi curta e grossa:
“Avada Kedavra. Eu não perdôo, trouxa... Lord Voldemort nunca perdoa!”
E foi embora da mansão dos Riddle. Minutos depois, quando a empregada entrou na sala para retirar as sobras do jantar, soltou um grito que ecoou por centenas de metros cortando o silêncio da noite calma e chamando a atenção de toda a população do vilarejo.
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