Da Doença à Saude



- Ela pode morrer – a mãe de Gina, a rainha, declarou gentilmente no jantar daquela noite.
Draco levantou a cabeça da sua sopa. Estivera ouvindo a conversa da rainha e seu pai. Ela estava contando a condição de Gina, e fazendo-a parecer bem pior do que realmente era.
- Eu disse que deveríamos ter tido mais filhos, Robert – comentou ela calmamente. Não tinha elevado sua voz mais alto que um sussurro rouco durante toda a noite. – Se Gina morrer, então quem vai me substituir como rainha? Eu não poderei me aposentar tão cedo como esperava.
- Você estava certa, querida – o marido dela respondeu com distração, obviamente não prestando atenção.
Draco revirou os olhos para a mulher. Ela estava realmente o perturbando, tentando fingir que estava preocupada com Gina, mas honestamente só se importava com a sua aposentadoria. Mas ainda, o que o irritava mais, era como ele estava incomodado de verdade com ela, por não estar temendo por Gina. Por que deveria o perturbar, afinal? Por que ele se encontrava tão bravo? Não tinha certeza sobre quem ou o quê estava mais com raiva.
- O que o doutor disse esta manhã, então? – perguntou o pai de Draco de repente.
“Doutor” pensou Draco. “Elle não havia dito que Dumbledore era um doutor?”
Por alguma razão, ele havia esquecido completamente de mencionar Dumbledore. Mas não que isso pudesse ajudar, de qualquer forma. Ele estava em Gales ainda, não estava?
- Ele disse que deu a ela algo para beber para que talvez baixe a febre – sussurrou a rainha – Ele esteve checando-a periodicamente durante todo o dia, e diz que ela está dormindo profundamente, apesar de estar ainda bem quente.
- Então por que o rapaz não uniu-se à nós em nenhuma refeição? – demandou o pai de Gina – Muito ocupado checando nossa filha adormecida para fazer outra coisa?
- Rapaz? – indagou Draco, atraindo para si olhares que ignorou. Os médicos não deviam ser homens?
- Ele não deve ter mais de vinte e um anos – respondeu Robert irritadamente, parecendo perturbado. Draco não sabia com quem.
- Ele esteve fora essa tarde, na cidade – disse a rainha suavemente – Tinha que visitar outro paciente. E acredito que agora esteja examinando Gina. Estou certa, Maria?
Draco virou-se e viu Maria parada ao lado da porta da cozinha, esperando uma tarefa para fazer. Ela concordou:
- Sim Majestade, está correta.
- Pode por favor dizer para ele vir e unir-se a nós? – continuou a mãe de Gina.
Maria fez reverência e deixou a sala de jantar.
O médico não desceu para comer alguma coisa. A empregada relatou que ele havia dito que não estava com fome no momento, e que iria até a cozinha quando estivesse.
Assim que Draco e Elle saíram da mesa, ela convidou-o avidamente:
- Quer brincar na neve lá fora?
Draco quase respondeu não, já que queria ver Gina, mas quando olhou para o rosto animado dela, rendeu-se e aceitou. Além do mais, Gina devia estar dormindo ainda. E por que iria querer passar por outra situação estranha como a da noite anterior?
O sol estava baixo, e fazia frio. Eles permaneceram perto do castelo, para que a luz das janelas pudesse iluminá-los. A lua estava brilhante também, permitindo que eles enxergassem o necessário.
Draco sabia que estava sendo chato e que estava ferindo os sentimentos da irmã, mas recusou-se a fazer um boneco de neve e anjos de neve* com ela. Nunca mais fizera isso desde os dez anos, e não planejava fazer agora. Era muito infantil e constrangedor, mesmo que ninguém pudesse vê-los, e que deixasse Elle feliz.
*Nota da tradutora: Se faz anjos de neve quando você se deita na neve e mexe as pernas e braços para cima e para baixo, deixando uma marca sem neve no chão, do que seria o “anjo de neve”.
- Você não é divertido, Draco – bufou ela, e andou alguns passos para longe antes de jogar-se na neve e fazer anjos sozinha.
Draco apoiou-se na parede do castelo, com os braços cruzados, e ficou de olho nela. Depois de mais ou menos quinze minutos, ela começou a ficar com frio e entediada, querendo voltar para dentro. Ele sabia que ela não duraria muito.
Assim que entraram no castelo, Elle soltou um grande bocejo. Draco desconfiou que devia ser a hora dela ir para cama.
- Troque essas roupas úmidas – ele disse – e vá para a cama. Não quero que fique doente como Wea... Gina.
- Wea... Gina? – repetiu a irmã, dando a ele um sorriso irônico bem típico dos Malfoy. Ela parou de caminhar e colocou suas mãos nos lábios. Draco parou e a olhou – Você quase chamou-a de Weasley?
- Nada escapa de você – murmurou ele.
- Acho que isso não importa. Mas como você sabe que foi o frio que deixou Gina doente?
- Não sei – disse ele, quase sinceramente – Estou só supondo.
- Você já viu o médico? Ele é bonito mesmo.
- Isso foi uma mudança brusca de assunto – zombou o príncipe – Você está só enrolando para que não tenha que ir para cama?
- Não – disse ela, sobressaindo seu lábio superior em um “bico”. Então sua expressão iluminou-se (Draco achou que ela mudava de humor mais que uma mulher grávida). – Você vai me cobrir?
Ele encarou-a sem expressão. Nunca alguém havia pedido isso antes. Por alguma razão, o fez sentir-se um pouco mais quente por dentro.
– Não pode se cobrir sozinha? – perguntou, ainda zombando.
Ela não pareceu chateada com a provocação.
- Posso, mas ainda quero que você me cubra. Você não tem feito isso ultimamente e eu não quero pedir ao papai. Ele sempre diz não.
Draco sentiu-se um pouco mal por ela. Ela era, em um jeito, muito parecida com ele. Não só por que eles tinham a aparência similar. Mas porque ela, como Draco, tinha um pai frio, e ela não tinha mãe. A mãe de Draco tinha sido meramente uma espinha dorsal e nunca ajudava seu filho. Era como se ela estivesse morta. Ele honestamente não se importaria se ela estivesse.
- Está bem – concordou Draco com um suspiro. Ela sorriu em felicidade e agarrou a mão dele, conduzindo-o para seu quarto.
Um dos empregados vestiu-a em sua camisola. Draco estava muito aliviado por não ter que fazer isso. Então o empregado saiu e Elle deitou na cama, puxando os cobertores para o queijo.
Draco fez o mais rápido possível. Apagou todas as velas rapidamente e levou a última para a cabeceira.
- Boa noite, Elle – disse ele, apressadamente correndo seus dedos pelos cabelos sedosos dela. Ele virou-se para sair quando ela o chamou.
- Espere, Draco. Não vai me dar um beijo?
Ele contorceu-se internamente. “Bem” pensou “pelo menos ela não pediu uma história.” Encarou-a novamente e inclinou-se, beijando sua testa rapidamente e logo arrumando-se.
- Boa noite – repetiu, e mais uma vez começou a caminhar.
- Nossa Draco, seus lábios estão tão gelados – ela disse atrás dele, como se fosse culpa dele.
Ele não respondeu, fechando a porta firmemente. Já que velas iluminavam o corredor, apagou a que estava na sua mão. Por alguma razão, não conseguia tirar as palavras de Elle da sua cabeça. Seus lábios não estavam tão frios assim, estavam?
“E o que isso importa?” ele perguntou a si mesmo. Quando virou na esquina, jogou a vela com o castiçal na parede. Observou-os bater no chão com um barulho, a vela cortando-se ao meio e o castiçal rolando. “É para isso que são os empregados mesmo” pensou “para limpar a sujeira que faço.”
Já que estava muito ocupado olhando onde a vela havia caído, não viu a outra pessoa que estava virando na esquina, diretamente a sua frente. Draco pulou um pouco quando colidiu com algo e saltou para trás levemente, surpreso com a repentina barreira.
- Eu sinto muito – desculpou-se uma voz sincera – Eu não o vi.
- Bem, é mesmo?! – replicou Draco. Ele, sendo alguém meio baixo para sua idade, teve que olhar para cima para ver o rosto da pessoa. Era um homem jovem, provavelmente não muitos anos mais velho que si mesmo, com cabelos preto e olhos azuis escuros. O príncipe pensou que ele parecia particularmente familiar, mas não sabia onde havia visto esse homem antes – Você devia ver por onde anda da próxima vez.
O homem não parecia bravo, mas tinha um olhar ameaçador quando encarou Draco com um sorriso forçado.
- Desculpe-me, Draco – disse, e começou a caminhar.
O loiro virou e observou-o ir.
- Draco? – disse atrás do homem – Você não devia me chamar de Alteza?
Ele girou e caminhou lentamente para trás, para que pudesse olhar Draco:
- Médicos chamam as pessoas pelo primeiro nome – disse com um tom de divertimento – Sejam elas da realeza ou não.
“Médico?” pensou ele. Como ele podia ser um médico quando dificilmente parecia mais velho que Draco? “E por que ele parece tão familiar? Aonde eu o vi antes? Ele é do futuro, talvez, e eu não consigo lembrar onde o encontrei?”
- Então você é o médico – disse Draco, sorrindo ironicamente – Não dê as costas para mim enquanto estou falando – ordenou quando o doutor continuou a se mover.
Ele parou repentinamente.
- Como queira – disse calmamente, sua voz fria cheia de veneno. Draco estava levemente irritado. Quem o médico pensava que era, agindo como se ele fosse o príncipe?
Draco andou lentamente em direção à ele, observando-o cruzar os braços e esperar. Não podia evitar notar que o homem tinha dedos longos.
- Que doença Gina tem? – demandou Draco de repente, parando na frente dele.
- Eu não sei dizer – respondeu o homem diretamente – Eu dei a ela algo para beber essa manhã que vai esperançosamente deixá-la melhor. Agora, se não se importa, Draco, eu estou com fome, já que não comi o dia todo. posso ir?
- Só mais uma pergunta – Draco estava se divertindo muito com expressão irritada do doutor. “Por que será que ele se parece mais com alguém que eu conheço quando fica com essa expressão?” perguntou-se, então continuou – Qual o seu nome?
- Thomas Riddle – respondeu, quase rapidamente – Boa noite – adicionou, saudando imediatamente. Então virou-se e seguiu em frente.
Draco franziu as sobrancelhas em confusão.
- Thomas Riddle? – repetiu para ninguém. Essa era certamente a última pessoa que ele esperava encontrar. Bem, talvez não, considerando que Tom Riddle era o jovem Voldemort, e quase fazia sentido.
“Não, não faz sentido” ele deu-se conta de repente. “Voldemort está morto. O grande e maravilhoso Potter o derrotou. Não há como ele possa ter sido capaz de mandar Gina e eu, junto com uma versão mais jovem de si mesmo, de volta ao passado em um mundo alternativo se ele está morto. Não é?”
Draco lentamente começou a caminhar pelo corredor, conduzindo-se para seu quarto. A chegada de Thomas Riddle só tornava as coisas mais difíceis de entender. Ele era o verdadeiro Riddle? Um jovem Lord Voldemort? Ou um verdadeiro médico dessa época que infelizmente foi amaldiçoado com o nome e a aparência de alguém...
“Potter” percebeu em um segundo. “É dele quem Riddle me lembra. Potter.”
Quanto mais tentava organizar as coisas na sua mente, mais confusas elas se tornavam. Ele não tinha idéia de como Tom Riddle era fisicamente – o Riddle do futuro. E poderia ser só coincidência que esse médico tinha o sobrenome Riddle, já que seu primeiro nome não era Tom... “Mas Tom é apelido de Thomas” deu-se conta. “E se é uma coincidência, então por que ele se parece com Harry? Outra coincidência?”
Já naquele ponto, Draco estava quase acreditando que tudo era possível. Afinal, nunca havia pensado, nem em seus sonhos mais ousados, que acordaria um dia a quatrocentos anos no passado como um príncipe. Mas aqui estava ele, um príncipe no século dezessete. Então porque diabos não poderia ser uma coincidência que o doutor tinha o mesmo nome do bruxo mais negro e mau do futuro e simplesmente se parecia com Harry?
Malfoy suspirou, parando na metade do caminho e sacudindo sua cabeça para clarear os pensamentos. Talvez ele devesse ver Gina. Ela não tinha passado por uma experiência maior com Tom Riddle durante seu primeiro ano em Hogwarts?
Talvez ela soubesse como ele se parecia fisicamente.
Draco se apressou para o quarto da princesa. Quando chegou lá, achou Maria do lado de fora em um cadeira, sua cabeça encostada contra a parede, roncando bem alto. Ele sabia que estava ficando um pouco tarde, e que todas as chances eram de que Gina estivesse ainda em sono profundo. Mas não se importava; iria acordá-la. Queria saber o que ela pensava de toda a situação do médico, agora que provavelmente já tivera um encontro com Thomas Riddle.
Ele empurrou a porta e entrou. Maria continuou a dormir, apesar de Draco ter fechado a porta atrás de si bem forte.
Algumas velas em candelabros clareavam levemente o quarto. Draco atravessou o aposento em direção à cama, e parou antes de sacudir Gina; algo o fez parar. Podia vagamente vê-la nas sombras, apenas um volume em meio aos cobertores, sua massa de cabelos vermelhos espalhados no travesseiro. Tudo parecia parado e silencioso.
Franzindo o cenho por alguma razão que não podia descrever, ele caminhou para a mesa e segurou o candelabro, retornando para o lado da cama. Não podia vê-la muito claramente – estava em baixo de algo que parecia pilhas de cobertores e seu cabelo estava por toda a parte, cobrindo seu rosto. Por que ele precisava vê-la, de qualquer forma? Havia vindo para interrogá-la, não para fitá-la enquanto dormia.
Ele depositou as velas de volta à mesa de cabeceira. Então estendeu a mão e gentilmente a cutucou.
- Gina – disse calmamente. Ela não se moveu um centímetro, mas deixou escapar um lamento. Suspirando, ele inclinou-se mais para perto e sacudiu-a pelos ombros, mas mais forte do que tinha a intenção – Gina! – repetiu com severidade, sentindo-se irritado.
Foi como se ela acordasse de sobressalto. Um minuto estava parada e dormente, e no outro deixou escapar um grito rouco e estava batendo no que quer que estivesse a sua frente.
- Me deixe sozinha! – berrou ela. Draco soltou-a e endireitou-se, surpreso com o repentino ato. Ele observou, dividido entre choque e divertimento, quando ela forçou-se a sentar com pressa, tentando tirar o cabelo de seu rosto para que pudesse ver. Seus olhos finalmente pararam nele e ela soltou algo que parecia um suspiro aliviado, desmoronando de volta à cabeceira da cama – É só você – murmurou, seu tom áspero de tanto esforço.
- Droga Gina, quem você pensou fosse? – demandou Draco – Estava tendo um pesadelo ou algo assim?
Ela encarou-o, seus olhos escuros frios. Então riu horrivelmente.
- Essa coisa toda é um pesadelo – disse ela, correndo uma mão para sua testa – Não preciso estar dormindo para vivê-lo.
- Está bem – disse ele vagarosamente. Queria mudar de assunto, para o porquê dele ter vindo. Honestamente não queria sentar e ficar ouvindo coisas sobre como tudo era terrível nesse mundo – Eu suponho que você tenha visto o médico, certo?
- Você viu? – ela atirou de volta, parecendo interessada na reação dele.
- Sim. Você sabe o nome dele?
Ela revirou os olhos para ele, embora não de uma maneira brava, e sim como se estivesse tentando descobrir algo. Então ela inclinou-se para frente e disse calmamente:
- Eu posso te dizer o nome completo dele, sua data de nascimento, suas notas médias durante seus anos por Hogwarts, e seu favorito e menos favorito professor durante a época.
Draco encontrou o olhar dela por um longo tempo antes de falar novamente, tentando organizar seus pensamentos.
- Você tem certeza de que esse Riddle é o mesmo Lord Voldemort Riddle? – perguntou ele distraidamente, apoiando-se em seus joelhos para que pudesse estar mais perto do nível dela, descansando sues cotovelos no colchão – O Lord das Trevas está morto. Como poderia ter enviado sua verdadeira pessoa, de muitos anos distante, dentro do passado junto com nós dois...?
- Ele é Voldemort, Draco – interrompeu ela lentamente – Ele pode fazer muitas coisas que muitos não podem, mesmo estando morto.
Um pouco irritado por ter sido interrompido, ele continuou friamente.
- Nem todos daqui são como eles são na nossa época. Potter, por exemplo. E, ao não ser que Dumbledore esteja guardando segredos sobre ser um médico, o que não combina muito com ele, então eu diria que Riddle é diferente também...
- Espere. Dumbledore? – Gina parecia surpresa. Draco notou que os olhos dela estavam focando um pouco melhor e que tinham um leve brilho de volta. Era por que estava melhorando?
Ele concordou, com distração.
- As chances são de que Riddle não seja igual ao do futuro...
- Dumbledore está aqui? – cortou Gina, aumentando seu tom de voz para um murmúrio áspero.
- Elle o mencionou no café da manhã do primeiro dia – contou Draco brevemente, querendo voltar a explicar seu raciocínio.
- E ele é um médico? – continuou Gina antes que ele pudesse dizer outra coisa.
- E isso importa? – perguntou Draco, deixando a mostra sua irritação.
- Sim! – explodiu ela ferozmente. Sentou-se ereta e de repente parecia uma torre para a visão dele. Ele levantou-se, sentindo que devia ser o mais alto – Droga Draco, Dumbledore esteve aqui o tempo todo e você não me contou?
- Ele está em Gales – explicou Draco de maneira monótona, entediado. - Nunca o vi, mas Elle disse que ele está lá. Sem mencionar que eu esqueci dele...
Mas Gina não estava mais ouvindo.
- Ele esteve aqui – murmurava ela, e Draco descobriu que estava falando para si mesma – o tempo todo. É um médico e estou doente. E ao invés de alguém que eu confio me examinar – continuou ela, olhando para cima e encontrando os olhos dele, mostrando que estava de fato falando com ele – Eu fico com a pessoa por qual sou absolutamente apavorada. Tudo porque você esqueceu dele?
Draco não esperava que Gina fosse ficar tão brava. Principalmente quando no dia anterior, ela parecia doente o bastante para desmaiar se falasse alto demais.
- Ouça, Weasley – começou ele, encarando-a.
- Não, ouça você – devolveu ela grosseiramente. Era impressionante quão intimidante ela parecia sentada entre os travesseiros brancos e montes de cobertores de veludo – Eu posso suportar algumas coisas que você faz. Eu posso suportar como você põe eu e minha família para baixo. Eu posso suportar como você me odeia. Eu posso suportar como você me trata. Eu posso suportar até a pessoa ordinária que você é. Mas isso... isso eu não posso suportar.
Draco fitou-a, incapaz de acreditar no que havia acabado de dizer.
- O quê? – gritou ele – Do quê você está falando?
- Você sabia que Dumbledore era um médico e que ele estava aqui! – replicou – Não me importa que você esqueceu dele; no instante em que você soube que eu estava doente, você devia tê-lo chamado!
- Eu não... – começou ele, tentando se defender.
- Você não sabe como é – continuou ela, obviamente continuando o que ele tinha começado – Você não sabe como é ter ele aqui dentro, em carne e osso, real e em pessoa. Eu posso senti-lo, eu posso cheirá-lo, eu posso ouvi-lo... e foi dez vezes pior do que aconteceu no meu primeiro ano. Eu sei que uma vez você ouviu como seu pai inocentemente deixou cair o diário de Tom dentro de um dos meus livros velhos e eu o usei, você riu por dias, mas foi difícil para mim. Você não sabe como é a sensação de saber que há algo terrivelmente errado com você, que você está fazendo coisas horríveis para alunos e não sabe como. E imagine o choque que eu levei...
- Gina, eu não me importo! – explodiu Draco, jogando seus braços para cima – Eu simplesmente não me importo! Então você não precisa me contar sobre isso!
- É claro que você não se importa! – gritou ela de volta, começando a ficar vermelha no rosto. “Se ela não se acalmar, pode realmente se machucar” pensou Draco, e descobriu que estava satisfeito com isso. Então talvez ela calasse a boca e o deixasse sozinho. Mas ela não calou a boca – Você não se importa com nada! E sabe por quê? Porque a sua família é uma merda, você nunca teve amigos, e ninguém se importa com você!
Ele cerrou os punhos, nunca desejando tanto bater em alguém tão forte. Apesar de se esforçar para não bater – ele se arrependeria depois, e não podia bater numa garota, principalmente se ela estivesse doente. Não podia bater em algo que não podia se defender.
E Gina ainda não tinha acabado.
- Você se pergunta por que ninguém se importa com você, não é, Malfoy? – insultou ela – É porque você é uma péssima pessoa! Dói, não é, Malfoy, saber a verdade? Tenho certeza que você passa noites em claro perguntando-se como seria se a sua vida fosse diferente, perguntando-se o que você podia fazer para mudá-la! Mas quer saber? Até mesmo em um mundo totalmente diferente você é um idiota, e ninguém gosta de você...!
Ele sabia que ela estava só gritando essas coisas para machucá-lo. Mas não estava o ferindo – estava apenas o irritando. Ela nunca calaria a boca? Sua voz estava dando à ele dor de cabeça. Fechou os olhos e tentou ter paciência.
- O pior de tudo, de qualquer forma, Malfoy, é que...
- Ah, dá pra calar a boca? – ele não podia agüentar mais.
- Não! Eu não terminei ainda! – gritou ela – Você é só um humano, Malfoy... ou talvez não seja...
Ela estava o levando à loucura. E se não fizesse algo, iria batê-la. Então, sem um palavra, ele sentou ao lado dela na cama e colocou as duas mãos nas suas orelhas.
- O que você está fazendo...? – ela começou a perguntar, mas foi cortada quando ele puxou o rosto dela em direção ao seu, e posicionou sua boca na dela.
Ele só tinha feito isso para que ela ficasse quieta, apenas para que ele não tivesse que ouvir a sua voz mais. Foi a primeira coisa que passou pela sua mente, e era estúpido. Porque assim que ele tocou-a, foi como uma erupção entre eles.
Todas as irritações anteriores desapareceram da mente de Draco no momento. Havia um pequeno aviso no fundo da sua consciência, como uma luz vermelha bem fraca, lembrando-o de que ele não devia estar fazendo isso, e não só porque ela estava doente. Era também porque, apesar dele não ter notado antes, ele vinha querendo beijá-la há um longo tempo. E não devia estar a beijando, era errado e não devia ser...
O lábios dela eram surpreendentemente suaves. No minuto em que o beijo começou, ela correspondeu imediatamente, como se já estivesse esperando. Ela envolveu seus braços em volta do pescoço dele e tentou puxá-lo mais para perto. O jeito que ela unia-se a ele, o jeito que seus lábios funcionavam... era como se ela precisasse dele, como se ele fosse a única coisa que a mantinha sana, o que parecia muito irônico, já que ele pensava que ele próprio era a única coisa que a deixava insana.
“Eu não devia estar fazendo isso” pensou ele. Podia sentir a nuca dela, podia sentir o suor da sua pele, umedecendo seus cabelos. Podia até sentir o salgado da sua boca. “Ela está doente, eu posso pegar... sem mencionar que essa é Gina Weasley que estou beijando…”
Ele continuou a ignorar a voz da sua razão, simplesmente porque não queria parar. Parecia surpreendentemente maravilhoso beijá-la, sentir sua pele sob seus dedos. Pelo jeito que ela estava correndo suas mãos pelos cabelos dele e o beijando de volta com força, ele sabia que ela devia estar gostando tanto quanto ele.
Ele finalmente recuperou o bom senso, soltando suas mãos e rompendo o beijo. Gina pareceu manter suas mãos ao redor do pescoço dele por um tempo maior que o necessário, até se dar conta de que ele queria parar, e as removeu. Ele fitou o rosto dela, quase sorrindo ironicamente pela cor vermelha que ela estava tomando.
Houve um silêncio longo e constrangedor. Draco não sabia se devia sair ou não. Metade dele queria beijá-la novamente. “E essa meia parte está errada” pensou. “Eu não a beijarei de novo”.
Mas ainda assim queria.
- Draco – disse ela finalmente, olhando para baixo para o cobertor e pegando uma corda imaginária – Eu sinto muito pelas coisas que disse sobre você.
- Eu não me importo – contou ele sinceramente.
Ele viu ela o encarando pelo canto de seus olhos, e virou-se para olhá-la nos olhos. “Oh, que ótimo, agora ela vai começar a gritar de novo” desconfiou ele, levantando e preparando-se para ir embora.
- Para onde você vai? – perguntou ela ao invés de começar de novo a discussão de como ele não se importava com nada.
- Para a cama – respondeu brevemente. Então parou de repente, lembrando de algo. Ele deu a volta e inclinou-se para baixo em direção à Gina, colocando uma mão na cabeceira para manter o equilíbrio – Posso te perguntar uma coisa?
Ela parecia um pouco surpresa de quão perto o rosto dele estava.
- Acabou de perguntar.
Ele deu a ela um olhar impaciente, e continuou com a pergunta:
- Meus lábios estão frios?
Ela piscou, então olhou dentro dos olhos dele, como se tentando ler a sua mente. Por um longo tempo ela não respondeu, até que abriu sua boca lentamente e murmurou:
- Não, eles estão realmente quentes, na verdade.
Draco sacudiu-se imediatamente, surpreso com a resposta dela. Um sentimento desconhecido passou por ele, e quebrou o olhar com ela, virando-se. Forçou-se a andar para a porta e sair calmamente, como se nada estivesse errado, fechando-a casualmente atrás de si.
Ele correu uma mão através dos seus cabelos e pensou de forma não estável “Preciso de algo gelado para beber.”

* * *

Gina estava se sentindo melhor.
Ela tinha se sentido melhor na hora em que Draco a acordara. Claro, ainda estava com febre, e sua garganta ainda estava arranhada e ferida, mas podia definitivamente dizer que estava mudando. Não parecia estar suando tanto – pelo menos, não estava mais desde que Draco saíra.
Ela sentou na cama por um longo tempo depois dele ter deixado o quarto, sua mente repassando sem parar o que havia acontecido entre eles. Ele havia a beijado. Ele tinha a beijado por livre e espontânea vontade. Como se quisesse.
Ele quis? Ou tinha só a beijado para que ela parasse de falar? Mesmo que tivesse sido essa a intenção, não precisaria ter continuado por tanto tempo, ou ter correspondido tão ferozmente.
Ela lamentou e mergulhou seu rosto quente em suas mãos. As coisas continuavam só piorando. Uma hora estava se preocupando com Harry, outra com Tom Riddle, e depois com o porquê de Draco tê-la beijado.
“Eu daria tudo para acordar de volta em Hogwarts e ter apenas os trabalhos escolares para me perturbar” pensou, agarrando um travesseiro e envolvendo seus braços em volta dele, descansando seu queijo. “Por quê isso está acontecendo comigo? Quando vai acabar?”
Naquele ponto, nem se importava mais que Harry estava bem aqui. Queria as coisas de volta como eram. Não eram tão ruins assim para o futuro de Harry, afinal, não é? Ele tinha amigos, dinheiro... não era completamente miserável, como ela era nesse mundo. Ele tinha sobrevivido, enquanto se ela continuasse aqui, certamente enlouqueceria e se mataria.
Draco não sabia, mas só tinha piorado as coisas quando a beijara. Tinha sido maravilhoso quando aconteceu, ela não podia negar. Ele tinha sido surpreendentemente gentil, apesar dela estar consciente de um sentimento de paixão profunda nele. Enquanto tinha sido incrível na hora, esse sentimento a assustava agora, quando lembrava. Draco, apaixonado por ela? Quando nem há dez minutos eles estiveram brigando e xingando um com o outro?
Agora ela estava realmente confusa. O beijo provavelmente não tinha significado nada. Tinha interpretado mal. Ele havia feito isso para que ela parasse de gritar, e tinha funcionado direitinho.
Mas tinha tornado a vida de princesa de Gina, já miserável, muito mais difícil.

* * *

Na manhã seguinte, Maria entrou, fungando e enxugando suas bochechas. Ela atendeu Gina por quase cinco minutos, esfriando sua testa com um pano molhado, até que a princesa não agüentava mais.
- O que houve? – perguntou ela, e então tossiu brevemente.
- Algo terrível. Outra família foi assassinada.
Gina sentou-se ereta. Tirou a mão de Maria da sua testa, não querendo mais ser perturbada com o pano molhado. Além do mais, estava se sentido de alguma forma mais fria desde a noite anterior.
- Quantas pessoas?
- Oito – respondeu a empregada, engolindo em seco – O mais novo era apenas uma criança.
“Foi Tom!” pensou Gina instantaneamente. “É Tom quem está fazendo isso! Eu sei que foi ele! Somente ele faria algo tão terrível, tão asqueroso...”
- Alguém tem alguma pista de quem está matando essas pessoas? – demandou Gina com voz aguda.
- Não – disse Maria, alcançando um dos bolsos do seu avental e tirando um lenço. Ela assoou seu nariz alto – Ninguém tem idéia. Seus pais estiveram fora a noite toda, tentando chegar aos motivos da tragédia. Talvez não estejam de volta nas próprias horas.
“Oh, coitadinhos” pensou a ruiva, bem mais preocupada com a pobre família assassinada. Não tinha idéia de que tipo de tecnologia eles possuíam nessa época, e não sabia se tinham maneiras de descobrir os criminosos além das testemunhas do crime. Era frustrante, também, porque sabia que ninguém acreditaria que o grande e maravilhoso Doutor Thomas Riddle era aquele que estava matando pessoas inocentes.
“Talvez Maria acredite” percebeu ela, observando sua empregada movimentar-se pelo quarto, limpando poeira imaginária dos móveis, fungando ocasionalmente. “Ela confia em mim, não é? Só porque acha que sou mimada, não significa que não vá acreditar em mim.”
Em seu coração, duvidava seriamente que Maria fosse até começar a considerar a possibilidade de “Thomas” ser um assassino. Ela tinha ficado furiosa quando Gina havia o insultado – como ela reagiria quando o acusasse de assassino?
- Você... – começou Gina cuidadosamente. Maria parou de se mexer e virou para encará-la.
- Eu o quê, querida? – perguntou ela com esplendor forçado, dando um pequeno sorriso, suas bochechas brilhando de lágrimas. Isso encorajou Gina a continuar.
- Você acha possível que... bem, que Doutor Thomas esteja matando essas pessoas?
Maria engasgou tão fortemente que Gina ficou impressionada com a quantidade de ar que ela inalou em seus pulmões. Colocando uma mão sob seu coração, ela disse rapidamente:
- Alteza Virgínia! Não acredito em você! O Doutor Thomas dá a vida, ele não a tira!
“Eu devia ter ficado de boca fechada” percebeu Gina.
- Eu sei, você está certa – admitiu apressada.
Maria relaxou levemente, mas encarou a princesa com severidade:
- Eu sei que você não gosta muito de Thomas. Deus sabe que você não gosta muito de nenhum homem bom – “Se ela está se referindo à Draco também, me dê um tiro agora” pensou Gina secamente – Mas ele não cometeria um assassinato. Ele não possui razão alguma para isso: é bem sucedido, bem-amado, atraente, rico... não faria algo tão terrível.
- Tudo bem, esqueça o que eu disse – repreendeu a mais nova.
Maria pareceu não tê-la ouvido.
- O Doutor Thomas é o homem mais gentil que eu já conheci na minha vida. Certamente ele não é do tipo que assassinaria alguém sem motivo.
- São sempre os mais quietos – murmurou Gina.
- O que? – a empregada ergueu a cabeça para um lado, como se pudesse ajudá-la a ouvir melhor.
- Nada! – gritou – Eu só quero dormir!
- É claro que quer – disse Maria, em um tom gentil – Desculpe por gritar, Alteza. Mas Thomas deverá estar retornando em pouco tempo para...
Como se em um sinal, houve uma batida na porta. Maria disse para a pessoa entrar, e Riddle deu um passo a frente, segurando um cálice de prata. Ele acenou educadamente com um sorriso na direção de Maria, e então fixou seus olhos azuis escuros em Gina.
No minuto em que trocaram olhares, ela piscou. Seu corpo inteiro parecia mole. Piscando novamente, viu uma figura impressa atrás de suas pálpebras.
“O que é isso?” pensou ela, sua audição ecoando alta em seu peito de repente. “O que está acontecendo?”
Seus olhos fecharam firmemente; uma cena estava começando a se revelar em sua frente. Ela estava repentinamente parada em um quarto vazio, embora soubesse que na verdade não estava – podia sentir-se sentada imóvel em sua cama. E ainda podia ver Tom, a alguns passos de distância, não mais parado na entrada de seu quarto, mas sim no meio do quarto vazio. A expressão de seu rosto era amedrontante – era uma expressão louca, quase satisfeita. Ele estava sorrindo para um pequeno garoto no chão, que estava estendendo as mãos para seu rosto, tentando proteger-se.
Era como se ela estivesse lá, como se estivesse parada bem no meio da cena. Mas como poderia ser possível, quando sentia seu corpo ainda sentado na cama?
As cores eram tudo no quarto, o Tom e o garoto também, e as coisas pareciam mais inclinadas e maiores que o normal. A visão era levemente borrada nas margens, provando que devia ser algum tipo de sonho que não era real.
Mas o medo era real. E os sons. E o cheiro...
- Por favor – o jovem garoto estava agora sussurrando para Tom, hesitando levemente assim que o homem deu um passo a frente, mais perto dele – Por favor, senhor, não me machuque.
A mão de Gina voou para sua boca, então ela olhou para baixo e notou um longo facão na mão de Tom. A prata da lâmina estava manchada de sangue vermelho, ainda molhado, ainda fresco...
Seu coração parecia contrair-se em seu peito, mas ela era incapaz de produzir qualquer som. Queria mais do que tudo evitar o que viria a seguir, mas nem estava realmente lá. Como poderia impedir?
De repente, a visão pareceu mudar-se; agora Gina tinha uma boa vista do quarto inteiro. E também podia produzir sons; não pôde evitar o clamor estrangulador que veio da sua garganta. Mesmo que Tom tivesse ouvido, ele não fez nada que o desse a entender. “Se eu não estou aqui, então não há como ele possa me ouvir” pensou ela. Ou melhor, rezou.
O quarto era evidentemente pequeno, simples, com sujeira no chão. Era como se tivesse sido agradável e aconchegante um dia, mas não mais. Havia sangue por toda a parte... na mesa, nos objetos pendurados na parede, no chão, misturando-se com a poeira...
Havia também corpos moles por tudo. Assustadoramente, a maioria era de crianças, apenas dois deles adultos, com suas gargantas cortadas. Vários lugares de seus corpos vazavam sangue também. O que era mais terrível era que todos tinham seus olhos abertos, fitando o teto ou as paredes sem expressão. Fitando, mas incapazes de ver realmente.
O som de um choro de bebê encheu os ouvidos de Gina. Ela moveu seus olhos sob suas pálpebras e viu um berço de madeira no canto. Obviamente, havia um bebê ali, berrando, suas mãos balançando-se no ar, como se desse pontapés. Parecia ser a única coisa viva que sobrara, exceto pelo garoto e Tom. Mas então...
- Tom, depressa – veio uma voz imunda. Na porta de outro quarto, uma cabeça não identificada espreitou – Essa criança não permanecerá parada.
“Criança? Que criança?” perguntou-se Gina, absolutamente apavorada. Não sabia o que estava acontecendo. Queria que acabasse. Seu estômago estava rugindo, e ela sentiu-se como se fosse vomitar. E o sangue... ela podia cheirá-lo, quase prová-lo... como podia não estar presente e ainda experimentar tudo como se realmente estivesse lá?
- Traga-a aqui – disse Tom lentamente, nunca desviando seu olhar do pequeno garoto assustado no chão – Para que ela possa ver o que vou fazer com seu irmão.
A cabeça da pessoa desapareceu por um minuto para dentro da escuridão do outro quarto. Então, gemendo, a figura retornou, mas dessa vez com outra pequena pessoa. Ele segurava uma menina jovem, provavelmente só um pouco mais velha que o garoto no chão, com cachos dourados e uma cara vermelha de choro. Ela lutou com seu seqüestrador, tentando libertar-se, mas o baixo e robusto homem, que vestia vestes negras, segurou forte suas mãos e manteve-as assim.
- Pare de se mexer, estúpida – o homem vaiou para ela, cutucando-a pelas costas.
- Eu não tentaria escapar se fosse você – disse Tom, finalmente erguendo os olhos para eles – Observe o que estou fazendo com seu pequeno irmão aqui... estarei fazendo com você em um minuto.
Então ele virou-se sem avisar e abaixou-se, pegando um punhado do cabelo do menino. Ele puxou o garoto chorão e gritante, que não podia ter mais de cinco anos, para o alto e segurou-o acima. O pobre garoto chutou e esforçou-se em vão para libertar-se.
Gina assistiu em horror, o terror congelando todo seu corpo, quando Tom esticou seu braço para trás, a mão segurando o facão com firmeza. Em um rápido movimento, ao som do grito alto da menina, ele avançou seu braço para frente e cravou a arma bem fundo no pescoço do garoto.
Devia ser a pior coisa que Gina já presenciara. Seu coração pareceu berrar alto junto com a garota, e ela queria mais do que nunca sair correndo do quarto. Já havia visto o bastante, não precisava mais... seu estômago não agüentava mais. Mas seus olhos não obedeciam seus comandos – estavam fixos na cena à frente.
O menino contraiu-se assim que o facão penetrou sua garganta. Seus olhos abriram-se úmidos, encarando o teto, e ele relaxou, suas mãos caindo quase vagarosamente para os lados. Então ele parou frouxamente, morto.
Se Gina pudesse gritar como um demônio incontrolável, ela teria. De qualquer forma, a garota estava berrando alto o suficiente para as duas, quando lutou-se, puxou-se e tentou se livrar do homem que a segurava.
E ainda, Tom não havia terminado. O garoto já estava morto, mas ele passou a lâmina em todo seu pescoço, encravando tão fundo que quase o decapitou. Isso produziu um horrível som de rasgo quando a faca terminou de cortar, como o som de alguém limpando o interior de um peixe.
Com isso, Gina abriu a boca e soltou um longo e alto lamento. Não se importava com quanto barulho estava fazendo, mesmo que ainda estivesse de volta ao seu quarto, fazendo Maria perguntar-se o que havia com ela. Era simplesmente tão terrível...
Então houve mais sangue. Sangue jorrando do pescoço aberto do garoto, derramando no chão, esguichando nas roupas de Tom e respingando no seu rosto. Ele pareceu nem perceber – estava ainda sorrindo de satisfação.
Riddle libertou o cabelo do garoto, soltando-o no chão em um baque de sangue e carne. Então virou-se, o facão mais uma vez ao seu lado, e encarou a menina. Ela estivera gritando e chorando até então, quando simplesmente rendeu-se e olhou-o. Lágrimas emanaram pelo seu rosto sem um lamento, e Gina podia dizer que ela estava tão assustada que não conseguia produzir sons.
- Você é a próxima, minha querida – disse Tom em um tom de horrível satisfação.
“Não!” Gina queria gritar. “Chega! Eu não agüento mais! Me tire daqui!”
Ela forçou seus olhos a abrirem-se e moveu-se para o lado. Piscando várias vezes, percebeu com imenso alívio que estava de volta ao seu quarto, sentada na cama, sem sangue por toda a parte. Suor estava pingando de seu rosto, e seu coração estava batendo tão forte que quase ficou com medo que ele fosse explodir em seu peito.
Maria estava ao seu lado, uma mão em seu braço.
- Alteza? Alteza, você está bem? Você estava gritando!
Gina deu uma olhada para ela, e seu estômago estarreceu. Inclinou-se para o outro lado da cama e abaixou sua cabeça, incapaz de vomitar algo sólido. Apesar de estar de volta, em segurança em seu quarto, não conseguia tirar as imagens da sua mente... não conseguia tirar os berros da menina de seus ouvidos, não conseguia tirar a imagem do pescoço do garoto sendo rasgado pelo facão, não conseguia parar de pensar sobre isso...
- Deixe-me examiná-la – a voz calma de Tom disse, soando distante. Gina de repente se lembrou que ele estava ali, e sentou-se ereta, o alívio anterior de estar de volta ao seu quarto desaparecendo. Imediatamente ficou tensa.
- Não – sussurrou ela – Não, estou bem.
- Você não está bem! – gritou Maria veementemente – Você fechou os olhos e ficou rígida, e começou a berrar como se alguém estivesse esfaqueando-a de membro a membro!
- Honestamente, estou bem – insistiu Gina com rouquidão, encarando Tom cautelosamente. Ele tinha parado de caminhar em direção à elas e estava agora parado no meio do quarto, parecendo incerto se devia continuar ou permanecer onde estava. “Fique” sua mente implorou. “Não dê um só passo para perto de mim.”
- Doutor, ela está bem? – perguntou Maria, girando seu tronco para olhá-lo.
- Se ela diz que está... – respondeu Tom, franzindo o cenho. Gina encarou-o duramente. Sabia quem ele realmente era. Havia testemunhado como ele era frio, como tinha assassinado aquele pequeno garoto infeliz, e havia feito provavelmente a mesma coisa com toda a família. Como podia parecer tão diferente agora? Como conseguia agir tão casualmente? Por que estava até fingindo estar preocupado com ela? – Mas você pareceu realmente mal, Gina – ele completou depois de um momento.
- Estou dizendo, estou muito bem – Gina disse através de dentes cerrados. Não percebeu que havia agarrado a mão de Maria até ela dar um grunhido de dor, indicando que Gina estava segurando seus dedos forte demais. Ela aliviou um pouco, mas não soltou-a – Eu só preciso dormir um pouco – continuou.
A boca de Tom fixou-se em um sorriso gentil.
- Só tome isso antes – ele disse, estendendo o cálice quando atravessou o quarto. Agora estava parado bem ao lado dela, e ela forçou-se para não tremer. Revirou os olhos para a taça, então para ele, sabendo muito bem que ele queria que ela o pegasse. “Deve ser mais daquela poção rosa que ele me deu ontem” percebeu quando o aroma chegou às suas narinas. “Obviamente não era veneno, ou eu estaria morta...” Mas ainda assim sabia que havia uma forte possibilidade de ser veneno, que demoraria alguns dias para fixar-se em seu organismo.
“Provavelmente ele quer me matar vagarosamente e dolorosamente” pensou ela, sua imaginação rolando solta. “Então ele vai me envenenar pouco a pouco, deixando-me morrer em agonia...”
- Se eu tomar – disse Gina finalmente – então você nunca mais colocará um pé fora desse castelo sem a minha permissão?
Maria deu uma risada estremecida e nervosa, obviamente constrangida pelo pedido de Gina. Ela tentou dar um tapinha no joelho da princesa, mas errou e acertou sua perna, que estava escondida atrás dos cobertores.
- Tudo bem, Alteza, apenas beba. Então você pode dormir.
Gina só não queria mais assassinatos enquanto dormia. E estava mortalmente horrorizada que se houvesse mais mortes, teria que testemunhá-los novamente, através da mesma visão estranha. Por hora realmente não se importava que havia exigido que Tom Riddle ficasse dentro das mesmas paredes e mesma casa que ela, só a alguns passos de distância. Apenas não queria que ele saísse e matasse outra família.
- Prometa – disse ela ferventemente – que você não sairá, pelo menos não até eu acordar. Prometa...
- Alteza, você está sendo ridícula – interrompeu Maria, dando a ela um olhar severo com seus olhos negros – Apenas beba e durma.
Gina viu que não tinha como discutir. Ambos Tom e Maria estava encarando-a, esperando que bebesse. Ela sentiu seus ombros aliviarem e suspirou em derrota. Não era seu problema mesmo – iria se preocupar com os assassinatos só quando estivesse bem.
A princesa pegou o cálice um pouco mais violentamente que o necessário e bebeu seu conteúdo.

Nota da autora: Essa fic está se tornando um pouco mais pesada que eu esperava, mas... ela vai ficar mais alegre assim que Draco e Gina começarem a, hum, se apaixonar... mas claro, sem deixar de lado a trama e o mistério... A propósito, fique de olho nos personagens, o pequeno cúmplice de crime de Tom é alguém que já conhecemos. Talvez você não descubra quem é até os capítulos finais, mas é só para deixá-lo adivinhando. ::sorriso malvado::
Nota da Tradutora: É provável que os próximos capítulos saiam um pouco mais rápido agora, que estou de férias, e pretendo postar uns 2 capítulos antes de viajar. Me aguardem!
No próximo capítulo: Gina fica completamente curada, e um baile é feito em sua homenagem. Mas como ela e Draco se sairão nas danças da época? E como a princesa reagirá à presença do convidado de honra, Thomas Riddle? Draco terá finalmente a chance de visitar Dumbledore? Descubra isso e mais no capítulo 7: O Baile!

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