O Beco Diagonal
Capítulo 3
O Beco Diagonal
Rachel saiu de uma velha lareira no meio de uma livraria cheia de feiticeiros com livros e mais livros nas mãos, crianças de todos os tamanhos e idades, vestidos com seus trajes tipicamente bruxos. Todos pareciam fazer fila para pegar um exemplar de um volume que estava em lançamento. Uma moça loira, muito atraente e de sorriso encantador estava sentada numa mesa rodeada de fãs, na sua maioria homens, distribuindo autógrafos. Ela estava lançando um novo livro sobre "História do Oriente", algo que Robin nunca houvera escutado a respeito. Rachel achou que a loja estivesse cheia demais, então levou os filhos para fora.
- Sem dinheiro não compramos nada, certo? Vamos dar uma passada no Gringotes e encher a algibeira.
E lá se foram eles até o mais famoso e seguro banco de duendes do mundo mágico: Gringotes. Este era o prédio mais alto e vistoso do beco, todo branco. Um duende baixinho, vestindo um uniforme vermelho, guardava as portas de bronze polido que davam acesso ao banco. Ele, que tinha barba branca pontuda, pêlos saindo das orelhas, mãos e pés grandes e longos, ar muito severo e astuto, e um olhar profundo e intimidante, que parecia ler tudo aquilo que se passava na sua mente. Ele cumprimentou a todos quando entraram. O segundo par de portas, que agora eram de prata, já impunham respeito àqueles que adentravam o lugar, pois possuíam a seguinte inscrição:
Entrem estranhos, mas prestem atenção
Ao que espera o pecado da ambição,
Porque os que tiram o que não ganharam
Terão é que pagar muito caro,
Assim, se procuram sob o nosso chão
Um tesouro que nunca enterraram
Ladrão, foste avisado, cuidado,
Pois vais encontrar mais do que procurou
O saguão principal era enorme e fazia as dezenas de duendes que lá trabalhavam parecer insignificantemente pequenos. Os balcões eram de mármore branco, e o chão era de granito claro formando desenhos geométricos, Rachel foi para um guichê à esquerda, onde um duende com cara de poucos amigos a examinou de cima a baixo. Sem se deixar intimidar, ela lhe disse:
- Estamos aqui para fazer a retirada de um pequeno montante nos cofres de Sra.Rachel Locksheart Stanford e Senhorita Robin Viollet Locksheart.
- Stanford... -Robin disse para si, e o duende fechou a cara diante da intromissão.
- A senhora tem as chaves? -perguntou o duende por cima da bancada de mármore com olhar desconfiado.
- Aqui estão.
Rachel tirou do casaco duas chaves: uma de latão e prata, muito simples; e outra, um pouco mais rebuscada em ouro maciço. O duende pegou as chaves, abaixou-se um pouco para pegar algo embaixo do balcão, então se levantou e estendeu uma algibeira de couro e cordão trabalhado para a garota.
Um outro duende, mais velho e com ainda mais pêlos nas orelhas, pediu para que eles o acompanhassem. Juntos, atravessaram o salão, depois de um longo corredor, e chegaram a uma porta de madeira maciça entreaberta: atrás havia um salão enorme todo de pedra iluminado apenas por archotes. Assim que eles entraram porta adentro, podiam ver de relance que a sala era cheia de túneis que se cruzavam e não pareciam ter fim. Um carrinho esperava sobre os trilhos do que mais parecia ser uma infinita montanha russa O duende olhou para todos e disse, com voz fria e esganiçada.
- Como vocês podem ver, só há espaço para quatro pessoas no vagonete, portanto aqueles que tem estômago fraco, ou são muito pequenos, devem esperar aqui. -e o duende apontou para um canto da sala onde surgiram duas poltronas verdes com adornos dourados. -Decidam entre si quem vem e quem fica.
- Adam, você fica para cuidar de Ronan! Ele é muito pequeno... -disse Rachel resoluta.
O garoto indignado franziu a testa, enquanto Ronan suspirava aliviado. Aqueles túneis eram apavorantes e só de pensar em subir naquilo, ele tremia dos pés à cabeça.
- Eu sou o mais velho daqui! Eu devo ir junto... Por que não escolhe o Eric para ficar com o pirralho?
- É por ser mais velho que você fica. Assim poderá cuidar melhor do seu irmão!
- Gárgulas saltitantes! Tudo eu! Por que a Robin não fica?
- Porque um dos cofres pertence a ela!
Mesmo a contra gosto, Adam ficou para cuidar de Ronan, que começou a se acalmar. O lugar não era nada aconchegante, mas ficar lá era melhor que enfrentar os túneis escuros que levavam aos cofres de Gringotes. Todos já ouviram histórias a respeito dos monstros e feitiços que guardavam o lugar para que nenhum intruso pudesse subtrair de lá nada que não fosse seu. Eric subiu correndo no carrinho assim que o duende se ajeitou, e antes que sua mãe pudesse mudar de idéia, apertou bem o cinto para que nada pudesse arranca-lo de lá. As duas se sentaram atrás e também colocaram o cinto, única proteção disponível.
Quando todos se acomodaram no vagonete, o duende falou "Para o cofre da Sra. Rachel Locksheart Stanford." e logo ele começou a se movimentar. Em poucos segundos ganhou velocidade, e em dois minutos o carro começou a frear e parou em frente a uma série de cofres simples, uma porta ao lado da outra. Eles desceram: o duende pegou a chave de latão e enfiou na porta, que se abriu com um leve estalo, então Rachel pegou sua algibeira e entrou numa saleta de dois metros quadrados onde centenas de moedas pratas jaziam no chão, dando destaque às poucas moedas de ouro distribuídas pelo cofre. Robin exclamou "Quanto dinheiro..." e Rachel riu. A mãe encheu a algibeira com orgulho e sorriu dizendo "Vamos precisar de algumas moedas para as compras.", e logo o cofre foi trancado e todos se acomodaram no vagonete novamente. "Para o cofre de Srta. Robin Viollet Locksheart.", disse o duende.
O carrinho atingiu uma velocidade fenomenal: mal dava para distinguir as galerias, túneis e descidas vertiginosas, as luzes piscavam velozmente pois o carro se movia rápido demais. Robin segurou firme o braço da mãe e fechou os olhos, Eric no entanto, parecia se divertir muito. Aquilo estava demorando demais, e após cinco minutos mais ou menos, o carrinho parou num lugar que parecia estar muito abaixo da superfície da terra. A garota estava um pouco tonta e precisou da ajuda de Eric para descer do carrinho.
Eles andaram por um corredor alto e estreito, as paredes de pedra davam um ar de masmorra ao ambiente e parecia que a qualquer minuto algum bicho monstruoso ia saltar do precipício. O lugar era iluminado somente por archotes que se distanciavam alguns metros uns dos outros, pois marcavam a entrada de cada cofre. Logo eles estavam de frente a uma grande porta preta. Quando o duende girou a chave na fechadura ouviu-se cinco estalidos do lado de fora e ela se abriu. Ele só deixou a menina entrar no cofre e tentou encobrir a passagem para que ninguém espiasse lá dentro, mas isso era impossível devido ao tamanho do homenzinho. "Quanto dinheiro!" exclamou Eric com olhinhos radiantes de desejo e uma "pontinha de inveja".
O cofre, que era maior que o seu quarto, estava com o chão coberto com centenas de pilhas de galeões de ouro, e alguns montes de moedas prateadas e acobreadas espalhadas pela imensa caixa-forte. Algumas pedras preciosas, como rubis, esmeraldas, topázios e diamantes do tamanho de bolas de golfe coloriam a caixa-forte. A garota ficou estupefata com a quantia e encheu a algibeira o mais rápido possível: não acreditava que tinha um cofre em seu nome, ainda mais com tamanha fortuna a sua espera. O duende ia fechar a porta, mas Robin o deteve por um instante:
- Espere, não feche ainda! O senhor tem certeza que este cofre é meu?
- É claro que tenho! -disse o duende indignado. -A senhorita esteja certa de que, se não fosse, nós já saberíamos. Aliás, acho eu que correria o mais rápido possível para não ter certeza! -ele e Eric riram do comentário.
- De onde vem este dinheiro? -Robin parecia mais confusa ainda.
- Depósitos mensais são feitos pelos rendimentos da poção de cicatrização rápida, que Viollet Locksheart desenvolveu. Nós podemos apresentar um histórico dos depósitos, se assim desejar.
- Viollet? Quem é Viollet? -disse a menina franzindo o nariz e olhando para a mãe.
- Viollet e Ronan Locksheart são seus padrinhos, meu bem. Lembra-se?
- Ah! Do tio Ronan eu lembro... Seu irmão mais novo, não é?
- Todos são mais novos, meu bem! Ele era o caçula... e também o meu irmão predileto! Você é a única herdeira deles. Lembro-me que deixaram quase tudo o que tinham para você. Eu só não sabia que era tanto dinheiro assim... -disse ela deslumbrada.
- É... acho que me lembro... Então porque não levamos algum dinheiro para o cofre da família?
- Não precisa, minha pequena! A mamãe sempre teve o suficiente!
- Ah! Mãe, deixa!!! Não é você quem cuida de mim? Então...
- É mãe! Deixa! A senhora sempre disse que o dinheiro anda curto, que falta isso ou aquilo! -Eric apoiou a irmã.
- Viu como estou certa? -então se virou para o duende e, sem o consentimento da mãe, lhe disse. -Vou levar algum dinheiro para o cofre da mamãe!
- Quer fazer uma transferência? Qual a quantia?
- Que tal uns... mil galeões! Tenho certeza que meus padrinhos iam ficar felizes com isso!
- Mil galeões!!! -exclamou a mãe tão alto que sua voz ecoou pelo precipício e corredores de pedra. -Mil galeões! Mas é muito dinheiro, minha pequena! Você não sabe o que são mil galeões!!!
- Espero que seja o bastante... O papai vive dizendo que o dinheiro, que vem do leite e do queijo da fazenda, quase não dá para nada! E eu vou ficar um ano fora... Acho que mil galeões são suficientes!
- Mas você deveria guardar esse dinheiro meu bem! Ele é seu...
- Se for meu, posso fazer o que quiser com ele! -ela piscou para a mãe. -E o que mais quero agora é colocar mil moedinhas douradas no cofre da família! Está claro pra você? -disse ela para o duende.
- Sim, senhorita. -disse ele sorrindo.
- Está claro pra você também, mamãe? Não seja orgulhosa... -ela disse abraçando a mãe.
- Meio à contra-gosto, eu aceito... Fica parecendo que estou a te explorar, minha filha! Mas sei que esse gesto nobre é por uma boa causa, e até veio em boa hora. As contas da fazenda não estão em ordem desde o último inverno... Mas saiba que tentarei pagar cada nuque, sicle e galeão quando eu tiver condições!
Então, enquanto o duende saia pelo corredor, Robin pegou a algibeira da mãe e colocou mais alguns galeões. Quando ele voltou com um bolsão de couro, colocou mil moedas de ouro, que em alguns minutos foram transferidos para o cofre de Rachel. O dinheiro mal coube dentro do cofre, e assim que o duende fechou a porta, ela começou a deslizar pela parede e sumiu chão abaixo. A chave da mãe mudou de latão e prata para ouro e prata. Robin ficou atônita quando as portas se espremeram, alinhando-se novamente como se lá nunca houvesse existido outro cofre.
O duende riu da expressão que eles fizeram ao ver a porta sumir e, na viagem de volta, explicou que o cofre teve de ser transferido para o subsolo onde eles, além de serem maiores, também ficam bem mais protegidos.
Finalmente o vagonete chegou à superfície, onde os dois irmãos estavam sentados, esperando entediados por longos quarenta minutos. Robin teve ajuda da mãe para sair de lá, mas logo se recuperou da tonteira. Eric contou aos seus irmãos que Robin possuía uma fortuna formidável lá embaixo e logo eles foram pedir dinheiro para a irmã, que deu um galeão a cada um deles. Adam e Ronan saíram correndo, felizes com a generosidade da irmã, mas Eric não. Ele puxou a garota pelo braço e sussurrou em seu ouvido:
- Eu não quero parecer interesseiro, mas sei que você tem muito mais dinheiro dentro dessa sua algibeira... Será que não pode me dar mais algum?
- Não sei... -disse ela sorrindo marota, brincando com seu irmão.
- Deixe de ser munheca, Robin! Você nem vai gasta-lo direito... Eu tenho tanta coisa pra fazer com ele!
- Calma... só estava brincando... -disse ela já abrindo a sua algibeira.
- Dê-me pelo menos mais uns quatro galeões, que não hão de fazer falta alguma a você!
- Nossa, tenha modos, Eric... -disse ela espantada com a reação do irmão.
- Deixe de ser chata! Anda logo... Quer que eu conte a eles?
- Contar o quê? Não há nada para contar! -ela franziu o nariz, revoltada com a atitude do irmão.
- Ah, não? Eu vou contar para eles tudo o que vi lá embaixo, cada pedra preciosa, cada galeão!
- Quê!?! Você está me ameaçando? -exclamou Robin surpresa.- Pode contar! Que diferença faz? E outra: se você quer mais dinheiro, por que simplesmente não pede com educação?
- Quer que eu implore, sua metida a rica!? Agora que tem dinheiro, vai ficar negando justo ao seu melhor irmão, aquele que sempre a defende? Parece-me que o dinheiro subiu rápido demais à sua cabeça oca! -Eric estava um pouco nervoso e parecia pronto para arrancar-lhe a algibeira.
- Nossa! Tome logo essas moedas... -disse a menina estendendo a mão com sete galeões, ainda chocada com os modos do irmão.
O garoto pegou o dinheiro da mão da irmã e mais uma moeda dourada da algibeira ainda aberta, e logo o guardou no bolso. Olhou para a irmã todo sorridente e disse:
- Mais uma para completar o dinheiro e... sem querer ser chato, mas é você quem está me dando este dinheiro, portanto, não me venha cobrá-lo mais tarde, pois eu não vou devolver!
Robin ficou muito decepcionada com Eric, que saiu correndo saltitante, e ouviu ele dizer ao longe "Quero ver a cara deles quando virem isso...". Já era quase onze horas quando eles finalmente saíram de Gringotes, e Rachel levou seus filhos à "Floreios e borrões", onde provavelmente Jonathan os esperava.
A loja parecia mais cheia que antes e logo na entrada, "Jojo" esperava com seus amigos, já com alguns livros em seus braços. De começo, ele pareceu ignorar a presença da irmã que puxava sua manga, mas assim que ela tirou um galeão do bolso, o garoto sorriu e a cumprimentou com respeito. Pegou a moeda da mão da menina e disse :
- Pra mim? Nossa, obrigado! -radiante, ele beijou a testa da garota.
A menina também ficou decepcionada com o irmão mais velho e sussurrou um "Seu vendido!" meio atravessado quando saia. Robin, já muito aborrecida com tudo o que estava acontecendo entre ela e seu "ex-irmão-predileto", grudou na mãe e a ajudou a fazer as compras. A garota não podia acreditar em como ele poderia ter mudado tanto em apenas um ano. "Ele não fala mais direito comigo, só resmunga! Não me conta o que está acontecendo, ou o que lhe aborrece tanto... Eu não sei ler pensamentos! Daria tudo para saber por que ele está agindo assim!" refletia enquanto olhava distraída às prateleiras da loja. Rachel recomendou à menina que pegasse a lista anexa para conferir os materiais necessários para o seu ano letivo. Robin se lembrou de que havia colocado uma das cartas no bolso de trás do jeans, então pegou o pedaço de papel, um pouco amassado, para observá-lo com mais atenção:
ESCOLA DE MAGIA E BRUXARIA DE HOGWARTS
Uniforme
Os estudantes do primeiro ano precisam de:
o Três conjuntos de vestes comuns de trabalho (pretas)
o Um chapéu pontudo (preto) para uso diário
o Um par de luvas protetoras (couro de dragão ou similar)
o Uma capa de inverno (preta com fechos prateados)
As roupas dos alunos devem ser etiquetadas com seu nome.
Livros
Os alunos devem comprar um exemplar de cada um dos seguintes:
Livro Padrão de Feitiços (1a. série) de Miranda Goshawk
História da Magia (Versão Atualizada) de Batilda Bagshot
Teoria da Magia de Adalberto Waffling
Guia de Transfiguração para Iniciantes de Emerico Switch
Mil Ervas e Fungos de Fílida Spore
Bebidas e Poções Mágicas de Arsênio Jigger
Animais fantásticos e Onde Habitam de Newton Scamander
As Forças das Trevas: um Guia de Auto Proteção de Quintino Trimble.
Outros Equipamentos
1 varinha mágica
1 caldeirão (estanho, padrão tamanho 2)
1 conjunto de frascos
1 telescópio
1 balança de latão
Os alunos podem ainda trazer uma coruja OU um gato OU um sapo OU um rato. Caso o aluno queira trazer qualquer outro tipo de animal (não mágico, porte pequeno), uma carta pedindo a permissão deve ser enviada ao Conselho dos Professores pelo menos uma semana antes, com a descrição do animal e hábitos alimentares, para que este possa ser avaliado e aceito ou vetado.
LEMBRAMOS AOS PAIS QUE OS ALUNOS DO PRIMEIRO ANO NÃO PODEM USAR VASSOURAS PESSOAIS.
Robin não pegou nenhum livro, pois queria aproveitar os que Eric havia usado no seu primeiro ano. No entanto, gastou muito com penas e pergaminhos das melhores marcas, um tinteiro todo rebuscado e um mata-borrão em forma de coruja. A garota começou a se distrair com a variedade de coisas que havia naquela loja. Ela mesma pegou uma pena de repetição rápida; um livro chamado "Poções Caseiras de Cura: Guia Prático e Natural"; um volume do livro sendo lançado na livraria chamado "História do Oriente" de Andrômeda Keefe; um lembrol; e uma agenda de couro preto onde podiam ser gravadas as iniciais do seu nome em dourado.
Eles saíram da loja com as sacolas cheias e os estômagos vazios. Jonathan se despediu de todos e foi passear com os rapazes do time de Quadribol para gastar seu galeão. A mãe os guiou pelas estreitas vielas do beco Diagonal e logo subiram uma larga travessa, chamada Alameda Quarto Minguante, muito bonita e bem iluminada, com muitas lojas enfeitadas e um toque de sofisticação. Pararam em frente a uma confeitaria, que tinha cara de casa de campo holandesa, com flores nas janelas e uma placa em letras douradas que dizia: "Confeitaria Talloway: Doces e Gostosuras Trouxas."
O lugar fazia jus ao nome, pois por dentro parecia uma confeitaria trouxa: as paredes cor-de-abóbora eram enfeitadas com quadros de atores trouxas de sucesso, como Marlin Monroe, Charles Chaplin e James Dean; havia algumas mesas quadradas de madeira distribuídas uniformemente pelo salão, que era bem maior por dentro que aparentava ser por fora. Estas mesas eram cobertas por toalhas xadrez verde e branco, e havia um arranjo de flores em cima de cada uma. Num balcão, logo na entrada, estavam os doces expostos para aqueles que estivessem no recinto, e uma placa com as palavras "Doces Trouxas.", jazia ao lado de uma mulher de cabelos castanhos avermelhados que estava debruçada sobre o balcão, meio distraída com o intenso movimento que havia àquela hora no recinto.
Rachel parou na porta até que a moça do balcão percebeu sua presença. Ela soltou um gritinho de alegria e veio cumprimentar a mãe, que também parecia muito empolgada. As duas se abraçaram e, depois de muitos "Há quanto tempo!" e "Você por aqui!", a mulher veio cumprimentar os filhos, que pareciam surpresos.
- Eu sou tia Rebeca! Lembram-se de mim? ...Não? Mas tudo bem, vocês eram tão pequenos!
- Olá, tia Rebeca! -responderam em coro.
- Hum... cadê o Jonathan? -retrucou a mulher contando os sobrinhos.
- Está por ai com seus amigos... Ele é capitão do time de Quadribol agora! -disse a mãe sorrindo.
A irmã de Rachel passou seus grandes olhos azuis por sobre as crianças até fixar-se na única menina do grupo. Observou-a com cuidado, segurou o rosto dela com as mãos e disse olhando firmemente:
- Você é a Robin, não?
- S-sim...
- Você é a cara da sua mãe! -disse sorrindo, e completou em tom saudosista. -E os seus olhos... São os olhos de uma Locksheart! Aliás, todos vocês têm os olhos e o sorriso de um legítimo Locksheart!
Ela soltou a menina, deu-lhe um beijo na cabeça e recuou. Robin franziu o nariz: nunca ninguém havia lhe dito que ela parecia com sua mãe... tinha cabelos pretos e lisos e era branca demais. Mas sempre tivera certeza que seus olhos eram iguais aos de Rachel! Finalmente alguém a entendia.
- Entendo porque não se lembram de mim! Eu fui embora quando Ronan tinha três anos... Mas o Jonathan deve se lembrar! Sabe, eu passei sete anos morando entre Portugal, Espanha, França, Alemanha e outros lugares que possuem maravilhas gastronômicas! Foi assim que conheci Pierre Talloway... ele é um grande cheff francês. Quem sabe um dia vocês não vão lá em casa para conhecer seus priminhos?
Os quatro irmãos ficaram lá, parados, sorrindo como bobos e concordando com tudo enquanto sua tia lhes contava toda a sua vida. Parecia que não ia parar de falar, mas então Rachel interrompeu sua irmã e disse:
- Que tal se vocês se sentarem logo ali enquanto a mamãe fala com tia Rebeca? -e apontou uma mesa que acabara de ficar vazia, num canto do salão.
As crianças foram se sentar e logo foram servidos com uma travessa cheia de doces sortidos de várias nacionalidades e com quatro cervejas amanteigadas para acompanhar. Robin observou aquele lugar: estava cheio de bruxos que pareciam muito sofisticados, cheios de boas maneiras, vestindo trajes requintados. Por um instante ela se distraiu com a conversa de duas bruxas, numa mesa ao lado, que discutiam uma notícia num jornal chamado "Profeta Diário", um jornal de bruxo, e quando deu por si percebeu que seus irmãos já haviam devorado quase toda a travessa. Logo Rachel e Rebeca sentaram-se à mesa com eles, seguidas por mais uma travessa de doces e outra rodada de cerveja amanteigada.
Depois que todos haviam degustado todas aquelas gostosuras, por conta da casa, a mãe deixou que seus filhos fossem dar uma volta pelo beco e a encontrassem ali na confeitaria às cinco horas da tarde em ponto. Adam e Eric se entreolharam com aquele sorriso maroto e foram correndo para a loja de logros mais próxima. Ronan se precipitava para fora do recinto quando sua mãe o segurou pela mão. Ele até desmanchou o sorriso, pois sabia que estava fadado a passar aquela tarde com as duas entre compras e mais compras.
O primeiro lugar para onde foram depois da Confeitaria Talloway, foi uma loja para comprar outros artigos mais específicos que constavam na lista, como o caldeirão, o telescópio e outros. Robin também pareceu ter se empolgado com tanto dinheiro, pois comprou até coisas de que não precisava, e tudo da melhor qualidade. "Vá com calma, minha pequena... Não gaste tudo de uma vez só!" alertou a mãe em vão. Mas é que como ela nunca tivera nada disso, precisava aproveitar. Ficou pensando então em Eric, e em como ele havia agido com ela mais cedo. "Talvez ele não estivesse tão errado, talvez eu esteja sendo um pouco egoísta mesmo..." ela pensou ao pagar a conta e ver que gastara demais.
Depois, foram visitar a loja do Sr. Olivaras. Ela ficava bem no começo do beco, perto da livraria. O estabelecimento era estreito, um pouco feio e velho. Uma placa antiga, de madeira escura, que estava assentada sobre a porta, com letras douradas bem desgastadas, podia ser lida com os seguintes dizeres "Olivaras: Artesãos de Varinhas de Qualidade desde 382 a.C.". Robin entrou no recinto e ficou impressionada com a quantidade e variedade de caixinhas, estreitas e compridas, que havia naquelas muitas prateleiras que enchiam o lugar do teto ao chão.
A loja tinha pouca claridade, e um cheiro de mirra e eucalipto misturado com mofo davam ao ambiente um ar misterioso, quase assustador. Os três pararam no balcão e bateram na campainha. Logo um senhor de cabelos muito brancos, bem aparados apareceu por trás de uma prateleira nos fundos da loja. Ele era um pouco baixinho, talvez pela leve corcunda em seu dorso, e muito magro também. Tinha a pele bem branca e olhos azuis prateados que percorreram os presentes.
- Boa tarde. -disse ele calorosamente. -Quem deseja?
- Quem deseja o quê? -perguntou Robin na inocência.
- É esta mocinha aqui? -o homem olhou para a mãe, que concordou com um aceno de cabeça. -Sim... sabia que você viria! -ele murmurou -Você tem os olhos do seu pai! Imbuia, 27 cm, cordas de coração de dragão e pena de fênix... Muito resistente... boa para qualquer feitiço. Lembro-me de cada varinha que vendi!
Robin sorriu sem saber o que fazer. "Se meu pai é trouxa, como poderia então o homem se lembrar dele?" Ela olhou confusa para a mãe que, como se estivesse lendo seu pensamento, se apressou em corrigir o homem:
- O senhor deve estar enganado... o meu marido é... ele não pode usar magia, sabe?
Sr. Olivaras parou por um instante e olhou fixamente para Rachel, e depois se desculpou dizendo:
- Deve ser a idade... -ele sorriu cordialmente. -São tantos jovens que passam por aqui, não é mesmo? Talvez tenha me enganado! Mas de você eu me lembro... Pêlo de unicórnio, 19 cm feita de Bordo, bem elástica!
- Sim! O senhor é muito bom nisso...
Ele esboçou um sorriso meio amarelo e continuou para a menina:
- Mas então, que tal se nós começar logo com a diversão? -o velho tinha um sorriso no canto da boca que deixou Robin nada segura.
O homem observou a menina por alguns instantes, depois começou a medi-la com uma fita métrica que tirou do bolso. Primeiro mediu da ponta do dedo indicador até o ombro, depois do ombro ao chão, de ombro a ombro, de uma ponta do dedo a outra, da axila até o joelho, e logo a fita a media sozinha, a circunferência de sua cabeça, de orelha a orelha, do queixo ao chão, até que o Sr. Olivaras a ordenou que parasse.
Ele foi até uma das prateleiras atrás do balcão e veio com um estojo de madeira, entregou a varinha na mão da menina e disse:
- Raiz de Mandrágora, Imbuia, 25cm. Muito usada por curandeiros. Vamos logo! Agite a varinha, minha jovem.
Ela levantou a varinha no ar, meio sem jeito e antes que terminasse o movimento, ele a tirou de sua mão com olhar desapontado.
- Desculpe-me! -disse ela vermelha.
- É assim mesmo... é só a primeira!! -o senhor sorriu com bondade.
Depois saiu para outro canto da loja e voltou com uma caixinha na mão. Abriu o estojo e disse:
- Vamos testar algo mais potente... Que tal uma com fios de cabelo de Ondina e pelo de unicórnio, 27 cm em cedro. Boa para conjurações.
Ela fez um gesto como se quisesse tirar algo de dentro da varinha, mas nada saiu. Então ela olhou bem dentro da ponta da varinha e Sr. Olivaras agarrou o artefato correndo:
- Quer ficar sem olhos, Senhorita. Locksheart!?
- N-não senhor... -Robin parecia ainda mais frustrada.
- Hum, então vamos tentar algo diferente dessa vez... Já sei!
Ele andou pela loja coletando varinhas por todos os cantos e acumulou vinte e duas caixas em cima da mesa e fez com que ela experimentasse cada uma. Ele deu mais voltas pela loja e trouxe outras pilhas de caixas, que foram se acumulando sobre o balcão. Mas a cada varinha testada, a menina parecia mais chateada e ele, mais decepcionado. Havia testado de tudo, mas nenhuma delas parecia satisfazer as exigências da jovenzinha.
- Uma grande bruxa requer uma grande varinha... -falou consigo enquanto tentava achar uma solução para seu problema.
Seus finos dedos batucaram o balcão enquanto ele pensava nas outras possibilidades que ainda restavam. Poucos eram os clientes que haviam dado tanto trabalho. Talvez tivesse que usar algo realmente ousado: algo que poderia levar metade da sua loja pelos ares, que ele só se lembrava de ter sido vendido a alguém pelo seu avô a mais de um século atrás. Ele olhou firmemente os olhinhos azuis da criança e disse, meio relutante:
- Quem sabe... pode ser que sim, pode ser que não...
- O que é que pode ser? -Robin perguntou curiosa.
- Não, não... Talvez isso seja ousado demais! Ou então perigoso demais para uma jovenzinha... -ele continuava a matutar alguma coisa.
- O que foi, Sr. Olivaras? -Rachel ficou preocupada com as indagações do ancião.
- Bem...só há um jeito de saber! -o homem sorriu. -Me acompanhem!
Ele guiou os três até os fundos da loja, e foi até um grande armário de mogno com muitas trancas. Ele deu cinco batidinhas em lugares diferentes e as portas se escancararam mostrando uma escada secreta para um lugar muito escuro. Alguns morcegos e mariposas saíram voando de dentro do compartimento. Ele sorriu desconcertado e disse um "Opa, lugar errado! Desculpem-me... Acho que estou precisando fazer uma faxina aqui..." enquanto fechava a porta e dava novamente mais cinco batidinhas.
Quando ele abriu as portas novamente, a escada havia sido substituída por prateleiras cheias de caixinhas, vidros com líquidos coloridos e livros diversos. Dentre aquela bagunça ele pegou um livro grande de capa marrom, e três estojos de couro preto, com travas, e os levou até uma porta, de madeira escura e com uma grande janela de onde se podia ver muito verde lá fora. Ela dava para o pátio da loja, um espaço ao ar livre, cercado de muros cobertos de heras, e uma mesinha de madeira com quatro cadeiras num canto próximo à porta.
- Primeiro, vou lhes explicar algo muito importante: há certas combinações de elementos mágicos em varinhas que... podem ser explosivas!
- Explosivas como aquelas? -desdenhou Robin das varinhas que pareciam fazer nada e possuir poder algum.
- Muito mais... -o senhor riu. -No entanto, para adquirir uma dessas é preciso assinar um registro que vai para o Ministério da Magia, mas e só por precaução. Para que não caia na mão de magos do lado negro.
- Por precaução? -indagou Rachel.
- É a parte burocrática do negócio... O outro problema é que elas são bem mais caras que as outras varinhas, quero dizer, muito mais caras mesmo!
- Isso não é problema para Robin, ela é bem rica! Muito rica mesmo! -Ronan comentou na inocência.
- Se isso não é problema, podemos começar o teste.
O homem abriu os estojos com muito cuidado e apresentou cada uma delas:
- A primeira é Amazarak, toda de prata, 30 cm, possui a mesma substância que produziu a varinha de Merlin, e o segredo desta aqui eu não conto nem sobre o efeito da magia Crucius!!!
- O que é isso? -Robin perguntou interessada.
- É um poderoso feitiço de tortura que pode levar alguém à loucura, se realizada por um mago competente...
Robin arregalou os olhos e Sr. Olivaras esboçou um sorriso de contentamento e continuou a descrição das varinhas.
- Ela é cravejada de rubis, que ajudam na execução de qualquer feitiço de defesa e conjuração. Como você pode ver, tanto nesta quanto nas outras, a sua ponta possui uma pedra usada pelos duendes de Gringotes para a proteção de seus artefatos mais preciosos... É uma perfeita obra de arte!
Os olhinhos de Robin pareciam muito curiosos, afinal de contas, aquelas varinhas eram verdadeiras jóias.
- A segunda é Abramelin, feita de uma parte de ouro branco e outra de ouro amarelo, enroladas como duas serpentes! Seu cabo é cravejado de topázios azuis e safiras. 27 cm da mais bela concepção de varinhas para encantamentos relacionados à memória e persuasão! Você pode gravar o seu nome na base de qualquer uma delas! Esta aqui possui o interior feito de essência de amaranto, cordas de coração de um dragão focinho curto sueco, e tutano de chifre de unicórnio.
- É linda! -exclamou Rachel.
- Por último a Aleph, 29 cm em ouro com haste revestida de escamas de dragão dourado, tudo isso para um melhor desempenho em feitiços de ataque e conjurações. O interior possui pena da cauda de uma fênix, tutano de chifre de unicórnio, três fios de crina de Pegasus e corda de coração de dragão dourado, raríssimo!!! Por fora possui os mais puros e perfeitos diamantes, a lapidação é idêntica, o que torna a varinha raríssima!
- Nossa! -Ronan estava com os olhos vidrados nas três preciosidades.
- Estas varinhas aqui são bem resistentes e foram feitas pelo meu bisavô, o que mostra que elas duram muito mais do que uma varinha normal. O investimento é alto, mas tem garantia de cinqüenta anos...
- Nossa! -agora era Rachel que estava achando tudo aquilo maravilhoso.
Robin pegou cada uma com cuidado e as observou atentamente.
- A primeira parte do teste é assim: você se afasta um pouco da mesa, enquanto eu fecho os estojos. -a menina obedeceu de imediato. -Agora, se concentre nas varinhas, estenda a mão, feche os olhos e diga, por exemplo, "Amazarak, venha!" Você vai ver que, mesmo com o estojo fechado, a varinha vai dar um jeito de sair.
- E qual eu devo testar? -ela parecia um pouco perdida.
- É você quem deve escolher, minha jovem! Ou melhor, o seu coração é que escolhe qual é aquela que se integra melhor ao seu ser... Mas saiba, ela não irá até à senhorita se sentir que você não a deseja ou merece...
Ela resolveu começar pela ordem, chamando pela primeira varinha três vezes, e o máximo que conseguiu foi fazer a caixinha estremecer. Tentou a segunda, conseguindo algum progresso. Na quarta tentativa, a varinha abriu o estojo e começou a flutuar até sua mão, mas quando tocou a ponta dos dedos, caiu no chão. Ela olhou para a terceira caixinha, com um pouco de receio. Robin sentia que a terceira varinha, Aleph, tinha de ser sua, "Mas e se não conseguisse? E se não a merecesse?" foram seus pensamentos. Então resolveu tirar a limpo suas dúvidas com o artesão:
- Hum... o que acontece se eu não conseguir fazer com que a terceira venha até mim?
- Não acontece nada... nada mesmo! Talvez você possa ficar com uma varinha de segunda mão, elas também servem. Ou então você será avaliada por um conselho que vai verificar se você é ou não um aborto!
- Um aborto! -Rachel estremeceu. -Mas eu lhe garanto que ela tem muita magia no sangue! Tem mesmo!!!
- Não é tão ruim assim, senhorita. -ele lhe sorriu esboçando muita segurança. -Mas eu lhe garanto! Você é uma grande bruxa! Posso ver isso em você! -e ele a mirou bem no fundo dos seus olhos.
Robin, meio decepcionada com a resposta que conseguira, olhou temerosa para o último estojo. Estendeu sua mão e desejou do fundo do coração antes de dizer:
- Por favor, Aleph, venha até mim!
E a varinha atendeu tão rápido seu pedido que nem teve tempo de ver a caixinha explodindo pelos ares e voando rapidamente até sua mão, pairando no ar até que ela abrisse os olhos, incrédula, e pegasse o precioso aterfato em suas mãos pequeninas. Ela ficou tão feliz que foi logo levantando a varinha e quando ia agita-la no ar, Sr. Olivaras a deteve.
- Então é esta! -ele abaixou a varinha. -Eu não disse? Sim, eu disse! Viu como sempre tenho razão?
Robin respondeu positivamente com um aceno de cabeça, ainda meio abobada com o seu feito.
- Bem, a segunda parte do teste você já sabe pelo jeito: pegue a varinha e agite no ar! Mas é melhor você esperar nós sairmos daqui para poder usa-la... só por precaução! -todos pareciam confusos com o que ele disse. -Acalmem-se! Faz parte da burocracia...
- Como assim? -Robin pareceu indignada, ainda sem entender direito o que se passava.
- Não queremos por em risco a vida dos outros, não é mesmo? Se alguém tiver de explodir, se caso algo dê errado... que seja você, não é mesmo?!? -ele sorriu muito misterioso.
Robin olhou para a varinha e para o homem, que não parecia estar brincando, pois estava juntando tudo o mais rápido possível. Sua mãe, no entanto parecia tão aflita quanto ela. Os três ficaram atônitos: a menina tinha que testar a varinha sozinha, e o Sr. Olivaras parecia não fazer objeção alguma. Sra. Stanford tentou argumentar, mas ela foi carregada pelo filho para dentro da loja e quando deu por si, o velho já estava fechando a porta com a garota lá fora. Antes de trancá-la sozinha no pátio, ele colocou o rosto para fora e, para consolar ou encorajar a pobre menina, tentou dizer algo que em nada ajudou:
- Não se preocupe! Não me lembro de Merlin ter explodido pelos ares!!!
Ele trancou a porta assim que terminou de dizer aquelas palavras. Agora sim a menina estava em pânico. A mãe, que havia se arrependido de deixa-la fazer aquela loucura, tentava abrir aquela pesada porta desesperadamente. Enquanto isso, lá fora, Robin segurava firme a sua varinha e respirava fundo: tentava assim reunir força e coragem dentro de si para testar o artefato.
Robin fechou os olhos, ergue a varinha no ar e a agitou, descrevendo um grande círculo sobre sua cabeça. Um calor tomou seu corpo esguio de súbito, um cheiro de flores a circundou e ela sentiu que tivesse saído do chão. "Morri..." ela pensou. No entanto, quando abriu seus olhos, viu que ainda estava viva e que os muros de hera estavam agora cobertos de flores silvestres, e um cheiro de jasmim dava um toque especial ao pátio. A menina ficou maravilhada com aquilo.
- Perfeito! Perfeito! -aplaudiu o homem. -Meu bisavô deve estar se remexendo de tanta felicidade, no estômago do dragão que o engoliu!
- Mas se seu bisavô foi devorado, não pode estar se remexendo... pode?!? -disse Ronan na inocência.
- Não é isso... garoto... É maneira de falar!
- Aquilo foi lindo, minha filha! Você tinha que ver! Estou até emocionada!
- Essas varinhas produzem efeitos variados nas pessoas... -riu o velhinho. -Pronta para assinar os papéis?
- S-sim! -gaguejou Robin. -Mas quem assina? Eu?
- É claro! Você é quem fica responsável se caso alguma coisa acontecer com a sua inseparável companheira!
- Entendo...
Robin assinou os papéis, mas Rachel ficou como responsável legal da garota. Depois o Sr. Olivaras mostrou para a garota uma infinidade de estojos com os mais diversos tipos de encantamentos para proteger sua varinha de furtos, artefato de extrema necessidade nesses casos, e recomendado pelo Ministério. Ela comprou uma que além de reconhecer o dono, ainda morde o ladrão e dá choque quando fica a mais de 500 metros de distância do proprietário. E se a pessoa ainda conseguisse abrir o estojo, receberia uma baforada de pó do sono e ficaria desacordada por pelo menos seis horas. Robin achou tudo aquilo divertido e já estava arquitetando um jeito de pregar umas boas peças nos irmãos.
Mas aquela brincadeira custou muito caro: contando com a varinha e estojo, Robin não pagou nada menos do que quatrocentos e sessenta e oito galeões. A mãe deu um saltou quando ouviu o preço e precisou de dois copos d'água para se recuperar. O senhor pediu para que Robin assinasse a ordem de pagamento e quando eles saíram da loja, ouviram o velhote soltar uivos de alegria.
Eles iam andando pelo beco quando passaram por uma loja de animais, e quando Robin se aproximou mais da vitrine, viu uma bruxa gorducha vestindo uma capa bordô correndo pela loja atrás de um bicho. Alguns clientes saíram do caminho, enquanto outros foram atropelados por aquela bruxa ensandecida.
A menina, muito curiosa, pediu licença à mãe e se aproximou da entrada para ver melhor o que estava acontecendo. Quando olhou para dentro da loja, viu a bruxa se aproximando, correndo atrás de um bichinho preto e branco, pequeno e peludo, muito espevitado. Ele saiu da loja, subiu pelas calças de Robin e foi se refugiar dentro do velho suéter da menina. A bruxa olhou muito aborrecida e quase tomou o bicho das mãos da menina que tirava carinhosamente o animalzinho de dentro da sua veste. Voltou para dentro e foi conversar com o cliente.
- Desculpe-me pela bagunça! Furões são espertos assim mesmo... Já é a terceira vez que ele faz isso esta semana!
- Acho que não vamos levar este bicho...
A mãe de um garoto baixinho, gorducho e cabelos castanhos escuros, parecia ter resolvido voltar atrás. O filho, no entanto, não parecia nem um pouco feliz com a decisão.
- Mas eu quero esse!!!
- Mas você não consegue cuidar nem de um sapo, quem dirá de um furão, que é muito mais esperto e astuto que um velho anfíbio!
- Eu não perdi o sapo... eu o libertei! Ele estava gordo e velho!
- Sei... E você tinha de liberta-lo bem no meio de um restaurante trouxa?!?
- Ah! Mãe, deixa, vai! Deixa!
- Por que não compra uma coruja?!? Em Hogwarts eles até tem um corujal, um lugar próprio para elas viverem e se alimentarem! Esse animal pode ser muito mais útil que um furão... Além de que, você nem precisa cuidar muito de uma coruja, elas se viram muito bem sozinhas!
Robin observava tudo de longe, e no fundo torcia para que o menino finalmente desistisse do pobre animal, que nas mãos dele provavelmente morreria de fome, entalado em algum lugar escuro e frio, longe do seu alcance. Resolveu então se meter na conversa para favorecer o seu lado:
- Você vai para Hogwarts?
- Sim... minha família toda estudou lá... e você? É do primeiro ano? -o garoto não parecia muito interessado na conversa.
- Sim! Não sei que bicho levar... Não sabia que podiam levar furões em Hogwarts?!?
- Eu consegui uma licença... -e ele mostrou uma autorização escrita meio às pressas com o timbre de Hogwarts.
- Dizem que esses bichos fazem muita bagunça, roem seus sapatos, esconde suas coisas...
- Hum... -ele a olhou para prestar mais atenção. -Quem disse isso? Você?
- Não, claro que não... Mas é sério!
- Sério? Como sabe?
- Não sei... Quer dizer... eu ouvi dizer... Nunca se sabe... na verdade, estou quase comprando aquela coruja ali, ela é muito mais bonita! É pequena, o que quer dizer que come pouco e dá menos trabalho...
- Hum... -o garoto largou o furão, que veio para cima de Robin outra vez, e ela o levou até a gaiola da coruja.
- Bem... eu também estou indeciso! Acho que... -ele ficou quieto por uns instantes e continuou. -Você não ficaria ofendida se comprasse essa coruja, não é?!?
- Bem... talvez. Mas eu perdôo rápido! Principalmente se você me der esta autorização que está com você...
- Ah... tudo bem. Não vou precisar disso mesmo...
O garoto estendeu o papel para ela, que disfarçou muito bem sua satisfação. Já a mãe demonstrou contentamento explícito e apoiou a decisão dos dois. Aquela velha bruxa carrancuda pegou a gaiola e levou até o balcão, depois olhou a etiqueta e disse:
- Nove galeões e doze sicles.
- O quê!? -a mãe parecia desmanchar o sorriso após contar as moedas. Faltava quase um galeão para inteirar o dinheiro. -Essa coruja veio de onde, da Austrália?
- Não, na verdade é uma coruja norueguesa.
- A-acho melhor ficarmos com o pequeno roedor, que é quase a metade do preço...
- Ah, não! Eu quero a coruja! Eu quero! Eu quero!!!
Robin, que agora não conseguia esconder seu desgosto, sentiu o sangue subir. Precisava pensar em algo, e rápido! Ela olhou para baixo e teve uma boa idéia, na sua concepção, é claro. Ela tirou um galeão do bolso e se abaixou rapidamente para perto do pé da mãe, que agora prestava atenção. Deu uma batidinha no seu pé, para que ela o retirasse, então se levantou do chão e disse com firmeza:
- Olhe o que eu achei debaixo do seu pé... É seu, não?
- A-acho que sim... -e ela pegou aquela moedinha dourada, pagou pela coruja e saiu do recinto com ar de satisfação estampado no rosto.
Para Robin, dinheiro nunca fora muito importante, mas aquele bichinho, sim. Sentia que devia salva-lo, afinal, ele a escolhera, e ela devia portanto, cuidar dele. Ela sabia que em suas mãos, a mascote seria bem melhor cuidado, portanto não hesitou nem em dar aquele galeão à senhora, nem de comprar o bichinho fujão, que a dona da loja estava vendendo por metade do preço.
- A propósito, mocinha, não é um furão, é um ferrete... macho... -disse a senhora aliviada por ter se livrado daquela peste.
- Que diferença faz?
- Nenhuma, pra mim... Só vou lhe alertar que se você não quer mata-lo de fome, frio, sede ou por mal-tratos, acho que deveria comprar o manual e todos os outros apetrechos dele... -a mulher sorriu maliciosamente.
O queixo de Robin caiu. Aquela senhora era esperta, viu o galeão que a menina deu à outra mulher e sabia que ela ia comprar tudo o que o bichinho precisava, desde cobertores, ração, coleira, bebedouro, brinquedos e tantas outras coisas que Robin nem sabia para que serviam. "Velha rabugenta..." a menina disse quando saiu da loja com um saco pesado e uma gaiola com o bichinho que brincava satisfeito com uma bola. Como se já não bastassem todos os aborrecimentos pelos quais passou hoje, ela ainda tinha que agüentar ser explorada por uma bruxa chata e gananciosa. Mas no fundo, Robin sentia que tudo valia a pena.
Quando sua mãe viu a gaiola com aquele bichinho diferente, não gostou muito de começo, mas depois até o achou engraçadinho e ajudou a filha a carregar aquela sacola. Ronan achou o ferrete muito divertido e queria por que queria tira-lo da gaiola assim que o viu. Sua irmã deixou-o brincar por algum tempo, até que chegaram na confeitaria da tia para deixar mais algumas sacolas guardadas. Agora se dirigiram a uma modista na mesma alameda florida, que agora refletia o tom avermelhado que tomava o céu. Subindo a Alameda, os três avistaram Eric, Adam e Jonathan vindo em sua direção, conversando animadamente e com algumas sacolas nas mãos.
- Alô, mãe! -disseram eles.
- Alô, meninos... O que vocês trazem nas sacolas?
- Ah... nada de muito importante... -Adam corou.
- Nada? Só espero que esse "nada" não seja alguma coisa como bombas de bosta, ou qualquer outra geminialidade dos Weasleys...
- Hum... nós só passamos lá para nos despedirmos de Gina, mãe... -agora era Jonathan quem estava corado e tentava segurar o riso. -A senhora se lembra dela, não?
- Sim, me lembro... Mas não é esta a questão, portanto pare de me enrolar! -ela colocou uma mão na cintura e disse em tom ameaçador. -Olhe, eu não tenho tempo para isso... Vocês sabem que eu já os proibi de visitarem qualquer loja de logros e brincadeira, sabem também que não me importo em mandar um berrador caprichado se caso algum de vocês aprontarem algo em Hogwarts... Enfim, já está escurecendo... Acho melhor deixarem essas sacolas com sua tia, e irmos rápido para a modista pois logo todas as lojas estarão fechadas. Rebeca fecha sua confeitaria às oito horas, e temos que passar lá para pegar o restante das sacolas antes de ir pra casa.
Rachel e seus filhos andaram pela travessa até chegarem numa bela loja, com uma vitrine grande, cheia de manequins que mudavam de pose constantemente, e arranjos florais dos dois lados da porta. Uma placa de madeira bem bonita, pintada com letras roxas, dizia o seguinte: "Tesoura de Prata de Anabelle Deveroux, desde 1485 d.C. fazendo a moda dos bruxos."
Dentro se via ainda alguns clientes sentados em confortáveis poltronas roxas; uma mulher esguia coordenando as muitas fitas métricas, tesouras e -para a surpresa de Robin -elfos domésticos, que pareciam muito atarefados anotando tudo, espetando as agulhas nas bainhas e costurando as roupas atrás do balcão. Da porta se ouvia um burburinho de madames com seus filhos a discutir os últimos ajustes nos uniformes.
Enquanto todos entravam na loja, Eric se deteve por um instante na vitrine, parecia admirado com algo e pelo jeito, não queria entrar lá dentro de jeito algum. Robin percebeu que ele não tirava os olhos de uma menina bonita, cabelos louros pendendo em cachos, olhos muito azuis e um ar soberbo, mas alegre. Ela se parecia muito com a costureira da loja, ambas tinham um nariz fino e arrebitado. Robin pôs a mão sobre o ombro do irmão, e este deu um sobressalto e caiu sentado no chão, chamando a atenção de todos que estavam lá dentro. Ele olhou feio para a irmã e esta tentou se desculpar:
- Opa, desculpa! Não quis assusta-lo... -ela estendeu sua mão para ajuda-lo.
- Por que fez isso?!? -ele brandiu muito nervoso.
- Eu só ia chamá-lo para entrar... Você ficou ai, parado!
- Está louca!? Quer me desmoralizar na frente dela! Quer dizer, deles...-ele corou e tentou corrigir o que acabara de dizer.
- Ela quem? Aquela menina loira? Que mau gosto! -ela tentou descontrair um pouco.
- Não pedi sua opinião! Se ela é bonita ou feia, o problema é meu! -ele empurrou a mão da irmã, se levantou do chão e tentou ajeitar suas vestes. -Olhe só o que você me fez fazer... Agora estão todos olhando para a gente! Por sua causa...
- Também, gritando desse jeito!
- Se você não fosse tão metida e... e... idiota, nada disso teria acontecido! -ele tentava se acalmar agora.
- Estão todos olhando pra você, não pra mim. O quer dizer que o problema é seu, bobão... -a irmã tentou ajudá-lo a se recompor.
- Por que você sempre faz isso? -ele parecia furioso novamente.
- Isso o quê? -Robin realmente não entendia mais o irmão.
- I-s-s-o! De me rebaixar na frente dos outros, mostrar minhas fraquezas, me colocar para baixo, ficar tentando sempre ser melhor que eu em tudo!
- Eu não faço isso! Eu não faço nada! Na verdade, nem ao menos tenho falado com você nos últimos dias...
- Argh!!! Você não se importa! Nunca se importou! -o menino balançou a cabeça e entrou bufando na loja.
A menina loira riu quando os dois entraram e depois lhe lançou uns olhares de canto de olho, mas mal falou com Eric. A modista, que tinha um sotaque francês muito forçado, disse que estava muito assoberbada de afazeres e pediu aos elfos que tirassem a medidas para que ela pudesse fazer os ajustes nos uniformes.
Jonathan foi o primeiro a subir num banquinho de madeira para dar alguns pequenos retoques no uniforme que lhe caiu como uma luva. Depois foi Adam, que precisou alargar um pouco as vestes devido a uma massa corpórea sobressalente que ele insistia em chamar de músculos. Quando chegou a vez de Eric, ele tropeçou no banquinho e aquela menina desta vez soltou uma gargalhada. Eis que, para a surpresa de Robin, e para completar o seu dia, chega um garoto, com ar arrogante, de quem Robin não gostou logo de começo.
Ele chegou acompanhado de uma mulher sofisticada, com ar meio carregado e cabelos bem crespos e compridos. Ela cumprimentou a modista como se fossem amigas íntimas e esta fez questão de atende-la. O garoto, talvez não percebendo a presença de Eric, que acenava para ele, ou então simplesmente ignorando sua existência, foi logo puxando uma poltrona para perto da menina loira e a cumprimentou educadamente. Somente depois que ela apontou o garoto envergonhado em cima do banquinho é que ele foi lá cumprimenta-lo:
- Alô, Eric! O que você faz aqui, na boutique mais chique do Beco!?!
- Comprando uniformes, não vê?
- E você vai pagá-las como? Aqui eles não aceitam produtos hortifrutigranjeiros! Só dinheiro, viu!?! -ele ria, acompanhado da menina loira que agora chegava mais perto para se intrometer na conversa.
- Para a sua informação, nós temos dinheiro, OK?
- Estou brincando, viu? -ele deu um tapinha nas costas do amigo, o fazendo se desequilibrar por um instante e quase cair. -Não é Margot?
- É claro... -ela riu. -Ângelo nunca é descortês..
- É-é-é claro... Quer dizer, se você acha... -ele parecia um bobo gaguejando.
Robin observou seu irmão de longe fazendo papel de palhaço, mas resolveu não se intrometer para não sobrar para ela depois. Eric deu um pouco de trabalho à elfa, que teve que fazer muitos ajustes, já que ele era um pouco magricelo. Depois foi a vez de Robin experimentar o uniforme. A "estilista" da loja, que fez questão de reforçar seu título pelo menos unas doze vezes, parou de atender a mãe do garoto com cara de morto-vivo para ajeitar a roupa da menina.
- Non, non! -disse ela para a elfa com um sotaque francês arrastado. -Ela é muint baixinha... Prrecisa de uns bons ajusstes na bainha!
- Eu estou satisfeita com minha altura... -Robin protestou.
- Xiii! Non fale! Non fale! Crrianças devem ficarrr quietinhes!
Robin não sabia o que era pior: aquela estilista, sua filha, seus ajustes, ou aquele menino, que definitivamente ela detestou. Foi quando ela se lembrou dele, sorridente na estação King´s Cross. Lá ele lhe pareceu muito mais interessante que agora. Se a idéia de que a primeira impressão é a que fica era realmente verdadeira, ele conseguira contraria tal lei, pois Robin não só passou a detesta-lo como estava decidida a ignora-lo assim como o fez com seu irmão. Por fim, a loja se esvaziou e em duas horas eles já estavam com tudo pronto.
Às sete e quinze eles chegaram na confeitaria da tia, e lá eles pegaram as muitas sacolas de compras e foram entrando um a um na lareira da confeitaria, após se despedirem de Rebeca e Pierre Talloway, um homem alto, esguio e obviamente francês. Rachel deu um último abraço na irmã antes de entrar na lareira e jogar sobre si o Pó de Flu dizendo "Fazenda dos Stanford, Singleton."
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Gente, muito obrigada pelos comentários! Até agora eu só estava apresentando os personagens para vocês ficarem familiarizados com eles... Mas é agora que a coisa engrena!!! Daqui por diante, coisas interessantes acontecem e que vão prender vossa atenção! Como já disse, Robin tem muitos sonhos estranhos, e pelo que os bruxos dizem por ai, ela tem um futuro brilhante pela frente! Portanto, NÃO PERCAM OS PRÓXIMOS CAPÍTULOS!!!!!!!!!
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