Deja vú



Playlist

Em homenagem a volta da fanfic, criei uma pequena playlist com músicas que combinam com o clima desse capítulo.

Espero que gostem.

Lyra
(04/05/2009)



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Gina acariciou o rosto de Luna com a ponta dos dedos; roçou as bochechas rosadas, os lábios entreabertos e afastou uma mecha loira que pendia sobre os olhos da menina. Cada curva do corpo dela parecia ter sido modelada por Gina, pois suas mãos percorriam todos aqueles caminhos com a familiaridade de um escultor para com sua obra. Luna era bela em todas as formas, harmônica, morna e sedutora como as palavras de um poema.

Havia algo de divino e de libidinoso que fazia com que os pêlos do corpo de Gina se eriçassem quando olhava para ela. Jamais poderia colocar em palavras a sensação, pois se tratava de algo muito além dos signos e convenções humanos. Doce, inebriante, lascivo amor. E o corpo de Gina desejava mais, sempre mais.

Ela roçou o joelho contra a coxa de Luna e acariciou-lhe o ventre. Aproximou os lábios do ouvido da menina e murmurou, rouca, palavras provocativas. Luna despertou com o calor dos toques de Gina, abrindo os olhos. Estava cansada, mas não o bastante para ignorar as investidas obscenas da intimidade da amante contra a sua. Ganhou mordidas carinhosas nos lábios e sorriu. O corpo de Gina estava sobre ela agora, seus narizes roçando entre beijos e lambidas.

- Libertina – Luna suspirou quando Gina escorregou as mãos para as suas coxas.

- Só com você.

Era verdade. E, além de pervertida, Gina descobrira-se também insaciável. Fazia uma semana que estavam se encontrando novamente, em uma freqüência arrebatadora. Elas se viam durante o dia, pelos esconderijos do castelo, e durante a noite, nos dormitórios da Grifinória e da Corvinal. Gina não conseguia evitar. Passara tanto tempo longe física e psicologicamente de Luna que sentia um impulso magnético de colar seu corpo ao dela sempre que estavam próximas. Quando não era possível, ela se contentava em deixar a mão ou o braço roçar na pele da menina. Seus pêlos se atraíam como que imantados; os poros dilatados transpiravam frio e o coração de Gina pulsava veemente.

Havia algo sobre Luna. Só podia haver. Ou talvez fosse só o fato de estar rendida em sua paixão por ela.

- Sou louca por você – murmurou em seu gemido abafado, apertando as coxas contra o rosto de Luna e cravando os dedos nos seus densos cabelos dourados.

Em outras épocas Gina imaginara se aquilo seria o paraíso ou um reflexo divino. Agora tinha certeza.

Ela estava nas nuvens, flutuando alto e de olhos fechados. Não conseguia evitar. Seus pés não pareciam capazes de pisar em solo outra vez. Estava tão feliz que não podia impedir os músculos da face de sorrirem. Se pudesse olhar para si mesma, ela perceberia o quão bobamente estava agindo naqueles dias. Mas que importância tinha isso, afinal? Estava se sentindo bem e completa pela primeira vez em muito tempo...

Gina não precisava perguntar para saber que Luna sentia o mesmo. Estava estampado vividamente em seu rosto, brilhando no olhar. Havia um desespero ávido no modo como ela a beijava, uma sede, um calor e um desejo tenso. Sua língua sussurrava para a boca de Gina todos os sentimentos latentes que não ousava confessar. Com as mãos agarradas à gola das vestes da grifinória, forçando sua coxa entre as pernas dela, Luna discorria sentenças inteiras sem pronunciar uma única frase; os narizes colados, seus olhos de céu de outono provocavam um temporal nas pacíficas lagoas cristalinas que eram as íris de Gina. E, quando a libido assumia o controle, os corpos ardiam como se realmente houvesse fogo nos cabelos carmesim da bruxa e este houvesse se espalhado descontroladamente com o vendaval que era Luna.

Havia um entendimento mútuo entre elas de nunca discutir o que de fato se passava. Encontravam-se todos os dias o máximo de vezes possível, o que, no mínimo, devia significar alguma espécie de compromisso. Ela não se atreveria a perguntar.

Estava ficando preocupada com a proximidade das férias. A idéia de passar o verão longe de Luna era dolorosa, absurda até. Mesmo temendo quebrar o pacto de Não-discutir-a-relação, Gina sabia que teriam que conversar sobre isso antes do ano letivo terminar. Afinal, não estaria pedindo que Luna dissesse “Você é o amor da minha vida, vamos fugir e viver de vender jujubas!”; algo como “Você pode vir me visitar sempre que quiser” estava de ótimo tamanho.

Gina estava refletindo sobre o assunto, naquela tarde, deitada displicentemente numa das grandes poltronas rubis do salão comunal da Grifinória. Devorava uma caixa de sapos de chocolate e fingia ler a última edição do The Quibbler, ambos presentes de Luna. As bochechas da menina haviam, de fato, enrubescido quando esticara o pacote colorido e amarrotado onde embrulhara o chocolate. Gina desviara os olhos da capa da revista, que lhe fora entregue primeiro, e também por sua vez corara.

- Chocolate é sempre um bom acompanhante à leitura – a loirinha explicou ao que Gina abriu o presente.

- Ah, Lu... – as borboletas em seu estômago esvoaçarem alegremente – Isso é... Você... – e sorriu enquanto abria um dos doces – Na verdade, sei de outra coisa que combina perfeitamente bem com chocolate...

Gina suspirou, sorrindo bobamente, e deixou um sapo escapar em sua distração. O chocolate saltitante teria desaparecido furtivamente se Harry não o tivesse capturado.

- Oh, obrigada – Gina sorriu sem jeito.

O garoto lhe estendeu o sapo, mas ela sacudiu a cabeça e disse que ficasse para ele.

- Posso sentar?

Gina assentiu com a cabeça e encolheu as pernas, recompondo-se numa posição menos espaçosa. Harry se acomodou na poltrona - as mãos sobre os joelhos, segurando o sapo de chocolate, e as costas curvas. Ele não disse nada por um tempo, manuseando o doce como se o examinasse. Era estranho. Harry estava estranho. Gina o conhecia bem o suficiente para perceber que tinha algo em mente, e o que quer que fosse era-lhe bastante incômodo.

Harry não era o tipo de pessoa que expunha seus conflitos interiores com facilidade. Mesmo quando a namorava, ele raramente falava sobre suas angustias. A infância solitária e os maus tratos dos tios fizeram-no rapaz fechado, austero, acostumado a resolver seus problemas por conta própria. Gina tentara de todas as formas penetrar aquela muralha que ele mantinha em torno de si mesmo, mas ele se esforçava para rechaçar qualquer investida dela nesse sentido.

- Quando você vai me deixar saber o que se passa por trás desses olhos verdes? – a ruivinha perguntou certa vez. Harry estava deitado com a cabeça nas pernas da namorada, que brincava com os dedos entre os fios de cabelo dele.

- Você vai saber quando dividir comigo o que existe além desses seus olhos azuis – ele sorriu em resposta e Gina enrubesceu.

Nunca houve qualquer cumplicidade no relacionamento deles, afinal. Harry e Gina se conheciam bem o bastante para saber que sempre existia algo não dito. E, apesar disso, nenhum dos dois nunca desenvolveu a habilidade de extrair o que quer que fosse da boca do outro. Era irônico e paradoxal.

Gina sabia que ele queria falar alguma coisa agora. O ângulo de suas sobrancelhas, os lábios semi-abertos e um leve tremor nos dedos denunciavam. Harry guardara muita coisa por tempo demais. Palavras engasgadas na garganta que ele visivelmente não podia mais suportar.

O rapaz ergueu o rosto e a encarou por alguns instantes. Gina se encolheu inconscientemente, intimidada.

- Você quer conversar? – ela perguntou.

- Quero fazer uma pergunta.

- Faça...

Harry desviou os olhos para um ponto invisível.

- Você está vendo alguém?

Gina gemeu internamente. Se havia uma pergunta que ela não queria ter que responder era aquela. Mordeu o lábio. Pensou por alguns instantes antes de decidir uma resposta.

- Talvez.

Harry fechou os olhos e passou a mão no cabelo.

Gina conhecia essa atitude. Ele fazia isso quando estava se zangando e tentava manter a paciência.

- Eu apreciaria uma resposta concreta – ele forçou um sorriso.

- Estou solteira, Harry – a menina suspirou com irritação. – O que você acha?

Gina imediatamente se arrependeu do que disse. Acabara de magoar os sentimentos dele mais uma vez e percebeu que se sentia horrível por isso.
Harry baixou a cabeça num misto de resignação, raiva e infelicidade.

- Suponho que isso seja presente de um dos seus amigos, então – o garoto riu forçadamente e jogou o sapo de chocolate de volta para Gina. Ele parecia indeciso quanto a assumir uma postura displicente ou sarcástica.

A ruivinha permaneceu em silêncio. Não queria ter que discutir com ele outra vez, mas Harry parecia decidido a obrigá-la.

“E eu cheguei a achar que você era diferente...”

- Pare – Gina cortou friamente.

Ela encarou o ex-namorado com firmeza. Percebeu que ele havia corado - por vergonha ou irritação.

“Pode me odiar, se isso fizer com que você se sinta melhor”, Gina escolheu as palavras com cuidado. “Mas você sabe que não tem o direito de me cobrar explicações.”

Harry riu cinicamente, passou a mão nos cabelos e ficou de pé.

- Eu não estava cobrando nada – ele disse, sublinhando o verbo cobrar. – Mas ingenuamente achava que pudesse merecer um pouco da sua consideração...

Harry sorriu um sorriso árido, forçado e indulgente.

- Harry...

Mas ele não ficou para ouvir o que mais ela tivesse para falar.

Gina observou o rapaz desaparecer pelo buraco do retrato a passos firmes, orgulhoso e ferido.

Sentiu uma pontada de culpa, mas, ao mesmo tempo, sabia que não havia como agir de outra forma. Harry não podia saber com quem ela estava. Ele ficaria arrasado demais e, magoado, poderia revelar ao Rony a verdade sobre a relação de Gina e Luna. Entretanto, as tentativas constantemente frustradas de Hermione de tentar persuadi-la a se abrir com Harry antes que ele descobrisse o que se passava por outras vias continuavam a reverberar em seu cérebro.

A situação estava longe de ser simples. Se ela contasse ao rapaz que estava com Luna, ele iria rapidamente somar dois mais dois e concluir que já havia algo entre elas antes de ele e Gina começarem a namorar. Nesse caso a ruivinha precisaria ter excelentes justificativas para explicar o rompimento com Luna e o quanto de sinceridade houve em seu envolvimento com Harry. Acabaria comprometendo Hermione – não que isso importasse muito, é claro – e terminaria de pisar nos sentimentos do garoto.

O estômago de Gina revirava sob a perspectiva de ter um ex-namorado furioso de posse da informação que poderia repercutir violentamente o bastante para destruir o elo frágil que voltava a se construir entre ela e Luna.

Ainda aflita por esses pensamentos, Gina seguiu para o jantar no salão principal. Havia purê de batata e rins, macarronada, pastelão de carne, torta fria e cenouras cozidas. Gina devorou um prato farto com um pouco de tudo, regando as garfadas com goles de suco de abóbora doce.

Rony e Hermione se juntaram a ela alguns minutos depois.

- Estou com tanta fome que poderia comer uma vaca inteira – Rony exclamou enquanto se servia de pastelão.

- Você é sempre um primor em educação – comentou Gina displicentemente.
Ela olhou ao redor e percebeu que Harry não estava em lugar algum. Ficou imaginando se ele estaria furioso demais para jantar ou se simplesmente não queria ter que olhar para ela por algumas horas.

- Harry não vêm jantar? – perguntou antes que pudesse avaliar se era ou não adequado parecer interessada.

Rony fungou e franziu as sobrancelhas. Hermione revirou os olhos.

- Esperava que você pudesse responder isso – disse o irmão, com a voz engrolada.

- Por que eu deveria?

- Harry disse que ia procurá-la – contou, encolhendo os ombros.

Gina ficou em silêncio enquanto mastigava. Podia sentir o olhar questionador e repleto de significado que Hermione lhe enviava, repetindo os seus velhos discursos sem emitir qualquer som. O olhar da garota capturou o seu, e Gina sentiu-se atravessada por sentimentos repreensivos. Decidiu que já estava angustiada o bastante para receber uma dose reforçada das lições mentais de Mione.

- Vou sentar com a Luna – disse, aproveitando que a loirinha acabara de acomodar-se em seu lugar habitual, na extremidade da mesa da Corvinal. – Tenho que conversar com ela sobre um trabalho...

Escapou para a mesa ao lado antes que alguém pudesse questionar qualquer coisa.

Sentou encostada em Luna, inconscientemente, e sentiu seu coração disparar como se estivesse com os dedos a poucos milímetros do pomo de ouro em uma final de quadribol. Arrastou-se alguns centímetros para o lado, corando, e cumprimentou a amante com uma frase gaguejada.

Luna resmungou uma resposta sem desviar os olhos do livro que lia. Se Gina não conhecesse a garota bem o suficiente, teria esperanças de que em algum momento ao longo do jantar ela fecharia o livro e começaria a lhe dar atenção. Mas, é claro, Gina a percebia melhor até do que a si própria, de modo que sabia que Luna passaria o jantar inteiro lendo. Ao contrário do que se poderia imaginar, isso não a magoava. Estava acostumada com a forma como Luna se comportava. Ela não sabia ser sociável e não estava minimamente preocupada em melhorar nesse aspecto.

Gina jantou em silêncio, observando distraidamente as pessoas nas outras mesas. Quando estava servindo mais meio copo de suco de abóbora, sentiu a perna de Luna procurar a sua por baixo da mesa, roçando o tênis no seu tornozelo. O sangue subiu imediatamente para o seu rosto, fazendo a pele alva das suas bochechas se tingir de rosa. Ela derrubou suco na mesa, mas não houve maiores problemas porque o feitiço que envolvia o móvel limpava a madeira instantaneamente.

Gina olhou afoita para Luna, mas não recebeu nenhuma resposta: a menina continuava concentrada em sua leitura. Era inegável, no entanto, que Luna estava acariciando-lhe sutilmente por sob a mesa. Não pôde evitar um largo sorriso de satisfação.

- Gostaria de falar com você mais tarde – Luna disse após uma última garfada de purê.

Ambas sabiam que falar era a última coisa que iam fazer. A ruivinha respondeu com um sorriso cheio de significado e acenou em compreensão com a cabeça.
Luna fechou o livro e deixou o salão carregando-o sob o braço.

Mesmo estando na mesa da Corvinal, Gina permitiu-se demorar um pouco mais e ficou para a sobremesa. Saboreou um cremoso pudim de passas e rum enquanto seus pensamentos vagavam distantes de si mesma, mas muito próximos da nuca de Luna, onde, em sua imaginação, os finos cabelos loiros da menina roçavam seus lábios.

Ela tomou Gina para si por inteiro aquela noite. A fricção de seus corpos e peles fazia pulsar os poros da ruiva no ritmo apressado das subidas e descidas de seu peito. Balbuciou palavras inteligíveis no ouvido da loira, a voz soando rouca através da sua garganta tensa.

- O quê? – Luna ofegou. Mechas de seu cabelo dourado estavam grudadas em suas bochechas e testas.

- Quente – gemeu, cravando as unhas nos ombros da amante.

Luna fez a temperatura se elevar ainda mais.

***

O móbile de vassourinhas na porta do Três Vassouras tilintou quando Gina empurrou a porta. Ela passou os olhos pelas mesas ao redor, distraidamente, e dirigiu-se ao balcão para pedir um copo de suco de abóbora bastante gelado.

Era o último final de semana em Hogsmeade do ano letivo. O sol radiante que brilhava no céu límpido e azul como uma piscina fazia da manhã extremamente convidativa para um passeio pelo vilarejo.

Gina e Luna haviam combinado de se encontrar no “seu” lugar - uma clareira ao pé de uma colina pouco íngreme – perto da hora do almoço. A ruivinha se antecipara e estava em Hogsmeade desde as 10 h, caminhando descansadamente sob a brisa agradável que brincava com a sua franja. Vestida como um muggle, trajando jeans e camiseta, Gina destoava completamente do resto dos transeuntes. Estava calor demais para vestes bruxas, afinal.

- Seu refresco, senhorita.

A menina agradeceu com um aceno de cabeça e virou-se para procurar uma mesa desocupada. Não havia nenhuma, mas Gina identificou Hannah Abbot acenando perto da janela e sentiu-se convidada a se juntar a ela. Puxou uma cadeira e se sentou.

- Tentei chamar a sua atenção quando a vi entrar, mas você não notou – ela disse, afastando os cachos alourados do rosto.

- Eu sou distraída – Gina desculpou-se.

Bebeu um gole do suco para constatar que estava doce em excesso, mas para um dia quente de início de verão esse não era um problema muito grave. A despeito do calor, Hannah estava bebendo seu terceiro copo de cerveja amanteigada, e suas bochechas estavam anormalmente rosadas.

- Você parece ótima, Gina – Hannah a fitou – Como vão as coisas?

- Eu diria que, colocando em perspectiva, estão muito melhores do que eu poderia imaginar – respondeu, e sentiu-se culpada por soar alegre demais em uma conversa com alguém que estava provavelmente infeliz. Mas a sua felicidade não chateava Hannah, que sorriu um sorriso morno, porém sincero.

- Termos nos esbarrado por aqui foi uma boa coincidência. Eu estava querendo falar com você.

Gina bebeu mais um gole de suco e encarou Hannah encorajando-a a continuar e dizer o que desejava.

“Na verdade, eu queria me despedir”. E completou antes que Gina tivesse tempo de fazer perguntas: “Vou embora de Hogwarts”.

A ruivinha piscou e olhou para Hannah em silêncio durante alguns segundos.
- Está dizendo que você não vai voltar em setembro?

- Sim. – Han desviou os olhos para a janela – Como lhe disse anteriormente, Gina, não posso suportar viver em um lugar tão entranhado de lembranças dolorosas quanto Hogwarts. Está me enlouquecendo.

Gina assentiu com a cabeça e murmurou que entendia.

- Enlouqueceria qualquer um.

Hannah suspirou. Apanhou um cigarro, acendeu e ofereceu para Gina, que recusou.

“Parei com isso por uns tempos. Talvez definitivamente, sei lá”. Encolheu os ombros.

A garota deu uma risadinha e uma tragada.

- Eu também – expirou a fumaça lentamente.

Elas não falaram nada durante algum tempo. Gina terminou seu suco em alguns minutos e secou a boca nas costas das mãos. Hannah a estava observando com atenção, o que era constrangedor e intimidante. A ruivinha resmungou que precisava ir e a amiga acenou com a cabeça.

- Gostei de conhecer você, Weasley – Hannah sorriu e estendeu a mão. Para ela, aquele era decididamente um adeus. – Se tivéssemos nos encontrado antes... Bem, você sabe. Não era para ser.

- Não – Gina sorriu, apertando a mão fria da menina – De repente, um dia...
Hannah sacudiu a cabeça negativamente com veemência.

- Você está com a pessoa certa, Gina, e existem poucas por aí – ela deixou a mão da menina escorregar - Não estrague tudo dessa vez.

- Não vou – Gina afirmou com veemência.

Nunca.

Do outro lado da rua, um rapaz de corpo esguio, cabelo negro revolto e óculos redondos observava as meninas através do vidro. Harry Potter botou as mãos nos bolsos e se afastou de cabeça baixa.

***

- Gina, precisamos conversar seriamente.

A ruivinha revirou os olhos, impaciente. Não estava disposta a socializar com ninguém no momento, especialmente se essa pessoa fosse Hermione Granger e ela estivesse querendo falar sério.

- Estou lendo – resmungou sem desviar os olhos do livro que lia. Era um romance medieval de aventura e ação que Luna lhe recomendara, e, mesmo que Gina não fosse o melhor exemplo de uma leitora assídua, o texto estava muito mais interessante do que imaginava que qualquer conversa com Mione poderia ser.

Gina estava deitada em sua cama no dormitório feminino. Ela e Hermione, que acabara de entrar decidida pela porta, eram as únicas no quarto.

A morena bufou.

- Você não está me ouvindo, Gina, e eu estou tentando evitar que você fique em uma situação estupidamente complicada!

A ruiva fingiu não ouvir e tentou continuar a ler, mas Hermione arrancou-lhe o livro da mão e ignorou seu protesto indignado.

- Você sabe ser gentil – Gina falou com ironia, aborrecida.

- Você sabe ser irritante – Hermione retrucou com impaciência.

Gina fechou a cara e cruzou os braços, resignada.

- Tudo bem, pode falar. Estou ouvindo.

E escutou Hermione tagarelar durante alguns bons minutos sobre Harry e o que ela chamava de obsessão da parte dele por descobrir se e com quem Gina estava envolvida.

- Ele só vai saber se eu, você ou Luna contar – e apertou os olhos para Mione de forma inquisitorial – E, obviamente, nenhuma de nós vai falar qualquer coisa. Certo?

Hermione sacudiu a cabeça, mal humorada.

- Harry não é o idiota que você parece achar. Ele está decidido a saber a verdade, independente da sua disposição de contar.

Gina ficou de pé e caminhou até a janela. Respirou o ar de pôr-do-sol durante alguns segundos. E pensar que há minutos atrás seu dia estava excelente, a lembrança da agradável tarde que passara com Luna em Hogsmeade ofuscando qualquer pensamento inconveniente. Estava inchada de felicidade, mas Hermione precisava fazer o papel de sua consciência e trazê-la aos pontapés de volta à realidade. O que, afinal, ela esperava que fizesse?

- Conte ao Harry!

- Eu não posso! – Gina exclamou.

- Você deve. Antes que ele descubra sozinho e tenho motivos verdadeiros para se zangar.

- Honestamente, Hermione, acho que ele teria motivos ainda mais sérios para se zangar se soubesse do seu segredinho com Rony – Gina alfinetou – Em vez de cuidar do que não lhe diz respeito, porque você não se preocupa com o seu problema? Harry provavelmente não percebeu ainda porque está, como você mesma disse, obcecado por mim. Mas, de fato, ele não é idiota, e cedo ou tarde vai enxergar o que está acontecendo debaixo do nariz dele.

As bochechas de Mione enrubesceram e seu rosto transfigurou-se numa expressão que mesclava chateação e aborrecimento. Gina sabia que inverter a ordem da discussão e fazer de Hermione a acusada era uma fuga previsível e, de fato, bastante infantil. No entanto, não conseguia controlar seus nervos. Aceitar um dedo em riste acusador era demais para o sangue Weasley em suas veias. Cruzou os braços, desafiando Hermione a se atrever a continuar.

A morena murchou, desanimada, e deu-lhe as costas.

- Não diga que eu não avisei...

E fechou a porta atrás de si antes que Gina tivesse a chance de retrucar.

***

Lá estava ela outra vez, os lábios colados aos de Luna, empurrando o corpo da menina contra a porta de uma sala vazia. As mãos da amante empurraram o peito de Gina, afastando-a, sem fôlego. A marca do batom rosado que usava ficara carimbada na boca de Luna.

- Vão perceber que estamos ausentes, vamos...! – e fez menção de sair, mas a ruivinha puxou seu rosto contra o dela para outro beijo. – Gin...

- Eu sei, eu sei – Gina exclamou ofegante – Precisamos ir. Não sei quando você se tornou responsável, nem sei se gosto disso, mas posso me acostumar, prometo.

Luna piscou e sorriu. Passou as mãos por trás do pescoço de Gina e beijou seus lábios superficialmente de modo gentil. A ruivinha suspirou, derretida. Gina puxou Luna para mais perto e encostou o queixo no ombro da menina. Sentiu os dedos dela acariciando seus cabelos.

“Estou tão viciada em você e, oh, é muito bom...” disse suavemente, sorrindo de olhos fechados.

- Eu sei – Luna murmurou.

Ela deu uma mordida carinhosa no pescoço de Gina e as duas se afastaram. Antes de seguirem caminhos diferentes, combinaram de se encontrar, à noite, naquele mesmo lugar.

Gina sabia que o dia passaria muito mais lentamente do que sua ansiedade poderia suportar, mas estava satisfeita. Caminhou para a aula de Transfiguração cantarolando uma velha canção de amor, e nem o fato de perder um ponto para a Grifinória por chegar atrasada conseguiu desmanchar o seu sorriso.

Evidentemente, ela não captou uma única palavra do que McGonagall falou durante a aula. Posteriormente, a narrativa inexpressiva e monótona de Binns sobre algum evento da historiografia mágica entrou e saiu pelos seus ouvidos inconscientemente. No último período antes do almoço, Poções, Gina atingiu algum grau mínimo de concentração por instinto básico de sobrevivência e quase saiu ilesa, perdendo pontos apenas minutos antes da sineta soar.

Almoçou à mesa da Grifinória, mas preocupou-se em escolher um lugar de onde poderia observar Luna. A menina não estava lendo dessa vez, e o coração de Gina saltitou exultante quando a loirinha retribuiu seus olhares, fazendo-a derrubar molho de tomate na camisa branca do uniforme. Gina consertou o estrago na roupa com um feitiço simples para remover manchas que aprendera com sua mãe. Devorou com bastante apetite um prato sortido e farto.

A tarde passou com uma lentidão desanimadora. Gina cochilou na aula de Feitiços, mas Flitwick não puniu sua falta de atenção. O fato é que, passados os NOM’s, não havia muito mais o que exigir dos alunos. Havia mais alguns dias a serem cumpridos no calendário escolar, mas quase toda a matéria já fora passada e não havia mais o estímulo das provas finais para fazer os alunos se interessarem. Alguns professores, como Snape e McGonagall, estavam adiantando a matéria do ano seguinte, mas a maioria estava apenas revisando o conteúdo do semestre. A última aula do dia era Herbologia, mas a profª. Sprout decidiu liberar os estudantes.

Gina atravessou o jardim em direção à porta do castelo, satisfeita, observando a grande esfera laranja pulsante que era o sol desaparecer lentamente atrás das montanhas a oeste.

Foi procurar por Luna na biblioteca, mas a menina não estava lá. Rony acenou de uma mesa, convidando-a a se juntar a ele e Hermione. Gina estava se aproximando quando viu Harry surgir do meio das estantes e largar alguns livros ao lado dos amigos. Ela parou no mesmo instante e voltou atrás, acenando sem graça para o garoto e gesticulando como se tivesse acabado de lembrar que esquecera alguma coisa. Gina não se sentia bem evitando o rapaz, mas estava quase totalmente convencida de que, por agora, era o melhor a fazer.

Gina subiu rapidamente as escadas para a torre da Grifinória. O salão comunal estava movimentado para o horário, e todas as suas poltronas preferidas já estavam ocupadas. Isso não a aborreceu, pois ela não tinha qualquer intenção de permanecer na companhia de seus colegas de casa. Largou sua mochila ao lado da cama, no quarto, jogou o casaco sobre as cobertas e livrou-se da gravata desconfortável. Abandonou o dormitório rapidamente, levando entre os braços uma caixa de doces.

A mão suada pela rapidez de seus passos apertava a pedra no colar em seu pescoço. Gina nunca o tirava. Passava horas brincando com ele entre os dedos enquanto sua mente vagava pelas lembranças agradáveis protagonizadas na companhia de Luna. Acostumara-se a deixar o medalhão escondido sob a camisa, para evitar perguntas, mas vez ou outra se surpreendia manuseando distraidamente o objeto. Era como se houvesse um vínculo físico constante entre as duas, e Gina apreciava bastante a idéia.

A ruiva empurrou a porta da sala velha onde combinara encontrar Luna. O local costumava ser utilizado pelo professor de Runas Antigas nas aulas de tradução automática da turma avançada. Havia poucos alunos no nível cursando a matéria naquele semestre, de modo que as aulas se restringiram a uma classe somente. O ambiente não era exatamente o mais romântico, mas havia um sofá largo de quatro lugares que servia confortavelmente aos interesses das meninas. O móvel costumava ficar na sala comunal da Sonserina, mas fora substituído recentemente por uma peça considerada mais adequada pelos arrogantes alunos da casa.

Gina deixou a caixa de doces sobre o estofado verde do sofá. O ambiente abafado pedia um pouco de ar, e a menina abriu pequenas frestas nas janelas de vitrais coloridos. Fechou os olhos para sentir a brisa noturna acariciar as maçãs do seu rosto, como seda escorregando pela pele. Era como o toque de Luna, pensou, e seus lábios desenharam um sorriso.

Ouviu um barulho e se virou, ansiosa, mas era apenas o vento balançando a porta para jogar com as suas emoções. Ela respirou profundamente, expirando o ar com lentidão, afastou-se da janela, fechou a porta e se acomodou na poltrona cor de oliva. Seu estômago resmungou. Gina apanhou uma rosquinha de creme de abóbora e saboreou despreocupadamente.

Uma das pesadas cortinas dançou com suavidade.

Gina comeu o último pedaço da rosquinha e lambeu os dedos.

A porta abriu e seu peito inchou de felicidade.

- Oh, você já chegou – Luna disse, distraidamente surpresa. – Achei que estava adiantada.

- Não tive a última aula – Gina sorriu – Está com fome?

- Um pouco – respondeu a menina, passando os olhos pela caixa de doces de Gina com interesse.

Ela se acomodou ao lado da ruivinha, que lhe passou uma rosquinha polvilhada de açúcar. Luna examinou o doce por alguns segundos, sorriu e deu uma mordida. Seu rosto brilhou de contentamento e ela passou a língua pelo açúcar nos lábios.

- É da Dedos de Mel – contou Gina – Comprei em Hogsmeade, depois que você foi embora.

Luna devorou o doce como uma criança satisfeita. Quando terminou, havia minúsculos cristais de açúcar brilhando em suas vestes e acumulados ao redor de seus lábios.

- Excelente – a loirinha elogiou, ainda de boca cheia.

Gina sorriu com ternura e afastou uma mecha de cabelo para trás da orelha de Luna.

- Você parece deliciosa com todo esse açúcar – provocou.

- Oh – Luna exclamou, passando as mãos pelas vestes. – Veja só...

A ruiva riu divertida.

- Não acho que seja um grande problema, mas – Gina puxou Luna pela gravata e passou a língua pelo canto dos lábios da menina – eu posso cuidar disso, se você quiser.

- Absolutamente – Luna murmurou e retribuiu a carícia fazendo o pulso de Gina acelerar.

Elas começaram a se beijar suavemente, a mão de Gina roçando o pescoço da menina, mas um baque metálico ecoou pela sala e fez com que elas se afastassem num pulo. Luna limpou os lábios na manga das vestes e apertou os olhos.

- Um castiçal caiu – constatou despreocupada – Deve ter sido o vento, não?

Mas o estômago de Gina era um buraco negro sugando todo o seu ar. Seus olhos arregalados deixaram-na assustadoramente consciente do pé que tentava se esgueirar para perto de uma janela. A cortina balançava e o ar estava completamente parado. Seu coração batia violenta e dolorosamente.

- H-Harry? É você?

Silêncio angustiante.

O pé se afastou da parede e segundos depois um Harry hesitante apareceu diante dos olhos de Gina. Apertava a capa de invisibilidade entre as mãos e não ousava olhar para ela. O rosto do rapaz estava corado e distorcido numa expressão que ela não saberia definir.

- Harry Potter – Luna falou num tom de voz neutro e abafado. Agora que podia vê-lo ela compreendia, mas Gina não conseguia imaginar o que a menina poderia estar pensando.

- Há quanto tempo você está aqui?

- O suficiente – Harry grunhiu em voz baixa.

Gina teve a sensação de que todo o sangue estava se esvaindo de seu corpo. Empalideceu.

- Por que? – sussurrou mais para si mesma do que para ele.

- Eu disse que ia descobrir, mais cedo ou mais tarde...

Gina enterrou o rosto nas mãos. Luna ficou de pé.

- Harry Potter – a garota repetiu – Eu sempre achei que você passava tempo demais se intrometendo nos assuntos dos outros. O que você estava espionando não lhe diz respeito.

Harry apertou os punhos e ergueu o rosto lentamente. Se antes Gina não saberia definir a expressão no rosto dele, agora podia claramente descrever como raiva.

- É mesmo? – Harry tentou ser sarcástico e soou violento – Pois eu acho que me interessa. Bastante.

Gina ficou de pé e segurou a mão de Luna antes que ela dissesse alguma coisa.
- Eu e Harry precisamos conversar – disse, e se esforçou para olhar de forma intensamente segura para a amante. Precisava que Luna confiasse nela.

Os grandes olhos azuis da garota a fitaram atentamente durante alguns segundos enquanto ela parecia avaliar a situação. Luna puxou o braço, resmungou qualquer coisa que Gina não compreendeu e saiu da sala, mas não sem antes lançar um olhar feroz para Harry. Encarando-o fixamente, avisou a Gina que estaria esperando nos arredores. A porta se fechou atrás dela com um baque seco.

Gina respirou profundamente e olhou para Harry. Ele jogou a capa de invisibilidade fechada por cima dos ombros e cruzou os braços.

- Fale.

A menina afastou a franja dos olhos enquanto escolhia as palavras. O que poderia dizer? Qualquer frase poderia soar para Harry como uma ofensa à sua capacidade intelectual. Ele presenciara o que estava acontecendo. Não precisava de nenhuma legenda para compreender.

Gina apertou os dedos e Harry tossiu para lembrá-la de que ele estava aguardando.

- O que você viu... – mordeu os lábios – É exatamente o que parece ser.

O garoto remexeu-se no lugar e apertou os punhos, mas não disse nada por algum tempo. Continuava a encará-la de modo frio e questionador.

- Eu sei – ele respondeu secamente. – E espero que você me explique.

Gina sacudiu a cabeça, cansada.

- Não posso, sinto muito.

- Faça um esforço.

- O que você espera que eu diga? – Gina exclamou – Simplesmente aconteceu, e quando percebi eu já estava...

- Gina!

-... apaixonada...

- Por Luna Lovegood?! – ele se exaltou, passando a mão pelos cabelos e sacudindo a cabeça com descrença – Veja bem o que está dizendo!

- Eu sei exatamente o que estou dizendo – Gina disse cerrando os dentes.

- Você enlouqueceu?! – ele berrou. – Por Merlin!

Harry apoiou os cotovelos no parapeito de uma das janelas e afundou o rosto nas mãos. Permaneceu assim durante alguns minutos, calado, e então ergueu o rosto para, sem olhar para ela, perguntar se era culpa dele.

- Não seja ridículo – Gina bufou, zangada. – Isso não tem nada a ver com você. Meus sentimentos por ela mudaram e...

- Quando?

Aquela era exatamente a pergunta que Gina não queria ter que responder, mas ela sabia que não poderia evitar. Tinha a sensação de que estava prestes a fazer Harry ter completa certeza da superficialidade do namoro deles e percebeu que estava nauseada. Era uma verdade terrível.

A despeito de tudo isso, ela segurou a respiração e respondeu, direta e secamente:

- Desde o ano passado.

Ele sacudiu a cabeça, destruído.

- O que houve entre nós, então? Era tudo um teatro para você disfarçar...

- Não! Não, eu não estava com ela quando namorei você! Eu realmente queria... – Gina suspirou – Eu gostei muito de você, Harry, mesmo. Você não tem idéia do quanto foi difícil...

- Pare – o rapaz cortou bruscamente – Eu não vou me sentir melhor se você fingir se importar.

- Sinto muito – Gina murmurou.

- Você mentiu para mim – Harry falou com a voz rouca. – Quem sente muito sou eu...

Ele caminhou até a porta lentamente, abatido, e tocou a maçaneta com os dedos.

- Harry – ela chamou, fazendo-o estacar – Por favor, não conte ao Rony...

Harry balançou a cabeça, apertou os punhos e saiu batendo a porta atrás de si.

***

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