Portville
Capítulo 8 – Portville
Harry não reclamou quando o amigo Rony o acordou bem cedo no dia seguinte. Apesar de ter dormido no máximo umas duas horas, sentia como se aquela tivesse sido a melhor noite de sono de toda a sua vida, e tinha a impressão de que todo o cansaço que sentira nos últimos dias tivesse desaparecido num passe de mágica. Levantou-se com um sorriso satisfeito no rosto, tomou um banho quente para ajudá-lo a despertar e quando desceu para tomar o café da manhã na cozinha da mansão, ainda mantinha o sorriso radiante nos lábios.
Gina já estava na cozinha, e também tinha o mesmo sorriso radiante no rosto. Ela enchia uma pequena cesta de palha com pãezinhos caseiros que tinham acabado de sair do forno à lenha, e carregava uma caneca de porcelana cheia de leite fumegante na outra mão, da qual tomava pequenos goles. O olhar apaixonado dos dois se cruzou por alguns segundos, daquela forma que apenas os apaixonados são capazes, e que dizia com todas as letras “eu te amo”. Os dois saíram para o deck de madeira do lado de fora para se juntar aos amigos Rony e Hermione para planejar o dia.
Harry e Gina tinham combinado ao se despedir na noite anterior que deixariam transparecer o menos possível o que acontecera entre os dois. Gina não tinha certeza de qual seria a reação de seu irmão quanto aos dois estarem juntos, e pretendia fazer com que o rapaz se acostumasse mais com a idéia antes que eles assumissem qualquer compromisso mais sério frente a todos.
– Bom, devemos partir em breve – disse Harry aos dois amigos enquanto terminava de empacotar os biscoitos que havia pegado na noite anterior – Segundo o que entendi de Morgan na noite passada, devemos estar apenas a algumas horas da vila. Talvez consigamos chegar até ela antes das dez da manhã se nós caminharmos rapidamente.
– Bom, então temos que nos apressar – disse Hermione, com uma expressão de desagrado no rosto. Ainda não tinha se acostumado com a idéia de ir atrás de ingredientes para uma sessão de adivinhação. – não tenho a intenção de perder meu dia todo com essa bobagem de vocês. Estou lendo um livro muito importante e tenho que estudar mais alguns capítulos à tarde.
– Será que você consegue pensar em mais alguma coisa além daqueles seus livros estúpidos, Hermione? – desabafou Rony, visivelmente contrariado. – Tente pelo menos parecer animada em ir com a gente. Vamos lá, vai ser divertido!
Hermione resmungou alguma coisa ininteligível para o amigo e continuou tomando o seu café da manhã em silêncio. Ninguém falou mais nada durante o café da manhã e o silêncio que se seguiu só foi quebrado meia hora mais tarde, quando eles se despediram de Morgan e da Sra. Weasley na soleira da mansão.
- Tomem cuidado para não se perder no caminho, crianças – disse Morgan, enquanto abraçava Gina – Tem uma trilha antiga que leva até o bosque, tentem ficar perto dela. Qualquer problema que tiverem, podem sinalizar no céu com as varinhas que nós aparataremos para lá imediatamente.
- Não precisa se preocupar, Sra. Morgan – disse Rony, disfarçando uma careta – Nós sabemos nos cuidar muito bem sozinhos.
- E caso a gente tenha algum problema, sinalizaremos pra vocês imediatamente – disse Hermione, dando um cutucão nas costelas de Rony – Nós não queremos que vocês se preocupem conosco.
Harry tentou encurtar ao máximo as despedidas, e teve a impressão que a Sra. Weasley lançou-lhes um olhar de desconfiança enquanto os quatro atravessavam o gramado em direção ao bosque. Tentou não pensar muito no fato de estar enganando a mãe do amigo, e se afastaram rapidamente da mansão, enveredando por uma trilha estreita que contornava o bosque onde tinham encontrado o Sinistro.
Fazia pouco tempo que o sol havia aparecido no horizonte lançando seus primeiros raios luminosos sobre a mansão, e a manhã ainda estava se aquecendo. O ar ainda estava gelado e Harry podia sentir as minúsculas gotas da névoa da manhã pousarem em seu rosto e nos seus cabelos. Ele respirou fundo e sentiu o ar fresco do campo encher seus pulmões com uma revigorante energia que o rapaz não sentia há tempos, e ele sorriu.
Harry sentiu-se feliz por estar caminhando ao lado dos amigos naquela manhã. Podia ser apenas um passeio até a cidade, mas não se lembrava de ter caminhando assim fora dos campos da escola. Normalmente suas férias eram resumidas a ficar evitando os tios e o primo, ou ficar trancado em seu quarto contando os dias do calendário para que suas férias acabassem. Nunca tinha se divertido fora da escola até esse dia.
O mau humor de Hermione parecia estar lentamente se esvaindo enquanto caminhavam pelo campo ladeado de pequenos abetos, porque ela ensaiou algumas conversas com Rony e Gina. Os dois também estavam muitíssimos bem humorados e pareciam bastante animados com a aventura. Em poucos minutos, já estavam conversando alto e rindo das palhaçadas de Rony.
Caminharam por algum tempo apreciando a paisagem da propriedade de Morgan, e viram que o lugar realmente era muito mais bonito do que tinham imaginado. Caminhavam por uma trilha estreita e fora de uso, quase que completamente tomada pelo mato, mas ao lado da mesma cresciam tufos de flores silvestres por todos os lados. O terreno se elevava suavemente numa pequena colina, de cujo cume podia-se enxergar quase toda a extensão da propriedade de Morgan.
Diante deles havia uma descida íngreme que levava diretamente a um pequeno córrego que seguia suavemente por um vale entre as colinas, fazendo uma grande curva e seguindo em direção ao bosque onde supostamente estava indo, a alguns quilômetros à frente. Podiam enxergar também, do seu lado direito, uma linha ocre contínua que se afastava deles em direção às montanhas, bem mais distantes. Era a estrada que levava a Portville. Apesar de não estarem indo na direção do Bosque, Harry podia sentir o cheiro de orvalho nas árvores do bosque à frente, trazido pela brisa suave que soprava naquela manhã de verão. O grupo desceu da colina apertando o passo e após mais meia hora de caminhada estavam pulando a cerca da propriedade de Morgan e entrando na estrada de terra batida.
- Bom, estamos com sorte – disse Harry, consultando o relógio de pulso – ainda são oito da manhã. Acho que vamos conseguir chegar mais cedo do que eu esperava.
- Espere aí, não sabemos o quanto longe fica a vila, Harry – disse Hermione, olhando para os dois lados da estrada, como se quisesse encontrar uma placa de quilometragem indicando a distância da vila – podemos estar a dez, vinte quilômetros da cidade!
- É, mas o criado ontem foi a pé até a cidade – disse Gina, olhando feio para a amiga – e estava de volta antes da gente dormir. A vila não deve ser tão longe assim.
- A gente não sabe se foi mesmo – insistiu Hermione – ele pode ter ido de vassoura.
- Não tinha pensado nisso – disse Harry, coçando o queixo pensativamente enquanto caminhava pela estrada – é perfeitamente possível.
Eles continuaram pela estrada apertando o passo, e caminharam por mais uma hora naquela estrada comprida e deserta. O sol se levantara bem acima da linha do horizonte, lançando seus raios dourados sobre a copa esverdeada das árvores e sobre o gramado macio que cobria os campos em todas as direções, aquecendo o ar e evaporando todas as minúsculas gotas de orvalho que ainda restavam sobre as plantas. A estrada pela qual seguiam era ladeada por grandes abetos que se erguiam como sentinelas em fila protegendo os viajantes que porventura se aventurassem por ali. O ar ainda estava carregado com o odor pungente dos óleos aromatizantes contidos nas pequenas folhas daqueles gigantes verdes.
À sua frente, o terreno começava a se inclinar lentamente para o alto, iniciando uma nova colina mais alta que as anteriores. O grupo seguiu rapidamente por ela com uma ansiedade crescente, já que uma colina daquela altura permitiria certamente uma ampla visão dos campos ao redor e, provavelmente, lhes revelaria a distância que ainda tinham que cumprir até a vila de Portville. O grupo foi subindo cada vez mais pela estrada de terra batida, que agora era pavimentada levemente com pequenos pedaços de cascalho, numa sucessão de curvas regulares que ziguezagueavam pela lateral do monte e levavam até o seu cume, muitos metros acima deles. Quando eles dobraram a última grande curva, ao longo da qual o terreno deixara rapidamente de ser tão íngreme e se nivelava para tornar a descer à frente, eles puderam ter uma visão que os decepcionou.
A altura da colina realmente permitia que eles tivessem uma boa visão das terras ao redor deles, estendendo a sua visão num raio de dezenas de quilômetros. O outro lado da colina para onde a estrada seguia revelava uma grande extensão de terra cultivada com mudas de trigo em estágios diversos de desenvolvimento, quadriculada de forma irregular como uma imensa colcha de retalhos em diferentes tons de verde. Mais ao norte a cadeia de montanhas cinzentas se erguia como uma imensa muralha de pedra limitava a visão deles. Havia um pequeno bosque ao leste de onde estavam cujas bordas começavam aos pés da colina e se espalhavam como uma gigantesca cabeleira verde. Para o Oeste, mais plantações e algumas pequenas casas de fazenda espalhadas sobre as colchas verdes como pequenos botões coloridos. Não viam a vila em lugar algum.
Harry sentou-se à beira da estrada, apoiando os braços sobre os joelhos, e olhou para o céu. O sol já havia se erguido bastante e mesmo com a proteção cerrada dos galhos dos abetos ao lado da estrada, que impediam que os raios de sol se esgueirassem pelas folhas e chegasse a eles, estava ficando mais quente. Em breve, seria meio-dia e teriam que decidir se seria viável continuar vagando pela estrada a esmo até encontrarem a cidade, sabe-se lá quanto tempo depois, ou desistir da empreitada e retornar de mãos abanando para a mansão de Morgan.
Os amigos também pareciam compartilhar do desânimo que estava tomando Harry. Gina encostara-se aos pés do enorme abeto ao lado da estrada que lançava a sombra sobre eles e cujas poderosas raízes haviam feito tombar uma parte da cerca de arame farpado que ladeava a estrada, marcando o limite dos campos cultivados ao lado deles. Rony colocara as mãos nos bolsos e fitava o horizonte quadriculado com um olhar perdido. Um pássaro negro pousou num galho próximo sem que ninguém desse a ele a menor atenção, e observou o grupo com um olhar curioso, virando a cabeça rapidamente à moda dos pássaros quando estão intrigados com algo em seu território. Hermione aproximou-se de Gina, lançando aos rapazes um olhar cortante que dava a entender com todas as letras que ela achava aquilo uma total perda de tempo.
Harry não sabia o que fazer. Olhou mais uma vez para o horizonte à frente como se quisesse verificar se a cidade tinha aparecido de repente em meio aos retalhos esverdeados que cobriam os morros ao redor. Como era de se esperar – ou não, Harry nunca sabia o que podia esperar no meio do mundo bruxo – não surgiu repentinamente nenhuma cidade no horizonte. Entretanto, enquanto buscava uma solução para o dilema que se encontrava, o ruído de uma risada alta soou como um tiro e rompeu o silêncio que predominava no alto da colina, chamando a atenção do grupo parado na estrada. Alguns pássaros, inclusive o pássaro que havia pousado nos galhos baixos do abeto, assustaram-se e alçaram vôo rapidamente afastando-se dali.
Harry se virou para o caminho de onde tinham vindo, na direção da mansão de Morgan, e percebeu que alguém vinha pela estrada na direção deles. O ruído de gargalhadas começou a ficar cada vez mais alto, acompanhado do ranger compassado de madeira na estrada de terra batida e cascalho. O soar de um passo vagaroso e ritmado também foi ficando cada vez mais alto conforme o que quer que fosse se aproximava da curva da estrada que levava até aquele patamar onde estava o grupo. Gina e Hermione viraram a cabeça na direção de Harry com um olhar interrogativo no rosto, enquanto Rony postou-se ao lado do rapaz, colocando uma das mãos no bolso da frente da calça – e no cabo da varinha. O rapaz ruivo olhou para Harry silenciosamente assentindo com a cabeça, e os dois fixaram o olhar na curva da estrada enquanto o bruxo achatava o cabelo com as mãos para cobrir a famosa cicatriz.
Não demorou muito para a fonte do ruído surgir da curva da estrada e entrar sob a sombra do enorme abeto sob o qual as moças descansavam. A primeira coisa que os garotos puderam enxergar na curva da colina foi o surgimento da cabeça de uma velha mula cinzenta e gorda que seguia lenta e compassadamente pela estrada, parecendo alheia ao estardalhaço que era feito atrás dela. Tinha os olhos grandes e gentis voltados na direção da estrada, mantendo a cabeça baixa, e mesmo quando os rapazes parados na beira da estrada entraram em seu campo de visão, não lhes deu a menor atenção, resumindo-se a continuar seu caminho calmamente, espantando com o rabo comprido as moscas que insistiam em pousar nas suas costas arcadas.
A velha mula arrastava atrás de si uma enorme carroça de madeira, talvez com uns três metros de comprimento. A carroça era composta de um tablado longo de madeira sustentado por duas rodas cujos eixos ficavam no centro da mesma. Ao redor do tablado, para evitar que a carga caísse, havia uma guarda de madeira pintada com linhas vermelhas e brancas no sentido do comprimento. As rodas de madeira, já bastante gastas devido à exposição à estrada, chuva e vento, rangiam compassadamente conforme a carroça avançava sobre os pedaços maiores de cascalho espalhados pelo chão, balançando a carroça para os lados.
Apoiadas sobre a carroça estavam meia dúzia de grandes caixas de madeira bem fechadas, amarradas frouxamente à guarda da frente da carroça, bem atrás do carroceiro. Quando a carroça balançava para os lados conforme avançava por sobre os buracos da estrada, a carga deslizava para os lados e batia com um baque seco nas guardas laterais.
Sentado na boleia da carroça estava a fonte das gargalhadas que haviam alertado o grupo da presença da carroça. Dois velhos riam com tanto gosto que um deles estava apoiado na lanterna à querosene que ladeava a boleia da carroça, soluçando convulsivamente. O outro segurava as rédeas da mula com uma mão, enquanto com a outra enxugava as lágrimas que rolavam pela barba espessa que cobria seu rosto. Também não pareciam ter notado o quarteto parado na beira da estrada conforme se aproximavam, de forma que Harry pode dar uma boa olhada neles antes que se aproximassem.
O velho senhor que estava abraçado à lanterna apagada da carroça parecia ser o mais jovem da dupla, apesar de mesmo assim parecer ter uns sessenta anos de idade. À primeira vista, Harry poderia jurar que era um bruxo, mas olhou melhor e achou que não passava de um mendigo. Vestia uma calça de algodão que ia até um pouco acima de seus tornozelos, curtas demais para a grande estatura dele. Uma enorme camisa de algodão verde cobria o peito, tão comprida que a manga tinha sido dobrada quatro vezes para chegar ao seu pulso. Trajava ainda um colete de couro de boi tão seco e velho que as rachaduras faziam com que parecesse um couro de crocodilo bem antigo. Certamente, Harry pensou, aquelas roupas tinham sido ganhas de segunda mão.
A cabeça continha poucos tufos de cabelos bem brancos espalhados esparsamente por uma careca lustrosa e cheia de manchas de velhice. O rosto era enrugado como um tronco de nogueira que se torna áspero com o passar dos anos. Os olhos eram pretos, mas ligeiramente descoloridos, e a íris já estava se tornando leitosa, sinal que a visão já não deveria ser mais como antigamente. Era ele a fonte das gargalhadas que eles tinham ouvido há poucos minutos, e ele ainda ria apoiado à lanterna, recompondo-se lentamente.
O outro, apesar de ser visivelmente mais velho que seu companheiro, parecia ser o mais jovial dos dois. Também usava uma roupa de algodão, mas a sua se ajustava perfeitamente ao corpo sem dar a impressão de terem pertencido a uma pessoa três manequins acima da dele próprio. Tinha na cabeça um chapéu de camponês feito de uma palha fina e amarelada sobre uma vasta cabeleira branca. Tinha uma barba comprida e branca com fios grossos e duros, que caía por cima de sua enorme e redonda barriga. Calçava botas longas de couro preto bem gastas e tinha na boca sorridente um cachimbo longo e fino do qual dava longas tragadas, enchendo o ar com um cheiro de fumo queimado. Ele também ria, porém com menos intensidade do que seu companheiro, e olhava displicentemente para a estrada aparentemente sem se dar conta que à frente tinha quatro pessoas paradas.
- Você é o melhor, Tom – disse o velho mais novo, entre risos – nunca ouvi algo tão engraçado em minha vida, e olha que já vivi bastante.
- E juro que é verdade, Simon – disse Tom, o velho barbado também rindo – Se não fosse por aquela mulher, nem eu nem a velha Iicha estaríamos aqui hoje para contar a história.
- Fale apenas por você – disse a mula calmamente numa voz esganiçada, olhando para trás onde estavam os dois velhos – Se depender de mim nunca mais entro naquele troço de novo.
Os dois rapazes se sobressaltaram ao ouvir a velha mula falar, o suficiente para chamar a atenção dos dois velhos que, até aquele momento, pareciam não ter se dado conta que não estavam sozinhos na estrada.
- Ora, ora, Simon, o que é que temos aqui? - disse o velho Tom, olhando para os rapazes na estrada com um sorriso no rosto – Parece que alguém virou uma curva errada por aí em algum lugar e se perdeu.
- Ora, mas não é que parece mesmo? - disse Simon, entre risos, olhando o grupo com seus olhos leitosos – o que diabos estariam fazendo esses quatro jovens num lugar perdido como esse? Estamos meio longe de cidades trouxas.
- Vocês dois são o quê? Cegos? - disse a mula, estreitando os olhos para o grupo parado na beira da estrada – Não vêem claramente que são quatro bruxos perdidos? São bem jovens, provavelmente ainda nem acabaram a escola.
Iicha parou a poucos metros de onde estavam Harry e Rony, na sombra do abeto, mas perto suficiente para dar uma boa olhada no grupo. Gina e Hermione, que estavam um pouco mais atrás, se aproximaram deles formando um grupo compacto.
- Ei, calma aí – disse Tom, descansando as rédeas de Iicha e inclinando-se para frente para dar uma olhada melhor neles, mostrando as mãos espalmadas para eles – A gente não vai atacar vocês. Não é como se fossemos uns malditos Comensais disfarçados.
- É, mas eles podem ser uns malditos Comensais – disse Iicha, a mula, olhando feio para os garotos. Harry percebeu que Simon, mesmo com o sorriso no rosto, tentou baixar a mão e alcançar alguma coisa no bolso da calça.
Rony agiu mais rápido, já que tinha a mão sobre o cabo da varinha. Quando Simon chegou à própria varinha, Rony já apontava a dele para a carroça. Harry também sacou a sua varinha, cautelosamente, e fitou os dois velhos sentados ali, olhando para eles.
- Ei, esperem aí, calma um pouco – disse Iicha sobressaltada, olhando as varinhas apontadas para eles – Não vamos nos precipitar! Ninguém aqui é um Comensal!
- Como é que vamos saber – disse Hermione, se intrometendo na conversa de repente – se vocês não estão nos enganando?
- É isso aí – disse Rony, apontando a varinha para Simon – vocês aí, mostrem os braços pra gente.
Os dois velhos levantaram os braços para o alto, deixando que os rapazes vissem seus antebraços e confirmassem que nenhum deles continha a Marca Negra, sinal que os identificaria como sendo Comensais da Morte. Eles pareceram se convencer porque baixaram lentamente a varinhas, mas o olhar desconfiado não desapareceu do rosto dos dois.
- Ufa – suspirou Iicha, olhando para eles mais tranqüila - por pouco vocês não cometem um grande engano, meus amigos.
- Não somos partidários de Você-Sabe-Quem – disse Simon para eles, tirando do bolso traseiro um lenço, com o qual limpou o suor da testa – muito pelo contrário, perdemos muitos parentes durante sua ascensão.
- É, aquele maldito filho-da-mãe nos causou muita desgraça – disse Tom. O sorriso havia desaparecido de seu rosto, substituído por uma expressão de raiva.
- Mas o que quatro jovens como vocês estão fazendo perdidos num lugar desabitado como esse aqui? - perguntou Iicha, intrigada – Não sabem que estes são tempos ruins para andar por aí sem a proteção de adultos?
- Estamos procurando uma vila chamada Portville – disse Gina, entrando na conversa – Mas já andamos algumas horas e não conseguimos vê-la em lugar nenhum, não imaginávamos que ela fosse tão longe.
- Ah, sim, a vila é bem longe – disse Tom com um sorriso, dando uma tragada no cachimbo e soltando alguns anéis de fumaça – ainda faltam pelo menos uns vinte quilômetros para chegar até ela.
- Mas por coincidência – disse Simon, encostando-se na boleia e cruzando os braços – é exatamente para onde estamos levando a nossa carga.
- Se vocês quiserem posso lhes dar uma carona – disse Iicha abanando as orelhas – mas vocês devem prometer que vão guardar essas varinhas antes que alguém se machuque.
Harry considerou a proposta, olhando para os campos à frente que se estendiam até onde a vista alcançava. Olhou para o sol, que já estava bem alto em sua trajetória pelo sol, e decidiu que talvez fosse melhor aceitar a proposta dos velhos estranhos e sua mula falante.
- Acho que é melhor mesmo pegarmos uma carona com eles, pessoal – disse Harry aos amigos, piscando um olho para Rony de forma que nenhum dos dois velhos ou a mula visse – Chegaremos mais rápido dessa forma, e cansaremos menos.
- É assim que se fala, garoto! - empolgou-se a mula, dando um coice para trás comicamente – vamos lá, montem todos aí atrás que chegaremos lá num instantinho!
Os quatro subiram na parte traseira da carroça, próximos às caixas amarradas na boleia, e Iicha recomeçou seu passo lento e compassado, assoviando uma canção tranqüila. Simon virou-se para os garotos, ainda apoiado na lanterna enferrujada da carroça, e fitou-os com os olhos opacos e lacrimosos. Tinha um sorriso no rosto que incomodou Harry, mas os amigos pareciam mais tranqüilos agora que estavam indo mais rápido na direção da vila.
- Vocês ainda não responderam o que estavam fazendo aqui perdidos no meio do mato – disse Tom num sorriso, virando-se para o grupo tentando puxar papo – Portville é meio longe para um passeio matinal.
- É, vocês com certeza não moram por aqui – disse Simon, ainda sorrindo para eles – estão visitando algum parente aqui na região?
- Mais ou menos – disse Rony, encostando-se numa das guardas de madeira da carroça e espreguiçando-se – estamos visitando uma amiga da família que tem uma casa de campo por aqui, e ficamos sabendo que existia uma vila mágica na região.
- Pois é – emendou Gina – e como a única vila mágica que conhecemos é Hogsmeade, vizinha de Hogwarts, ficamos curiosos para conhecê-la. Só não sabíamos que ela era tão longe.
- Interessante – murmurou Simon, olhando para eles com uma expressão estranha – Vocês só pretendem conhecer a vila, então?
- Mais ou menos – adiantou-se Harry, antes que o resto pudesse falar alguma coisa – Também estamos precisando comprar alguns ingredientes de poções para um trabalho extra-classe de Poções.
- Estudando nas férias – riu-se Tom – vocês certamente são alunos bem esforçados, não é mesmo, Simon?
- Pode apostar – disse ele rindo, voltando a olhar para frente – no meu tempo não éramos assim, não.
Os dois velhos riram mais alguns minutos e continuaram conversando sobre coisas que não interessavam a nenhum dos quatro, de forma que o grupo ficou em silêncio. Hermione trançava os dedos, nervosa, enquanto olhava para o resto do grupo com uma expressão aterrorizada no rosto. Rony estava esticado na carroça, mas mantinha os olhos vigilantes aos dois velhos sentados no banco à frente. Gina encostara-se ao lado de Harry e agora girava a própria varinha nos dedos, produzindo uma pequena chuva de fagulhas douradas sobre a madeira áspera da carroça.
Eles continuaram em silêncio pelo resto da viagem. Iicha, que inicialmente parecera caminhar bem devagar, provou-se muito diferente depois de algum tempo. Em poucos minutos já desciam do outro lado do vale e serpenteavam rapidamente pela estrada de terra batida. Quando o sol estava finalmente em seu ponto mais alto no céu, lançando sobre eles seus raios quentes, Eles puderam finalmente avistar no horizonte as pontas avermelhadas dos telhados de telhas de barro e as chaminés das casas.
Eles seguiram por mais alguns poucos minutos pela estrada, e conforme avançavam Harry pôde perceber o quanto a paisagem mudava conforme o grupo se aproximava mais da cidade. A cerca de madeira velha que se tornara uma parte comum da paisagem nas últimas horas começava a dar lugar a cercas feitas com tábuas de madeira nova encaixadas lado a lado na vertical com pequenos espaços entre elas, cuidadosamente pintadas em cores suaves como branco ou azul-céu.
Logo à frente delas havia enormes jardineiras de tijolos onde seus donos haviam plantado flores das mais variadas formas e tamanhos, algumas das quais Harry jamais havia visto em toda a sua vida. Havia arbustos densos de onde brotava flores de pétalas lisas e amarelas como girassóis, mas do tamanho de um polegar de criança. Havia ramos de roseiras de onde brotavam flores roxas em cachos semelhantes a orquídeas, e que exalavam um odor suave de uva. Havia também pequenos chorões que lançavam seus galhos finos sobre a estrada, e em cujos caules flores brancas parasitas haviam se afixado deixando seus caules longos e finos se entrelaçarem como cipós formando uma cerca como a teia de uma aranha.
Todas estas maravilhosas flores e árvores enfeitavam a frente das casas que começavam a aparecer na estrada, muito antes de chegarem à cidade. Harry podia sentir o cheiro de tortas de maçã sendo assadas nos fornos e o cheiro de canela daquelas que já estavam prontas e agora descansavam tranqüilamente na janela, para esfriarem. Harry viu uma bruxa vestida com um avental de bolinhas vermelhas agitar sua varinha na direção de um cesto de roupas, que se levantaram sozinhas no ar e começaram a se afixar ao varal de corda com pregadores de madeira que também voaram de um balde próximo.
Nos gramados verdes dos quintais das casas crianças brincavam, lançando olhares esperançosos às suculentas tortas que descansavam no parapeito das janelas, e empinavam seus narizes no ar sentindo o cheiro da comida caseira do almoço que escapava pela porta aberta da cozinha. Rony olhava também esperançoso para as casas, e seu estômago roncou tão alto que Harry jurou que o amigo tinha engolido o leão da Grifinória. Os quatro amigos se entreolharam e caíram na gargalhada.
- O que vocês esperavam – disse Rony para os amigos, entre risos – Já é meio-dia, estou morrendo de fome.
- Tem um restaurante chamado Rei da Pradaria no final desta estrada – disse Simon para eles, rindo da exibição de Rony – A comida lá é uma das melhores que já comi nestas partes da Grã-Bretanha, apesar do preço ser meio salgado.
- Infelizmente, receio que vocês terão que ir sozinhos – disse Tom sorrindo, parando a carroça numa bifurcação da estrada à direita deles a estrada seguia em direção a um pequeno vale logo abaixo, onde podiam ver uma pequena fazenda – Nossos caminhos se separam aqui, amiguinhos.
Os quatro saltaram da carroça para a estrada e se despediram dos dois velhos e da mula Iicha, que seguiram pela estrada em direção à fazenda logo abaixo. Harry virou-se para a estrada que seguia em frente, em direção à cidade. Podia ver perfeitamente que, a uns cinqüenta metros do ponto onde estavam, a estrada de terra se transformava numa rua cuidadosamente pavimentada com paralelepípedos hexagonais por onde caminhavam alguns bruxos apressados. Ele assentiu com a cabeça para seus amigos, e todos seguiram em frente.
A vila lembrava em muitos aspectos o Beco Diagonal, com suas casas de pedra ladeando a rua de paralelepípedos, mas as vielas eram bem mais amplas e o volume de pessoas caminhando por elas era bem menor do que em Londres, de forma que podiam caminhar tranqüilamente pelas ruas sem se preocupar em trombar com nenhum bruxo passando apressadamente com os braços cheios de embrulhos ou caixas de ração para corujas.
Não que a pequena vila de Portville fosse desprovida de lojas, muito pelo contrário. Harry notou que deviam estar num vilarejo relativamente movimentado da região central, porque havia tabuletas por todos os lados indicando lojas com as mais variados. Lojas de logros e brincadeiras, como a Zonko’s, livrarias, lojas de ingredientes para poções, havia até mesmo uma alta dizendo vender artigos esportivos. Entretanto, a maior parte delas tinha uma faixa avisando que só retornariam as atividades daqui há duas semanas.
Harry supôs imediatamente que tinham vindo à cidade numa época de baixa temporada de vendas, provavelmente o início das aulas seria só dali a algumas semanas. Provavelmente, os comerciantes locais só abriam suas lojas nas duas semanas anteriores ao início das aulas em Hogwarts porque antes disso não havia procura por certos materiais. Ali deveria ser o centro de comércio da região, como o Beco Diagonal era para Londres e suas cidades vizinhas.
Entretanto, havia algumas lojas locais que estavam abertas para suprir a baixa demanda da região no período de baixa de vendas. Naquele instante, enquanto caminhavam em direção ao prédio com uma placa em formato de cervo adiante – que fez com que Harry sentisse um frio no estômago no mesmo instante – passavam frente a uma loja que vendia artigos diversos de bruxaria como pequenos caldeirões, plantas mais ou menos raras, comida e temperos. Uma placa num grande barril fechado com tábuas dizia “ração para lesmas carnívoras”. Seria como uma mercearia trouxa, mas que vendia os mais diversos artigos mágicos de uso diário.
O grupo seguiu em frente, não mais podendo ignorar os uivos famintos emitidos pelos seus estômagos, e chegou finalmente em frente ao restaurante indicado pelo velho Simon. Passaram por uma porta dupla, da qual apenas um lado estava aberto para dentro, e entraram no restaurante.
O cheiro de carneiro assado e purê de batatas tomou-os de assalto, antes mesmo que tivessem a oportunidade de poder olhar o lugar com mais atenção. Harry fechou os olhos e aspirou profundamente aquele cheiro maravilhoso de comida feita na hora, sentindo sua boca encher-se d'água. Rony olhava para os lados maravilhado, procurando a fonte de onde vinha aquele cheiro maravilhoso, e encontrou um garçom parado a alguns metros de onde eles estavam. Era um rapaz jovem e alto, de talvez uns vinte e cinco anos, com o rosto fino e olhos negros, e se aproximou do grupo com uma expressão cortês.
- Bem-vindos ao Rei da Pradaria, cavalheiros – disse ele, fazendo uma pequena reverência para os rapazes. Virou-se para as moças e fez outra reverência – e damas. Se puderem me acompanhar, terei o prazer de levá-los a uma mesa.
Ele guiou o grupo por entre as pequenas mesas quadradas arrumadas pelo interior do restaurante, seguindo para os fundos do mesmo. Harry aproveitou esse instante para dar uma boa olhada no interior escuro daquele lugar.
O restaurante não era exatamente o que ele tinha esperado ao ver a placa de cervo do lado de fora e as paredes de pedra com a pintura já desgastada pelo tempo. Por dentro, o Rei da Pradaria era muito mais luxuoso do que tinha imaginado. As mesas de madeira de lei estavam ricamente decoradas com toalhas finas e arranjos florais vivamente coloridos. Dentro, um candelabro de cristal pendia do teto de madeira, refletindo a luz do sol que entrava pela fresta das janelas e criando padrões coloridos no teto. Penduradas nas paredes havia várias tapeçarias retratando a região em tempos medievais, com grupos de gamos pulando alegremente pelos campos verdes.
O lugar estava relativamente vazio, exceto por um casal de bruxos que almoçava numa mesa afastada, num dos cantos do restaurante, e que mal deram pela presença dos quatro jovens bruxos que tinham entrado. Ele segurava a mão dela próximo a seu rosto, e o sorriso dele indicava claramente que estavam apaixonados. Gina corou ligeiramente quando viram a cena, e seus olhos buscaram o de Harry, que também olhou e sorriu. Os quatro bruxos foram levados pelo garçom até uma varanda que ficava no lado oposto do restaurante, onde havia algumas mesas para quatro pessoas dispostas em arco. Atravessaram uma porta balcão semelhante à mesma da varanda de Morgan, com vidros jateados de areias em padrões florais, e saíram novamente para a claridade do dia.
A varanda era coberta por um toldo vermelho que impedia que os raios do sol do meio-dia incidissem diretamente sobre as mesas. A varanda acabava num muro baixo de tijolos que a separava de um belo jardim logo abaixo. Uma grande carvalho se erguia logo abaixo e ajudava a proteger o local dos raios quentes do sol, e o restaurante parecia ter sido construído de forma a acomodar o gigante verde sem incomodá-lo. Duas escadas em arco desciam uma dezena de degraus até um pequeno passeio de tijolos que ficava logo abaixo, e pequenos bancos de madeira para duas pessoas repousavam calmamente aos pés do gigante, dando à cena um ar bucólico e romântico. Logo à frente da varanda, abaixo deles, havia uma fonte de água cristalina que parecia correr por debaixo do restaurante, onde pássaros sorviam pequenos goles d'água.
Os quatro amigos se acomodaram na pequena mesa que o garçom lhes oferecia, Harry de frente para Rony e tendo Gina e Hermione aos seus lados direito e esquerdo, respectivamente. O Garçom, que se apresentou como William, entregou aos rapazes o cardápio e retirou-se novamente para dentro do restaurante fazendo uma pequena reverência, deixando-os sozinhos.
A comida do restaurante era deliciosa, e Harry teve certeza que aquela tinha sido a melhor refeição que fizera na vida. Rony havia comido tanto que parecia ter engordado uns dez quilos, e Hermione e Gina riam de sua aparência estufada, mas o rapaz parecia ter atingido algum estado superior de existência tal era o sorriso satisfeito que exibia em seu rosto. Harry riu e olhou para baixo, no jardim, e sentiu uma dormência agradável tomar conta de seu corpo.
Ele levantou-se da cadeira, pegando uma taça da cidra de maçã que estavam tomando em uma mão e a mão de Gina na outra, e caminhou com ela tranqüilamente até a escada, descendo-a lentamente até o gramado verde logo abaixo. Nem se importou com o rosto abobado do amigo Rony para ele, completamente alheio ao que estava acontecendo além da agradável sensação de satisfação que o almoço havia lhe proporcionado. Sentia-se leve e feliz, sem a sensação de preocupação que o acompanhara até ali.
Rony observava estupefato Harry levar sua irmã para os bancos no gramado logo abaixo, e sentar ao lado dela de frente para a fonte onde os pássaros ainda tomavam água ou banhavam-se. Gina colocou a cabeça sobre o ombro do amigo, que começou a acariciar os cabelos da irmã lenta e apaixonadamente. Ela pegou sua mão carinhosamente e beijou-a de olhos fechados.
Apesar do espanto que sentiu, Rony sentiu algo se apoderando de seu corpo enquanto olhava os dois apaixonados sentados demonstrando o amor um pelo outro de forma tão clara e pura. Um fogo intenso se acendeu em seu peito e começou a dominá-lo como um incêndio que vai se alastrando por madeira embebida em gasolina. E ele se virou para Hermione sentada ao seu lado, que também olhava para o casal abaixo sem parecer nem um pouco espantada com o que estava acontecendo, e pegou sua mão como o rapaz dentro do restaurante fizera com a namorada.
Rony sentia-se ridículo, e tinha certeza que seu rosto estava ainda mais vermelho do que seus cabelos, mas não conseguia refrear este instinto que há tanto tempo tentava encontrar uma forma de escapar-lhe do controle. Hermione, sentindo o toque das mãos quentes do rapaz, desviou o olhar dos dois logo abaixo e olhou para Rony, apenas para perceber que o rosto do rapaz se aproximava rapidamente do dela, com os olhos abobalhados, mas fixos nos seus.
Rony não sabia o que o guiava, mas era algo mais do que o fogo que ardia em seu peito. Ele se aproximou do rosto dela com tanta vontade que a moça chegou a assustar-se e se afastar ligeiramente para trás, mas não conseguiu escapar dos lábios dele, que chegaram tão intensamente quanto era o desejo de beijá-la. Rony sentiu os lábios macios e quentes de Hermione sobre os seus e achou que jamais sentira algo tão doce quanto aquilo em toda a sua vida. Ele a abraçou e puxou mais para perto de si com a força apaixonada de uma represa que se despedaça e deixa fluir um rio há muito contido, aproximando mais o corpo dela do dele. Ele sentiu que ela ainda tentou esboçar uma reação, tentando afastá-lo sem muita vontade, mas acabou cedendo ao seu abraço e se entrelaçaram novamente, ela jogando os braços sobre os ombros dele e ele abraçado à cintura dela.
Levou algum tempo para Harry perceber o que se passava na parte superior da cena, onde os dois amigos se abraçavam com paixão, tão entretido que estava acariciando os cabelos sedosos de Gina e sentindo o seu perfume perto do rosto. Os dois ficaram mais boquiabertos ainda quando viram Rony levantar Hermione no colo e descer as escadas com ela em seus braços, ainda beijando-a como se não houvesse amanhã, e sentá-la em seu colo em um dos bancos próximos. Ela o beijava com tanta força que seus lábios ficaram vermelhos como brasa, segurando o rosto dele junto ao dela para que não recuasse um só milímetro, e ele a segurava pela cintura com as duas mãos e a puxava para si como se quisesse que seus corpos se tornassem um só.
Por um instante que pareceu um milésimo de segundo, o rosto dos dois se separou e eles olharam na direção de Harry e Gina, sentados abobalhados a poucos metros de distância e completamente ignorados até aquele momento. Os dois sorriram para eles e os olhares dos quatro se cruzaram por um instante, numa mútua aceitação de que tudo aquilo que deveria ser agora estava em seu lugar, e então os dois voltaram a se agarrar no banco, beijando-se e deixando extravasar todo aquele amor que por tanto tempo estivera escondido sob a teimosia de ambos.
Naquele momento, Harry teve a estranha impressão que havia algo que aquele beijo apaixonado entre os seus melhores amigos havia desencadeado, algo que começara quando ele beijara Gina pela primeira vez no gramado da mansão de Morgan na noite anterior. Enquanto a ruiva abraçava-o com um sorriso e colocava aqueles lábios sedosos nos seus, levando-o mais uma vez ao lugar maravilhoso que estivera quando os sentira pela primeira vez, ele ouviu um clique dentro de sua própria cabeça, como se as engrenagens do destino tivessem finalmente se encaixado e começassem agora a rodar, lenta mas inexoravelmente, em direção ao futuro que os aguardava.
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