A Rua dos Alfeneiros n. 4, Pel
1. A Rua dos Alfeneiros, n. 4, Pela Última Vez?
Enquanto aprontava tudo para quando os Weasleys chegassem, Harry ia rememorando todos os anos que tinha passado naquela casa. Definitivamente, não sentiria falta de nada.
Sempre se sentira feliz em ter que deixar os Dursleys e ir para a escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Seus tios nunca esconderam que não o queriam por perto, e que se permitiram sua presença na casa deles naqueles últimos dezesseis anos fora porque não tiveram escolha. Harry era um bruxo, como seus pais, e os Dursleys os odiavam. Aliás, odiavam a tudo e a todos que não se enquadrassem em seu estreito conceito do que era “normal”.
Agora que o momento de se livrar de Harry estava se aproximando, eles se mostravam mais satisfeitos, quase alegres mesmo, na expectativa de que o sobrinho completasse dezessete anos (idade que, pelas leis dos bruxos, se atingia a maioridade), para vê-lo sair porta afora e nunca mais voltar. E isso ocorreria no dia seguinte, dia 31 de julho de 1997.
Mas não haveria Hogwarts dessa vez. Nada de professores, colegas, aulas... Diante dos últimos acontecimentos, ninguém acreditava haver como manter os alunos a salvo. A segurança de todos, inclusive a de Harry, era Dumbledore. Mas ele também não estaria mais lá. O diretor e amigo estava morto, e Harry nunca sentira tanto o peso de sua responsabilidade como agora.
De agora em diante haveria apenas ele e a missão que sabia que somente ele poderia assumir. Estava decido. Mesmo que fosse diferente, que a escola reabrisse ao fim daquele verão, sabia que não teria como voltar a Hogwarts. Voldemort não iria descansar enquanto não o matasse, e não pouparia quem estivesse no caminho. Principalmente seus amigos.
Após o dia seguinte, inexoravelmente, tinha que encarar o que poderia ser o resto de sua vida – ou o fim dela.
O dia seguinte... O dia do casamento de Gui e Fleur também. Era este o motivo dos Weasleys buscá-lo hoje. Ou melhor, um dos motivos: sabiam que não teria para onde ir depois disso e Harry desconfiava que tivessem feito o casamento de Gui e Fleur se realizar no dia do aniversário dele só para terem certeza de que estariam com ele, a salvo, quando isso ocorresse.
Os Weasleys... Harry os considerava sua verdadeira família, não os Dursleys, com quem sua única ligação era o estranho acidente biológico que fizera tia Petúnia e sua mãe serem irmãs.
Não, com os Weasleys era diferente. Era uma família barulhenta de nove pessoas (sete filhos), que mostrara a Harry o que era o amor de uma família. Ou melhor: nove pessoas, um vampiro de sótão, uma comunidade de gnomos de jardins, e um gato que gostava de vestir pulôveres. E Harry adorava tudo. De fato, achava-a a casa mais maravilhosa do mundo.
Rony, o penúltimo dos garotos Weasley a nascer, era seu melhor amigo desde o primeiro ano em Hogwarts. O senhor e a senhora Weasley sempre o trataram como filho, passando todo aquele desvelo que tinham por seus sete filhos para Harry também. E Gina... Algo se remexia dentro do peito de Harry sempre que pensava nela, mas agora isso também pesava dolorosamente. Terminara o namoro com a filha caçula dos Weasleys para protegê-la, mas fora a coisa mais difícil que tinha feito na vida, talvez até mais que enfrentar o próprio Voldemort.
Destruí-lo havia se tornado sua meta, sua obsessão e, mais que isso, a consciência que qualquer possibilidade de felicidade que pudesse ter dependia do fim de Voldemort.
A campainha tocou. Harry sorriu e correu para a porta, já com as malas nas mãos, ansioso para ir embora com os seus amigos.
Antes que alcançasse o hall de entrada, Tio Valter se pôs na sua frente, com imensos bigodes de leão-marinho, o dedo em riste e os olhos perigosamente estreitados:
- Devagar, moço! Ainda está na nossa casa. Pode ser que seus amigos esquisitos achem normais esses modos incivilizados, mas...
Harry apenas levantou uma das sobrancelhas, em sinal de indiferença. Os maus tratos dos Dursleys já não provocavam mais do que isso nele. Então... Poooooom! Um barulho terrível se fez ouvir no jardim. Duda estava jogando futebol nos fundos, e tinha acabado de destruir um dos vidros da janela da casa.
- Dudinha, querido, tenha mais cuidado, sim? – para Tia Petúnia, o gordo e mal-criado filho de dezessete anos ainda era “Dudinha”.
A campainha voltou a tocar.
- Ora, mas que hora mais inconveniente para... – dirigiu-se à porta – Só podem ser aqueles seus amigos... – abriu a porta.
- Olá! – o senhor Weasley cumprimentou. – Como vai senhor Dursley? Lindo dia não?
Tio Valter resmungou alguma coisa com uma expressão de alguém que estava com algo mal-cheiroso debaixo do nariz. A aparência dos Weasleys não era exatamente “normal” quando tentavam se vestir como trouxas... O senhor Weasley estava com uma camisa havaiana e gravata, e a senhora Weasley com um suéter largo e saia xadrez que não combinavam de forma alguma.
O senhor Dursley não fez menção de se mover um milímetro, como se a simples idéia de deixar aquela gente entrar na sua casa fosse um insulto.
- Harry, querido! – a senhora Weasley exclamou quando o visualizou atrás do enorme Tio Valter. Entrou sem esperar convite, sendo seguida pelo restante da família. Tio Valter ficou lívido, o rosto passando de vermelho para roxo.
Seguiu-se uma profusão de beijos, abraços, apertos de mão e tapinhas nas costas. Os Weasleys tinham essa capacidade de fazer Harry se sentir querido. Lá estavam também Gui, o mais velho, Fleur, sua noiva, os gêmeos Fred e Jorge, e Rony, que lhe disse um “Eu não falei que os Chudley Canoas iriam se classificar?”. Quando naquela confusão de cumprimentos, Harry voltou-se para o último membro da família, parou subitamente, o rosto ficando vermelho, sem saber ao certo como agir.
- Er... Oi, Harry! – Gina disse, também sem graça, e estendeu a mão.
- Oi... C-como vai? – apertou a mão dela, esquecendo-se do resto do mundo.
Nesse momento, Duda entrou na sala, curioso com o motivo do barulho (afinal, só ele podia fazer barulho naquela casa). Ao ver Gina, os olhos de Duda se arregalaram. Então, passaram para as mãos dela e as de Harry, que ainda estavam entrelaçadas, e um brilho conhecido tomou conta deles.
Harry leu os pensamentos do primo com a mesma facilidade com que leria um livro. Conhecia aquela expressão: Duda se interessou por Gina. Porque ela era bonita, mas principalmente porque percebeu que HARRY a queria.
- Olá! Devem se lembrar de mim, sou Duda Dursley. Por favor, sentem-se...
Harry fechou a cara diante da reação do primo. Tio Valter passou de roxo para um pálido, uma coisa rara de se ver nele. Certamente, desaprovava tanto a amabilidade do filho quanto ela o surpreendia. Afinal, em ocasiões anteriores, Duda sempre tinha se borrado de medo de bruxaria. Harry tinha a desconfiança que aquela coragem toda vinha da certeza dele de que os bruxos estavam proibidos de atacar trouxas. Fechou ainda mais a cara quando Duda conduziu Gina para um sofá e se sentou ao lado dela, esquecido completamente dos demais.
- Então... – passou um braço no encosto do sofá, atrás da cabeça dela. – Você também estuda em... – Duda tentou se lembrar, e a atividade mental era, a toda a evidência, um verdadeiro esforço para ele.
- Hogwarts, sim. – Harry respondeu por Gina, o olhar feroz, pronto para atacar Duda. – Ela é uma ótima bruxa. Porque não conta para ele da vez que você transformou a orelha de Smith em asas de morcego?
Satisfeito, Harry viu o rosto de Duda empalidecer. Tio Valter bufou frente à “ousadia” de Harry em falar “daquelas coisas de magia” em sua casa. Como se tivesse sincronizado tudo, Tia Petúnia apareceu na sala e exclamou ao ver o filho sentado perto de Gina:
- Duda!!! – estava horrorizada por seu filho estar sentado perto daquela “aberraçãozinha”.
Estas coisas combinadas pareceram o suficiente para fazer Duda se levantar de um salto. Com proibição de leis mágicas ou não, Duda não arriscaria.
- Er... Se me dão licença, tenho que encontrar um colega da Smeltins... Um jogo de futebol, sabem?
Quando o garoto saiu da sala, passou por Rony, que aproveitando a posição privilegiada, ameaçou Duda discretamente com a varinha, o que fez o garoto se apressar na saída, lutando contra toda a gordura que dificultava seus movimentos. Afinal, pensava Rony, ninguém mexia com a irmã dele... E só tinha feito uma exceção para Harry porque era seu melhor amigo...
Harry se apressou em sentar ao lado de Gina, antes que Duda mudasse de idéia. Ainda lançava olhares furiosos para o primo. O senhor e a senhora Weasley entreolharam-se bastante satisfeitos. Nem tudo estava perdido, afinal. Eles ainda iriam ter Harry na sua família, o que lhes agradava profundamente.
- Bem, crianças, hora de ir. – disse o senhor Weasley, o que pareceu aliviar os Dursleys. – Temos um casamento para organizar! – e olhou carinhosamente para Gui e Fleur.
Gui ainda apresentava ferimentos bem feios no rosto, resultado da luta com um lobisomem no último ano, quando os Comensais da Morte invadiram Hogwarts. Para a surpresa de todos, Fleur, que parecia tão superficial no começo, mostrou-se irredutível quanto a se casar com o noivo. Nada importava para ela: o amava, e era o que bastava.
Harry mais que depressa pegou a mala.
- Adeus, Dursley. – o senhor Weasley se despediu, já não estranhando mais o fato dos tios não demonstrarem nenhum afeto pelo sobrinho que haviam criado (o que não o impedia de continuar achando o fato revoltante). – Senhora Dursley. – fez um aceno polido à Tia Petúnia despedindo-se. – Ah! Já ia quase me esquecendo... Espero que não se importem de termos estacionado no seu jardim...
Os Dursleys olharam desesperados pela janela.
- Mas não há nada lá... – Tio Valter disse, confuso.
-Er... Há sim. É que está invisível. Você sabe como é, os trouxas... digo, os não-mágicos não devem ver um carro voador. E também pela segurança de Harry... – fez um gesto, a guisa de desculpa. – Bem, vamos lá!
- Oh, Valter! – choramingou Tia Petúnia – O que os vizinhos vão dizer...
- Ah, não se preocupe, querida... – A senhora Weasley tentou consola-la. – Ninguém nos viu! Esse é o objetivo de um carro invisível, não é? – A senhora Weasley estava tentando ser amigável, achando que era a segurança do sobrinho que a preocupava, mas Tia Petúnia lhe lançou um olhar ao mesmo tempo zangado e de estranheza, como se a mulher tivesse duas cabeças.
Imediatamente todos bateram em retirada para o carro, ou melhor, desapareceram dentro dele. Quando estavam acomodados (o veículo estava enfeitiçado para se ampliar), o senhor Weasley deu a partida, e, ao se moverem, atingiram um gnomo de jardim.
- Oh, desculpem! – a senhora Weasley desceu do carro e, apontando a varinha, disse: - “Reparo”! – e o gnomo voltou a ficar inteiro.
Fred e Jorge se entreolharam, e Harry quase pode ver a mente diabólica dos gêmeos aprontando outra travessura:
– Ah, esperem! – Fred gritou da janela. - ISSO, não é um gnomo, eu posso garantir! Temos vários deles em casa!
Jorge, da outra janela, apontou sua varinha:
- Deixe que eu cuido disso: “Vera forma!” – e o gnomo de gesso se transformou em uma centena de minúsculos gnomos de cabeças maiores que o corpo e carecas, tal qual Harry tinha visto no jardim dos Weasleys.
Os Dursleys exclamaram horrorizados, mas a senhora Weasley interpretou aquilo de outra forma:
- Ora, não precisam agradecer! Se queriam gnomos de jardim, era só pedir para a gente, embora eu não possa entender porque alguém ache agradável ter estas coisas no quintal! Adeus! – e entrou no carro.
Enquanto o carro “levantava vôo” e se tornava invisível de novo, Tia Petúnia subiu em uma cadeira, tentando escapar daquelas criaturinhas. Tio Valter pegava a vassoura, tentando acerta-las.
A senhora Dursley rosnou para o marido:
- Que gente mais horrível!
E dentro do carro, Fleur disse, com seu sotaque francês:
- Qu`e gente horrrível!
***
Ana fechou o livro ainda sorrindo. Que pena! Hora de trabalhar. Adorava Harry Potter. Não sabia dizer por que, mas, realmente gostava. As coisas contadas no livro lhe pareciam tão... Familiares! Simplesmente não conseguia parar de ler.
O pacote com o livro tinha chegado naquela manhã, com os selos da Grã-Bretanha. Não havia remetente, o que era estranho tendo em vista os recentes atentados terroristas no território inglês. Certamente envelopes anônimos iriam levar a uma atitude mais desconfiada por parte das autoridades britânicas.
No entanto, como sua tia-avó estava por lá, e a própria Ana havia pedido para que aproveitasse a viajem e procurasse algo a respeito da série para ela, acabou esquecendo-se do assunto. O livro estava lá, era um fato.
Mas a surpresa e desconfiança voltaram quando leu o título. “Harry Potter e o Segredo de Sonserina”. Devia ser brincadeira. Ou uso ilegal da propriedade intelectual de J.K. Rowling, autora da série. Ora, Ana era fã de carteirinha, lia tudo o que era publicado a respeito e, DEFINITIVAMENTE, não havia sequer especulação quanto à publicação de um novo livro, quanto mais uma continuação da saga!
Com um suspiro, deixou o livro de lado. Mistérios para mais tarde. Quando tivesse tempo de resolvê-los.
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(N/A): Minha primeira fic! Peguem leve! Prometo que vai ficar mais interessante... Então, como todos os autores dizem... Comentem, por favor!
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