Capítulo único
Apesar de tudo, ainda te amo
Uma lágrima marejou em seus olhos e ele deixou-se cair em uma poltrona com o
porta-retrato preso entre seus dedos frágeis; se sentia mal com tudo o que
havia acontecido, porém, era o que devia ter feito e tinha essa certeza dentro
de si com ferocidade. Ainda podia sentir os cabelos loiros entre seus dedos,
enquanto ele a acariciava de leve e sentia seus lábios tocarem nos seus. Mas se
tudo aquilo estava realmente acontecendo, era porque ela provocara.
Não basicamente ele; os dois. Não conseguiam mais se entender e nem ter uma
conversa de uma hora sem ao menos brigar uma vez sequer. Mas como aquilo era
difícil; a presença dela ainda era forte, queimando dentro de si como brasa!
Mas teria que esquecê-la, quer quisesse quer não.
Eu tenho que me livrar de você
Porque o amor não é mais o mesmo
E você continua com seus joguinhos
Como se você soubesse que eu estou aqui para ficar
Eu tenho que me livrar de você
[Shake you off, Mariah Carey]
Sirius desvencilhou-se do porta-retrato e pousou-o ao lado da poltrona,
aproveitando para passar o dordo da mão nos olhos, secando-os e voltando-os
para a foto novamente; primeira dia de namoro.
Sentados sob a faia, na borda do lago, dois adolescentes sorriam radiantes
para a foto, acenando e mandando beijos; ocasionalmente, o Sirius da foto
abraçava a parceira e beijava-a de leve nos lábios, voltando-se para a câmera
e sorrindo de deboche.
Ainda podia lembrar-se claramente daquele dia.
O céu misturava o tom opalescente do alaranjado, com uma fina linha no
poente, onde um crepúsculo espreguiçava calmamente, parecendo contemplar-se
nas águas calmas no lago, que mantinha uma superfície lisa e sem ranhuras.
Na borda, quatro adolescentes riam alegremente, contando piadas um ao outro
enquanto uma garota entre eles, tentava prestar atenção ao livro entre os
dedos, embora fosse constantemente empurrada para os lados, no montinho
que eles faziam.
Irritando-se, ela puxou seu livro raivosamente e levantou-se de abrupto,
cruzando os braços e encarando-os com cinismo.
- Vocês são crianças, retardados ou simplesmente querem aparecer? - ela
vociferou, as veias da têmpora parecendo estar a segundos de explodir.
- Calma, Nicole, querida.- murmurou Sirius, levantando-se e segurando-a nos
braços. A juventude ainda mantida em sua expressão, ele tinha um cabelo
extremamente negro e até os ombros, um olhar másculo e sedutor e ombros largos
e retos, com músculos contidos, retesando levemente a camisa do colégio, que
estava dobrada até o ante-braço. -, venha, sente-se aqui e nós vamos parar de
brincadeiras, não é, pessoal? - Ele ergueu os olhos para os outros.
Lílian e Thiago murmuraram um humrum baixo, em uníssono e
sentaram-se novamente, aprumando-se hesitantes no gramado esverdeado.
- Hum - começou a garota, calmamente. -, me desculpe, Nicole, nós não
fizemos por mal...
- Tudo bem - disse a outra, irritada. -, eu não devia esperar outra coisa de
vocês, não é?
- Não coloque na segunda pessoa, querida, ou, você pode acabar se
dando mal...
- Lílian, por favor - murmurou Sirius, com um sorriso amarelo. -, controlem
os hormônios...
- Que tal tirarmos uma foto? - sugeriu Thiago. -, Poderia ser legal.
- Mas onde vamos arranjar uma câmera? - perguntou Lílian, o humor
melhorando consideravelmente.
- Lá está vindo Rabicho... e... a câmera.
Um garoto magricela e desengonçado, orgulhosamente segurando uma máquina
fotográfica com a lente com quase dez metros para a frente, cambaleava pela
relva, os cabelos ralos brilhando com a luz fraca do crepúsculo.
- Olá, pessoal - ele disse, o sorriso aumentando até quase rasgar seu
rosto. -, veja... câmera nova... recebi agora pouco, do correio! Que tal uma
foto?
- Era isso mesmo que estávamos querendo - exclamou Lílian, alegre. -,
vamos?
- Claro - respondeu Sirius. -, mas antes, eu queria falar uma coisa. -
virou-se para Nicole, que fingia estudar, o rosto semi-obscurecido pelo livro.
-, quer namorar comigo?
A garota demorou algum tempo para responder, abaixando o Mil e uma
maneiras de adivinhar, e o encarando com uma expressão incrédula no rosto.
- C-como?
- Namorar... tipo... eu te amo e você me confessou que... também me ama...
porque não...
- Claro - disse ela.
- Como?
- Claro - repetiu, segura. -, eu aceito!
Do lado, um grupo de alunas aplaudiram quando Sirius se inclinou para frente
e comprimiu seus lábios nos dela; Lílian apertou Thiago, puxando-o para trás
e deixando os dois apenas na mira da câmera.
- Pessoal, sorriam!
E então, quando eles se desvencilharam, o flash brilhou como um corisco
dourado no céu azul marinho, e eles se abraçaram, beijaram, acenaram e Nicole
deixou o livro cair no chão, frouxamente entre seus dedos, enrubescendo as
faces demasiadamente.
Parecia fazer tanto tempo desde aquela vez, porém, apenas alguns meses
haviam passado. Foram meses perfeitos, verdadeiramente; eles intensificaram o
romance nos tempos que se sucederam, até que todo aquele amor foi
misteriosamente esfriando. Eles quase não se olhavam mais e Nicole inventava
que tinha que estudar incansavelmente para os N.I.E.M's, embora ele soubesse
perfeitamente que tudo não passava de uma desculpa mal feita para não ter que
suportar os segundos em que ficavam sozinhos.
Sirius perscrutou o resto do quarto, passando lentamente o olhar pela cama de
dossel alto, a janela de caixilhos sujos, a cômoda com gavetas abertas e com
roupa pulando para fora. Depois pousou novamente os olhos negros na fotografia,
lembrando-se dolorosamente do dia em que eles terminaram o namoro...
Luau de verão
Hoje à noite, na beira do lago, realizar-se-á um luau, onde queimaremos uma
fogueira e festejaremos alegremente. Não esqueça de comparecer. Apenas pessoas
do quinto ano para cima poderão ir!
Os cartazes haviam sido afixados por toda a superfície de parede possível,
e, logo, o luau era o único assunto geral da escola. Os alunos que não podiam
entrar, andavam resmungando e planejando mil e um feitiços para envelhecer
alguns anos e comparecer à festa, embora Thiago e os outros soubessem
perfeitamente bem que nenhum daqueles planos iria dar certo - eles já haviam
tentado isso uma vez.
Então, às três horas da tarde, as aulas pararam e os mil alunos se
entulharam nos corredores, andando com um barulho elefantino e berrando
alegremente, comentando sobre a festa. Os que não podiam ir, se reuniram no
Salão Principal e resolveram jogar uma espécie de Quadribol, coriscando pelos
ares em vassouras antigas que conseguiram surrupiar do zelador Andrew Loghtton.
Quando finalmente chegara a hora do luau, Sirius arrumou-se rapidamente e foi
até a sala comunal, esperando Nicole descer; depois do que pareceu meio
século, a garota apareceu no patamar, espiando calmamente, como para
assegurar-se que ele não estava lá, embora não conseguisse tal façanha.
Um vestido de lavanda longo e reteso sobre seu corpo, relevando curvas
esculturais. O cabelo loiro recém pintado em um tom ruivo extremo, caindo em
cascatas nos ombros e emoldurando um rosto doce e angelical. Enormes olhos azuis
com delineador contornando-os sensualmente.
- Você está... simplesmente linda... estonteante - sussurrou Sirius,
piscando diversas vezes para ter certeza que era realmente aquilo que ele estava
vendo.
- Obrigada - respondeu suavemente Nicole, estendendo a mão para ele
beijá-la.
Curvando-se com gentileza, ele segurando os dedos pálidos dela entre os
seus, e tocou-os com seus lábios, querendo deslizá-los até a boca da amada...
mas ela logo desvencilhou-se e precipitou-se para o retrato da Mulher Gorda,
dizendo que precisavam se apressar.
Os jardins do castelo estavam simplesmente irreconhecíveis; o gramado que
outrora fora verde, agora estava ocupado por uma fração de areia branca e
fofa, que fez que grande partes das garotas que usavam sapato de salto, andassem
descalças; o lago, agora, tinha ondas e inclusive, alguns estudantes se
aventuravam a nadar, jogando água uns nos outros, ocasionalmente, um esguiço
mostrava que a Lula Gigante ainda estava lá.
Uma fogueira alta queimava no meio de tudo aquilo e Sirius e Nicole logo
acharam um lugar calmo para sentar-se, perscrutando a festa inteira sem trocar
uma palavra um ao outro.
Logo, Lílian e Thiago foram dançar e opinaram que seria bom que os dois
também fossem.
- Ah... claro - murmurou Nicole, taxativamente. -, vamos...
E começaram uma dança louca e animada, passando pela lenta, os corpos
cálidos encostados com languidez.
Mas Sirius não estava feliz; algo o incomodava e, embora sentisse que o seu
amor por Nicole era verdadeiro, percebia que ela parecia não corresponder
aquele sentimento. Nos segundos em que ele segurava sua mão com cavalheirismo,
tentando mostrar-se o mais romântico possível, ela desviava os olhos pelos
estudantes um pouco afastados deles, e Sirius pôde notar que pousara o olhar em
um em especial, encarando com algo nos olhos. Algo como... paixão!
- É ele, não é? - murmurou ao seu ouvido, calmamente.
- Ele quem?
- Não se faça de sonsa, Ni... é ele o amante, não é?
- Eu não faço idéia do que você está falando, Sirius.
- Não faz? - ele afastou-se dela, os olhos já enchendo-se de lágrimas e,
então, cerrou o punho, brandindo-o enquanto falava. - Dias sem nos olharmos;
noites sem saber onde você está; e... eu não queria te falar mas... Eu achei
uma cueca na sua mochila e ao menos que você goste de se vestir de homem nas
horas em que ninguém te vê, ela me parece caber direitinho naquele garoto ali!
- Ótimo, sr. Black. - rugiu ela. -, pois então agora que você sabe tudo,
pare de se meter na minha vida! PORRA! Eu não te agüento mais!
E girou nos calcanhares, indo até onde o garoto que ele indicara conversava
animadamente com os amigos e beijando-o calidamente.
Como aquilo ainda era doloroso, meu Deus! A presença dela ainda marcava
presença ali e ele podia lembrar-se do cheiro dela, da sedosidade de sua pele,
dos seus cabelos loiros deslizando por entre seus dedos...
Eles não pararam de se falar por completo. Uma ou outra vez dirigiam um bom-dia
singelo ou apertavam as mãos, dizendo que estavam bem e esse tipo de assunto.
Mas ele ainda sentia falta dela. Do relacionamento que mantiveram e de todos
os momentos bons que haviam passado.
E então, ele abriu a outra mão e dela caiu um envelope branco; fora com ele
que Sirius começara novamente a martirizar-se por ela. Um rapaz jovem viera
entregar-lhe, mas até agora ele não tivera coragem de abrir, relembrando-se do
passado que eles haviam tido...
Com um dedo fino, rasgou a aba do envelope e dele pendeu um bilhete curto,
naquela caligrafia fina e bem feita que ele reconhecia a quilômetros.
Tanto tempo se passou, e eu sinto que os erros pesam sobre as minhas costas
como um fardo! Porque apesar de tudo, eu ainda te amo, querendo ou não. Tudo
não passava de um mal entendido, quando eu achei que os meus sentimentos não
correspondessem mais aos seus... mas... agora tudo vai acabar. Talvez, quando
você leia isso, seja tarde demais para fazer alguma coisa. Mas deixo meu pedido
de perdão e meu voto de amor eterno, onde quer que eu esteja.
Seu coração acelerou demasiadamente, parecendo explodir dentro de si e ele
apenas deixou-se cair no espaldar cansado, sentindo que as lágrimas
invadiam-lhe os olhos.
A quilômetros dali, uma jovem loira terminava de encher uma taça de whisky
e depois derramar nela um pó branco; encarou-se no espelho mais uma vez e
tragou com rapidez o líquido, sentindo o efeito fluir em seu sangue...
Já faz tanto tempo
Mas as lembranças
Ainda queimam em meu peito
Ardentemente
As cartas esquecidas
Dentro de um livro
Às vezes reelidas
Lágrimas rolando...
É difícil entender
É difícil acreditar
É difícil aceitar
Mas você permanece aqui
É difícil entender
É difícil acreditar
É difícil aceitar
Mas você permanece aqui
Flores amassadas
Recordando dos velhos tempos
Dedos sobre as páginas
Sobre a sua caligrafia
Meu amor, por favor
Volte eu imploro
Meus pensamentos não conseguem
Se afastar de vc
É difícil entender
É difícil acreditar
É difícil aceitar
Mas você permanece aqui
[É difícil, Mac carey (euzito XD)]
- FIM -
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!