O Beijo



Capítulo IV

O Beijo

Eram cinco horas da tarde, Lícia e Thera já estavam impacientes aguardando os amigos em frente ao Caldeirão Furado.

- Dá nisso não usar relógio. Os infelizes já tão duas horas atrasados. Mais dez minutos e eu vou embora.

- Calma Thé, deve ter acontecido alguma coisa. Maya e Neon devem tá com problemas pra se livrar da Profa. Geller. - Não era novo para ninguém que a mãe dos dois era uma histérica convícta.

- Isso que dá não ter telefone. Sabe que eu nunca entendi esse lance de só usar coruja! Nada rápido, nada prático e nada limpo.

- Eu acho meio romântico! – Disse a garota olhando para a esquina, esperando ver os amigos.

- Romântico, Lícia? Romântico é caixa de bombom, flores, jóias e não um bicho fedorento cheio de pena bicando o vidro da sua janela. Se ainda fosse um pavão, uma águia ... Mas coruja ... Coruja é quase galinha.

- Nooossa! Enorme semelhança. Anda fala alguma coisa pra gente se distrair enquanto eles não chegam.

- Alguma coisa? Sei lá...Seus pais viajaram pra onde vez?

- Foram pra Turquia. Parece que surgiu algumas evidências importantes sobre a existência de Tróia por lá.

O pai de Lícia, George Boydes era um entusiasmado Arqueólogo que vivia se revezando em expedições pelo mundo e temporadas em casa. A mãe Katlin Bandardis Boydes era uma antropóloga, que atuava na área de pesquisa e de vez em quando viajava a trabalho junto com o marido, deixando Lícia em casa sozinha, como naquele momento. O casal era um típico casal Trouxa. A notícia sobre as tendências mágicas de sua única filha, porém, foi recebida com profundo encantamento. Para os dois, aquilo fora a maior descoberta que tomaram conhecimento em suas carreiras.

Mesmo com algumas ausências os pais da menina sempre foram bastante presentes. A criação de Lícia havia sido a mais normal possível, com direito a mãe carinhosa e as vezes super-protetora e pai zeloso e representante da autoridade no lar. Diferentemente de Thera eles não eram ricos e George e Katlin trabalhavam muito para sustentar a casa e a filha, ainda mais agora no mundo bruxo. Receber os amigos bruxos na ausência deles era algo que eles com certeza jamais iriam permitir.De qualquer forma eles jamais tomariam conhecimento em todo caso.

- Sei... – Thera conhecia os pais da amiga há muito tempo, mas sempre ficava impressionada com o interesse deles pelo que ela considerava bugingangas da antiguidade.

- Aí meu Deus! Aquilo ali é a Maya? - Lícia, que acabara de avistar os amigos à distância, parecia não gostar do que estava vendo. - Aonde ela pensa que vai vestida assim, tão ...tão...

- Brega! E a Tulace, já reparou? As duas tão parecendo um cruzamento de executiva daltônica com a Cher.

- Elas tão se aproximando, disfarça. – Pediu Lícia.

- A gente tem que disfarçar é elas. Eu que não vou cruzar Londres com essas duas alegorias a tira-colo. Você sabe algum feitiço pra transfigurar roupas? - Devolveu Thera.

- Não, ainda bem! Por que senão eu não ia conseguir resistir a usá-lo.

- Também não. O jeito vai ser elas irem assim mesmo. - Constatou Thera desanimada.

- Ótimo, mas se eu for vista por alguém, eu juro que digo que sou voluntária pra passear com doentes de umhospício.

Thera não teve tempo de responder, o grupo já estava perto demais.

-Oi, e aí, demoramos?- disse Maya sorridente, enquanto Neon levantava Thera no colo e Tulace abraçava Lícia.

- Não que isso, me larga Neon, que é que são duas horas, afinal? – Disse Thera séria.

- Thera sua gentileza me emociona. O atraso foi culpa delas. – Se defendeu Pietro.

- Mentira Pietro.Vocês é que ficaram de segredinhos na sala com a Sarah Black, nós levamos o mesmo tempo para nos arrumarmos. E fomos até bem rápidas se você for levar em consideração que pra gente é muito mais difícil se vestir de trouxa. A gente nem sabia direito a roupa que trazer pra ir lá, na ..., naquele lugar lá. – Explicou Tulace.

- As roupas que vocês trouxeram são parecidas com essas? - Perguntou Thera, que embora não tenha deixado passar batido o nome de Sarah Black achou por bem não questionar, afinal já estava entediada de estar tanto tempo ali, e aquela, com certeza, seria uma explição demorada.

- Por que você não gostou, Thé? – Indagou Maya.

- Pra dizer a verdade ..., a Lícia e eu estávamos justamente conversando sobre isso - disse Thera, puxando Lícia que a essa altura estava cumprimentado Pietro meio sem graça.

- Hãn, que?

- Fala aqui pra eles o que você estava me dizendo sobre o look das meninas.

- Eu disse que, bom, bem, eu disse que vocês me surpreenderam. – Disse Lícia olhando de Maya para Thera.

- Ai que bom. A gente tava morrendo de medo de nos vestirmos mal.- disse Tulace num tom de alívio.

- Vamos pra minha casa então? Thera você vem?

- Não esperta. Eu vim até aqui, só pra ficar esperando.

- Não sei, né?- disse Lícia, apontando o Neon com os olhos.

- RÁ RÁ RÁ ...Tão engraçadinha você.


-Qual é Sirius vai ficar me olhando com essa cara até que horas? – Disse Sarah sentada numa poltrona da sala, para o irmão que vinha da cozinha com um copo de suco.

-Até você se contorcer e cair dura no chão. Na boa Sarah, sai de perto, eu ainda não digeri essa palhaçada que você me meteu.

-Ah não é? Você preferia então que eu tivesse deixado vocês se ferrarem? Você é realmente muito mal agradecido e muito babaca também, pra levar tão a sério essa rivalidadezinha medíocre com o Tiago.

- Desde quando o Potter virou Tiago pra você? Que intimidade é essa? Viraram amiguinhos foi? - Sirius estava realmente furioso.

-Deixa de ser ridículo Sirius. Minha única relação com o Tiago Potter é na aula de Aritimancia que você não faz e você ta cansado de saber disso. E de qualquer forma o que eu faço da minha vida não é da sua conta.

- É, a partir do momento em que você também se mete na minha. Você não podia ter me mandado pra lareira do Potter, garota! De jeito nenhum, isso podia ter acontecido.

- Garota não, que eu tenho nome! Você não parecia tão exigente... E era isso ou a Irlanda seu imbecil...

- Dane-se a Irlanda, Sarah. Qualquer coisa seria melhor do que ficar devendo um favor a ele.

- Cara, ás vezes parece que você não pensa sabia? – Disse Sarah rindo de raiva.

- Penso, penso sim. Agora por exemplo eu estou pensando que graças a você, ele e aqueles amiguinhos dele vão ter motivo pra rir da minha cara o resto do ano. E você ainda tem coragem de perguntar até quando eu vou ficar com essa cara?

- Engraçado, eu no seu lugar teria raiva de quem me dedurou e não de quem tentou me ajudar. Eu posso até aceitar Sirius que você não tenha gostado da minha idéia, mesmo sabendo, e você também, que essa era a única alternativa. Mas na boa, eu sinceramente não entendo e não aceito que você descarregue toda essa raiva em mim. A minha intenção era te ajudar e você sabe disso.

-Sei? Eu não sei de mais nada Sarah. Você não tem sido exatamente muito sincera comigo nos últimos tempos.

- Tava demorando! Tá falando do que hein Sirius?

- De tudo. Dessa sua amizade repentina com o Potter, do seu relacionamento secreto com o Bradley, teve também a notícia do meu noivado, que se você não sabia, com certeza desconfiava e não me disse nada. Sabe, você não devia duvidar da minha inteligência, Sarah. Fica difícil acreditar em você desse jeito.

- Cara você tá sendo muito injusto comigo. Não existe amizade alguma entre eu e o Potter. Eu quanto ao Bradley, eu só tava esperando as coisas se firmarem, o Walden não tinha nada que ter te falado.

- Ao contrário de você o Walden não sabe mentir pra mim.

- Ah Ok! A partir de hoje eu sou então uma pessoa falsa e mentirosa.Nossa! Eu achava que você me conhecesse melhor Sirius.

- Pronto! Vai se fazer de vítima agora. Me poupa vai Sarah, não tô afim de melodrama.

-Não dá pra acreditar... Nossa como odeio você...

- Ótimo. Então me deixa quieto. – Disse ele sentando-se no sofá, finalmente tomando seu suco.

- Como você quiser, só não dirija mais a palavra a mim. – Devolveu ela se levantando.

- Não vai ser nenhum esforço. – Respondeu Sirius.

Dito isso, Sarah se retirou da sala, deixando Sirius ainda tomado pela raiva. Segundos depois o garoto pode ouvir o estrondo da porta do quarto da menina sendo batida no andar superior. Ele sabia que tinha sido agressivo com Sarah e pior, sabia que aquela discussão não seria resolvida tão facilmente como às outras que tinham de costume, no entanto a mágoa latente o impedia de se sentir arrependido.

Aproveitando que estava sozinho na sala ele se jogou no sofá procurando esfriar a mente, coisa que não foi possível devido à chegada repentina de Helen acompanhada por Caim Fortman.

Imediatamente Sirius, ajeitou a postura e fingiu estar lendo uma edição da revista “Tradição e Contexto” que ele apanhou na mesa de centro e que trazia sua tia na capa, dentro fotos de todos os Black da Inglaterra, a dele era uma que havia sido tirada enquanto estava comprando algumas miniaturas de vassoura para sua coleção numa loja em Saint Sossir. Nunca se acostumava com aquilo, na verdade a perseguição por parte dos colunistas sociais sempre o irritava. Não conseguia entender por que razão sua mãe ou sua tia alimentavam tal absurdo concedendo entrevistas.

Helen e Caim conversavam ignorando sua presença, ao que o garoto parecia não desgostar. Sirius ainda não sabia exatamente, do que Helen tinha conhecimento sobre sua saída matinal, mas a falta de pressa da mãe em dirigir-se a ele era sem dúvida um sinal favorável.

Helen se despediu de Caim agradecendo por ele tê-la acompanhado e logo em seguida o rapaz se retirou sem conseguir ter com ela a conversa que queria. Quando cruzou a porta da mansão Negra, porém, o menino não pode evitar que seu cenho se relaxasse. Era cansativo fazer o papel de bom moço para Hellen, nada podia ser mais chato do que fingir interesse e concordância com todas as convicções da madrinha.

Agora a sós, Sirius sentia um misto de curiosidade e apreensão.

Numa espécie de tortura silenciosa Helen sentou-se na poltrona ao lado do filho e pôs-se a ler também, um livro sobre lendas; do sofá o menino pode ler o título na capa, chamava-se: “A Cidade dos Hirtas, os exilados”.

Ficaram os dois assim por alguns minutos até que Helen quebrou o silêncio.

- Aonde você foi essa manhã? – Perguntou ela calmamente.

Sirius achou por bem, responder o óbvio embora não tivesse idéia de como continuar o assunto se a mãe insistisse.

- Fui até a casa da Tia Viviana com Walden e Lucius.

- Fazer? – Indagou ela, sem tirar os olhos do livro.

Sirius tentou ser rápido como alguém que fala a verdade.

- Queria saber notícias da viagem.

- E pra quê as vassouras?

- Quem te disse sobre as vassouras? – Devolveu ele sem pensar.

Helen mantinha o mesmo tom do início da conversa:

- Viram vocês, quando entraravam na casa das suas primas.

- E aí vieram correndo te contar? - Sirius se irritou - Posso saber o que tem de errado em eu visitar minha família?

- Nada. Acho até que você deveria fazer isso mais vezes. Mas responda, pra que eram as vassouras?

- Nós fomos praticar logo que saímos de lá. Temos um jogo em Hogwarts assim que voltarmos. – A mentira não poderia ser maior.

- Claro. Sabe? Seria ótimo se você estudasse com o mesmo afinco com que pratica esse esporte.

- Creio que isso jamais será possível mamãe.

-Pois bem, faça como quiser só nunca se esqueça de que nessa casa nós não aceitamos baixo desempenho.

-Eu sei disso. Você não me deixa esquecer. - Respondeu o garoto sério. Sirius era mais inteligente do que a média e não enfrentava grandes dificuldades com as matérias, mas sempre se lembrava daquela frase em época de receber suas notas.


Estavam todos eufórico, exceto Thera e a dona da casa Lícia, quando eles finalmente chegaram a residência da garota, um apartamento antigo, que os pais da menina diziam ter valor histórico, sem luxo, mas muito confortável apesar das vasta quantidade de objetos não identificados desenterrados de todas as partes do mundo. Os demais pareciam chegados de alguma ida ao parque de diversões ou de alguma grande aventura, mas toda a animação na verdade devia-se unicamente a uma viajem de metrô por Londres.

- Que raça de bicho é aquela?

- Não é bicho Pietro, é uma máquina. - Disse Thera com tom de tédio.

- Uma o quê? Mas como que aquilo entra embaixo da terra se não é um bicho?

- Por que abriram um buraco debaixo da terra antes do metrô entrar! – Continuou a garota quase pacientemente.

- Abriram como sem mágica?

- Com outras máquinas!

- Outras? Você ainda não me disse o que é esse negócio de manica! Têm quantas? Como que usa? Eu quero um troço desse pra mim, cara!

- Não é manica Pietro, é Má-Qui-Na! E é tipo assim, isso aqui, por exemplo, é uma máquina. – Disse Lícia calmamente enquanto ligava a tv para espanto de Tiago, Tulace, Pietro, Maya e Néon que deram um pulo pra trás quando na tela do objeto surgiu um homem apresentando um telejornal.

-Ele tá preso aí? Por onde ele entrou? Bem que dizem que você trouxas são estranhos! – Exclamou Pietro enquanto corria os quatro cantos do aparelho em busca de alguma porta que desse pra dentro.

-Estranhos? Nós? Você já olhou pro seu umbigo Pietro? – Irritou-se Thera. – Estranho meu filho, é pegar fogo e depois ficar rodando dentro de uma lareira imunda, estranho é ser sugado por uma meia e ir parar em outro lugar, estranho é ter como empregados uns coitados de uns bichinhos feiosos que amam serem escravos, estranho querido é...

-Thera, acho que eles já entenderam o ponto. – Cortou Lícia para depois observar a cara de incompreensão dos amigos e concluir: - Ou não, né? Em todo caso vamos deixar isso pra lá. Já são quase seis horas, é melhor nós começarmos a tomar banho e nos arrumarmos. Eu ainda pretendo comer antes de sair. Depois eu te explico melhor esse assunto de máquinas Pietro.


-Sarah posso entrar? – Disse Sirius com a cabeça para dentro do quarto, na porta entreaberta.

- Você já entrou. Não notou, estúpido?

-Ok! Eu mereci essa. Escuta, desculpa a forma com eu te tratei lá em baixo, eu tava muito irritado. Juntou tudo e eu acabei perdendo a razão. Olha, eu sei que você não fez por mal. Na verdade você foi incrível, se não fosse por você, há essa hora com certeza eu estaria fazendo minha mala para ir para a Irlanda.

-Que bom que você reconhece. Dizem que a gratidão faz bem a saúde. –Disse a menina sem tirar os olhos da página de seu livro sem lê-lo.

-Qual é Sah. Não faz assim. Eu já pedi desculpa. Que você que mais?

- Quero que você caia duro no chão e que me deixe quieta para eu dissolver a forma como você me tratou.

Sirius sorriu. Sarah usara suas palavras. – Sua idiota, deixa de ser rancorosa, dizem que o rancor faz muito mal a saúde.

- Dane-se!

-Ah Sah pára! –Insistiu o garoto em seu tom mais apelativo deitando na cama ao lado da irmã.

-Eu tô parada.

-Ok! Eu já entendi. Quando você quiser me perdoar eu tô no meu quarto. Mas Sirius não foi para seu quarto, ainda tinha algo a resolver.


Na casa de Lícia todos já estavam prontos para sair depois de horas de árduo trabalho das duas meninas nascidas trouxas, para vestirem os amigos de jovens londrinos. Thera trouxe roupas de todos os tamanhos, escondidas de seus quatro irmãos, para os garotos, o que tornou a tarefa de vesti-los até fácil em comparação com as meninas. Já que estas pareciam não gostar de nenhum dos trajes e insistiam em ir vestidas com os modelitos esdrúxulos que trouxeram de casa.

Antes de saírem, porém, todos estavam famintos e Lícia resolveu por a mesa para um lanche, todos sentaram-se rapidamente.

- Meninas, cadê os talheres?- Questionou Tulace confusa.

- Por quê? Vocês comem cachorro-quente de garfo e faca, Tulace?

- Na verdade Thé, nós nunca nem comemos isso!

-Cara, às vezes eu sinto tanta pena de vocês. Presta atenção amiga, MÃOS – disse a garota erguendo as suas próprias – SANDUÍCHE - apontando para o prato, - e BOCA – disse ela, abrindo a sua - Agora vamos lá, todo mundo junto, não é assim tão difícil quanto parece. Me acompanhem.


Após algumas batidas, a porta da mansão Fortman foi aberta por Pollie, uma das elfas doméstica da família.

- Em que posso lhes servir?

Antes que Sirius e Walden pudessem responder, foram interrompidos pela dona da casa, Anália:

- Saia Pollie. Sirius? Walden? O que fazem aqui?

- Boa tarde Sra. Fortman, viemos falar com o Caim. Ele tá aí?

- Está sim Sirius, ele está no quarto. Fique a vontade, você já conhece o caminho.

Sirius subiu a escada bufando, sendo seguido por Walden, que a essa altura já não tinha certeza se aquilo era uma coisa sábia a se fazer.


Em seu quarto, Caim conversava com um amigo um ano mais velho. Sirius já iria se precipitar para dentro, quando foi impedido por Walden. O rapaz também fez sinal para que o amigo ficasse em silêncio. E assim, ambos permaneceram ouvindo a conversa do corredor.

- Pois bem Caim é isso. Sexta haverá uma reunião. Acho provável que até lá já haja uma decisão sobre os que serão iniciados.

- E quais são as minhas chances Pavel?

- Ainda não sei ao certo, não depende de mim como você sabe. Mas pelo que tenho ouvido, suas chances são boas. Avery parece ter ficado muito satisfeito com o seu desempenho e com o da Abdelazir. Vocês obviamente se destacaram perto dos demais.

- O que me preocupa mais, é não saber nada sobre o último teste. – Insistia Caim jogando verde.

- Quanto a isso eu já disse que não posso dizer nada, é contra as regras.

- Eu sei, só queria saber como é que ...

- Não Caim! Agora deixe-me ir, preciso avisar aos outros sobre a reunião.

- Tudo bem, desculpe...

Subitamente os dois foram interrompidos pela presença inesperada de Sirius e Walden.

- O que vocês estão fazendo aqui no meu quarto? – Falou Caim nada receptivo.

Pavel, percebendo o clima ensaiou uma retirada: - Eu já vou indo Caim, amanhã nós conversamos...

- Pode ficar cara, nosso papo com o seu amiguinho vai ser bem rápido. – Impediu Sirius. Pavel encarou o garoto, que embora já o tivesse visto em Hogwarts, nem de longe sabia com quem estava se metendo.

Antes que algo pudesse acontecer, Caim se apressou:

- Então diga logo ao que veio Sirius. O que você quer?

- Eu vim só te dar um recado amigo. Se eu fosse você daqui pra frente eu pensaria duas vezes antes de dá uma de dedo-duro particular...

-Eu não sei sobre o que você está falando. – Devolveu Caim impassível.

-Não se faça de idiota Caim. Eu sei que você tentou me ferrar hoje de manhã, levando minha mãe até a casa da Narcisa. Você é ridículo. Tanta coisa boa pra fazer e você perdendo tempo me vigiando. Arranja uma namorada colega. Eu garanto que minha irmã não vai se incomodar, ela não tá nem aí pra você mesmo.

- Eu não sou obrigado a ficar ouvindo desaforo e calúnias dentro da minha própria casa... – Falar de Sarah trazia uma alteração involuntária para Caim.

- Então presta bem atenção no que eu vou te dizer agora, não tente me sacanear de novo, você não sabe do que eu sou capaz...

- Vai fazer o quê? Você acha mesmo que eu tenho medo de você Sirius, faz-me rir.

A essa altura quem ria mesmo era Pavel, com o absurdo da situação.

- Eu juro que eu queria entender qual é a grande vantagem de ser bajulador da minha mãe, ela te paga pra ser informante dela por acaso?

- Eu apenas respeito a sua mãe garoto, agora saia já daqui antes que eu resolva mandar uma coruja pra sua casa, contando sobre esse incidente, você teria que explicar a razão para está tão irritado com o que houve essa manhã. Isso é quase uma admissão de culpa. Afinal quem não deve não teme, não é assim?

- Faça isso Caim, e você verá que eu não estou de brincadeira. Eu posso até me dar mal, mas antes com toda certeza eu acabo com essa sua imagem de bom garoto. Você está muito enganado se pensa que me conhece só porque crescemos juntos. Não se meta comigo.

- Suas ameaças me soam como cartadas de desespero. Você nem se parece um Black , tendo tal atitude.

- Pois então me provoque, eu terei um enorme prazer em te apresentar o meu lado Black. Você se surpreenderia com a força da genética.

- Saia já daqui. Não me faça perder tempo.

- Depois não diga que não foi avisado.

- Tchau Sirius! Lembranças a sua mãe.

- Ah, por falar em minha mãe, não se iluda. Ela não tem real admiração por pessoas sem personalidade e sem originalidade. Essas ela apenas usa, como faz com você. E a propósito, boa sorte na reunião de sexta.

Sirius e Walden saíram batendo a porta. Caim envergonhado não sabia como encarar Pavel.

- Se você for aceito meu caro, essas cenas vão ter que deixar de existir.

- Eu sei, foi patético. Normalmente isso não aconteceria...

- Será? Difícil acreditar. Seu infenso conhece seu ponto fraco.

- O que? Como assim? Do que você está falando?

Pavel sorriu.

- Conhecer o que nos abala é uma das principais condições para a vitória. Eu espero que você seja aceito pela Serpente. Você tem potencial, mas tem muito aprender.

Glossário:

Infenso (do latim infensus) : Adverso, inimigo, contrário.


Após todos terem terminado de comer, e Lícia ter posto os pratos e os demais na máquina de lavar, o que gerou exclamações do tipo: - “Se isso não é mágica, e algum truque bastante parecido” – desceram as escadas rumo a portaria do prédio. O plano da noite era irem á uma Boite. Thera foi à frente.

- Presta atenção que eu não quero ninguém se perdendo! – começou Lícia – A Thé foi falar com o Tivory e já ela tá voltando.

- Tivory? Quem é esse cara?- Perguntou Neon.

- É o irmão mais velho da Thera. – Respondeu Lícia.

Tivory tinha 20 anos e era trouxa convicto, apesar de não ter nada contra as tendências bruxas da irmã. O rapaz cursava faculdade de direito e quando a Thera estava em casa fazia o papel de seu motorista particular.

A família de Thera apesar de ser trouxa não era nada convencional. Tivory na verdade era uma exceção no lar dos Owtclew, dada a sua normalidade. Todos a seu modo eram bem excêntricos naquela família onde a magia de Thera era coisa no máximo interessante. O pai da menina, Thomas Owtclew, mas conhecido como Dark T. era um cantor de rock pesado, cabeludo e mal encarado, porém simpático que ganhara popularidade há poucos anos na Grã-Bretanha do mundo Trouxa. A mãe, Tamara Aguiar Owtclew era uma ex-modelo brasileira lindíssima, que após o fim de sua carreira tornou-se uma estilista bem sucedida e conhecida pelas polêmicas de suas coleções. Desssa forma, a menina que não havia nascido rica, se tornara logo no final da infância uma filha de milionários.

Além de Tivory, Thera tinha outros três irmãos: Thór de 17 anos, um vagabundo convicto com características marginais e apelo punk. Tuano de 15, um pseudo-hippie, seguidor de Krisna, macro-vegetariano e que ultimamente preferia ser chamado de Taioby, seu nome de batismo na tal religião. E por último Talles o único mais novo que ela com 10 anos de idade, um menino bastante precoce para sua idade, que desfrutava da fama dos pais e apresentava tendências não se sabem homossexuais ou revolucionárias.

Todos consideravam que o convívio com eles era a razão do temperamento bastante diferente da garota.

- Afinal Li, você ainda não disse como nós vamos. Nós vamos naquela minhoca trouxa gigante novamente? – Perguntou Pietro com certo tom de entusiasmo.

- Não, não tem estação nenhuma lá perto. A Thé foi justamente ver se o Tivory dá uma carona pra gente de Kombi. - Kombi que Tivory, apesar de ter pais milionários fizera questão de comprar com suas míseras libras, fruto de um estágio muito mal remunerado.

- O que é carona? - foi à vez de Tiago perguntar.

- É... –Lícia balançou a cabeça como se para espantar algo da mente. – Carona, Tig é como nós chamamos quando alguém te faz o favor de te levar pra algum lugar.

- Sei...E kombi é o que? – Ele continuou.

- Kombi é um carro, um pouco maior que o normal, carro você sabe o que é né? Cara, às vezes nem parece que vocês fazem Estudos dos Trouxas, eu vou ficar impressionada se vocês passarem nessa matéria. - Disse Lícia olhando na direção em que a amiga deveria chegar, já ficando impaciente, mas de repente na direção oposta ouviu-se alguém gritar:

- Ei ! “Bora” povo! - Era Thera, já sentada no banco de carona da Kombi branca, que parecia bastante chamativa na escuridão da rua deserta.


Já era à noite quando os Abranson chegaram a Sandels, vindos de sua viagem ao Sul da Europa, onde haviam passado às festas de fim de ano.

Sirius, Lucius e Walden que ainda àquela hora estavam sobrevoando com suas vassouras a área verde do bairro, puderam ver quando o casal e sua filha única Ariana aparataram, na frente da mansão que residiam, a mansão da Pedra.

Ariana também pode avistá-los, mas com todo o seu esnobe e peculiar ar de superioridade não se deu ao trabalho de devolver o aceno dos amigos.

- Sabe que eu já tava até sentindo falta das grosserias dela! – Riu Lucius.

- É, eu sempre soube que você tinha um lado meio masoquista. – Brincou Sirius.

- Eu sou um sujeito multifacetado, meu caro. – Declarou Lucius.

- Bom gente, eu vou indo, já deve estar perto da hora do jantar. – Falou Walden já inclinando a parte anterior da vassoura para perder altitude.

- Eu vou com você. – Disse Sirius fazendo o mesmo.


Na volta da boite, Lícia, acomodou as amigas que estavam mortas de cansaço de tanto dançar, em seu quarto. Thera que havia se divertido mais do que imaginara achou melhor ir para casa.

Para os meninos Lícia empurrou alguns móveis da sala para os cantos e colocou alguns colchonetes no chão.

A saída noturna, para as tão populares matinês, era coisa comum para a menina, mas para seus amigos todos nascidos bruxos, a noite tinha sido bastante intensos e eles não tardaram em pegar no sono apesar de todo o entusiasmo com a situação.

Ela também tentou dormir, mas no meio da noite, despertou com sede e resolveu ir até cozinha. Ao passar novamente pela sala, já de posse de seu copo de água, mesmo no escuro pode notar que alguém também estava acordado, sentado em um dos cochonetes. Tentando não acordar mais ninguém a menina resolveu sussurrar.

- Quem ta aí?

Prontamente a vulto respondeu.

- Sou eu... Pietro. Lícia?

- Eu. Perdeu o sono?

Sem a mesma preocupação com o sono dos amigos, Pietro levantou-se no meio dos dois, Lícia teve a ligeira impressão que ele pisara na mão de Néon. Em seguida o garoto deu dois passos para frente, alcançando o interruptor do abajur, uma das coisas mais interessantes que ele aprendera a usar na casa da amiga, ligando assim a luz.

- Eles vão acordar. – A menina continuava a sussurrar.

- Duvido. Esses aí agora, só acordam quando estiverem com fome. Pode falar normal. Não tem chance de eles acordarem, eu garanto.

- Se você diz. – Lícia agora já usava seu tom natural.

Ao contrário do imaginado por Pietro, Neon tinha sido acordado pelo pisão que amigo dera em sua mão, mas achou por bem, tentar voltar a dormir.

- Eu sou um cara confiável. E aí perdeu o sono?

- Tava com sede, e acho que agora não vou conseguir pegar no sono de novo. – disse a garota enquanto se sentava no sofá que estava encostado na parede para abrir espaço para os colchões.

Pietro achou melhor sair do meio dos amigos e se sentou ao lado dela.

- Que bom. Assim a gente faz companhia um ao outro.- Ele disse.

Lícia sorriu de nervoso, ela não sabia ao certo como se comportar ou o que dizer perto do garoto. Pietro era lindo. Moreno, olhos castanhos cor de mel, um metro e setenta de altura, e um corpo bastante definido pelo quadribol. Além disso, era dono de uma postura altiva digna de um bruxo pertencente a uma família rica e imponente, coisa que ficava evidente mesmo com todo o ar despojado do rapaz.

Lícia era mais amiga de Tulace, a irmã dele, sua campanheira de quarto, e o contato dela com Pietro embora não se resumisse aos treinos do time de quadribol da Grifinória, do qual ela era a artilheira, e ele o goleiro, eram sempre atravessados pela presença do resto do grupo.

Todas as poucas vezes que os dois ficavam a sós a menina ficava sem graça, sem saber ao certo como agir.

Pietro por sua vez, parecia bastante à vontade e achou que aquela era uma ótima oportunidade de conseguir alguma coisa com a amiga, que ele sempre achara bastante interessante.

Pietro do alto dos seus 14 anos já era um galinha inveterado, trocava facilmente de companhias, mas mesmo assim Lícia não conseguia deixar de se encantar com todo o charme do rapaz. Fazia pouco mais de um ano que vira sua atração pelo menino se transformar em algo mais forte. Desde então, era uma tortura para ela assistir as incursões amorosas do garoto. Morria de ciúmes invariavelmente.

- E então, como vai o namoro com a Natalie?

-Quem? Ah...a filha do ministro? Cara isso vai me dar um problema... Mas como você sabe sobre essa história?

- Sua irmã me contou.

-Tulace, claro! –Ele resmungou. – Mas eu e Natalie não estamos namorando não, nem rola. Nós só ficamos de vez em quando. Por quê? Você ficaria com ciúmes, se eu tivesse com ela? – Disse ele como que brincando, mas se aproximando da garota.

- Eu? Que idéia. – Lícia estava vermelha. Não conseguia tirar os olhos do chão. Um silêncio se vez, segundos que para ela pareceram horas. Mas de repente para sua própria surpresa e também para a de Pietro a garota voltou a falar. - Por quê? Você gostaria que eu sentisse ciúmes de você?

Prevendo até aonde aquele papo poderia chegar, Neon que ainda não tinha conseguido dormir novamente, tratou de discretamente cutucar Tiago que estava deitado ao seu lado. Tiago abriu os olhos lentamente e não tardou em perceber o que estava acontecendo. Assim os dois permaneceram em silêncio ouvindo a conversa de Pietro e Lícia.

Com um rosto de menino travesso, Pietro sorriu e encarou a menina diretamente nos olhos.

-Você sabe mesmo como virar um jogo! – Disse ele numa alusão aos jogos em que a Grifinória começava perdendo e depois ganhava graças à participação da menina.

Ela ruborizou novamente e desviou o olhar.

- Acho melhor a gente ir dormir. – Disse.

Ignorando o que ela acabara de dizer, ele se aproximou ainda mais.

- Posso te beijar?

Ela olhou para o lado por uns segundos, sorriu e então voltou a fita-lo.

- Beijo não se pede ...

- Se você diz. – Sem hesitar o garoto arriscou um beijo, e foi correspondido.

Para Pietro aquele momento não era na verdade muito especial, embora fosse diferente. Ele nunca havia ficado com uma amiga. Mesmo porque ele não tinha muitas. Além de Lícia e Thera, que se tornaram próximas principalmente por conta do quadribol, Pietro tinha uma relação desse tipo somente com Maya, que sempre fora sua vizinha, e que com o passar dos anos se tornara quase uma irmã.

Para Lícia, porém aqule era um dos momentos mais felizes de sua vida.

Infelizmente o beijo não durou muito tempo, foi interrompido por Adler, a coruja de Eric Clifford que bicava impacientemente a janela do apartamento. Pietro se desesperou ao notar a presença da ave.

-Adler!

Tiago e Neon imediatamente se levantaram e não fosse pelo fato de Lícia já estar de costas, indo em direção a janela, ela facilmente teria percebido que ambos não estavam dormindo, devido a velocidade com que se ergueram.

Os três amigos se entreolharam, mas não ouve tempo para cumprimentos machistas.

A garota abriu a janela e a coruja prontamente adentrou a sala, deixando um bilhete cair nas mãos de Pietro, feito isso, o animal deu a volta e saiu novamente por onde entrou.

Pietro não parecia estar com muita pressa em abrir o envelope. Tiago e Neon, sabiam exatamente o porquê. Pietro era filho de um dos homens mais conservadores e moralistas do mundo bruxo. E Eric não deveria estar nem um pouco contente, com o fato de que o filho além de ter mentido sobre onde dormiria, estava agora na casa de uma trouxa.

Sem ter outra opção o rapaz abriu o papel e leu em silêncio. Em seguida virou-se para os amigos.

- É da minha mãe. Tia Agnólia foi até a sua casa Tiago, por que sonhou que o Neon não estava conseguindo dormir. ...Daí pra frente vocês podem imaginar o resto... – Pietro se deixou cair no sofá.

- Eu não acredito. Quando que ela vai parar com essas besteiras!Que droga! Agora a gente tá ferrado! – Reclamou Néon.

Lícia não sabia exatamente o que dizer. -Eu vou acordar as meninas! – Disse saindo da sala.

- Meu pai vai me matar! – Deixou escapar Neon.

- Seu pai? Tá bom... Sem comentários cara! – Disse Pietro irônico, com os cotovelos nos joelhos e as mãos na nuca.

Tiago permanecia mudo. Ele tinha consciência que de todos ali ele era o menos encrencado. Seu pai James Potter dificilmente se estressava com alguma coisa, na verdade ele até curtia algumas das suas “aventuras” e apesar de sua mãe Emma Potter estar provavelmente furiosa a essa altura, isso nem de longe se comparava com a situação que os outros dois teriam de encarar.

Os três permaneceram em silêncio por alguns minutos, cada qual imaginando como seria o fim daquela noite.

Tulace e Maya apareceram nesse instante na sala acompanhadas de Lícia. Tulace visivelmente mais tensa com a notícia. Pietro então se levantou e tentando parecer calmo disse:

- Arrumem as coisas logo! É melhor nós não os deixarmos esperando.

Antes de deixar o apartamento de Lícia, Pietro se despediu da garota com um beijo na face e disse:

- Desculpe...Eu não queria ter que ir embora assim.

-Tá tudo bem...Boa Sorte em casa!

Ele riu carinhoso. – A gente retoma esse assunto depois.

Ela ainda sorriu sem graça antes dele desaparecer pela lareira atrás dos demais.


Já eram quase duas horas da manhã quando Pietro e Tulace, Tiago, Maya e Neon atravessaram cada um a lareira de suas respectivas casas.

Tiago deu de cara com o pai, com sua cara tranqüila de sempre sentado na poltrona lendo calmamente o jornal de três dias atrás.

Ao ver o filho, James sorriu:

- Tiago...Tiago... – Balançou a cabeça.

- Oi pai. Boa noite? – Falou num tom de quem sabe que fez besteira.

- Pra mim com certeza. Já pra você... Acho que você está em sérios apuros, meu caro.

Tiago respirou fundo, limpou um pouco a sujeira das vestes e se sentou numa cadeira ao lado do pai.

- Eu já esperava por isso! Cadê a mamãe?

- Na cozinha, preparando o milésimo tipo de chá da noite. Temos chá de abóbora, chá de lentílias, de amoras, enfim...Chá de todas as cores e tipos que você puder imaginar.

Tiago sorriu. Chá era a única coisa que sua mãe sabia fazer na cozinha. E sempre que esta ficava nervosa, fazer chá funcionava como uma espécie de tranqüilizante.

- Mandei mal, não é?

- Essa eu não entendi, filho. Você sabe que era só ter nos pedido, nem eu nem sua mãe veríamos problemas em você dormir na casa de uma amiga trouxa.

- Eu sei que não. Mas vocês nunca iam concordar em mentir ou omitir do tio Mariom ou do tio Eric que eles iriam junto comigo.

- É verdade, mas eu poderia tentar intervir em favor de vocês.

- Não iria adiantar, pai! – Ele exaltou um pouco a voz.

- Talvez não, mas esse não é o ponto aqui. – A voz de James também pareceu soar mais firme. - Mentir para nós ou para eles nunca vai ser uma boa alternativa. – O homem então fez uma pausa por alguns instantes. – Quer dizer que vocês estão fora do campeonato? – Tiago sentiu ainda mais remorso, tinha escondido isso também. E era óbvio que seus pais haviam ficado sabendo do acontecido do último jogo naquela noite, através de Agnólia.

- Estamos. Eu ia contar...ou não, nem sei mais. – Foi sincero. – É que vocês podiam acabar achando que eu participei de toda a confusão, e eu então ia ficar mais revoltado do que já estou com essa história.

- Eu só terei motivos pra desconfiar do que você diz Tiago, se você continuar a mentir pra mim.

- Eu sei. Desculpe por não ter te contado sobre o quadribol. E desculpe por essa noite também, pai. Mamãe deve ter te perturbado por conta do meu sumiço.

- Você não faz idéia. Não foi nada divertido se você quer saber. Quando sua Agnólia chegou aqui desesperada dizendo que vocês estavam correndo sérios riscos, eu achei que sua mãe ia surtar junto com ela. – Falou James se lembrando da cena.

- Coitada da tia Agnólia. Acho que é melhor eu ir até a cozinha agora... – Falou desanimado, Emma com toda certeza não deixaria aquilo tudo passar barato. O menino sabia que iria ouvir ao menos umas duas horas de esporro quando se levantou.

- Boa sorte. – Sorriu James da cara do filho para depois virar calmamente a página de seu jornal.


Em seu apartamento, Lícia agora mais do que nunca não conseguia dormir. Estava preocupada com a situação dos amigos. Apesar do adiantado das horas a menina resolveu ligar para Thera.

- Alô! - Uma voz de garoto atendeu o telefone depois de várias chamadas.

Lícia nunca consiguira diferenciar pelo telefone a voz dos irmãos de Thera, com sono então era impossível.

- Oi, boa noite, desculpa. Quem fala?

- Tales. Quem é?

-Oi Tales, sou Lícia, amiga da Thera, eu poderia falar com ela?

- Peraí que eu vou ver se ela tá acordada.

Cinco minutos depois Thera atendeu o telefone.

- Alô

- Oi, te acordei?

- Não, tava acabando de arrumar minhas malas. Que foi? Aconteceu alguma coisa?

- Várias. Você quer as boas ou as más primeiras?


Maya e Néon atravessaram a lareira, mas tiveram que cruzar a saleta para encontrarem com alguém. A recepção, entretanto não foi tão simples como a de Tiago.

Na sala principal, Agnólia Geller, a mãe dos dois estava com os olhos vermelhos como se tivesse chorado por horas a fio e ao vê-los iniciou sua cena melodramática de sempre. Sendo assistida de perto pelo marido que permanecia sério e em silêncio.

- Graças a Merlim vocês estão salvos. Vocês perderam o juízo de vez foi? Vocês querem me matar de uma vez? Eu vi coisas horríveis acontecendo com vocês... Vocês não conhecem o mundo...ah não...não sabem dos riscos que estão por todos os lados... Vocês não podem fazer idéia do meu sofrimento de mãe...

Antes que a mulher pudesse prolongar o falatório, Marion Geller resolveu se pronunciar.

- Chega Agnólia! Você precisa se acalmar... Quanto a vocês dois vocês passaram completamente do limite dessa vez. Que decepção Maya!

A menina abaixou a cabeça.

- Até segunda ordem eu estou suspendendo sua autorização para Hogsmead, sua mesada e a sua assinatura da revista francesa. E quanto a você Neon, pode esquecer também a mesada e os passeios. E é claro a compra da nova vassoura também está anulada.

- Mas pai... – O garoto tentou argumentar.

- O que? – O homem devolveu irritado. - Contente-se por eu não lhe dar uma boa surra, que é o que você está merecendo. Não pense que eu já me esqueci de toda a história da pancadaria que se meteu! – Neon se calou de vez. - Onde vocês estavam com a cabeça? Dormindo na casa de trouxas, num lugar completamente desconhecido? Depois dessa eu perdi totalmente a confiança em vocês. Agora subam os dois! O trem de vocês saí amanhã as nove. Estejam prontos as oito, por favor. - Marion encerrou o assunto.

Sem muitas alternativas, os dois subiram as escadas rumo aos quartos.

- Até que não foi tão ruim. A mamãe vai acabar ficando com pena e autorizando a gente mesmo – Comentou Maya enquanto subia.

- Eu tô pouco me lixando pra Hogsmede Maya! Eu acabei de perder a minha vassoura, ou você não ouviu essa parte? – Devolveu o garoto irritado.

- Não sei pra que vassoura nova! Vocês estão fora do campeonato mesmo, Neon.

- Eu vou fingir que não escutei o que você disse... – Ele a encarou de cara feia para depois dar-lhe as cosras e sumir para dentro de su quarto no final do corredor.

- O que? Tô mentindo por acaso? – Ela falou um pouco mais alto para que ele ouvisse.

- Boa Noite, Maya! – Finalizou ele, num berro de dentro do quarto.


- ... e a gente se beijou!

- O QUÊ LÍCIA?COMO QUE EU PERDI ISSO?

- Ninguém viu na verdade. Tava todo mundo dormindo.

- Tá nas nuvens né? Pietrão, Pietrão...Não perde tempo aquele safado!

- Nem sei direito o que eu to sentindo...Com toda a confusão que eu te contei que aconteceu depois, nem deu pra curtir direito.

- E ele beija bem?

- MUUUITOOO!

- E agora? Como é que vai ser?

- Não vai ser nada! Foi só um beijo Thé, ninguém tá comprometido com ninguém.

- Era de se esperar mesmo. Do jeito que o Pietro é Galinha... Ah! Desculpa! Foi mal...

- Não. Tudo bem, até por que eu sei que ele não é o tipo que namora sério. Eu sempre soube disso. – concluiu Lícia disfarçando sua tristeza.


Assim que saiu de dentro da lareira, Pietro respirou aliviado por não encontar ninguém na sala.

- Não tem ninguém aqui. –Disse ele em tom sério já caminhando para os outros cômodos, enquanto Tulace ainda limpava suas vestes.

Ele não tardou em encontrar Marla Clifford parada na Copa. Ela parecia irritada e ficou encarando o menino em silêncio nos segundos até Tulace se juntar a eles.

- Tulace sobe! Eu já me entendo com você. Eu preciso ter uma conversa séria com o seu irmão antes.

A menina olhou para Pietro que pareceu dizer um “tudo bem” e em seguida saiu da sala em silêncio.

- Eu devia deixar você se entender com seu pai sabia?

Pietro permanecia calado.

- Eu só não faço isso Pietro, por que ele já um homem muito atarefado, cheio de responsabilidades, pra ficar se desgastando com você.

O menino sentiu o mundo sair de suas costas naquele instante. Ele não teria que encarar Eric.

- Sinceramente eu não sei mais o que fazer com você. – Ela continuou. - Sua madrinha me contou sobre o incidente do último jogo! Você pretendia me contar quando?

Pietro mantinha agora os olhar passeando pelas paredes.

- Nunca não é? É mentira atrás de mentira, armação atrás de armação...E agora como se não bastasse você resolve fazer amizade com os trouxas? E pior, ainda leva sua irmã junto. O que você pensa que está fazendo?

Como sempre ele era o responsável de tudo, nunca Tulace. Mas isso já não o irritava mais.

- Essa é a sua última chance Pietro. Mais uma das suas gracinhas e eu juro pra você, que coloco seu pai a par de tudo que você anda fazendo. Tudo! Fui clara?

- Foi. – Ele disse irritado.

- Daqui pra frente eu vou estar bastante atenta a você. E nem pense em repetir essa palhaçada. Agora saia!

- Boa Noite! – Disse ele ao se retirar com as mãos nos bolsos.

Quando Pietro chegou ao quarto, já havia esquecido das ameaças da mãe. Tudo que conseguia pensar era em Lícia e em como tinha sido desagradável ter de sair da casa dela daquela forma. Pensou no beijo e sentiu uma coisa estranha, uma vontade de ignorar a circunstância e ir novamente ao encontro da menina. Mas lhe faltava coragem ou lhe sobrava juízo. Se jogou na cama e aos poucos pegou no sono ainda pensando nela.


Na madrugada de quinta para sexta-feira , Caim Fortman, mal conseguiu dormir. Às quatro da manhã já estava de pé. A causa de todo aquele nervosismo era reunião com os membros da Sociedade da Serpente, que aconteceria somente dali a várias horas. Ele finalmente saberia até o fim daquele dia se seria ou não aceito e ser iniciado para ele era uma questão de vida ou morte.

Assim que alcançavam o quinto ano, aqueles dentre os alunos da Sonserina que apresentavam certas características peculiares eram convocados há realizar uma série de provas como forma de testar suas capacidades, habilidades e convicções.

A Sociedade da Serpente, uma ordem fundada por Amzalag Slytherin tataraneto de Salazar, tinha como objetivo preservar e honrar a integridade dos ideais propostos por seu tataravô. O posicionamento radical contra a miscigenação entre bruxos e trouxas era o principal pilar da organização. Além disso a ordem era um veículo de acesso e de treinamento a conteúdos mágicos. Principalmente a um tipo de magia, vulgarmente chamada magia negra, que fora retirada do currículo de Hogwarts com a saída de Salazar.

O funcionamento da Serpente, como era chamada a ordem por seus membros, é e sempre fora extremamente sigiloso. Todos os alunos quintanistas convocados para os testes de adesão eram impreterivelmente submetidos a uma poção que os impedia de falar sobre o assunto com pessoas não envolvidas. Outra forma de precaução era o fato de que ao fim da bateria de testes, os não aprovados, eram descartados com um feitiço de amnésia, sem possível reversão.


Naquela manhã, Lícia e Thera foram quase as primeiras a entrar no expresso para Hogwarts e logo trataram de reservar uma das maiores cabines, a mesma que elas e o resto do grupo haviam utilizado nas ultimas viagens.

Lícia mal conseguia disfarçar sua ansiedade, ficava se perguntando como seria lidar com Pietro depois daquele beijo.

Como moravam no mesmo bairro, Sandels, o resto do grupo chegou junto à estação, mas Tulace e Maya apareceram primeiro na cabine, já que os três rapazes, pareciam ter muita gente pra cumprimentar ao longo do trem. As quatro amigas se abraçaram, mas as saudades não eram tantas, fazia poucas horas desde o último encontro. Mesmo sem terem tido tempo pra conversar a respeito, Tulace e Maya foram rapidamente inteiradas da razão que estava deixando Lícia tão estranha.

Quando Pietro surgiu na cabine, seguindo Tiago e Neon, a garota sentiu o coração palpitar, mas manteve-se intacta sem dar nenhum sinal disso. Abraçou Neon, depois Tiago e por fim Pietro, da mesma maneira que sempre fazia nesses encontros. Ele por sua vez, também estava bastante apreensivo desde que acordara aquela manhã e quando a abraçou demorou um pouco mais do que deveria.

Os demais observavam em silêncio, tornando a situação ainda mais constrangedora!

Ele se soltou dela, abaixou a cabeça e riu. Riu do clima que estava no ar.

Pietro era muito espontâneo. Licia achou por bem desanuviar o ambiente.

-Que foi? Nunca viram não? – Perguntou! – Prazer, meu nome é Lícia Boydes, esse é o Pietro Clifford, nos somos amigos...e bem...- Ela olhou para ele que já tinha erguida a cabeça, mas permanecia com o sorriso na face, sem saber o que continuar a dizer, ele então completou...

- Bem... –Ele passou o braço por cima dos ombros dela. – Ontem foi muito bom, se é isso que vocês querem saber.

Todos riram.

- Isso! Foi muito bom e assunto encerrado! –Ela endossou.

Depois disso, todos se acomodaram e ninguém tocou mais no assunto. Contar sobre as recepções que tiveram em casa naquela madrugada, falar mal dos sonserinos que tinham usado a lareira dos Potter em total desespero ocupou a maior parte da viagem. Mesmo porque, Tiago e Neon já tinham ouvido toda a explicação da história, no tempo em que ficaram com o amigo fora do trem sem as meninas, e elas por sua vez eram muito mais pacientes e podiam aguardar a chegada em Hogwarts para aí então trocar confidencias na paz do quarto que dividiam.


N/As: Chegamos ao fim de mais um capítulo. Esse para nós é bastante especial, afinal o foco principal, são personagens de nossa autoria. Esperamos que eles tenham agradado de alguma forma.

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