Sangue por Sangue



Tom Riddle

@_TRiddle

Os passos do sonserino progrediam sorrateiros e friamente calculados pelos corredores naquela tarde melancolicamente cinzenta, úmida e gélida em Hogwarts.



Um silêncio quase total pairava pelas entranhas e arredores do castelo, cuja grama verde viva anunciava a renovação de suas madeixas provocada pelo período chuvoso que se instaurara pela região há algumas semanas. Grande parte do corpo discente havia se dissipado pelos terrenos de Hogsmeade a fim de aliviar a tensão estabelecida na escola não só por conta da figura autoritária de Dolores Umbridge, a mando do Ministério, como também pelas incertezas que a divergência dos boatos sobre o retorno de Voldemort provocavam na Grã-Bretanha e que reverberavam por aquele singelo núcleo bruxo acadêmico.



E aquele vazio, aquela taciturnidade, sacramentara as condições ideais para que Riddle finalmente pusesse em prática o que planejava há algum tempo, desde então realizando com a sutileza do cair de uma partícula de poeira importantes estudos acerca de padrões comportamentais e de rotina; dia após dia; noite após noite, sendo aquele estudo de campo tão fundamental para que seu plano fosse arquitetado com base em todas as possibilidades de acertos e falhas, a fim de ser realizado com a maestria impecável que não deixava rastros. . .



Fazia pouco mais de um mês e meio que vinha interagindo com Ginny Weasley após tantos anos de afastamento. E Riddle se surpreendia com o fato de que a dinâmica entre os dois havia se modificado tanto em tão pouco tempo.



Não só pela evolução da relação dos dois, como principalmente. . . pela forma curiosa com a qual as percepções de Tom haviam se transformado a respeito de Ginny.



A mágoa que a manteve afastada dele por tanto tempo já não residia nela, assim como não havia mais a opinião inteiramente desdenhosa e esnobe dele sobre a garota.



É claro; ainda trocavam farpas por vezes, mas. . . cada vez mais soavam tão somente como uma provocação leve e despretensiosa, obrigatória; motivada por fatores que iam além do que Riddle poderia simplesmente afirmar tratar-se apenas de divergências de ideias e tentativas de não só provar à ela sobre o quão certo ele sempre estava e estaria como também de provocá-la e irritá-la, até ela finalmente ceder e admitir aquilo à ele. . .



E esse era um dos motivos. . . que o faziam suspeitar de que havia algo errado.



Ele tinha de admitir; Ginny carregava consigo traços peculiares, que, ao mesmo tempo que o surpreendiam de um modo de fato inesperado, estranhamente soavam-lhe como se ele os esperasse o tempo todo. Ginevra sabia ser simples e conduzir o dia-a-dia com descontração, dando pouca importância para a opinião alheia a respeito de suas roupas e hábitos inusitados e muitas vezes improvisados; da mesma forma que era capaz de manter conversas interessantes e gostos substancialmente requintados e diferentes - vários deles indo de encontro aos seus.



Ele poderia passar horas ao lado dela que o assunto entre os dois parecia fluir tão. . . naturalmente.



A jovem Weasley, detentora de uma língua incessante e de uma impulsividade de pensamentos, também portava um poder e vontade dignos de sua apreciação. Não bastasse a bravura dela em defender o que desejava e acreditava, encerrava em si a ambição de provar para si e para os demais seu potencial, assim como sua inocência e sua astúcia e persuasão caminhavam de mãos dadas com tanta sutileza e agudez.



Já estava acostumado com o conforto singular que a presença da garota de feições belas e delicadas, tons tão alvos quanto sua ingenuidade, cabelos tão ruivos e ferruginosos quanto as chamas ardentes do sol e olhares tão vivos quanto os de um cristal de tons castanhos a brilhar com a incidência da luz trazia que não concebia mais a ausência dela, bem como às vezes sem perceber, porém dando-se conta posteriormente em breves momentos de auto indagação, da forma minimamente descontraída com que um pouco de seu âmago se revelava à ela de forma involuntária e sem o menor esforço; algo que não acontecia com notória intensidade - e porquê não descuido? - nem mesmo com Harry, Rony e Hermione.



E eram sempre aqueles momentos em que seu subconsciente sentia sua guarda abaixar que uma voz distante e preocupada reverberava em si.



Tentando alertá-lo.



Ele não queria dar ouvidos. . . não; seu subconsciente estava apenas desenvolvendo paranoias.



Afinal, sabia que Ginny era como qualquer outra; que a intimidade que tinha com ela era semelhante à que tinha com o Trio.



. . . . . . . . . Riddle sabia que isso não era verdade.



Pfffffff! Até parece que ele, um bruxo sempre atento e cauteloso, tão confortavelmente enclausurado e protegido pelas sólidas barreiras da indiferença e invencibilidade em volta de si, se deixaria permitir ser ludibriado tão tolamente por algo pífio que se achava abaixo de seus pés e que ele poderia esmagar se desejasse - somente para provar que suas crenças detinham sempre a razão.



. . . até que aquele dia na Irlanda lhe dera a primeira sacudidela.



O primeiro deslize.



Ele deveria ser completamente capaz de controlar quaisquer ameaças de sorriso impensado por parte dele  - ou melhor, sequer deveria tê-los - diante das demonstrações de furtiva timidez, dos sorrisos e do “eu” mais orgânicas de Ginny. Jamais deveria ter se importado se ela o interpretara mal ou não; se acreditava que ele estava fingindo ou fazendo pouco caso dela; jamais deveria ter se sentido ofendido e medíocre por ela ter se equivocado diante de suas palavras e de sua costumeira e crua sinceridade.



Jamais deveria ter se deixado preocupar de modo diferenciado por ela por razões que sequer era capaz de explicar.



E o fato de não possuir controle absoluto da situação - especialmente do que parecia ser dele mesmo -  fazia com que ele desejasse profundamente revirar Hogwarts inteira de cabeça para baixo e transformar aquelas antigas e robustas paredes em um amontoado de pó e destroços.



Extravasar, transmitir para o meio externo toda a sombra de caos angustiante e enigmático que tamborilava dentro de si.



Por todos aqueles motivos ele havia se afastado por um tempo de Ginny. Tempo aquele o suficiente para que ele pudesse se recompor. . .



Talvez aquilo lhe fosse um teste. Uma difícil provação - a mais complicada até agora - que caíra em suas mãos a fim de questioná-lo até onde seus limites eram aptos a chegar; para que ele mostrasse se realmente havia conquistado a invulnerabilidade que se esforçara por tantos anos para segurar nas mãos.



Isso. Aquilo era um teste. . . e ele mostraria mais uma vez que toda aquela situação lhe era nada.



Que Ginny era tão somente um detalhe trivial.



Uma pessoa agradável e de conteúdo, certamente, mas que não poderia abalá-lo nem influenciá-lo.



E ele não fugia de nenhum desafio.



. . . muito menos quebrava uma promessa.



Era por isso que, naquele instante, Tom adentrava invisível os aposentos emperuados de forma patética e desagradável com enfeites, tapetes felpudos e cortinas de veludo rosa, além dos inúmeros quadrinhos com imagens animadas de gatos - animais os quais Umbridge somente admirava a aparência por puro capricho, porque torturaria o mais indefeso deles se lhe fosse incumbida a tarefa de cuidar de um pequeno felino: ela não se importava com mais nada a não ser ela mesma.



Riddle havia deixado escapar para Ginny que estava planejando algo contra Umbridge, mas não lhe deu detalhes do como nem do porquê. Logicamente a vaca rosa merecia o sutil castigo por todas as ações que conduzira com tanto cinismo e hipocrisia até agora; mas havia uma que motivara Tom acima de tudo.



“Traidora de sangue.”



A sombra de ira iminente e silenciosa havia coberto todo seu ser por dentro naquele dia, sendo, desde então, remoída e alimentada com doses das mesmas motivações a cada passar de vinte e quatro horas; crescendo e se acumulando até poder enfim ser canalizada com todo um vigor taciturno e certeiro: o sangue quente da mais nova, marcado pela dor pulsante e pela quietude vexatória, parecia gritar em ira e sofrimento com o passar de seu polegar pela cicatriz na mão maculada de Ginny. Era como se ele conseguisse ouvir e sentir com muita clareza e tal qual presenciasse ao vivo tudo o que a garota tentou esconder por um tempo relativamente curto, mas que parecia infindável.



A hora do chá da tarde de Umbridge se aproximava. Sempre naquele horário, a bruxa levantava-se da sua cadeira que mais lembrava um trono desonrado pelo roubo descarado, descia os curtos degraus do assoalho de madeira com seus saltinhos altos, passava rente à mesinha de vidro e se dirigia à sala anexa, a qual improvisara para ser uma espécie de cozinha e despensa particular. . .



As íris cinzentas de Tom brilharam com a passagem da mentalização sádica de como os eventos que planejara aconteciam com tanta perfeição em sua cabeça.



Cada passo e cada instante conforme uma sequência impecável e derradeira.



Seus olhos encontraram agourentos e concentrados o andar de Umbridge, em seguida a quina da mesa de vidro. . .



“Devolva o que foi tirado,

na mesma proporção e intensidade

e faça voltar o que se foi.”



De repente uma pisada em falso. O salto alto da bruxa havia se partido, fazendo-a se desequilibrar e raspar profundo e com força a extremidade pontuda da mesa, soltando um grito agudo, curto e agonizante antes de desabar ao chão - por pouco suas mãos impediram que seu rosto bofeteasse o assoalho com um baque. Um feio corte havia sido produzido no braço de Umbridge e uma quantidade considerável de sangue escorria tanto dele quanto pingava da quina.



Dolores não tardou a se erguer, assustada, sua compostura vacilante e tentando inutilmente estancar a ferida que ardia como chama viva. O primeiro pensamento impetuoso que lhe ocorreu foi andar às pressas e desengonçada direto para Madame Pomfrey - já que era obrigação da medibruxa daquela escola lhe prestar os devidos cuidados; isso para não considerar o fato de que a espiã e inquisidora do Ministério sempre fora uma vergonha no que dizia respeito a produzir uma poção ou recorrer a um feitiço que remediasse a mais simples das feridas, porque sempre recorrera mediocremente, por meio da coação, ao demais para que todas as suas vontades fossem feitas - afinal ela nascera para ser servida.



Umbridge lançara um último olhar à sua sala antes de abandoná-la temporariamente e ir de encontro à uma Madame Pomfrey que jamais seria apta a ter conhecimento de ou empregar os meios para que o curto e intenso corte em seu braço não se estagnasse em uma cicatriz eternamente viva e ardente. E uma onda de mau augúrio fez sua espinha se arrepiar e sua confiança vacilar terrivelmente pela primeira vez: era como se tivesse alguém ali ou a presença de uma aura maligna e inexplicável, com a qual ela jamais queria ter o desprazer de cruzar em sua totalidade.



Talvez Sibila Trelawney não estivesse exatamente errada sobre suas ridículas previsões.



. . . maldita Adivinhadora!



Tom se aproximou do núcleo que utilizara para forjar o banal acidente e colheu gota-a-gota com um pequeno frasco de vidro que retirou dos seus bolsos o sangue denso e rubro que pingava da mesa, tendo cautela para não alterar o cenário e levantar suspeitas quanto à presença de alguém ali além dela - e um consequente atentado contra sua pessoa, o que faria o tiro sair pela culatra e agravar o tratamento dado aos alunos.



Era o último ingrediente do qual ele necessitava para produzi-la.



(...)



O sonserino dobrou impassível o último corredor no térreo e adentrou a passagem que conduzia à cozinha. Ginny costumava frequentá-la para um lanche ou divagações tardias àquela hora da noite em que somente os fantasmas circulavam esporadicamente pelos corredores. . .



E lá estava ela.



Tom parou a poucos metros da garota, observando-a com atenção.



— Então você está aí. . . o que obviamente não é nenhuma surpresa.





Ginny Weasley

@O7WEASLEY

Ginny tirou as meias e capa da invisibilidade, sentou-se sobre uma das mesas da cozinha e se encolheu dentro da velha camiseta das Harpias que usava como pijama. O local a agradava, a calma e algumas piadas de elfos eram o que a alegravam alí. . .por um lado ela queria ficar sozinha para pensar e por outro, desejaria que sua solidão não desse brechas para que seus pensamentos a sabotassem..



Seus olhos pairaram sobre a cicatriz em sua mão enquanto tomava uma xícara de chocolate quente com café. A simples menção daquele dia ainda a irritava, tanto pelo modo como foi feita quanto o que ela havia feito com aquela informação



Havia contado somente a Riddle sobre o ferimento, sobre a revolta que sentiu e aquilo a assustava. A relação dos dois ainda não era clara em sua mente, jamais esperaria que um ato de coragem no começo das aulas fosse render uma amizade tão. . . peculiar. Sua presença havia se tornado agradável, por mais que Ginny já soubesse as motivações de sua personalidade, se surpreendia pelo modo qual ele se portava, ou como ainda conseguia o tirar do sério. Os assuntos maduros e discussões infantis dos dois eram algo comum em sua rotina, são extremos que a fazem questionar o porquê de desenhar os olhos azuis oceânicos do mais velho com tanta frequência.



Talvez fosse o lado sentimental que era desejava esconder. . . mas gostava dele e do tempo que passavam juntos, ela deixaria um dois sorrisos escaparem mas jamais falaria em voz alta sobre o espaço que ele tinha conquistado em seu coração. Desde o dia na irlanda seus olhos passaram ao olhar com mais carinho e cuidado. Ver “Tommy” relaxado a fazia pensar se a guarda dele havia baixado, se Tom seria mais uma pessoa a quem ela gostaria de cuidar, contrariando seus princípios e o sentimento estranho em seu peito...ela o queria mais perto do que nunca, ela se preocupava.



Seu cenho se franziu em raiva apenas por pensar nele, não se falavam a certo tempo desde o dia na Irlanda, ele havia a bronqueado de forma tola e a deixado falando sozinha. Bufou de raiva ficando com os ombros tensos, porquê havia dado a ela um dia bom e uma memória especial para no fim do agir como um idiota?! começou a rodar um dos anéis em sua mão enquanto pensava sobre isso. A falta de sono e as preocupações em relação aos amigos havia tirado seu bom humor, suas pernas nuas se encolheram e ela apenas suspirou enquanto tentava ficar acordada.



Por alguma razão seus pensamentos voaram até os burburinhos que havia escutado algumas horas mais cedo, algo sobre Umbridge e a enfermaria. . . pouco se importava com a mulher,mas tinha medo de pensar que ela poderia ter machucado alguem tão friamente ao ponto de ter sido algo grave.



Estão tão imersa que não notou o garoto a encarando e arregalou os olhos sendo pega de surpresa.



— Está tentando me assustar?! Inferno. . .- ela disse puxando a barra da camisa e evitou olhá-lo. E lá estavam os dois, novamente sozinhos em uma cozinha. — É uma surpresa ver você aqui, pensei que comesse ratos mortos assim como as corujas em seus poleiros - disse incomodada e cedeu espaço na mesa para que ele se sentasse ao seu lado.



Tom Riddle

@_TRiddle

Riddle inclinara a cabeça tenuamente para o lado diante da reação dela, permanecendo com uma inexpressividade moldada com requintes sutilmente carregados de sisudez enquanto a observava em seus mínimos reflexos.



Teria se divertido com o susto não-intencional que causara na garota mediante outras circunstâncias. Mas ali, naquele momento, as sensações rançosas remoídas pela memória e orgulho próprio desde a Irlanda impregnavam o ambiente em uma tensão velada e desagradável, trazidas agora à tona pela presença da ruiva que experimentava a onda constrangedora tanto quanto ele, a julgar pelo desviar de seus orbes.



Felizmente os elfos não estavam naquele pedaço da cozinha para serem envolvidos por aquela aura incômoda.



Era em um misto de relutância e sentimento de que não poderia deixar de fazê-lo que Tom fora de encontro à Ginny. Aquela obrigatoriedade que o beliscava com força somente atiçava sua raiva por tudo o que a jovem Weasley andava fazendo o herdeiro de Slytherin passar, desde agir e reagir de modo que considerava fora de seus padrões seguros a vivenciar uma bagunça de sentimentos turvos em seu interior, enfrentando a miserável incompetência em decifrá-los e encontrar uma solução efetiva.



Ademais, um sistema orgânico não sobrevivia sem a luz do sol.



Mesmo os que se localizavam nas profundezas escuras e em ambientes inóspitos para a maioria das espécies: havia uma interdependência, uma origem em comum, com os elementos que banhavam-se da luz.   



— Não. Ratos vivos e que se debatem enquanto os devoro fazem parte do meu cardápio, mas tenho uma preferência por gatos e outros felinos que deem o azar de cair em meu covil — respondeu com uma frieza seca; um sarcasmo que vinha graciosa e naturalmente como modo de transbordar sua ranhetice e como forma involuntária de ataque ao que lhe importunava.



Não vá de encontro à ela; você não tem a menor necessidade de fazer isso!



Tom se aproximou da garota e se sentou no espaço cedido por ela, mantendo-se a poucos centímetros de distância de Ginny.



Encarava o nada no chão durante o breve instante de silêncio total que mais parecia uma eternidade naquela cozinha em que a iluminação amarelada e de focos menores, porém extremamente aconchegante e receptiva naquela noite tardia gélida, predominava.



Tom suspirou imperceptivelmente e enfim parecia acalmar-se por dentro. Finalmente foi capaz de encarar Ginny, sendo inundado pela estranha serenidade que ela costumava proporcionar; o perfume de peônia tão característico.



Olhou para a mão dela que havia sido machucada e tornou a fitá-la; o brilho habitual em seu cinzento profundo. — Me deixe ver a cicatriz — ele pediu; um tom autoritário e direto típico seu, porém brando e cuidadoso, jazia em sua voz grave e macia.



Ginny Weasley

@O7WEASLEY

Ginny tinha a mania tola de esperar os outros adivinharem seus sentimentos, se ela estivesse brava raramente falava o motivo, normalmente esperaria um pedido de desculpas que inflasse o seu ego, e sempre conseguia o que queria. Bastava alguns dias de silêncio e caras fechadas para que seus irmãos fizessem a sua vontade.



Mas Riddle. . . ele jamais faria isso. A presença do sonserino a irritava naquele momento, ele fazia pouco caso em relação a inconstância de sua presença, a ruiva pensou em dar a ele o “castigo do silêncio” por conta dos dias em que não se falaram, mas provavelmente seria mais doloroso para ela se conter do que para ele em ficar sem suas palavras.



Ela sabia que perderia caso tentasse travar um jogo de frieza com ele. E por que ela se importava? por um pequeno momento ela pensou em iniciar uma discussão por ele ter a deixado sozinha, mas. . . ela se sentia só? bobagem.



A jovem Weasley se perguntou por que ele estava alí, mas deixou que ele desse os primeiros passos.



Sua curiosidade falou mais alto que o sentimento de raiva quando ele sentou-se ao seu lado, inconscientemente, ela diminuiu a distância entre os dois e encostou seus ombros com sutileza. Os marshmallows que flutuavam em sua xícara pareciam menos confusos do que o que ela estava sentindo, suspirou pesado e encarou as peças de açúcar enquanto se escondia atrás das mechas cor de cobre que caiam em seu rosto.



Ignorou o comentário grotesco sobre suas refeições medonhas e apenas fechou o rosto por alguns minutos antes que seus olhos se encontrassem. O modo qual ele a encarava a fazia se sentir em um encontro de águas. . . mares tão diferentes e ao mesmo tempo tão parecidos, contrastando um com o outro, de modo superficial jamais se encontrariam, mas eram os mesmos caso fossem colocados em sintonia.



Apertou a xícara com força e o encarou de volta, seus ombros abaixando gradativamente conforme se perdia nos pequenos pontos azuis. Ao ouvir a pergunta deu seu melhor sorriso e. . . ergueu o dedo do meio da mão machucada em um gesto obsceno, sussurrando perto do rosto do sonserino de forma sorrateira :



━ Consegue ver? - suas sobrancelhas se ergueram e afastou o rosto de perto do mais velho enquanto sua risada meiga se espalhava pela cozinha. Ela negou com a cabeça sobre a pergunta depois de parar de rir e suspirou. ━ Você faz tudo de um jeito complicado, não é assim que se pede a mão de alguém. . . digo, eu. . . você entendeu.- revirou os olhos para o rubor em seu rosto e se sentou de frente para ele enquanto deixava a xícara de lado.



━ Ouvi dizer que ela fez com mais pessoas. . . até com os mais novos, Harry me mostrou a dele na madrugada passada. - seu sorriso pareceu murchar e ela afastou as mangas compridas da camiseta cor de esmeralda, entregando sua mão com calma e desviando o olhar da mesma. Talvez algum dia ela pararia de temer a vergonha da própria tentativa falha de se proteger. ━ O que vai fazer?





Tom Riddle

@_TRiddle

O sonserino ergueu a sobrancelha em um semblante tedioso diante do gesto de Ginny, fazendo-o parecer tolo e previsível quando na verdade. . . não o havia sido.



Tom empregou esforço considerável para que um riso sagaz e espontâneo não se exteriorizasse; para esconder sua real emoção assim como ocultava todos os seus sentimentos geralmente sem dificuldade, evitando dessa maneira conceder uma vulnerabilidade aos que o rodeavam. Não podia negar; gostava da audácia afiada e inesperada da garota e sentira falta de suas provocações; mesmo aquelas que instigavam o caos indecifrável dentro de si.



Como sentira. . .



A tensão azeda e embaraçosa que outrora envolvia ambos e o ambiente parecia ter se esvaído por completo como se o vazio em que haviam permanecido sem se falar até aquela noite nunca tivesse ocorrido. A proximidade com que o rosto delicado, pontilhado com algumas sardas e sobre o qual a cascata ferruginosa descia fez com que Riddle inconscientemente desviasse o olhar por um ínfimo segundo aos lábios graciosamente rosados da garota, tornando a encará-la com um olhar convicto e com um cintilar. . . ávido?



Foi com um protesto sigiloso que seu íntimo a testemunhou se afastar. . . Riddle a assistia quieto e reservado, aguardando pacientemente como um predador que a risada aprazível e singela aos seus ouvidos cessasse e só se pronunciou com um esgar malicioso pela postura momentaneamente vacilante dela e com pinceladas de ironia, como se a cogitação dela fosse completamente improvável, após ela terminar de falar. —  O que espera que eu faça, Ginevra; que eu venda todos os órgãos da pura e nobre família Malfoy no mercado negro bruxo, compre um anel de diamante azul e o ofereça à você em troca de sua mão? . . . Quanto melodrama oneroso!



A sobriedade e invisíveis névoas de melancolia, quietude, tornou a se fazer presente. Tom ouvia Ginny calado ao mesmo tempo em que sua cabeça não prestava muita atenção nas palavras dela, como se tudo o que ela estivesse lhe dizendo já fosse de seu conhecimento - e de fato o era.



Não respondeu com palavras às indagações da garota que virara o rosto em vergonha. Tomou a mão dela com a terrível e viva cicatriz e, analisando-a muito cuidadoso, retirou do bolso do casaco, com a mão livre, um pequeno frasco de vidro, em cujo interior jazia um líquido vermelho em tonalidade semelhante à vinho diluído.



Abriu o minúsculo recipiente, cuja tampa continha um filamento de vidro com a finalidade de um conta-gotas, e permitiu que algumas gotas do líquido pendessem da fibra com suavidade na ferida de Ginny.



Feito um tecido invisível, o fluido remendava a área danificada, diminuindo-a até que não houvesse mais resquícios da tortura provocada por Umbridge.



— Sangue por Sangue — Tom mostrou o frasco à garota após fechá-lo. — É uma poção que utiliza o sangue de alguém para restruturar ferimentos provocados por magia das trevas, baseada no princípio de que algo deve ser dado em troca; geralmente “algo que se foi deve retornar”. . . Nem toda lesão causada por intermédio das artes das trevas pode ser curada pela “magia limpa”.



“Digamos que os boatos abafados que ouviu mais cedo sobre Umbridge ter passado na enfermaria se deve ao fato de que um pequeno acidente por descuido próprio a acometeu”, uma linha sugestiva e simpática encurvou o canto de seus lábios.



“Em alguns casos. . . se combate artes das trevas com artes das trevas.”



Ginny Weasley

@O7WEASLEY

━ Não fale dos Malfoy perto de mim. . . e além do mais, as bruxas da minha família são pedidas em casamento de um modo muito específico, você jamais saberia, não é como se eu fosse dar a minha mão- disse encolhendo os ombros e revirou os olhos com seu tom, deixando um breve suspiro impaciente escapar.



Ela observou seus movimentos e apertou sua mão com força em aviso, não estava com medo, era apenas a reação interna que tinha sempre que eles se tocavam se manifestando tão involuntariamente. Seu olhar revezava entre o garoto e o líquido em contato com sua mão e Ginny franziu o cenho com o leve formigamento em sua pele. . .sentiu uma leve ardência e logo a marca profunda havia desaparecido como se nunca estivesse alí.



Encarou o tecido por vários segundos enquanto segurava a própria mão junto ao corpo e ponderou enquanto ele falava. Havia confrontado Umbridge apenas para que a marca em sua mão se curasse? Como ele sabia tanto sobre magia negra?. . . Ginny provavelmente estava com mais um de seus olhares perdidos, o misto de emoções trabalhando como engrenagens a mil por hora em seu cérebro, a procura de uma resposta a altura.



━ Você está bem? alguém viu você saindo de lá? - disse de modo infantil e seus olhos castanhos o encararam da cabeça aos pés, tão astuta e minuciosamente, mas ele não estava ferido, ainda estava metodicamente arrumado e alinhado dentro de suas vestes. Weasley apontou o dedo em seu rosto, se aproximando e se afastando várias vezes de forma contida, seus lábios se abriam repetidamente como se lhe faltasse palavras para o acusar de algo.



Ela estava sem palavras.



Piscou algumas vezes e se afastou dele ao se levantar da mesa, se virando de costas para o garoto. Um sorriso brotou em seus lábios sem motivo aparente. Respirou fundo e tentou fazer sua melhor cara de brava e voltou a andar furiosamente em sua direção, o olhando com raiva ao apontar o dedo em seu peito



━. Você briga comigo, me deixa plantada naquele porto como se eu tivesse feito algo de errado. . . some durante semanas e depois- você fez ela ir ‘pra enfermaria só para que a cicatriz sumisse?! e a troco de quê?- ela levantou a mão como se fosse bater em seu rosto e apenas afastou o cabelo castanho de sua testa, beijando a mesma lentamente e suspirou derrotada.



━ Obrigada, Tommy. - ela encolheu os braços como se seu “sermão” estivesse dado e brincou com a barra da camiseta antes de pegar uma xícara para ele no armário atrás do mais velho. Ginny resmungou em sussurro quase inaudível enquanto carregava uma expressão um pouco mais leve. ━ Ainda odeio você. . . estou ficando tão louca quanto.



Tom Riddle

@_TRiddle



— A existência de uma família tão medíocre quanto os Malfoy é tão relevante a ponto de você se importar com a simples menção a eles? — ergueu o cenho em sério desdém antes de exibir um sorriso fechado e enviesado, deliciando-se com os efeitos que sua provocação provocava na garota. — Ah, nada que seja uma complicada questão — fitou o teto por um mero segundo como quem fingia descaradamente parecer se esforçar muito para resolver um grande problema, então tornou a olhá-la sugestiva e ironicamente. — Basta que eu tenha uma conversa despretensiosa com seu pai para que ele solte a informação sem o menor esforço — e deu de ombros; os olhos brilhando insinuantes em seguida — sabe como é; ele sempre admirou um assunto cativante. . .



— É claro que eu jamais deixaria Umbridge levantar a mínima suspeita de minha presença — respondeu com um semblante neutro. — Adentrei a sala dela imperceptível a seus olhos e provoquei o acidente com telecinese; nada que fosse dispendioso. . .



Sua neutralidade ocultava a miúda indignação que desejava ganhar espaço e aos poucos conseguia. Ninguém esquecia o impacto e influência que sua presença provocava por onde ele passava, mas. . . Como Ginny poderia ter se esquecido de seu traço particular em tomar atitudes e arquitetar acontecimentos de modo a não deixar rastros?? Quer dizer, àquela altura, com o tanto que já haviam convivido, aquilo deveria ser de conhecimento trivial para ela. . .



Afinal de contas, Ele jamais permitiria que um atributo singular dela escapasse de seus sentidos.



. . . Esqueça! Isso é asneira.



Tom sacudiu sutilmente a cabeça, dispersando seu olhar para o vazio por um ínfimo instante, imerso em seu próprio universo, na tentativa de afugentar aquele pensamento indesejado e patético. . .   



Então sua sobrancelha se arqueou em estranheza e monotonia frente ao comportamento colapsado e indeciso, seguidamente de uma tentativa falha de acusação, como se Weasley estivesse agindo de maneira muito atípica. . .



Mas a reação do sonserino somente escondia e tentava evitar, inconscientemente, o calor confortante que se alastrava em seu peito como se sorrisse internamente sem pensar nem planejar; uma satisfação genuína.



Ele sabia.



Sabia que a imprecisão e vagueza nas reações e palavras de Ginny traduziam o inesperado positivo que ela sentira e a preocupação espontânea para com ele que jamais haviam tido; sabia o quanto o misto de vergonha e impotência haviam sido liquidados da garota com aquele simples gesto. Sabia o quanto aquilo a deixara feliz.



E aquilo, de alguma forma, o contaminava com contentamento.



Então suas feições se crisparam em indignada irritação, fazendo-o cruzar os braços - por pouco não se levantara para “ganhar” vantagem na potencial discussão; porém se segurou para manter a postura - por ela vir à tona e apontar-lhe o dedo, acusando-o de algo do qual ele não tinha a menor culpa - uma vez que era ela a errada naquela história.



— É lógico! — ele começou. — Você agiu de forma completamente infantil, Weasley, e eu--



Riddle não deu continuidade, deixando que o início de sua argumentação morresse ali. Primeiro porque talvez não fosse levar a lugar algum naquele momento, já que ele jamais iria expor com palavras claras o quão idiota ela o fez se sentir com a interpretação equivocada dela - e pior: o quão furioso ele ficava pelo fato de Ginny fazê-lo experimentar uma montanha-russa de emoções no escuro.



Segundo, porque ela não parava de falar - e sequer parecia tê-lo escutado. Simplesmente não valia a pena gastar energia com aquilo; ele não queria ter o trabalho de se indispor. . .



Até ela levantar a mão para ele.



Ele estava pronto; prestes a segurar o pulso dela e impedi-la de dar continuidade. . .



Mas fora surpreendido. . . por um beijo na testa.



Se a aflição e júbilo do emaranhado estranho e nebuloso em seu âmago discutiam palavras desconexas entre si em um sussurro para não despertar o colapso tempestuoso dentro de si, naquele momento eles pareciam ter protestado um contra o outro em um volume ligeiramente maior, fazendo a cabeça de Tom enguiçar por velozes instantes.



Quantas. . . vezes ele já não a deixara ciente do quanto repudiava contatos físicos?



Ginevra conseguia ser deliberadamente irritante e inconveniente, fazendo pouco caso de seus limites!



Ele odiava a bagunça em que Ginny fazia seu ser se afundar.



Mas não conseguia nem queria esquecer o formigamento caloroso deixado em sua testa pela garota.



Seus olhos se arregalaram, visivelmente nervoso e prestes a reclamar, mas as palavras logo morreram na sua garganta.



. . . Seria perda de tempo naquela hora. Era melhor deixar para lá e fingir que não aconteceu.



Só desta vez.



Tom balançou a cabeça em negação para si mesmo enquanto Ginny dirigia-se ao armário atrás dele e suspirou em silêncio, apaziguando-se e relevando o ocorrido.



Não estava a fim de iniciar discussões.



Não foi realmente ruim.

 

Então o canto de seus lábios se envergou.



Ginny poderia ter achado que ele não ouvira. . . mas ele ouviu.



— Parabéns pela esplêndida conquista, Ginevra — ele provocou; a voz calma; mais tranquilo. — Acabou de entrar na infindável lista de pessoas que me odeiam. . . Mas o que espera ganhar enfatizando tanto uma óbvia constatação, um passe vip na fila?



Ginny Weasley

@O7WEASLEY

Depois de alguns segundos ela suspirou e começou a preparar uma xícara quente de chocolate para ele. Aquela era sua forma de agradecimento. Ginny acreditava que poucas coisas uniam as pessoas tão verdadeiramente, a comida era uma delas. Talvez fosse bobo e imaturo, ela não ligava. Suas orbes castanhas o olharam pela visão periférica vez ou outra enquanto colocava pequenas peças de açúcar em sua bebida, se lembrou da vez em que o “obrigou” a comer jujubas e ele a contemplou com a simples informação de quais tipos de doce agradavam seu paladar tão refinado.



“Paladar de velho” em outras palavras. Aquilo lhe arrancou um breve sorriso, assim como uma ruga de estranhamento quanto a finalidade daqueles pensamentos.



━ Odeio você pelos motivos errados, e não pelos motivos quais eu realmente deveria e é por isso que o odeio tanto. . . não me incomodaria em estar no topo de sua lista, não mesmo. Mas creio que sou irrelevante dentro da biblioteca mofada que você insiste em chamar de pensamentos. Me dê mais algumas semanas e quem sabe consigo atingir uma posição melhor, a conquistaria tão facilmente como uma partida de quadribol. - falou desafiadora antes de retomar o assunto que tanto estava intrigando.



Jamais a deixariam plantada e receberam silêncio de volta.



Não daquela vez e muito menos com ele. ━ . . .Eu não agi de uma forma infantil aquele dia. Você utiliza uma forma muito severa de se comunicar, abre brechas para que todos interpretem da forma que bem entenderem e ainda ousa ficar bravo caso a resposta das suas indagações não estejam coesas com a sua linha peculiar de raciocínio. . . estamos a um mês nisso, Riddle. Quando vai parar de me tratar como se eu fosse uma criança?



Ela respondeu calma na tentativa de ignorar seu gesto carinhoso a alguns minutos. A vontade de rir de seus olhos arregalados com o ato ainda estava alí, Tommy mal havia notado a marca clara de gloss de cereja em sua pele. Definitivamente adorava irritá-lo, mas a gratidão que calou seu orgulho. . . era verdadeira. O breve pensamento de que ele havia se preocupado minimamente com ela trazia uma sensação engraçada na boca de seu estômago, como se estivesse enjoada ou apenas como se fosse a âncora que a impedisse de falar demais em horas erradas.



Ou talvez só estivesse delirando. Afinal, ele jamais se preocuparia com algo tão tolo e mundano quanto sua opnião.



━ Jamais vou entender o que você tanto teme na morte, e não me refiro ao modo como morreremos ou se de fato iremos partir. . . mas sim ao conceito de “fim”. Para mim a morte é apenas o começo do que nunca iremos entender. Sei que não tenho toda a sua famosa experiência, mas morrer como uma heroína me parece uma boa forma de ir, Tommy. - Ela disse ficando a sua frente enquanto segurava a xícara destinada a ele na esperança de aquecer suas mãos. Seus olhos o encarando de modo indecifrável enquanto se revezavam por todo seu rosto.



Sua pele não parecia fria de perto, assim como sua personalidade. Ela gostava da pequena marca em sua bochecha. Talvez em seus pensamentos mais íntimos ousaria dizer que o pequeno traço o deixava atraente.



Por que diabos estava pensando naquilo? ugh.



━ Posso morrer em cinco dias ou em cinco meses, talvez cinco décadas se der sorte. . .uma hora esse momento chegará e não podemos o impedir, só posso dar a você a certeza de que vou viver minha vida da melhor forma, mesmo que aos seus olhos seja burrice.- deixou um riso anasalado escapar.



━Ainda tenho muito a aprender e muito a lutar, lutar pelo merecimento de estar rodeada por pessoas tão boas e lutar por meu espaço como bruxa. - Ela entregou a xícara e ignorou o suspiro gelado que saiu de seus lábios quando a geada que ela sempre fazia ao ficar nervosa havia se manifestado. Ela odiava o quão vulnerável ficava perto dele.



Vulnerável era a palavra certa para aquele efeito do misto de emoções tão presentes em seu coração.



━ Quero visitar todos os campos da escócia, fazer uma tatuagem, criar um feitiço, dedicar um gol para alguém. . . minhas ambições sempre estarão em contraste com o meu jeito imprudente de ser, eu creio que você não tenha sido o único a perceber isso. - suas mãos passaram pelos fios ruivos e pararam atrás de sua nuca, ela se sentia estranha sempre que soava séria ou sincera demais, como se aquele ar não fizesse jus ao seu humor. Não esperava que ele entendesse.



Não esperava que ele mudasse o conceito de “burrice” e entendesse que Ginny apenas vivia cada dia como se fosse o último. Que jamais iria temer seus próprios atos, não importava o quão caro o custo fosse, Weasley colocaria seus princípios e aqueles que ama acima de si mesma sem hesitar.



Como se estivesse envergonhada por ter falado demais ela mexeu os ombros incomodada e moveu os pequenos marshmallows em sua xícara para que formassem um sorriso. Suspirando ao olhar para a mão sem a cicatriz.



Ela jamais esqueceria daquele dia. Porém, ele havia trago momentos de paz assim como havia aumentado as dúvidas em sua cabeça. . . não era tão ruim quanto ela esperava.



Tom Riddle

@_TRiddle

Sua sobrancelha se arqueou em frio desdém e insinuação enquanto estava virado na direção do vazio na cozinha.



— Está mesmo disposta a enfrentar as consequências de atingir uma posição de destaque?



Riddle não manifestou sinais, na tonalidade sóbria de suas palavras, de interesse pela explicação minuciosa dos motivos de Ginny. Porque, curiosamente, as razões para que ele a odiasse eram tão erradas quanto às dela.



Talvez não fossem as exatas motivações que guiassem a garota. Mesmo assim. . .



Mal Ginny fazia ideia da posição especial em que ela já se localizava. Mas Tom não deixaria essa informação clara, ainda mais de modo tão fácil para ela.



Jamais exporia o que se passava em seu interior. Jamais concederia a ela sentimentos mais profundos ou confusos, que tão somente seriam sinônimo de vulnerabilidade.



Além do mais, gostava de desafiá-la.



Tanto quanto ela o desafiava.



Apreciava o quanto ela se empenhava para conquistar o que havia se proposto e, embora uma fração dele desdenhasse, duvidasse e internamente a diminuísse, havia outra que sabia do talento natural dela para vencer quaisquer obstáculos.



E ele queria mais.



— Não utilizei uma linguagem severa naquele dia, Ginevra. Fui apenas sucinto e analítico. Seu primeiro pensamento que agiu impulsivamente antes de considerar outras implicações às minhas palavras — respondeu calmo, como se o desentendimento daquele dia nunca tivesse ocorrido e se tratasse de um mero detalhe. Vez ou outra espiava de soslaio na tentativa de saber o que a garota estava fazendo. — O mundo não utilizará um discurso bonito e amansador para falar com você. Ele é hostil e a estraçalhará no primeiro sinal de fraqueza. Terá que aprender a lidar com isso se quer de fato viver como deseja, Weasley.



Pelo aroma no ar, ela estava preparando chocolate quente.



Riddle contraiu as sobrancelhas, curioso e. . . por um fugaz instante, admirado, não demonstrando isso em sua expressão comedida. A capacidade de Ginny em introduzir assuntos maduros em momentos inesperados - ou substancialmente propícios como aquele, em que o silêncio, olhares e a atmosfera do local diziam muito mais do que sentenças e aparências eram capazes - despertava seu interesse.



Ele a fitava com profundidade enquanto ponderava sobre suas considerações filosóficas acerca da morte.



— Eu não temo a morte, Ginevra — pôs as mãos em cima da mesa e as cruzou; o brilho tão convicto quanto as chamas que nunca se apagam em suas íris cinzentas. — Eu repudio a ideia de me esvair de modo tão banal sem deixar meu legado, meus ideais. Sem explorar todas as possibilidades em minhas mãos.



"O mundo é feito de ciclos. De fins e começos. Eu não quero simplesmente virar cinzas após cada ciclo e ser dissipado pelos ventos. Eu quero ressurgir como uma fênix a cada fim."



Tom odiava a morte no passado por ter sido a escolha, a preferida, de sua mãe em detrimento dele - talvez ele fosse, como tanto lhe disseram no orfanato, tão repugnante assim para que ela sequer se esforçasse para sobreviver -, até descobrir que, se seu asqueroso pai não os tivesse abandonado, como se eles fossem tão nojentos a ponto de contaminar os demais com um simples toque, aquelas desgraças nunca teriam ocorrido à ele. Nem à sua mãe.



Aquele havia sido um dos fatores para impulsionar sua ambição de querer se diferenciar, ter um destino diferente dos demais - e não morrer estava incluído no pacote. Detestava a ínfima possibilidade de ser fraco. Comum.



Mas ele nunca temeu a morte de fato. Pelo contrário.



Riddle sempre temeu o que ele não podia controlar.



— Ser um herói e agir como o protagonista de sua vida nem sempre é sinônimo de encarar os problemas de frente, expondo-se em demasia. Os feitos mais eficazes são conquistados pelos bastidores, estrategicamente arquitetados, se embrenhando e contaminando o sistema de dentro para fora - só então você poderá se expor e dar o xeque-mate como em um grand finale, se isto convier. . . não vê Umbridge? Talvez você inspire os demais a ter coragem ao desafiá-la, porém, se desconsiderarmos isso, não conseguirá nada além de tortura e a aplicação de decretos mais rigorosos no castelo que resultará em um regime inimaginadamente pior. Você só precisa aprender a ponderar, equilibrar, em que situações será melhor se revelar ao inimigo.



“Nunca discordei quanto à querer viver da maneira mais apropriada às suas aspirações. . . sua força de vontade e imposição de poder são instigantes, Ginevra. E embora pense que acredito se tratar de burrice, não acho que deveria apagar isso de você - nem mesmo se você o desejasse.”



Tom estava sendo sincero. Talvez nunca tenha sido tão honesto com os outros - muito menos consigo mesmo - tanto quanto vinha sendo com ela. E a luz amarelada do recinto refletida em seus olhos parecia intensificar aquilo.



Mesmo que seu íntimo acabasse fomentando e, em várias ocasiões, expondo certa presunção em relação à Ginny, ele não poderia negar tal fato.



Nem queria.



Seu rosto estava fleumático, camuflando certas sensações que reluziam enigmaticamente em seus orbes. Os longos períodos em que se entreolhavam em silêncio; as risadas infantis dela, os gestos que denunciavam a timidez e a maneira como inesperadamente o surpreendia parecia acender uma chama em seu peito e até mesmo provocar batidas irregulares de seu coração.



Como a xícara que Ginny acabava de lhe entregar.



((Você deveria ser capaz de controlar isso. Está perdendo o domínio de si próprio.



Que vergonhoso. . .))



O sonserino franziu a testa ao receber o chocolate quente e se demorou alguns segundos a fitando em sentimentos camuflados pela impassividade, mas embaraçado em sua própria concepção, enquanto uma tímida neve curiosamente começava a pender do teto e o primeiro floco caiu em uma de suas mãos.



O lugar havia esfriado; não por ação dele, voluntária ou não. Porém parecia morno e aconchegante o suficiente. . .



Riddle agradeceu em uma voz baixa e reflexiva que não utilizava com ninguém, levando a bebida quente à boca e a degustando com o pensamento longe; desde o sabor equilibrado do cacau até sua temperatura morna - nem quente ou fria demais - e sua textura - espessa no ponto.



Ginny. . . havia lhe dado algo estruturado em intenções genuínas.



E se lembrado da quantidade de açúcar que ele apreciava. . .



Aquilo fazia seu ser entrar em um estado de torpor e agasalho.



E, por mais que as vozes desesperadas dentro dele berrassem para que lutasse contra aquilo, ele não queria ouvir. Não daquela vez.



Aquele instante poderia durar um bom tempo.



Ginny Weasley

@O7WEASLEY

─ Estou, você não? - Falou confiante com o queixo erguido e negou com a cabeça como se a pergunta soasse boba aos seus ouvidos.



Estaria disposta a testar e provocar Riddle de vários modos. . . o pensamento de que semanas atrás ela jamais chegaria perto do garoto preencheu sua mente por alguns segundos, o medo enraizado tão amargamente em seu coração havia se transformado em uma bola de neve preenchida por emoções que ela não compreendia,e apesar do sentimento de mágoa ainda estar alí, ela o queria por perto.



Talvez Ginny tivesse se afeiçoado demais a ele, se acostumado com os jogos nada amistosos entre os dois, talvez se preocupasse minimamente com seu bem estar. . . ou até mesmo a pequena possibilidade de um comentário habilidoso dirigido a ela.



Aquilo a assustava.



Mas ela jamais fugiria de um desafio. Sabia muito bem como sufocar suas emoções durante muito tempo. Mas com ele? não, talvez não mais. Riddle era o fogo ou quem sabe a pólvora que explodiria o pavio curto da jovem Weasley. . . e diferente dele, ela não sabia a extensão de seus limites ou muito menos o que seus poderes fariam caso algo ruim voltasse a acontecer entre os dois.



Sua atenção se voltou fielmente em direção ao garoto enquanto seus olhos se distraiam com a tonalidade convidativa de seus lábios, ela mordeu os próprios e depois piscou algumas vezes como se voltasse para a atmosfera a sua volta e tornou a escutar suas palavras, um suspiro pesado escapando nasalmente.



─ Você sempre culpa o meu jeito impulsivo por muitas das nossas discussões e por mais que dessa vez esteja certo, olhe um pouco mais para o modo como você fala. . . eu não sou qualquer uma. - Falou severa o olhando com uma expressão séria. Estava indecisa entre encerrar aquele assunto e finalizá-lo de vez, por um segundo Ginny pareceu mais brava por ter sido destratada do que por suas palavras de fato. Seu orgulho se fere facilmente e ele sabe disso, o que a deixava com ainda mais raiva. ─ Seja diferente do mundo, a normatividade não combina com você.- Deu de ombros por fim.



Ginny se sentou ao lado dele enquanto afastava alguns flocos de neve de perto de si, um pequeno sorriso brotou em seu rosto ao ouvir sua constatação sobre a morte, as pequenas marcas de alegria surgindo no canto de seus olhos. Suas palavras não pareciam frias ou metodicamente arquitetadas naquele momento, ele soava sincero e aquilo a fez sorrir ainda mais. Sua irritação pareceu cessar. Ela não achava que ele merecia, não. . . mas decidiu o contemplar com todos os pensamentos que vieram a sua mente, sem filtro e sem se conter como de costume.



─ Você tem um legado. . . muitos irão o conhecer como Tom Riddle, herdeiro de Salazar Slytherin, ofidioglota e grande bruxo das trevas, mas eu? tsc.- Olhou para cima como se pensasse sobre o assunto e riu levemente.─ Não, para mim você será apenas Riddle, estudioso, péssimo ouvinte de diários, o encantador de cobras, o garoto mais- posso deixar esse item de fora…. um bruxo teimoso. Mas para mim - realmente - será apenas “ Tommy, amigo de Ginevra Weasley”.- Pronunciou seu nome lentamente para que ele saboreasse a vitória de tê-la chamado de Ginevra e revirou as orbes castanhas, ainda odiava aquele nome, e sabia que ele era o único que fazia questão de a chamar assim.



A ruiva pensou em mencionar Voldemort em seu legado, mas não conseguia associar o garoto ao seu lado com aquele que vinha causando tantos problemas, se manteria fiel aquele pensamento - mesmo sem perceber - até que Tom provasse que ela estava certa. Riddle jamais seria um herói, assim como jamais seriam um vilão aos seus olhos. . . naquele momento, era apenas ‘Tommy.Talvez ele entendesse o quão importante era para ela deixar que aquele pensamento escapasse, ou apenas ficaria bravo pelo tom debochado qual ela se expressava acerca de algo tão importante.



Porque ela ligaria se ele entendesse ou não?



Seus lábios se abriram diversas vezes em busca de argumentos que o refutassem em relação a seu heroísmo, não porque ele não estava certo, mas sim pelo fato de saber transcrever bem a forma como ela agia. Um incômodo grande e angustiante gritou em seu peito, como se ele tivesse quebrado uma pequena parede em sua moral e Ginny piscou algumas vezes ao ser elogiada, suas bochechas ficando tão vermelhas quando o fios cobres que caíam bagunçados por seus ombros.



Apenas negou com a cabeça como se estivesse em um pequeno retiro mental acerca das informações e colocou as mãos na xícara de Riddle como se o calor que emanava da porcelana a trouxesse de volta a realidade, a ponta de seus dedos se tocando sem que ela percebesse até que se afastará novamente.



─ Eu, eu. . . canela! um pouco de açúcar e marshmallows. - apontou para a xícara e passou a mão pelo rosto como se estivesse tentando ficar acorda e voltou a se sentar sobre a mesma.



“ ….Como diabos ele faz isso? se recomponha.



Tola, ouch...”



Alguns minutos se passaram em um silêncio levemente confortável para ela, as vezes ficar sem falar podia ser angustiante para alguém tão elétrico, mas gostava da plenitude no “estar” ao lado dele. . . nem sempre era complicado, nem sempre precisava ser. Um olhar tão sutil quanto um toque poderiam ser suficientes para um boa comunicação, muito melhores do que diversos sonetos que ela havia lido.



Ginny olhou para o relógio bruxo na parede e coçou os olhos, talvez fosse a hora de parar de afogar o péssimo sono em café. Seus pés balançaram enquanto estava sentada, já que os mesmos não tocavam o chão e ela sorriu para Riddle. ─ Boa noite, Tommy. . . obrigada por hoje.- Sussurrou sonolenta e quase inaudível contra o ouvido do sonserino e pulou da mesa, piscou para ele de um modo engraçado enquanto calçava as meias feitas de lã coloridas e fez uma careta apontando os pares que não combinavam .─ É melhor limpar a sua testa, vão achar que eu estou tentando marcar território- falou ácida e começou a cantar uma música trouxa enquanto pegava a capa da invisibilidade e a xícara que estava tomando.



“ In the middle of the day now baby

I seem to think of only you, hey, oh yeah “



Cantou distraidamente e inspirou o cheiro de chocolate uma última vez antes de sair dançando até a porta com as pêras, derrubando algumas fruteiras de modo distraído durante o curto percurso. A voz suave ecoando pela cozinha de Hogwarts antes que ela acenasse cordialmente com a cabeça e se escondesse sobre a capa. . . a música havia grudado em sua mente assim como os sentimentos confusos do último mês.



“ Uma noite de sono, apenas uma. Não esteja lá, azul “



Tom Riddle

@_TRiddle

 

— Você quer que eu fique no topo de uma lista de todos que me odeiam? Disparate, Weasley. Isso seria odiar a mim mesmo.



Suas feições eram sérias, inexpressivas; a voz inabalada. Mas carregavam um requinte de zombaria.



Riddle nunca permitiria transparecer todos os motivos que já o fizeram odiar a si mesmo e que ainda o assombravam como uma velha e longínqua história de terror de infância que vez ou outra sussurrava à porta quando se menos esperava: não eram capazes de lhe desestabilizar como já o fizeram pela razoável maturidade que desenvolvera até o momento, porém certamente haviam lhe deixado cicatrizes que incomodavam feito uma ferida que ardia ao entrar em contato com singelas gotas de álcool.



Porque, embora não fossem de sua responsabilidade, aqueles motivos eram fruto de fatos intrínsecos à sua existência que jamais poderiam ser alterados.



E, ainda que tivesse tratado o atrevimento de Ginny com presunção, no fundo tinha a sensação de que detinha perfeito conhecimento acerca do que ela se referia.



Estaria ele disposto a odiar a si mesmo. . . por navegar contra seu robusto status quo?



Se seu orgulho por um lado esbravejava pelo questionamento da ruiva à sua coragem, por outro argumentava que se tratava de pura tolice o ato de provar a outros algo que concernia apenas à si próprio e que manter a base sólida da segurança era primordial na construção de um indivíduo e de sua imagem. . .



Não tinha uma resposta clara para a pergunta que ecoava por seus pensamentos.



Só havia um único fato que afirmava e sempre afirmaria com convicção:



Que ele jamais estaria disposto a perder.



Foi com um aborrecimento velado que ouviu direto em sua face o ralho da garota sobre como ele deveria falar ou não com ela, como o deveria e seu pouco caso quanto sua singularidade, indiretamente acusando-o de estar sendo comum?!. . . quem ela pensava que era? Ninguém nunca se atrevia a afrontá-lo, ainda mais daquela maneira!



Ninguém nunca se atrevia a afrontá-lo. . .



— Me responda, Ginevra. Acha que eu realmente despenderia meu tempo lhe dizendo tudo que lhe disse e como disse se fosse qualquer uma?



Seu semblante era ligeiramente tedioso e ele a encarava com uma profundidade singular no olhar e que muitos poderiam considerar como intimidadora sem qualquer esforço. Apesar disso, não estava zangado.



Estava sereno. . .



Algo nas últimas palavras dela o deixavam assim.



Talvez. . . por ela parecer entregar nas entrelinhas que sabia de seu potencial de ser mais do que as aparências?



Aquilo também o alarmava.



. . . e ele esperava não ter dito nem entregado demais com o que acabara de dizer.



Ainda que o tivesse realizado. . . o mais prudente seria continuar mantendo a postura.



Decerto que sua forma mais severa e realista, porém sutil, de se expressar e falar com uma sinceridade bruta muitas vezes era reflexo de todo o invólucro de indiferença que construíra em torno de si, fundamentado pela revolta alimentada a vida inteira, a fim de impedir que o mundo o esmagasse como um animal fraco e patético e de permitir com que ele devolvesse na mesma tonalidade - ou pior, todavia sempre com um assustador e elegante sadismo - todas as agressões atentadas contra ele; e não só por isso como também intrinsecamente fazia parte de seu caráter e de sua natureza ser daquela maneira. . . agir diferente disso seria paradoxalmente agir contra o que ele era - ou acreditava ser ideal ser.



Mas. . . será que Ginny merecia um tratamento tão áspero quanto os demais?



Parte de si alegava que sim; como modo de rechação por ela exorbitar uma linha que não deveria ser violada.



Porém a outra negava.



Instintivamente o incentivava a ser o “diferente” sobre o qual ela se pronunciara.



Porque apenas desse jeito se aproximaria dela.  



Tom a cravava em silêncio enquanto ela expunha o tipo de pensamento guardado e que só seria testemunhado uma única vez; suas íris com um brilho significativo e indescritível, porém intenso, ao mesmo instante em que era invadido por um calmo bem-estar.



Se tivesse seguido o rumo de degradação mental e psicológica de sua contraparte certamente teria se ofendido com as declarações de Ginny, por na superfície terem a característica de diminuir as conquistas dele à nada.



Não que ele não apreciasse o legítimo reconhecimento. Mas, ali, com todo seu progresso pessoal, pôde perceber o quanto de profundidade estava arraigada na simplicidade daquela conclusão.



Infinitamente mais significativa e particular do que quaisquer linhas e linhas de elogio.



No começo tudo simbolizava a provocação e a competição que visava rebaixar o outro - e chamá-la propositalmente pelo nome completo era uma dessas atitudes; não apenas para mostrar um distanciamento e uma formalidade do sonserino em relação à ela.



Só que agora aquele nome incomum, atributo da realeza dos tempos do Rei Arthur, parecia desencadear o efeito contrário. E ele era incapaz de parar aquilo.



Mesmo se o desejasse.



Tom adentrava a toca escura do coelho cada vez mais. Afoito pela clareza e para retornar ao caminho de onde viera, mas também ávido por continuar cada vez mais fundo até obter a resposta.



Estava percorrendo um rumo sem volta.



Então ergueu sério a sobrancelha, embora não estivesse de fato sério. — “péssimo ouvinte de diários”? Não era o que vivia me dizendo na época.



Um esgar astuto moldou a linha de seus pensamentos, sendo externado para um dos cantos de seus lábios em seguida. Não apenas pelo saborear de quebrar toda a argumentação e postura de Ginny como especialmente revelar um lado dela que ela fazia questão de não deixar que os outros vissem. Gostava daquela timidez que subia em um vermelho abrasado por seu rosto, assim como da forma com que ela hesitava e tentava desesperadamente, sem sucesso, inserir outro assunto quando desconcertada.



Ele levou à xícara mais uma vez à boca pouco antes de ela começar a entregar os ingredientes que utilizara para fazer o chocolate quente.



Alguns instantes de um silêncio que organicamente dizia mais do que palavras e unia mais do que longas conversas ou tentativas de conquistar intimidade se estabeleceu entre os dois antes de Ginny manifestar os primeiros sinais de sono.



— Eu sei — confirmou sem se fixar em seus castanhos, degustando a bebida e aquela mudez tão confortante entre eles antes de modificá-la parcialmente durante o breve período em que terminou de se pronunciar. — Estão na dosagem ideal.



Ele retribuiu com um pequeno e esperto, mas sereno, sorriso. — Não foi nada, Ginevra — observava entretido e distraidamente Ginny manifestar de modo espontâneo mais uma singularidade sua - a de usar meias exageradamente coloridas e que em nada se harmonizavam - antes de ela fazer mais um comentário que o fez contrair a testa momentaneamente em estranheza e logo erguê-la. — Não poderão falar do que jamais viram e sequer sabem a origem. Além do mais. . . é preciso muito mais do que uma marca de batom para “marcar território”.



Obviamente que desagradaria a Tom se ele seguisse pelos corredores de volta ao dormitório, alguém notasse os vestígios de um beijo na testa e começasse a espalhar boatos de que ele andava se engraçando com alguma garota por Hogwarts com os hormônios à flor da pele - o tipo de associação da qual sempre tivera repulsa. O quão ridículo e fútil lhe soava somente em imaginar que pudessem ligá-lo àquele tipo de imagem. . .



Seria a ruína de seu orgulho próprio.



Só que. . . a noite se encontrava em um horário avançado, não haveria ninguém pelos corredores para reparar e, honestamente? Não estava com a mínima disposição para limpar sua testa naquela hora.



Porque tinha a inconsciente impressão de que aquela sensação que o massageava como nunca se esvairia se maculasse a região.



. . . por mais que a angústia em seu âmago gritasse e vociferasse para que ele não se permitisse influenciar. Não poderia sucumbir.    



Agora o leve aroma de morango que havia sentido estava explicado.



E, interiormente, fora surpreendido mais uma vez.



Ginny começara a cantarolar uma das músicas que ele mais gostava de ouvir, principalmente em suas caminhadas reflexivas e apaziguantes pelas selvas de pedra do mundo trouxa e quando as observava do alto de um de seus edifícios. . .



Parecia até que ela andava ouvindo ou prestando atenção demais em seus gostos musicais.



A canção repercutia em sua cabeça e, por um breve instante, o fez devanear em uma daquelas tardes em que apreciava o ritmo. . .



Só que agora imagens involuntárias da garota começava a ser associadas ao som e a seus devaneios.



Mas uma risada contida que escapara de si o despertara.



— Cuidado para não cair no chão, Weasley — alfinetara levemente. — Pelo que vejo o sono possui efeito tão eficaz quanto o álcool em seu corpo, tsc.



Tom sacudiu a cabeça enquanto terminava o chocolate e com um sorriso distraído tanto se indagava a respeito do fato de que a neve havia cessado assim que Ginny abandonara o recinto quanto revia na memória a última cena da ruiva se comportando de forma aleatória e atrapalhada antes de deixar a cozinha.



Aquela maneira dela havia sido entalhada em sua memória como xilogravura.



. . . Era um de seus traços preferidos.



(...)


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