Capitulo I - Inverno
A noite estava fria e sombria. O pequeno vilarejo estava soterrado em neve branca e fofa, que ia até meio metro acima do chão, dificultando a andada das pessoas.
As rajadas de vento gélidas assopravam as folhagens e assobiavam nos ouvidos. O vazio em que Godric's Hollow encontrava-se, fazia com que o lugar parecesse ainda mais assustador no escuro.
Entretanto, uma única e solitária alma viva estava em pé, de frente ao velho e enferrujado portão de ferro que dava entrada ao cemitério local.
O homem parado ali, não parecia ter mais que dezoito anos. Seus cabelos ruivos chacoalhavam para lá e para cá, conforme o vento ordenava, e seus olhos intensamente azuis estavam rodeados de olheiras muito profundas, o que indicava seu péssimo sono nos últimos tempos.
O homem ruivo encarava o portão do cemitério cautelosamente, como se este fosse uma perigosa arma que pudesse atingi-lo caso ele se aproximasse demais.
Passou-se algum tempo, até que o homem ruivo finalmente empurrou o portão, que soltou um rangido com o gesto. Pareceu que o homem precisou de todo a sua força de vontade e determinação para por os pés no cemitério.
O homem caminhou vagarosamente pelo lugar, correndo os olhos pelos vários túmulos, e parecendo desolado.
Então, o ruivo parou em frente à uma lápide de mármore branco, que estava muito bem limpa e rodeada de flores e guirlandas. Na lápide lia-se:
Harry James Potter
Grande amigo, herói corajoso, valente guerreiro, e um coração de ouro
31/07/1980 - 02/05/1988
O ruivo pareceu vacilar ao encarar o nome na lápide, mas muito silenciosamente, o homem abaixou-se, ficando de joelhos, rente à cova.
-Oi.-o ruivo murmurou, com um olhar penetrante para o túmulo.-Já faz um bom tempo que eu venho aqui, não?
Como era o esperado, ninguém respondeu. Lágrimas silenciosas escorriam dos grandes olhos azuis do homem ruivo, mas ele não deu importância a isso, nem incomodando-se em seca-las.
-Harry...-sua voz falhou um pouco.-E-eu... eu não venho aqui desde o funeral, você sabe. Já fazem três meses, Harry. Três meses desde que você se foi. Eu ainda não consigo acreditar, cara.
O ruivo lançou mais um olhar penetrante na lápide.
-Quero dizer, você era tão forte!-continuou o ruivo.-Tão... tão corajoso, que achei, sinceramente, que iríamos sobreviver todos juntos. Iriam ter mortes, disso eu sabia, mas eu nunca realmente cheguei a pensar que você fosse morrer, Harry. Eu... eu achei que iríamos vencer a guerra, e depois tudo iria acabar, e nós íamos ser felizes, cara. Eu, você, e Hermione.
O homem soltou um riso trêmulo.
-Ela que me mandou vir aqui, por falar em Hermione.-disse ele ao túmulo.-Ela disse que fez bem á ela vir aqui e, er, conversar com você, se é que isso é uma conversa. Ela disse que faria bem a mim também.
O ruivo ficou em silêncio por um momento, apenas olhando para os inscritos na lápide.
-Você era meu melhor amigo, Harry. Ainda é.-disse o ruivo, sua voz tremendo com o esforço para segurar os soluços.-E-eu... eu vim aqui para te agradecer também. Por tudo.
O homem parou por um momento, tirando um pouco da água salgada que embaçava demais a sua visão.
-Você matou Voldemort.-disse o ruivo, voltando a falar com a lápide.-Você salvou o Mundo Mágico inteiro. Inteirinho. Mas você se sacrificou para isso, Harry, e a morte de um cara estupido nunca vai valer a sua vida, cara. Nunca. Não para mim, pelo menos.
O ruivo respirou fundo, tentando controlar as lágrimas, e continuou a falar:
-Obrigado também pelo testamento. Acharam na semana passada, no escritório do Dumbledore. Acho que você deve ter escrito antes de... bem, eu só quero dizer obrigado por ter deixado todo o seu dinheiro para a gente. Mamãe está chorando até agora por isso. Não se preocupe com o Ted, aliás. Ginny está cuidando dele. Falando nela, cara, ela está inconsolável. Ela ainda te ama, Harry. Assim como o resto de nós.
Um sorriso triste escapou pelos lábios do homem.
-Fred também se foi, sabe. Ele deve estar aí com você. Perdi dois irmãos de uma vez só, Harry, e isso eu nunca vou superar. Mamãe e papai disseram que perderam dois filhos também. Eles te consideravam da família, assim como o resto de nós, não esqueça disso, irmão.
O ruivo acariciou a lápide com as mãos trêmulas.
-Ah, Harry.-murmurou ele, os soluços lutando para vir.-Eu sinto tanto a sua falta. Você era o meu melhor amigo, Harry. Você era o meu irmão, Harry. Eu te amava muito, cara. Eu te amo ainda, eu te adoro. Por favor, onde quer que esteja, não se esqueça disso, tá bem?
Os olhos do homem percorreram pelos outros túmulos, e ele sorriu muito tristemente quando seus olhos pararam em uma lápide dupla a alguns metros de distância.
-Você deve estar com seus pais.-sussurrou o ruivo, sem olhar para o túmulo em sua frente.-Com Sirius, Lupin, Tonks, Collin, F-Fred...
O homem finalmente voltou a olhar para a lápide de Harry Potter, agora os soluços vindo ocasionalmente.
-E-eu sinto muito, muito mesmo, Harry. Por ter te abandonado na caça às Horcruxes. Eu realmente sinto. Desculpe pela briga no quarto ano, também...
O ruivo engoliu em seco e disse, agora com a voz tremendo horrivelmente, e com um tom terrível de culpa:
-Harry, se tem uma coisa que eu nunca vou me perdoar é não ter conseguido te impedir d-de se entregar para Voldemort. Você mais do que ninguém merecia ver o fim dessa guerra, Harry, e eu... eu sinto que eu não pude ajudá-lo a chegar lá. Você merecia ter casado com Ginny, ter tido filhos com ela, deveria...
Mas ele não conseguiu terminar, pois soluçava tão fortemente, que alguns dos pássaros que toscanejavam nas árvores assustaram-se e voaram para longe.
-Você não merecia isso!-gritou ele, por entre o seu choro.-Isso... isso não é justo!-exclamou ele, batendo os punhos no chão, como uma criança desobediente.
O homem ruivo continuou lá por algum tempo, chorando e gritando sobre injustiça da morte de seu melhor amigo. Mas não importa o quanto ele gritasse, chorasse e soluçasse sobre a lápide, suplicando para Harry Potter que voltasse, esta continuou parada, exatamente igual à quando o ruivo chegara no sombrio cemitério.
O homem ruivo não sabia quanto tempo tinha ficado ali, apenas olhando para o túmulo, tentando fazer com que as palavras que indicavam a morte de Harry Potter parecer coerente para seu cérebro.
Mas então, um badalar do grande e antigo relógio que ficava no topo da torre da Igreja, anunciando a chegada da meia-noite, e avisando ao homem ruivo, que era hora de ir para casa.
-Eu vou voltar mais vezes a partir de agora, Harry.-murmurou o ruivo, colocando-se de pé, e olhando intensamente para a lápide.-Prometo que vou, irmão.
E então, dando meia volta, o homem ruivo caminhou lentamente para fora dos portões do cemitério, deixando a lápide de Harry Potter para trás.
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