A visita mais inesperada



No outro dia, Ron trabalhou apenas de manhã. Contou a Harry tudo o que havia descoberto. Eles ficaram preocupados. Ainda que mais ninguém no mundo acreditasse na “teoria da conspiração” de Hermione, eles dois eram obrigados a acreditar. Harry lera por cima os artigos da amiga, e se o que ela suspeitava fosse verdade, a garota podia estar correndo um sério perigo. Foram até o chefe do QG dos aurores para pedir vigilância para a casa dos Zabini, mas como não podiam formular uma acusação, nem mesmo uma suspeita definida, não conseguiram nada. Combinaram, então, de se revezar na vigilância da casa por conta própria.


Ron tentou pegar a mala da esposa, quis examinar sua sala, mas não foi possível. Como medida de precaução contra concorrentes, as salas do Profeta Diário só podiam ser abertas por seus próprios ocupantes. Sem saber exatamente o que Hermione sabia, encontrá-la ficava muito difícil para os rapazes.


Numa noite em que Harry vigiava, Ron estava em casa, na sala, com alguns papéis sobre a mesa e uma garrafa de hidromel. O rapaz não era de beber, mas já estava ficando desesperado, a ponto de perder o controle sobre si mesmo.


Era a noite de quarta para quinta, na manhã seguinte completaria uma semana que Hermione estava desaparecida, mas Ron achava que parecia um ano. Muita coisa acontecera. Como Ron não pudera comunicar-lhe alguma informação positiva sobre o paradeiro da filha, Ann Granger avisara a todos os parentes e amigos da família, e também colocara a polícia trouxa atrás de Hermione, mesmo sabendo no fundo que isso não adiantaria. Ammy ficara furiosa (mais ainda) por não ter sido avisada por Ron e, tendo sido dissuadida por Harry e Ron de pedir auxílio ao departamento para investigar o desaparecimento da prima, porque isso poderia alertar os inimigos de Hermione para a identidade que ela provavelmente tentaria esconder, Ammya montou sua própria equipe, que depois, a pedido de Harry, começou a cooperar parcialmente com ele e Ron. A equipe contava de Ammy, o marido, e o primo Petter, que por acaso era amigo de Wilfred, também sumido. Ele se incumbiu de falar com a família de Willie para que essa não alardeasse o desaparecimento dele, pelos mesmos motivos citados. Ron foi até o Profeta mais uma vez para pedir que não publicassem nada sobre esses desaparecimentos e desmentissem qualquer boato que surgisse. O diretor acatou esse pedido com muito prazer – não queria mesmo assumir a responsabilidade por esses problemas, que surgiram enquanto eles trabalhavam. As pessoas notaram, porém, a ausência de artigos de Hermione no jornal – ela era uma jornalista conhecida. Alguns amigos, como Neville e Luna, procuraram Ron para saber o que houvera e oferecer ajuda. Mas o sumiço de Hermione e Reed conseguira ser apenas um rumor na comunidade bruxa.


Só que isso não ajudava muito; as investigações estavam em ponto morto. Ron lia e relia os relatórios dos vigias dos Zabinis, mas eles pareciam ser completamente inocentes, não havia nada de concreto contra eles, nenhuma pista válida. Eles passavam muito tempo em casa. Como as investigações não eram oficiais, Ron e os amigos não conseguiriam entrar ali, não tinham um mandado de busca. Ammy sugerira invadir a casa, mas a idéia foi refutada, pois nenhum deles, e especialmente Ron, achava que ela estava ali. Pouco a pouco percebiam que nesse caso o buraco era mais embaixo.


Além disso, uma idéia fixa martelava na cabeça de Ron: Hermione estava com Reed. Passava por maus pedaços, e Ron estava lá pra protegê-la, ajudá-la, ou ao menos sofrer com ela? Não; mas Wilfred estava. Se Ron tivesse sido menos egoísta e prestado maia atenção na esposa, talvez nada disso tivesse acontecido.


Ron estava zonzo, seu pensamento oscilava. Era quase meia-noite. Ele jogou de lado o papel que examinava e tomou um gole de hidromel. Apertou os olhos, cansado, e de repente ouviu alguém lhe chamar.


— Weasley – Ron fitou a garrafa, entre espantado e aborrecido.


— Essa porcaria já está me fazendo mal – mas a garrafa ainda estava pela metade.


— Weasley! – chamaram de novo. Ron olhou em volta, incomodado.


— Quem está aí? – disse, em voz alta.


— Weasley, na lareira, caramba!


Ron olhou para a lareira e não pôde reprimir um grito de espanto; não porque houvesse a cabeça de alguém flutuando nas chamas – ele era um bruxo e de certa forma estava acostumado com isso. Assustou-se porque a cabeça pertencia a Wilfred Reed.


— O que você está fazendo aqui? Cadê a Hermione? – perguntou Ron rapidamente, assim que se recuperou. Ele acocorou-se junto à lareira.


— Vim justamente para lhe dizer isso...


— Então não enrola!


— Mas não digo nada enquanto não tiver comido alguma coisa, não estou em condições – Ron olhou-o com raiva e impaciência, mas o garoto estava mesmo horrível, pálido, mais desalinhado e barbado do que o habitual e emagrecido. Ron sentiu um aperto no coração ao pensar em como estaria Hermione. – Vem – disse, por fim, levantando. Wilfred saiu da lareira e seguiu Ron para a cozinha.


O dono da casa preparou rapidamente alguns sanduíches. Ele mesmo não comia havia algum tempo, mas agora se sentia demasiadamente excitado para fazê-lo. Deu o resto da garrafa de hidromel a Reed e esperou, batendo ritmadamente com o calcanhar no chão para controlar o nervosismo. Wilfred Reed comia com voracidade. Só depois de quatro sanduíches (que ele nem perguntou do que eram), botou o prato de lado com um suspiro e começou:


— Bem, deixa eu contar do começo. Eu e Hermione estávamos investigando os Zabini. Descobrimos que eles têm relação com neocomensais, especialmente o rapaz.


— Neocomensais? – Ron repetiu, boiando.


— Sim. Eles seguem o plano de Voldemort, querem limpar o mundo de trouxas, fazer uma raça pura de bruxos – explicou Wilfred. – São na maioria rapazes, alguns parentes de comensais, mas há moças também, e mesmo mestiços. Tudo isso eu e ela pudemos deduzir porque eu tenho um amigo no correio e um contato na rede de Flu, e eles interceptaram a comunicação da casa dos Zabini. Muitas vezes nós ficamos vigiando a casa dos Zabini, achávamos que o QG dos neocomensais era lá, mas também não entrava ninguém suspeito. Então Hermione fez amizade com uma velha elfa doméstica da casa, Zilma, se não me engano. E a elfa nos contou que o senhorzinho entrava num quarto de despejo e então sumia por horas... Hermione ficou louca para entrar lá, mas eu disse a ela que devíamos esperar um dia em que houvesse reunião no QG, senão estávamos talvez nos arriscando em vão. Então, quinta eu recebi uma comunicação do meu amigo do Flu. Ele disse que mais de cinco pessoas entraram seguidamente pela lareira do quarto do Zabini e não haviam voltado ainda. Chamei Hermione e nós corremos pra lá. Hermione conseguiu fazer a elfa nos admitir na casa e nos mostrar o quarto de despejo. Ela ficou muito agoniada quando a elfa começou a se castigar, mas nós tínhamos que nos apressar. Atravessamos um túnel enorme e paramos na frente de uma porta pesada, mas que não estava trancada. Colocamos orelhas extensíveis pra ver se havia alguém além da porta, e como não havia, passamos por ela. Nos vimos, então, em um vestíbulo muito grande, cercado de inúmeras portas. Nós fomos de porta em porta, testando-as. Quatro estavam abertas e tinham outras passagens como a pela qual tínhamos entrado. Uma era um banheiro, duas Hermione abriu com um Alorromora, e tinham uma escada pra cima e uma escada pra baixo. Até que ouvimos vozes atrás de uma delas. Botamos as orelhas extensíveis, estavam tendo uma reunião; ouvimos por uns quinze minutos, quando de repente se abriu uma das portas com passagens e entraram três pessoas. Eles gritaram, e o pessoal da reunião todo saiu. Se eu e Hermione não estivéssemos tão abismados com o que tínhamos ouvido, poderíamos ter fugido, depois de estuporar os recém-chegados, mas bobeamos, e apesar de termos lutado, desarmado e estuporado alguns, eles nos desarmaram e nos pegaram.


Wilfred Reed fez uma pausa para respirar, e tomou um gole de hidromel. Ron bebia cada uma das palavras dele, a cada segundo mais agoniado.


— Tomaram nossas varinhas e a minha máquina; eu tinha tirado várias fotos das partes do QG deles. Nos levaram escada abaixo e nos trancaram numa masmorra, em calabouços separados, um ao lado do outro, eu acho. Hermione gritou: “Fica calado!”, mas ela não precisava ter feito isso, eu sei que se eles descobrissem que somos da imprensa teriam nos matado. Me torturaram e me interrogaram até a exaustão. Não usaram Crucioporque o Ministério os teria encontrado. Vinham trazer comida de vez em quando, sempre um carcereiro diferente. Eu tentei não comer, pensando que eles podiam ter enfeitiçado a comida, mas no fim não resisti. Sei que uma hora veio uma moça com um bebê, acho que ela morava na casa. Descuidou-se de mim por um momento e eu fugi. Subi até aquele vestíbulo e peguei a primeira passagem que vi – e Wilfred calou-se. Ron esperou com a respiração suspensa. – Saí à luz do dia, e com medo que me pegassem, me escondi no meio do mato. De noite, andei. Amanheceu e eu me escondi de novo. Aí andei até encontrar uma casa bruxa, que por sorte estava vazia e eu usei a lareira para vir para cá.


Houve silêncio.


— Quer dizer que deixou a Hermione para trás? – perguntou Ron, aparentemente calmo; mas o olhar duro e as orelhas vermelhas denunciavam o perigo. Não houve resposta. Reed susteve o olhar dele, quase com insolência. – Miserável! – vociferou Ron, saltando da cadeira com um pulo de tigre e avançando para Reed, varinha em punho.


Wilfred, por sorte, não foi menos ágil e catou um prato, a primeira coisa que tinha à vista, ameaçando Ron com isso enquanto fugia dele contornando a mesa.


— Eu não ganhei um prêmio por serviços prestados à escola! – gritou o poeta, despeitado. Por um instante Ron se distraiu imaginando como Reed teria tomado conhecimento desse detalhe; ele era um pouco mais velho que Ron, frequentara Hogwarts um ano atrás de Percy e na frente dos gêmeos. – Nem fui de Grifinória! – gritou de novo Reed. Ron despertou, voltando a persegui-lo. Espumava. Retrucou:


— Grande coisa; podia ter honrado o que tem no meio das pernas! Você é um homem, seu maldito, e abandonou uma dama nas mãos dos bandidos! E ainda diz que gosta dela! Só por isso já merecia morrer – Ron avançou pra ele novamente, jogando-lhe um feitiço. Willie abaixou-se rapidamente; interpondo uma cadeira entre si e Ron, começou a falar, muito rápido e em voz alta.


— Se me matar nunca saberá onde a Hermione está! – isso fez Ron estacar. Willie continuou, sem parar pra pegar fôlego, receando que Ron mudasse de idéia – Eu gosto dela sim, poderia ter procurado minha família, mas vim antes te dizer onde encontrá-la. Eu fui de Corvinal porque tenho uma memória prodigiosa, lembro de todo o caminho, apenas me dê pena e pergaminho que eu te desenho um mapa. E se é tão corajoso quanto quer parecer, não vai atirar em um cara desarmado, eu estou sem varinha, já disse que pegaram a minha.


Ron acalmara-se; sua respiração foi serenando. Wilfred percebeu e ergueu sorrateiramente a cabeça acima da borda da mesa.


— Saia daí – disse Ron, secamente. Pegou uma pena, um tinteiro e um pedaço de pergaminho de uma gaveta da pia e bateu com eles na mesa. Reed, timidamente, levantou-se e desenhou um mapa detalhado no pergaminho. Ron olhou por um momento, em seguida começou a andar de um lado para outro da casa, pegando várias poções, e outras coisas que costumava usar no trabalho como auror. Por fim, apanhou a vassoura e uma capa e voltou para junto de Reed. Este, terminando o mapa, explicou-o a Ron. Ele pegou o mapa e foi saindo, calado.


— Você não está pensando em ir sozinho, está? – questionou Wilfred, seguindo Ron. Este apenas olhou-o. – Você está louco! Há sempre gente na casa, não vai dar certo, é tolice! Você não vai ajudar Hermione se for pego, pode até piorar a situação dela – então uma idéia assaltou-o e ele arregalou os olhos. – Não está pensando em me levar junto, não é? Eu nem poderia ir, estou sem a minha varinha... – ele relembrou, recuando alguns passos. Ron olhou-o ironicamente.


— Não se preocupe, não pretendo exigir nenhum sacrifício – respondeu, em tom seco. – Volte para a sua família – acrescentou, oferecendo o pote de Flu a Wilfred. O poeta respirou aliviado e se adiantou para a lareira.


— Reed – chamou Ron. O outro se virou. – Obrigado... e me desculpe – despediu-se Ron, pensando nas Vomitilhas. Willie deu um meio sorriso e partiu.


 

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