Sorrisos e olhares
12. Sorrisos e olhares
Mesmo que se vá, ficarão as marcas e as lembranças.
Eu era uma pessoa solitária, tanto nos tempos do orfanato como quando estava com a Serena e a Rose. Gostava muito de usar esse tempo livre para reflectir sobre tudo e nada. Nessa altura, chegava a conclusões engraçadas e uma delas era que eram as nossas acções que nos faziam ser uma boa ou má pessoa e, principalmente, eram as nossas acções que nos faziam fazer o que era certo ou, pelo contrário, o que era errado.
Era isto que nos definia como pessoas correctas ou incorrectas!
Também tinha concluído que nem sempre, como se dizia por ai, o caminho mais certo era o mais difícil. Para mim o caminho certo era só, maioritariamente, o que nos fazia ter que pensar mais. Como, por exemplo, ajudar uma pessoa que estava com problemas. Isso não era difícil. Para mim até era mais difícil não ajudar, visto que teria que aturar o mau humor dessas pessoas. No entanto, o que fazia com que eu pudesse não ajudar, era, primeiramente, porque precisava de entender que a pessoa tinha problemas e depois tinha que perceber que eu podia ajudar e a forma como poderia ajudar. Não era complicado ajudar, só era difícil perceber. É claro que esta minha visão do mundo era só para coisas mais simples. Até eu compreendia que nas coisas verdadeiramente complicadas o mais difícil, é sem dúvida fazer o certo. Porque se não fosse, quem faria o errado? Se fazer o certo fosse o mais fácil?
No entanto, o verdadeiro problema, que eu odiava sentir era: e quando não havia um caminho certo nem um caminho fácil? Só haviam coisas complicadas que pareciam que de qualquer das maneiras iriam prejudicar a minha vida?
É, de repente, a minha nada animada vida parecia não sofrer de tédio e sim de insegurança, onde o quer que eu fizesse, iria acabar por magoar boas pessoas ou até a mim próprio. A única solução correta que eu via, era voltar no tempo e nunca conhecer nem o mundo, nem os meus pais biológicos mas, infelizmente, para mim, isso não era possível. Então o que é que eu podia fazer quando a minha própria existência era um perigo, que não sorrir falsamente para a minha simpática e adorável família, que tinham vindo a correr mal eu informei o Dumbledore que iria afinal ficar no mundo mágico? É, nada além de sorrir e ver o sorriso aliviado no rosto do James e a da Lily que veio a correr dar-me mais um dos seus abraços…. De urso, onde eu me sentia completamente espremido…
Olhei para as outras pessoas, à espera de ajuda, antes que morresse sufocado mas o James estava entretido a dizer alguma coisa ao Charles que abriu um sorriso de orelha a orelha. Olhei para os outros dois presentes, o Sirius e a Natalie mas enquanto o Sirius só sorriu, aparentemente orgulhoso da minha decisão, a Natalie só olhou para mim, com o seu olhar superior e sorriso de lado, que dizia claramente que eu tinha caído no plano dela. É realmente, Slytlherin era a casa dos astutos…
- Tu vais adorar a casa! – Ouvi o grito feliz do Charles virando-se para mim. No entanto, apesar do sorriso feliz, as suas olheiras pronunciadas faziam-me ver que o que a Natalie disse, era verdade… ele não estava a descansar.
Eu sorri para ele e suspirei aliviado ao ver que a Lily finalmente me largou para olhar para o seu filho mais novo.
- E vamos poder passar o Natal todos juntos. – Disse o James mandando-me mais um dos seus sorrisos brilhantes que retribui com um fingido. Se continuasse assim iria-me tornar num especialista em mandar sorrisos forçados.
- Então do que estamos à espera? – O Sirius perguntou, com um sorriso, mostrando toda a sua animação. – Vamos embora que já estou farto desta enfermaria.
Eu assenti, desta vez não conseguindo manter o sorriso, no entanto, ninguém reparou porque se preparam todos para sair e eu mal tive tempo de me despedir da Madame Pomfrey antes que a Natalie, simpática como sempre, me empurrasse de encontro a ela, para agarrar uma garrafa que era a Chave de Portal que me levaria a casa.
Senti um puxão e a minha cabeça ficou muito pesada, como se estivesse a ser pressionada. No entanto, esta sensação foi muito rápida, porque num minuto estava na enfermaria e na outra estava numa sala bem decorada.
Olhei à volta e vi espantado em como aquela divisão me fazia lembrar os filmes antigos, com o seu sofá luxuoso, que estava à frente da lareira. A mesa grande e de vidro que tinha uma pequena jarra em cima. Uma escadaria que levava ao andar superior. Os outros pequenos sofás que estavam à volta da lareira. O móvel feito de madeira antiga. Naquele momento, tive uma certeza. Eles eram muito mas muito ricos.
- Gostas Harry? – Perguntou a Lily que magicamente, já estava ao meu lado, com os seus olhos a brilharem esperançosos e eu fiquei preocupado que ela me voltasse a abraçar. Ela conseguia ser realmente assustadora…
- Sim. – Eu disse, assentindo, não sabendo se disse aquilo porque realmente gostava da sala ou se foi porque estava com medo dela.
- Eu vou-te mostrar o resto. – Ela disse e agarrou a minha mão, mostrando-me realmente o resto da casa, até os quartos das visitas…
Não vou mentir e dizer que aquilo foi a coisa mais secante e que odiava tudo na casa, só para ser do contra. Não, eu gostei e fiquei maravilhado ao olhar para as divisões. Até a cozinha era grandiosa, com a sua mesa que devia dar para alimentar umas dez pessoas (pequeníssima comparada com a da sala-de-jantar), os utensílios que eram Muggles e uma visão pela janela para uma floresta. Aquela casa era grandiosa, o que me fez recriminar mentalmente por não ter pensado logo isso, afinal se as aulas eram dadas num castelo porque é que as casas não seriam mansões, dignas do século passado?
- E este é o teu quarto. – Ela disse, fazendo-me despertar e ver a ansiedade que ela tinha enquanto abria a porta.
Eu entrei à frente, dando-lhe mais um dos meus sorrisos e vi, já não tão espantando, que o quarto era gigante. Possuía uma cama feita em madeira maciça, tendo de cada lado pequenas mesas-de-cabeceira, cada uma com um candeeiro. No outro lado, num canto estava uma secretária, com algumas coisas em cima e ao lado uma estante com livros. Do meu lado esquerdo encontrava-se outra porta que eu sabia que iria dar a um pequeno corredor com duas portas (igual ao quarto das visitas), uma para a casa-de-banho e outra para um armário, que eu também não me espantaria se estivesse cheio de roupas. Senti o meu coração parar de bater quando vi que em cima da minha secretária encontrava-se uma foto de um bebé que eu presumi ser eu.
- É bonito. – Eu disse e olhei para ela, vendo espantado que ela tinha lágrimas nos olhos.
- Desculpa Harry mas se tu soubesses o quanto eu queria que isto fosse verdade…. – Ela disse limpando as lágrimas. – Sabes o que é mais engraçado? É que no fundo, eu acredito que sabia que isto poderia acontecer. Este era para ser o teu quarto desde que nasceste e com a tua morte, era suposto termos dado a outras pessoas, como o Remus, no entanto, nunca conseguimos. Este quarto era teu e só teu. Nós não o podíamos dar porque dá-lo queria dizer que tínhamos ordem para te esquecer e nós não te queríamos esquecer. Quando te digo que para mim tu estiveste sempre vivo mesmo nunca desconfiando que realmente estivesses, é verdade. Sempre estiveste no meu coração e eu sei que para o James também. – Ela disse olhando de relance para o James que estava com o Charles a observar um bocadinho mais afastado. – Finalmente, estamos todos em casa. – Ela disse e abraçou-me com mais um dos seus abraços de urso. No entanto, desta vez eu não quis fugir e fiquei ali, parado sem reagir, a deixar-me abraçar mais uma vez, contudo, sentindo. Se tinha alguma dúvida que eu tinha aceite a Lily como a minha mãe, ela desvaneceu-se, naquele momento.
- Obrigado por nos dares uma oportunidade Harry. – Disse o James, mais afastado, olhando para mim.
Eu observei-o e reparei que além de estar mais afastada de mim, ele encontrava-se tão cansado que até a sua postura, denunciava a sua condição. Não sei porquê, não consegui parar de me lembrar das palavras da Natalie… será que aquela família não estava mesmo demasiado assombrada com o Voldemort também?
- Nós… - Eu calei-me de repente, vendo uma pequeníssima esperança nos olhos dele. Eu ia para dizer, nós fizemos um acordo, que era a verdade, no entanto, lembrei-me da sua postura, do Charles que estava ao lado dele e da Lily e não consegui… dizer isso, só os iria fazer sofrer mais. – Nós temos ainda muita coisa para fazer, não é Charles? – Eu perguntei, dizendo a primeira coisa que me lembrei. Não saiu inteligente mas nestas condições não se podia pedir muito…
Ele olhou para mim em confusão, não percebendo bem o que eu queria dizer mas mesmo assim assentiu. Ele era, realmente, uma criança adorável.
- Ainda não mostraste a grande atração da casa, que me fez escolher viver aqui. – Disse o Sirius aparecendo e trazendo consigo a Natalie.
- O campo de Quiddich! – Disseram o James e o Charles ao mesmo tempo, que fez a Lily revirar os olhos.
Eu ri-me, vendo a familiaridade com que eles agiam, que me fez lembrar do tempo que passei com eles, antes do incidente. Eles eram realmente uma grande e feliz família. Será que eu não iria destruir só a paz que eles tinham entre si? Mesmo que sofressem no início, não compensaria no final? Os fins não justificavam os meios?
- Vamos. – Disse o Charles puxando-me a mão e levando-me pelo corredor, que eram os quartos da família.
Eu deixei-me levar, vendo o Sirius, o James e a Natalie virem atrás de mim, enquanto a Lily parecia ficar pelo meu quarto.
Quando finalmente chegamos à porta do que eu percebi ser das traseiras, pela cozinha, eu parei chocado ao reparar que eu conhecia aquele lugar. Eu conhecia aquelas árvores e aquela zona. Eu conhecia, perfeitamente, aquele caminho pedestre que iria levar a uma pequena lagoa. Como é que isto era possível? Aquela não podia ser a casa…
- Aquele caminho… - Eu comecei a perguntar, apontando para o caminho, por entre as árvores. – Vai dar onde?
- A uma lagoa. A vista é muito bonita. – Disse o Charles animado, puxando-me outra vez, no entanto, eu não deixei. Aquilo não era mesmo possível!
- Tu conheces isto, não conheces?
Para meu espanto quem perguntou foi a Natalie, que estava ao lado do pai a olhar para mim, com os olhos semicerrados e mais uma vez, tive a confirmação que ela era mais astuta do que parecia.
- É impossível. – Eu murmurei simplesmente, não tendo palavras para descrever o que aquela casa era para mim. Ela era o meu porto seguro, a minha casa de sonho, que eu ia sempre que era espancado pelo Louis. Aquele caminho era o que fazia sempre e ficava ao lado do lago a observá-lo, abstraindo-me da realidade. Como é que ela existia? E, principalmente, como é que aquela era a casa deles? Eu nunca lhes conseguiria se quer explicar o significado que aquela casa… não, caminho, tinha para mim, quanto mais dizer que eu conhecia? Era impossível mas ao mesmo tempo, magnífico.
- Harry? – Ouvi o James chamar-me, vindo para perto de mim, preocupado, no entanto, eu não lhe liguei e sem pensar comecei a correr por aquele caminho.
Aquele caminho de terra era igual. Aquela árvore que ficou torta no seu crescimento, estava ali. Até os patos, que estavam no lago, se encontravam ali. Era impossível mas era verdade. Aquele era o meu sítio, que eu nunca imaginei que fosse verdade.
Sem tomar consciência, parei de correr e andei até à frente do lago, sentando-me lá, vendo um casal de patos nadar.
Aquilo era verdade, o meu sonho, era verdade! Os meus pais estavam vivos. Tinha um irmão. O que não seria mais verdade? E como é que era possível?
- Harry, está tudo bem? – Perguntou o James que pelos vistos tinha corrido atrás de mim, com eles todos, menos a Lily que ainda estava a faltar.
Eu pisquei, tentando clarear os meus pensamentos mas isso estava difícil. Como é que era suposto acalmar o meu coração e pensar, com precisão, quando se tinha acabado de descobrir que o seu sítio seguro, a minha casa dos sonhos, era verdade?
- Sim. – Consegui murmurar, no entanto, distrai-me logo de seguida, olhando para tudo à minha volta.
- Como é que conheces este lugar?
Eu olhei para a Natalie, vendo que ela mais uma vez persistia nas suas observações. Suspirei, vendo que eles não me iriam deixar pensar.
- Este sítio… eu sonhei muitas vezes com ele. – Disse, observando outra vez os patos.
Eu estava alheio ao fato que o Sirius e o James trocaram um olhar, no entanto, ouvi claramente a gargalhada que eles deram.
- É claro. – Disse o James com tanta convicção que eu olhei para ele. – Nós não vivíamos aqui antes de desapareceres mas viemos cá algumas vezes. – Ele murmurou com um sorriso saudoso. – Era a nossa casa mas com o teu nascimento, mudamos de casa. Apesar disso, ainda viemos cá algumas vezes e tu adoravas isto. Lembro-me que passamos tardes aqui porque tu adoravas ver os patos e até tentavas ir atrás deles. Sempre te fascinaram. – Ele murmurou rindo.
Eu dei um pequeno sorriso, o mais honesto do dia e voltei a olhar para a paisagem. No entanto, a voz hesitante do James, fez-me voltar a olhar para ele.
- Fico feliz que te lembres pelo menos disto.
Eu lembrei-me dos estranhos sonhos que estava a ter, com o Peter mas achei melhor não comentar, até porque já não me lembrava muito bem...
- Eu não fazia ideia que este sítio existia. Ele é tão calmo. – E era verdade. Eu conseguiria ficar, sem qualquer tipo de problema, até à noite, sentado apenas a observar a paisagem, no entanto, eles pareciam não me querer deixar fazer isso.
- Pois é. – Concordou o James. – Vem ver o campo, pode ser que te lembres de mais. – Ele disse, energético. Eu sabia que não me lembrava, afinal na minha imaginação eu fazia sempre o caminho e parava aqui. Contudo, não tive energia para lhe dizer isso e, por isso, segui-o outra vez, até casa, onde apanhei a segunda surpresa boa do dia. A Serena e a Rose estavam ali.
- Harry! – A Rose, gritou, chamando-me e correndo até mim. Na minha felicidade de vê-la, nem reparei que a Lily e o Remus estavam a um canto, a falar entre si.
- Rose! – Eu disse, abraçando-a de volta e sentido um estranho peso sair de cima de mim. Naquele momento, sabendo que tinha a Rose comigo e a minha casa de sonho, aquela escolha já não me parecia tão má e muito menos me parecia que todas as minhas escolhas fariam alguém ser magoado. Havia um caminho, que eu teria todo o gosto em seguir. Um ao lado da Rose.
---OLC---
As pessoas só vêm o que querem. Esta é uma verdade universal. Uma verdade, tão verdade, que eu tinha que controlar a minha vontade de revirar os olhos, ao observar a canção feliz que o Sirius estava a assobiar, o jogo de xadrez que a Natalie e o Charlie estavam a jogar, a conversa animada entre a Lily e a Serena e a conversa, aparentemente, inofensiva entre o James e o Remus, que conversavam num tom baixo. Olhei para a Rose, que estava deliciada a ler um livro sobre magia e suspirei, vendo a felicidade aparente no rosto de todos, naquela tarde de Natal.
Nós não eramos aquela família feliz.
Tive esse pensamento quando acordei com a Rose a saltar em cima de mim para ver as prendas e vi um Charles e até uma Natalie na porta, com um sorriso feliz. Tive ainda mais essa certeza quando desci e vi o Sirius, o James e o Remus, a colocarem ainda mais prendas debaixo de uma árvore de natal gigantesca, que já estava cheia de prendas. A Lily, aparentemente, estava a fazer o pequeno-almoço mas apareceu ali mal nos ouviu, deu um abraço gigante a cada um de nós e desejou um bom natal com a sua voz mais querida.
A primeira certeza que eu tive foi que faltava ali a mãe da Natalie e as conversas alheias que tive com eles, levaram-me a concluir que ela devia de ser a melhor amiga da Lily que morreu também naquela noite. Isto fez o meu pseudo bom humor, desaparecer e ficar com um humor mais negro. Piorou quando vi a Serena também vir da cozinha e abraçar-nos desejando um bom natal. Eu podia tê-la perdoado mas se ela nunca tinha feito isso antes porque fazia agora? Só para fingir que estava tudo bem? Aquilo tudo seria um fingimento?
Esqueci-me um pouco desses pensamentos quando fui abrir os presentes. Tinha tantos… Do James tinha uma vassoura e uma promessa que ele me ensinaria a voar, da minha mãe um fio, do que parecia ser ouro branco, com a forma de um anjo. Eu sei que parece um pouco não masculino mas quando ela disse que era para eu ver todos os dias que eu tinha uma família comigo, que me iria proteger para sempre, como esse anjo da guarda, eu não resisti e aceitei com um sorriso. Do Sirius tive uma caixa estranha, que ele disse que me ensinaria a mexer noutro dia, mandando um olhar de lado para a Lily que deve ter percebido e bateu-lhe, com uma revista que tinha nas mãos. Recebi do Charles um livro sobre Quiddich e da Natalie (ela deu-me uma prenda!) uma caixa de bombons. Mas um dos presentes que gostei mais foi do Remus, que me deu um livro sobre magia defensiva e que eu sabia que iria precisar de usar, para sobreviver naquele mundo. Eu agradeci-lhes e pedi desculpas por não ter nada para eles mas eles não deram importância a isso, simplesmente sorrindo com a minha alegria de ter tantos presentes. Disseram-me que eu tinha ainda muitos mais, que estavam a chegar, devido ao meu reingresso ao mundo mágico, de várias pessoas mas como estavam a ser feitas medidas de segurança para ver se não estavam amaldiçoados, só poderia ver mais tarde. Eu não liguei a esses, se eram de pessoas que nem conhecia, então não eram propriamente importantes para mim e foi isso que lhes disse, que parece ter sido uma coisa acertada porque sorriram para mim contentes.
Vi os outros abrirem os seus presentes e como nos outros natais, senti-me feliz por ver a alegria das outras pessoas num gesto tão simples como ter um presente. Contudo, em exceção aos outros natais, eu agora não era uma pessoa desconhecida e tudo o que faziam, queriam que eu participasse. Felizmente, consegui agarrar-me ao livro do Remus e fiquei a lê-lo, tendo uma desculpa para não participar na animação deles. Já no dia anterior tinha sido o mesmo. Com a Rose ao meu lado, eles levaram-me a conhecer o tal campo, que era realmente gigante, só um pouco menor que o de Hogwarts. Depois, como uma grande família (onde a Serena e a Rose faziam parte) explicaram-me que elas iriam viver connosco e que assim iria poder ver a Rose todos os dias. Não me importei, para mim, sinceramente, até foi o melhor presente que me podia dar, no entanto, importei-me quando voltamos todos para casa e todos queriam a minha atenção. Era o James, o Remus e o Sirius, querendo-me treinar para ser um maroto, como eles diziam. Era a Lily, perguntando o que eu poderia precisar. Era a Serena, sendo tão doce que eu ficava enjoado, querendo se desculpar pelas acções anteriores. Os únicos que não me importava que me chamassem eram a Rose e o Charles. Felizmente, consegui sair daquela confusão pela Natalie, que me chamou para jogar um jogo de xadrez com ela, enquanto o Charles e a Rose, jogavam outro. Nós não falamos, se não acabaríamos por nos provocar mas como não eramos tão bons jogadores como o Charles, acabamos por demorar muito tempo e foi um bom jogo, onde eu ganhei por pouco.
- Harry, tenho uma boa notícia para ti. – Ouvi a voz da Lily chamar-me, fazendo-me despertar dos meus pensamentos. – Amanhã vamos a Hogsmeade para comprares finalmente a tua varinha. Assim, vais poder começar as aulas práticas.
Eu franzi a testa, lembrando-me de ter lido que era proibido praticar magia fora de Hogwarts.
- Não é proibido praticar magia fora de Hogwarts?
A Lily trocou um rápido olhar com o James que me fez despertar alguns alarmes. Algo de estranho estava a acontecer…
- É mas infelizmente, essa regra só é para as casas Muggles. Sendo esta uma casa ancestral, as nossas próprias defesas fazem com que o Ministério não tenha ideia se a magia praticada é por ti, pelo Charles ou por mim.
- Então qual é o objetivo dessa lei?
Ela trocou outro rápido olhar com ele e desta vez quem me respondeu foi ele.
- É de não haver magia perto de Muggles, para eles não descobrirem que nós existimos.
- O estatuto de Sigilo. – Murmurei, lembrando-me que não se podia praticar magia perto de Muggles e que tinha sido, inclusive, isso que fez os bruxos me descobrirem.
- Exatamente. – Concordou o James.
- Mas isso assim só vai proibir os nascidos Muggles de praticar magia… - Conclui. – E como eles não tinham um conhecimento anterior de magia, não os vai prejudicar?
Eles voltaram a trocar, o que passei a chamar de, o olhar, e quem voltou a responder foi, desta vez, a Lily.
- Existem certas partes do mundo mágico que são extremamente antiquados. Essa lei foi feita, como disse, para nos protegermos dos Muggles quando eles fizeram, literalmente, a caça aos bruxos. Infelizmente, essa caça fez com que muitos bruxos olhassem para os Muggles com desprezo e vais reparar que na nossa sociedade existem certas injustiças para os nascidos Muggles. Nós estamos a tentar mudar isso, no entanto, é difícil fazer as pessoas desistirem dos seus privilégios. – Ela murmurou.
Então o mundo bruxo não era mesmo uma utopia, onde o humano poderia fazer tudo. Primeiro, havia esse tal de Voldemort que deveria de ser um ditador que queria conquistar o país. Depois, havia a falha da segurança que eu vi em Hogwarts. E, por fim, havia esta falta de princípios que eu só ainda estava a começar. Se o mundo Muggle era cheio de defeitos, este não era nada melhor…
- Então, os nascidos Muggles, que não têm os benefícios de conhecer o mundo mágico antes, como a Rose, simplesmente são ainda mais prejudicados?
- Sim. – Respondeu o James. – E é mais complicado que isso… - ele murmurou, lambendo os lábios. – Os sangue-puro acham-se superiores e muitas vezes, demonstram a sua maneira de ver aos nascidos Muggles.
Eu franzi a testa, lembrando-me que a Rose era uma nascida Muggle.
- Como assim? Eles fazem mal?
Houve outro silêncio e quem respondeu foi estranhamente o Sirius, que também estava a ouvir a nossa conversa.
- Existem diversas formas de fazer mal. O que eles por norma fazem, é comentários ofensivos e acreditam-se superiores. No entanto, a mentalidade está a mudar e acredito que não vejas nenhum tipo de ofensa, em Hogwarts.
- Porque eu sou sangue-puro?
Eles trocaram outro olhar e desta vez, até o Remus deu um suspiro. O que é que eles queriam esconder?
- Na verdade não és um sangue-puro. És um meio-sangue. Eu sou nascida Muggle. – A Lily disse e eu dei por mim, a olhar para ela com ainda mais respeito.
- Foram difíceis os tempos em Hogwarts?
Ela sorriu.
- Não, eu tive muitos amigos e vais ver que a mentalidade está a mudar. Por isso, não te precisas de preocupar pela Rose. – Ela disse com um sorriso amável e eu tive a impressão que ela me leu como se fosse transparente.
- Além do mais se alguém fizer algum comentário ofensivo a ela, podes protegê-la. Potter é uma família antiga que tem certos direitos. Se tu a protegeres então ninguém a pode desrespeitar, sem estar a desrespeitar a casa dos Potter e isso é uma grave ofensa. – Respondeu o James.
- Então eu posso proteger todos os nascidos Muggles?
Eles trocaram mais um olhar, um de espanto e quem respondeu foi o Remus.
- Existe um contra, em protegeres alguém. Imagina que algum desses nascidos Muggles não é boa pessoa e desrespeita outra pessoa. Sendo que tu os estás a proteger, tu também serás responsabilizado pelas suas ações. Por isso, essa proteção só é dada a pessoas depois de terem uma relação, como no teu caso e da Rose, onde tens uma amizade com ela, excepcional.
- Ela é a minha irmã. – Eu disse, não gostando da forma como ele estava a descrever a minha relação com ela. Não era uma amizade excepcional. Ela era a minha família, a única pessoa que eu precisava. Olhei para ela e vi, para meu alívio, que ela continuava a jogar xadrez com o Charles, ambos alheios à nossa conversa. Infelizmente, a Natalie não estava, olhando para mim, com a sua face, sem expressão.
- E é essa relação forte e única que permite que tu lhe possas estender a proteção.
Eu assenti para o Remus e tentei analisar o que tinha aprendido. Então havia racismo dentro do mundo mágico, o para os nascidos Muggles. No entanto, estes podiam ser protegidos através da proteção só que essa proteção também trazia o contra, de todas as ações dos tal nascido Muggle protegido serem analisadas como da família. Ou seja, se eles fizessem alguma coisa de errado, toda a família seria responsabilizada.
Eu suspirei, vendo que o mundo mágico cada vez mais se tornava numa estranha, complicada e, infelizmente, atraente, equação matemática que parecia não ter solução mas que mesmo assim, me fazia querer saber mais sobre ele.
---OLC---
- James, nós temos que agir! – O homem suspirou quando olhou pela janela para a rua. Os alunos estavam reféns e até o Dumbledore não conseguiria fazer nada sem magoar ninguém.
- Eu sei Remus. – Ele murmurou para o espelho, fazendo um gesto com as mãos para os seus aurores agirem. – Nós só precisamos de mais 5 minutos para não falharmos. Ficas com a segurança dos alunos, não te esqueças. – Disse, por fim, erguendo-se e vendo os aurores a espalharem-se pelas várias janelas.
O combinado era que cada um deles atacasse um Devorador da Morte, com um feitiço limpo. Ele ficava com a Bellatrix, como iria-se aproximar com o manto de invisibilidade e o Remus, vindo da floresta, estaria a tratar da segurança dos alunos, caso alguma coisa desse errado. Era, também, esperado que o Dumbledore entrasse neste ataque, quando os visse a reagir.
No entanto, o que ele não esperou, quando fez o plano, foi ver o seu filho, o seu Harry, que não sabia nada de magia, Aparecer mesmo à frente da Bellatrix depois de ela ter morto um aluno. Primeiro, ele nunca devia de ter morrido mas mesmo sentido a raiva, por ter visto uma criança inocente morrer, a parte racional dizia que nunca teria conseguido ajudar, devido ao atraso no Ministério para se organizarem. Naquele momento, a sua raiva não ajudaria e, por isso, conseguiu matar esses sentimentos naquele momento. Contudo, não conseguia claramente parar o tremor da sua mão quando viu o seu filho aproximar-se e dizer aquilo tudo. Ele não se podia entregar. Ele não ia deixar! Mas também não podia agir porque todo o seu plano iria ser um desastre se agisse. Aqueles segundos, onde viu a interação dos dois, enquanto se aproximava da Bellatrix foi um autêntico pesadelo, tendo que lutar contra o seu instinto para não agir.
Viu aflito, o Harry fazer a magia branca e foi naquele mili-segundo, onde a Bellatrix levantou a varinha em choque, vendo os alunos desaparecerem, que ele pouco se importou com o plano e agiu, tirando a capa e mandando o primeiro feitiço que se lembrou contra ela. Viu com alívio o Dumbledore também agir e pôr o seu filho em segurança, fazendo com que os feitiços que foram direccionados a ele falhassem. Com o Dumbledore, o Remus (que apareceu mal viu que podia agir) e os seus Aurores, foi com uma rapidez impressionante que os conseguiriam capturar. No entanto, mesmo tendo-os levado logo para o gabinete do director, onde fizeram um questionário rápido, sobre se a escola continuava em perigo e como é que tinham entrado (através de Verisateum que era permitido para casos de perigo eminente, terrorista), quando os levaram para fora de Hogwarts, eles todos desapareceram. Assim, simplesmente, Desapareceram mal ficaram livre das defesas de Hogwarts. Até o Pettergrew, a pessoa que ele só queria torturar e levava nas suas mãos, para ele não fugir nunca mais, simplesmente desapareceu. Como é que ele tinha falhado tanto, para deixar isso acontecer?
- James, não podes ficar assim.
Ele suspirou, quando acordou dos seus pensamentos nostálgicos pela voz da sua mulher que olhava para ele, da cozinha, preocupada.
- Eu estou bem Lily. – Ele murmurou dando um sorriso para ela que, infelizmente, não a convenceu. – Finalmente, temos o Harry aqui, connosco. Não há nada que eu pudesse pedir mais.
Ela pousou o prato que tinha na mão com um suspiro.
- James, tu sabes que não me consegues enganar. Eu vejo a forma como olhas para o Harry e pior, vejo a forma como falas para ele.
Ele não aguentou a forma como a sua mulher olhava para si com repreensão e desviou o olhar para a cozinha, onde se tinha refugiado.
- Eu não sei do que falas. Eu estou a ser o mais normal para ele que poderia ser nestas circunstâncias. Ele acabou de nos conhecer.
- Eu sei James mas isso não é uma desculpa! – Ela disse mostrando os primeiros sinais de irritação pela forma como batia o pé no chão. – Tu não estás a tentar falar com ele e não… Não me interrompas! – Ela quase gritou quando o viu abrir a boca. – Tu estás perdido no teu mundo de culpa e não ages. Como é que esperas que ele alguma vez te trate como um pai se não tentas? Eu sei que te culpas mas a culpa não é nossa.
Ele teve que morder o lábio e fechar os punhos com força ao ouvir as palavras dela. Ela não era a Chefe dos Aurores, ela não foi a pessoa que deixou escapar o Peter pelos seus dedos. Ela não sabia nada porque ela era inocente. O único culpado da sua família estar assim era ele, treze anos antes devido a não procurar o seu filho, naquele momento, porque não soube defender e fazer o seu trabalho como devia de ser.
- Eu sei querida. – Ele disse, tentando distrair a sua mulher daqueles pensamentos aproximando-se dela e agarrando-lhe a cintura com um sorriso. – Estás demasiado preocupada. – Disse inclinando-se para ela para a beijar, no entanto, foi parado por uma mão pequena dela.
- Não, James, nunca me enganaste e não é agora que vais começar. – Ela disse, com tanta recriminação na sua voz que ele sentiu remorsos por a tentar distrair. Mas ela não iria perceber então porque é que ela insistia? Só os iria fazer discutir. – Eu sei que te recriminas – ela murmurou e ele sentiu um arrepio ao sentir a mão dela passar pelo seu queixo – porque eu também me culpei mas a culpa não é nossa. Não é de ninguém. Se podíamos ter mudado o passado, podíamos mas não conseguimos. Então não te sintas culpado e aproveita esta oportunidade de ter o Harry connosco. Se tu não te perdoares ele nunca te conseguirá perdoar James.
Ele fechou os olhos quando sentiu a mão dele parar nos seus lábios, distraindo-o. No entanto, o seu sentimento de culpa, que ardia no seu peito fê-lo abrir os olhos e observar os verdes brilhantes da Lily.
- Eu não mereço ser perdoado. Se eu tivesse feito alguma coisa nós tínhamos sido sempre uma família. A culpa é minha Lily mas não te preocupes, eu vou fazer tudo ao meu alcance para isto nunca mais acontecer. Eu vou dar um lar seguro ao Harry, nem que seja a última coisa que faça.
Ela suspirou e estava tão perto de si, que sentiu o ar que ela exalou.
- James… tu estás tão errado. A culpa não foi tua e se continuares a ter essa atitude não vais resolver nada. Tu precisas de compreender que se houver culpados não é ninguém de nós, são o Voldemort e o Peter. Não te culpes… - Ela parou um segundo de falar para segurar o queixo dele, obrigando-o a olhar para si. – Por favor… - Suplicou, encostando a sua cabeça ao peito do marido, sentindo o cheiro dele.
Ele fechou os olhos, vendo a dor que estava a causar a ela e puxou-a ainda mais, de forma a abraça-la. Ele amava-a com toda a sua força e apesar da crise do casamento, quando o Harry desapareceu, ele sempre soube que sem ela, ele não era ninguém. No entanto, apesar das palavras e de querer que ela tivesse razão, ele sabia que ela não tinha e foi esse sentimento que o levou a dar-lhe um beijo na testa e se juntar a todos na sala, com um sorriso. Ele merecia o olhar triste do Harry na sua direção, ele merecia o seu filho não o reconhecer como pai e era por isso, que ele sorria, tentando salvar o pouco do Natal que aquela família ainda tinha.
N.A. Um capítulo mais calmo. Este é o Harry normal. Mais irónico, mais racional e ao mesmo tempo, desconfiado. Nos outros capítulos, ele estava chocado, sem saber bem o que fazer mas agora finalmente voltou ao normal.
Bem, agora sobre a fic. Ando a escrever muito lentamente e é possível que tenha erros. No entanto, quando tiver tempo para dedicar só à fic quero ver se avanço nela e escrevo logo uns dois capítulos para acabar o arco, antes de Hogwarts e continuar com o ritmo de um capítulo a cada uma ou duas semanas. É, brevemente, vemos o Harry em Hogwarts, com o Ron, Hermione, Draco e mais pessoas :p.
No próximo capítulo, temos o Ollivander, Voldemort (ele não está morto) e mais algumas coisinhas.
Vejo-vos lá e qualquer coisa comentem =).
Neuzimar de Faria: O Harry está a evoluir emocionalmente, principalmente, com a Lily mas ainda vai ter um árduo caminho até confiar completamente. Mas como diz o ditado, o tempo cura tudo :p. Por isso, é normal que ele aos poucos e poucos, até inconscientemente, passe a confiar mais.
Ana Marisa Potter: O Harry passou por muito em pouco tempo... descobriu que tinha uma família que o queria, descobriu o mundo mágico, foi atacado e viu uma criança, pelo que ele acredita, morrer por sua causa e sabe que é perseguido por um psicopata. Devido a isto tudo, ele mal pensou sobre isso. Ele agora está simplesmente a deixar-se levar. Mas algo me diz que o Voldemort não o vai deixar ficar quieto e vai faze-lo tomar uma decisão.
Comentários (1)
Carregar um complexo de culpa por toda a vida é uma coisa bastante destrutiva, faz com que a pessoa revolva sentimentos de não aceitação de si mesmo a cada momento. O melhor é aprender com os erros e seguir em frente. É bom o James perceber isso, perdoar-se e aproveitar os momentos com toda a família enquanto é possível. Gostei do capítulo. Até o próximo!
2013-04-19