Capítulo Um
Os flocos de neve caiam lá fora, acumulando-se pelo chão e nos telhados das casas. Transformando tudo em branco; uma paisagem bonita. E apesar disto, o frio intenso tornava a ideia de permanecer em casa mais agradável. Porém, para o filho mais velho da família Black, que tinha apenas dez anos, todo aquele frio e neve era mais reconfortante que os cômodos sombrios e silenciosos da nobre mansão dos Black. Sentia-se um estranho em sua própria casa. Nada lhe era reconfortante. E odiava o quão só se sentia durante as enormes e lotadas reuniões que sua mãe promovia entre amigos e família.
Em passos largos, o garoto Black caminhou em direção à porta da frente. Mas antes que pudesse sair pela porta – que o levaria para a liberdade temporária – os berros de sua mãe foram ouvidos. “Onde é que você pensa que vai agora? Seu moleque!” Sirius nem ao menos se dignou a virar-se para encarar Walburga, que estava logo atrás dele. O garoto estava mais do que acostumado com este ritual de sua mãe fingir se importar consigo.
“Como se eu falando qualquer coisa fosse fazer alguma diferença, mãe.” Sirius respondeu, sua voz transbordava escárnio ao referir à mulher que lhe dera a luz como ‘mãe’. “Eu só quero ficar longe de você, desta casa, do Kreatcher... Na verdade, eu sempre quero ficar longe de você... O que significa: eu sempre quero estar fora daqui.” E ele saiu porta a fora. Os gritos de sua mãe, Walburga, fizeram-se ainda mais altos. E o garoto apenas continuou se afastando daquela casa.
Sirius Black tinha pouco mais de um metro e meio de altura, seus cabelos eram negros e cacheados – na altura de seu queixo –, era magricela e, sua pele bastante alva. Porém, eram seus olhos que chamavam a atenção das pessoas; cinzas, insondáveis, e tinham um constante brilho maroto perpassando por eles.
Neste frio dia, o jovem moreno trajava uma calça jeans clara – desbotada –, uma camiseta branca e um casaco preto; assim como suas luvas, sapatos e gorro. A única cor em seu visual era de seu cachecol vermelho sangue. Tinha um ar tremendamente casual vestido naqueles trajes muggles.
Tais trajes que faziam Walburga enlouquecer. Um Black vestindo-se como um muggle era um ultraje para a mãe de Sirius. “Um sangue puro deveria usar apenas roupas confeccionadas por bruxos” é o que ela sempre falava, a cada vez que via seu filho usando roupas muggles.
Walburga, mais conhecida como Senhora Black, sempre estava brigando com Sirius. Simplesmente pelo fato de que Sirius parecia ter nascido para irritá-la e desafiá-la; desde não concordar com a ideologia dos sangues-puros – sendo estes a raça suprema, os nascidos muggles e muggles apenas lixo –, e por sempre fazer as coisas ao contrário do que ela manda. O que fazia do jovem Sirius ser a ovelha branca dos Black.
Como dissera à sua mãe, sempre que podia, Sirius estava longe de casa. O garoto era sempre visto pelos vizinhos, caminhando solitariamente pelas ruas do Largo Grimmauld. O que ninguém sabia era que o moreno tinha uma melhor amiga – sua única amiga na vizinhança. Beatrice era o nome dela. Os dois se conheceram em um ensolarado dia de verão, há alguns anos, enquanto Sirius brincava no parquinho mais próximo. Beatrice fora a única criança a brincar com o jovem Black. Talvez o garoto fosse estranho demais para as outras crianças. Mas ela o achou divertido.
Por que ninguém sabia sobre esta amizade? Primeiramente, ambos eram bruxos. Como Sirius sabia disto? Pegou Beatrice fazendo magia involuntária uma vez. Segundo, suas mães parecem se odiar com unhas e dentes, pelo que Beatrice contou para Sirius. Walburga nunca tinha comentado nada sobre a família Aragon, mas aquilo não a impedia de realmente odiar a mãe de sua amiga, e todas as pessoas da família dela.
Flashback I
Sirius, aos seis anos, brincava sozinho no parquinho, balançando-se o mais alto que conseguia. O que era bastante alto; estava quase girando uma volta completa no balanço. As outras crianças que também estavam no local não se aproximavam do garoto. Por medo de serem atingidos ou simplesmente por medo dele. Porém o jovem Black pouco se importava. Já estava acostumado com a solidão.
Na verdade, até gostava dela.
Porém, Sirius não ficou sozinho por muito tempo naquele dia. Uma jovem garota, que tinha no máximo seus seis anos, mal media um metro, se aproximara dele. Ela também era magricela. Sua pele era ainda mais pálida que a de Sirius, o que às vezes dava-lhe um ar doentio. Seus cabelos eram loiros – quase brancos – ondulados, que iam até a sua cintura facilmente. Tinha olhos azuis-turquesa – intensos e calorosos, e, assim com os de Sirius, tinham sempre um brilho maroto; vistos por detrás das grossas lentes de seus óculos quadrados que não retirava quase nunca. Era a primeira vez que isto acontecia, e Sirius apenas a observava. Provavelmente ela passaria direto. Doce engano. A garota havia parado em sua frente, em uma distância segura o bastante para que não fosse atingida por ele, que ainda se balançava.
Ela o encarava, esperando que o moreno parasse de se balançar. O que o jovem Black não demorou a fazer. Pôs-se de pé e aproximou-se da garota, encarando-a de volta. Os minutos foram passando, e a garota nada falava. Sirius, já se irritando com a situação, falou “Perdeu alguma coisa aqui?”
“Não”, a garota falou simplesmente. Sua voz era suave, não havia aumentado o tom de voz, mesmo com a pergunta mal criada do outro. “Meu nome é Beatrice Aragon-Fancourt, e o seu?” Estendeu a pequena mão para ele, que pensou muito antes de apertá-la e responder-lhe: “Sirius Black”.
“Por que ninguém brinca com você?” Perguntou Beatrice, em seu rosto tinha uma expressão inocente. Talvez ela não tivesse ouvido os boatos de que Sirius, e toda sua família, eram estranhos. Após perceber que o garoto não responderia, ela continuou com suas perguntas: “Posso brincar com você? Quantos anos você tem? Qual seu brinquedo preferido aqui?”
Sirius encarou a loira com uma sobrancelha erguida. Beatrice tinha uma expressão tão esperançosa que o jovem Black não teve coragem de negar seu pedido. “Tudo bem, vamos brincar. Quem balançar mais alto vence.” Comentou enquanto voltava para o balanço e esperava a garota sentar-se no balanço ao seu lado.
“Quem saltar mais longe vence!” Gritou Sirius, aumentando o nível da brincadeira.
Beatrice estava rindo. Se balançar alto lhe dava a impressão de que estava voando, livre. E o garoto ao seu lado parecia sentir a mesma sensação. A garota apenas concordou com a sugestão de Sirius. Saltar seria legal. “No três! Um...”
“Dois...” O jovem Black continuou a contagem.
“Três!” Exclamaram juntos.
Pularam no mesmo instante. Sirius conseguiu cair de pé, por pouco não caindo de joelhos, poucos centímetros à frente. Beatrice não tivera a mesma sorte, seu corpo pequeno e magricela acabara por não conseguir manter-se de pé. E é aí a coisa toda fica estranha: o chão, abaixo da garota, ficou como uma gelatina enquanto a loira caía em câmera lenta – ao menos foi o que pareceu para Sirius. Aquilo era magia. E não fora ele a utilizá-la involuntariamente. “Você é uma bruxa!” Exclamou o garoto Black, num tom de voz baixo. Afinal, ninguém mais podia saber.
“O que disse?” Beatrice perguntou enquanto levantava-se rapidamente, ficando até um pouco tonta. Sirius, com seus pequenos braços, a segurou no lugar.
“Bruxa!” Os olhos azuis-turquesa arregalaram-se de surpresa e medo por ele ter descoberto. “Não adianta negar, eu sei o que eu vi...” Ele complementou enquanto afastava-se dela.
“Você não pode contar para ninguém!”
“E, por que, eu contaria?” Perguntou o moreno. Um sorriso maroto surgia em seu rosto. “Não se preocupe, seu segredo está guardado comigo... Promessa de bruxo.” A garota demorou alguns instantes para processar o que seu mais novo amigo havia falado. Porém, quando o fez, seu rosto iluminou-se. “É isso aí, sou um bruxo.”
Fim do Flashback I
Desde aquele dia, a amizade entre Beatrice e Sirius apenas crescia. Porém, por motivos óbvios já citados, a amizade tinha de ser um segredo entre eles. E apenas eles. Era quase como uma regra; a única que respeitavam verdadeiramente.
E, com os pensamentos girando em torno de sua amiga, Sirius resolveu caminhar até a frente da casa dela. Parou ali, do outro lado da rua, pensando em uma maneira de chamá-la sem que percebessem que ele se encontrava ali.
A casa em que Beatrice morava era branca, e tinha portas e janelas vermelhas. O telhado, agora coberto por uma espessa camada de neve, era feito de uma telha avermelhada. Era uma casa bonita e alegre. Em nada se comparava com a mansão Black, que era sombria. Não que a casa de Sirius fosse feia, apenas não era o lugar ideal para uma criança. Parecia mais um cemitério, na opinião do moreno.
Sirius preferira não se arriscar em ir chamar Beatrice para brincar. Caminhou apressado em direção ao mesmo parquinho em que conhecera a loira. Passaria algum tempo ali, e então voltaria para casa. Só esperava que, quando o fizesse, sua mãe estivesse se esquecido de que ele existia, nem que fosse por alguns momentos. Mas Sirius sabia que já estava pedindo demais.
Sentou-se no balanço e, esquecendo-se de sua família e os problemas que era tê-la, Sirius voltara a se sentir uma criança. Balanços nunca deixarão de ser divertidos, ele pensara enquanto balançava cada vez mais alto. Estava sozinho no parque.
“Eu te vi na frente da minha casa”, disse Beatrice que entrava em seu campo de visão, caminhando devagar, com receio de escorregar na neve. “Imaginei que estivesse querendo brincar, mas não queria dar brecha de nosso segredo ser descoberto.” Comentou enquanto sentava-se no balanço ao lado do dele. “Encantador de sua parte. Mas, eu duvido que você ainda pule mais longe que eu!”
“Ah! Se você conseguir se manter de pé...” Sirius alfinetou relembrando o ocorrido de alguns anos. “No três?” Perguntou, recebendo um sinal positivo da loira. “Um...”
“Dois...” Beatrice tinha uma expressão de desafio no rosto.
“Três!” Exclamaram juntos.
Novamente, haviam pulado no mesmo instante. Só que, desta vez, não fora apenas a loira que se desequilibrara. A neve havia deixado o solo escorregadio. E, neste momento, Sirius Black e Beatrice Aragon-Fancourt encontravam-se caídos ao chão, lado a lado, rindo. “Ok, desta vez o chão venceu a nós dois.” Foi o único comentário da parte do moreno.
“Eu tenho a impressão de que ele sempre me vencerá, quando se trata de pular do balanço”, Beatrice comentou. Sua voz tinha um tom fingido de pesar. Ambos voltaram a rir. Sabia que não era verdade, mas a sorte não estava ao lado dela nas últimas tentativas. “Bem, tenho de voltar pra casa antes que minha mãe dê por minha falta.” O sorriso morrera do rosto da loira. Ela queria poder brincar mais com Sirius. “Amanhã eu prometo tirar mais tempo pra brincar com você, ok?” E ao dizer isto, deu um beijo na bochecha do moreno – que acenou positivamente com a cabeça –, levantou-se e correu rua abaixo.
Sirius ainda ficou um bom tempo deitado no chão. Porém, quando a neve começou a cair mais forte, resolveu que era hora de voltar para casa. Então ele se levantou e caminhou lentamente em direção à sua casa, fazendo o mesmo caminho que Beatrice, só que com menos alegria ou disposição.
Comentários (1)
continua gostei muito ;)
2018-01-05