JANE UNHA LONGA

    Saí daquele hotel perdido, eu não sabia ser um vampiro, não tinha idéia do poder que tinha, tentei desaparatar e descobri que de nada adiantava, não era mais um bruxo... Lubna retornara para Morpheus, eu estava só e ligeiramente idiotizado pela minha nova condição. Demora um tempo para se acostumar com um corpo que não respira... e existe a fome, a fome constante do recém vampiro... você não é realmente um vampiro até fazer a primeira vítima, e enquanto isso não acontece, você morre de fome, é uma fome maior que a que qualquer sangue quente pode sentir, pois nunca se aplaca de todo.
    Não conheci um vampiro, nenhum que não tenha levado à morte pelo menos a primeira vítima, temos uma natureza assassina, mesmo eles, a família, que se dizem do bem, em algum ponto obscuro do passado foram vampiros assassinos. E minha primeira vítima fatal foi uma mulher, na noite seguinte.
    Antes de amanhecer eu estava encolhido numa cripta que eu arrombara, passei o dia em claro, amedrontado e faminto, escondido no escuro daquela cripta,  meus pensamentos começavam a clarear e eu não sabia ainda direito o que eu era... não me pergunte como, mas mesmo estando enclausurados, temos a capacidade de saber quando a noite chega. E comigo foi assim, anoiteceu, eu saí para a caça, ainda por puro instinto.
    Eu caminhei até a ponte que separa Nova Jérsey de Nova Iorque, e fiquei olhando Manhattan ao longe... era lá que eu queria estar, eu sentia o cheiro das emoções humanas. Nós, os vampiros, não temos sensações, frio, calor, tudo isso nos é indiferente, se bem que não gostamos de água, o elemento nos é estranho e desagradável... não sentimos cheiros físicos, porque não respiramos, mas sentimos o cheiro que as emoções tem, não é estranho?
     E eu sentia o cheiro das emoções em Manhattan, em Nova Iorque, a minha casa, a maldita cidade dos vampiros. Estava atravessando a ponte a pé, aliás uma tremenda idiotice da minha parte, eu não sabia que podia virar morcego... sabe como é, mente de bruxo, cheia de preconceitos, eu não era animago, afinal de contas... então eu a vi... uma mulher muito interessante, e eu senti sua emoções e nem soube na hora como, descobri seu nome.
    Marianne... Mystica, Misty... minha primeira vítima... ainda sinto saudades dela, às vezes. Ela era linda e oriental, me lembrou Lubna. Eu era um neófito, portanto, um idiota, e naquela hora, pouco depois do anoitecer eu saltei sobre a moça e a ataquei, e como um monstro destrocei a jugular da coitada e absorvi avidamente a vida dela que se extinguia. Foi quando ouvi uma voz bem atrás de mim:
‒ Que espécie de idiota é você, cara?
Eu me virei, numa posição meio ridícula, debruçado sobre o corpo morto da garota, a cara coberta de sangue, fora o desperdício que eu causei, espalhando todo aquele sangue no asfalto... sem dúdida, eu era um imbecil acabado, para a vampira que me olhava, porque eu a reconheci como tal imediatamente, e tive a certeza que estava diante de alguém muito importante. Nós sabemos a nossa hierarquia instintivamente, um neófito, a menos que muito corajoso, dificilmente vai desafiar alguém com o poder que Jane Unha Longa parecia emanar.
Ela era muito alta e muito negra, seus olhos eram amarelos como os de um gato, os cabelos negros eram cortados à maneira militar. Quando falava, sua voz emitia um poder e uma frieza que eu não me lembro de ter encontrado depois em nenhum outro vampiro. Eu fiquei mudo por um tempo até que tive coragem de perguntar:
‒ Quem é você?
‒ Quem sou eu? A pergunta está errada, meu caro... eu que digo: Quem é você? E o que está fazendo na ponte, idiota? Não sabe que a ponte é proibida? Você é uma porra de um escravo, certo? Tem semlpre algum que se perde e acaba fazendo besteira por aqui... eu odeio escravos, por isso que eu briguei com a droga da aliança... o que foi, ô ensanguentado? Quer um guardanapo, por acaso? Ou se entusiasmou tanto vampirizando a garota que comeu a própria língua? Ah, nem acredito que ela vai ficar com essa garganta arruinada para sempre... você a mutilou, sujeito, não tem vergonha? Que droga de vampiro burro é você? Qual o seu nome?
‒ Caius ‒ Gaguejei ‒ Caius Black ‒ eu vi o rosto da mulher se transformar, e uma expressão indecifrável substituir o esgar de desdém anterior.
‒ Um Black? ‒ ela disse ‒ aqui, no limite com Nova Jersey? Porque Morpheus te mandou para a ponte? Eu tenho certeza que ele queria por as mãos no seu bumbum macio antes de você nascer, garoto!
‒ Ele não me mandou... ‒ eu contei brevemente o que me lembrava da noite anterior e ela gargalhou alto.
‒ Eu não acredito! O velho Morpheus perdeu o juízo? Mandar uma escravinha apaixonada te sugar? Que grande babaquice, cara... ah, mas isso veio bem a calhar, tava chato aqui, eu precisava mesmo de alguém diferente de um escrevo por estas bandas.
‒ Do que você está falando? ‒ em menos de cinco minutos, a vampira me explicou a hierarquia vampira, o que era um escravo, um irmão e um líder. O estranho era que eu não me identifiquei como nenhum deles. E ela, lendo meu pensamento disse:
‒ Você está fora deste esquema, meu querido. Você é um renascido, alguém cujo corpo não precisou ser tocado, você recebeu o presente, e por amor. Já nasceu mais poderoso que um escravo, por ter bebido o sangue de um. E nem bem nasceu, já fez uma escrava, o que é uma droga. Quando essa garota acordar, você vai ser dono da vontade dela, sabia?
‒ Eu?
‒ É, você. Até que ela mate o suficiente para ser uma irmã sua, ou que seja pega, ou que morra no sol... essa é nossa sina, cuidar daqueles cuja vida mortal extinguimos.
‒ Mas, e se eu não quiser escravos?
‒ Abandone-os, eles se tornam perdidos, confusos, e acabam sendo pegos pelo sol. Se forem fortes, sobrevivem para começar um novo clã. A liberdade é a pior coisa que se pode dar a um vampiro neófito, porque ele ainda não sabe o que fazer com ela.
‒ O que você faz com seus escravos?
‒ Eu faço poucos escravos, não sou uma máquina de matar que nem os malucos da aliança, nem uma boa babá dos sangues quentes que nem os anjinhos de presas da família. Eu caço, mas não mato a vítima de uma vez, faço como os gatos, extinguo-lhes a vida  aos poucos, até que eles sejam meus. Se eles me agradam, eu os mantenho por um tempo antes de libertá-los, senão, os descarto. Dificilmente um escravo liberto fica por aí muito tempo, tem sempre um VH para matá-los.
‒ VH?
‒ Vai me dizer que você não conhece a irmandade? Eu sei que eles ajudam os Black de sangue quente a manterem-se desta forma, os malditos sangue imune.
Aquilo me lembrou desagradavelmente quem fora até a véspera meu melhor amigo. Eu ia dizer algo, mas me calei, creio que Jane, cujo nome eu ainda não sabia, pode ler novamente o que se passou pela minha cabeça, porque ela mudou de assunto.
‒ Então...  o que vai ser agora? Vai andar por aí e se enfiar num canto até o amanhecer ou quer aprender a ser um legítimo vampiro?
‒ Como?
‒ Junte-se ao meu clã. E leve a escravinha contigo, você vai precisar de alguém capaz de te amar incondicionalmente neste momento... é pegar ou largar.
‒ Eu pego... mas antes, quem é você?
‒ Você só precisa saber meu nome e minha área... Jane Unha Longa, a rainha de Nova Jérsei... use meu nome e qualquer um o temerá.
‒ Eu não quero ficar aqui, quero ir para lá ‒ apontei Manhattan com o queixo.
‒ Você não está preparado para aquela selva, morceguinho... primeiro tem que aprender algumas coisas. Eu fui seu bilhete premiado, acredite ‒ ela foi andando pela ponte e eu a segui, mas ela ordenou que eu pegasse o corpo da garota. Nem a contestei, eu naquele momento me tornei o único súdito de Jane, a rainha renegada dos vampiros de Nova Jérsei.
 
Enquanto eu seguia Jane pelas ruas de Jérsei, John descobriu meu desaparecimento, e fez uma força tarefa Van Helsing para me procurar. Ele achou que eu tinha aceitado a proposta de Morpheus, demorou algum tempo para ele descobrir Lubna entre os vampiros. Comunicou meu pai, que se recusou a acreditar nele e acabou montando aquela farsa sobre minha "morte". Ninguém soube onde eu estava nem teve certeza de como eu me tornara aquilo que fui. Demoraria sete anos para eu entrar triunfalmente em Manhattan, tão poderoso quanto qualquer um, e disposto a ser o chefe supremo da aliança. Nesse tempo tanto Morpheus quanto John fariam tudo para me achar, mas como dizia Jane, não se pode capturar a névoa. Enquanto eles procuravam um sujeito chamado Black, um vampiro apelidado de Fog (névoa), ganhava poder em Nova Jérsei.


Caius sorriu para Harry cinicamente e mexeu o Bloody Mary ainda rindo.
‒ Gostando de minha história?
‒ Adoraria ouví-la em outras circunstâncias, mas não quando estou em missão e preciso resolver um crime.
‒ Você nunca ouviu falar em entretenimento, jovem? Em determinados momentos é melhor se distrair um pouco, para alcançar o sucesso. Se eu fosse você, ouviria um pouco de música...
‒ Eu não quero ouvir música. Eu quero solucionar os crimes.
‒ Que cantilena monótona, Potter. Bem se vê o CDF que você deve  ter sido em Hogwarts.
‒ Pelo que eu sei, você foi um CDF.
‒ Mais ou menos... eu tinha meus segredos e meus passatempos. Eu soube que Sirius fez um mapa que quase todas as passagens que eu descobri em Hogwarts. Ele deve ter fuçado meus cadernos secretos. Mas eu não tive amigos como os que ele teve.
‒ Sim, ninguém nunca te traiu...
‒ É o que você pensa, meu jovem... ‒ Caius sorriu e voltou a narrar sua história

Jane era completamente diferente de tudo que eu já havia conhecido. Ela me ensinou tudo, tudo que eu precisava para ser um vampiro, e me falou da importância do amor para os vampiros. Amor de vampiro não tem nada a ver com amor de sangue quente... entre nós não há essa coisa de sexo, se bem que se necessário para seduzir um sangue quente, damos a ele o maior e mais caro prazer sexual que ele teve em sua vida. Lubna fez isso comigo.
Mas nosso amor é mais forte, porque não tem motivação hormonal... o amor de um vampiro é a busca de alguém que possa preencher o vazio de não se ter uma alma. Amantes vampiros escolhem e matam juntos, decidem o destino de seus escravos, dividem o mesmo nicho (você não acredita realmente que a gente durma em caixões, acredita? Isso é tremendamente cafona para nós). Não há nada mais prazeiroso para um casal vampiro que extinguir a vida de uma vítima juntos. E a minha primeira amante, Misty, matou muitas vezes comigo, a despeito da mágoa que eu lhe causei.
Talvez você se pergunte porque eu não me tornei amante de Jane, tão poderosa que era... isso era impossível, porque Jane só gostava de ter companheiras do mesmo sexo. Ela ainda se recuperava da queda de sua última companheira quando eu a conheci. A vampira que fora sua companheira por 60 anos morrera nas mãos de Steve Van Helsing.
Gravitavam em torno de Jane uns sessenta vampiros, vampiros meio caipiras de Jérsei, e eu me achava melhor que todos, eles eram os ex-escravos dela. Foi através deles que eu soube a história de Jane. Ela fora escrava no Sul dos Estados Unidos há mais de 200 anos. Então, um homem, que mais tarde foi conhecido como o fundador da família, ofereceu-se para torná-la uma vampira, e libertá-la de sua escravidão. Pois bem... ela foi vampirizada e tornou-se uma vampira escrava, mas logo foi liberta e se juntou à família. Aprendeu a tática de nunca matar a vítima, mas aquilo foi lhe pesando... não parecia certo para ela que um vampiro contrariasse tão frontalmente sua natureza. Quando Hans Hagen, que a vampirizara, partiu para o Brasil, ela migrou para Nova Iorque, e conheceu a Aliança.
Foi uma festa para ela. Matar sem compromisso depois de quase cem anos de frugilidade. Mas também aquilo a entediava. Escravos demais, aborrecimentos demais... e daquele jeito Nova Iorque teria que ser ilhada para os vampiros em alguns anos... então, os Van Helsing chegaram, e as coisas ficaram menos divertidas ainda. Porque além deles perseguindo os vampiros, começou uma onda de obsessão por poder que culminou com uma guerra fria que dura até hoje.
Há uma regra: vampiro não mata vampiro, de forma alguma. Se hoje eu empunhar um punhal de prata diretamente contra um vampiro, não importa como, eu morro junto, entende? Todos nós sabemos disso. E nos esforçamos para não quebrar esta regra de sobrevivência. Porém, há algumas brechas nesta mesma regra... se eu não matar um vampiro diretamente, mas provocar sua morte por meios indiretos nada me acontece. Isso explica porque um super cérebro como Morpheus sobreviveu por 100 anos... ele adorava encontrar formas de "ferrar" quem entrava em seu caminho... mas, bem, ele entrou no meu caminho um dia.
Nos anos que fiquei em Nova Jérsei eles me deram o apelido de "Fog", porque eu só me transformva em névoa, não gostava de virar nem lobo nem morcego. É desprezível para alguns o vampiro que não vira morcego e isso jogou a meu favor. Eu e Misty crescemos juntos no mundo vampiro, mas eu sabia que ela tinha um segredo que não me contava. Eu sabia que ela tinha tido um namorado no mundo vampiro, mas ela aprendeu rapidamente a esconder seus pensamentos de mim, e eu só soube quem era seu namorado quando era demasiado tarde.
Talvez você queira entender porque eu me tornei poderoso e , eu sei, tão pouco modesto em relação ao meu próprio poder. A chave é Jane. A verdade é que Jane me tinha como um filho. Ela nunca os teve naturais, e vampiros obviamente não deixam descendência. Então eu pareci a Jane alguém a quem passar todo seu conhecimento, que era muito. Ela me treinou, e com ela eu me tornei capaz de seduzir qualquer sangue quente que eu quisesse, deixá-lo vivo tempo suficiente para que ele implorasse ser vampirizado, e com essa tática eu fiz os melhores escravos de jérsei. Eu libertava muitos e os mandava para Manhattan, onde eles diziam se discípulos de Fog. E em Manhattan todos queriam saber quem era Fog. Eu demorei alguns anos para responder o chamado, mas antes, fui traído pela minha companheira.

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