Vale-Beijo II





Narrado por Remus Lupin


 


 Respirei fundo.


 - Kate! – chamei. Ou pelo menos foi isso o que pareceu. Mas eu estava tão nervoso que o que acabou saindo foi um sussurro rouco para chuchu.


 Respirei fundo de novo e pigarreei.


 - Kate! – ah, agora sim [aplausos]!


 Ela virou a cabeça ao ouvir meu chamado, um sorriso pronto no canto dos lábios. Mas, quando viu quem era, fechou a cara e começou a andar mais rápido pelo corredor, indo em direção às amigas.


 ‘Taí uma coisa que eu não entendo. Porque diabos as garotas adoram andar em bando?! É bem mais difícil conversar quando elas estão acompanhadas.


 Respirei fundo (de novo) e fui em direção ao grupo. Ao ver que eu estava indo até lá, Kate me deu as costas e fingiu conversar com Marlene. Troquei um olhar com Lily, que levantou a sobrancelha para mim, um sorrisinho maroto nos lábios.


 Decidi ignorá-la totalmente.


 - Kate. – eu disse, ao chegar perto das garotas. Ela nem se dignou a me olhar. Eita, garota difícil, viu? Vou te contar, não é fácil, não. – Kate. – tentei de novo. Nada. – Katherine. – e de novo. Nada de nada.


 Ás vezes eu me surpreendo com a minha própria paciência. Qualquer um já teria dado as costas e desistido. Eu poderia fazer isso. Mas, o fato é, eu realmente queria ficar. Não só queria ficar, como queria que Kate me perdoasse e voltasse a falar comigo.


 Ô, saco, viu? Gostar de gente que não gosta de você é um saco.


 - Katherine, será que dá para falar comigo? – perguntei. – Por favor?


 Kate fingiu não me ouvir. Eu a odeio. Como pode uma pessoa ser assim tão teimosa?


 Lily trocou um olhar irônico com Marlene.


 - Qual é, Kate. – fez Marlene. – Conversa com o garoto.


 Olhei, esperançoso, para as costas da garota loira. Merlin, se ela me perdoar, juro que subo as escadas da Torre de Astronomia de joelhos!


 - Seja rápido. – resmungou Kate, se virando para mim.


 Ah, eu a adoro! Sabia que ela ia me dar uma chance! E ela fica tão linda, brava desse jeito, com o nariz vincado e as sobrancelhas arqueadas!


 Concentra, Remus! O que a Lily disse mesmo que eu deveria fazer? Ah, sim...


 Passo I: peça desculpas.


 - Kate, eu... – comecei, meio incerto. Pedir desculpas seria... só pedir desculpas? Assim, do nada? – Olha, eu... – Lily é mesmo inútil. Porque não especificou como eu deveria pedir desculpas? – Me desculpe.


 Acho que não foi o jeito certo... Como eu sei disso? Bem simples: minha voz falhou, Lily bateu na própria testa, Marlene fez uma careta e Kate... bem, Kate [risos nervosos]... saiu sem dizer nada.


 E eu? Fiquei olhando para as costas dela, sem reação.


 Porque eu dei ouvidos à Lily, me diz? Quais eram as chances da minha cabeça não terminar em um saco plástico?


 Olhei para Lily, pronto para ralhar com ela e acabar com a nossa amizade, mas ela bufou e começou a falar antes que eu soltasse meu discurso brilhante:


 - Por Merlin! – exclamou, jogando os braços para o alto. – ‘Tá esperando o que?! Vai atrás dela!


 Passo II: corra atrás dela.


 Me sentindo um idiota, fui correndo atrás de Katherine, que já tinha virado o corredor. Pelo menos agora ela estava sozinha, o que deixava tudo bem mais propício para conversar.


 - Kate! – chamei, pelo que parecia ser a milésima vez naquele dia.


 Ela fingiu que não tinha me ouvido, o que não foi nenhuma surpresa, porque, de acordo com Lily, o próximo passo seria...


 Passo III: segure-a pelo cotovelo e a faça olhar para você.


 Tenho que admitir que essa parte do plano foi fácil, isto é, até a Kate decidir que sacudir o braço que eu segurava com raiva seria uma boa idéia.


 - Me solte! – ordenou, entredentes.


 Nota: ela não estava olhando para mim. E o plano dizia claramente que ela tinha que olhar para mim.


 Apertei o braço que eu segurava (para ela não ter chance de escapar) e, com a mão livre, virei o rosto dela na minha direção. Kate olhou para mim, mas foi com muita má vontade.


 Passo IV: se xingue de todos os nomes que conseguir imaginar.


 - Kate, me escute, está bem? – pedi, tentando soar sério. O que, de fato, não aconteceu. Saiu bem mais desesperado do que eu gostaria.


 - Seja rápido. – ela resmungou, pela segunda vez no mesmo dia.


 Grossa.


 - Eu sei que fui estúpido, grosseiro, idiota, detestável, imbecil, ignorante, desprezível, cafajeste, canalha... – será que já estava bom? Não conseguia lembrar de mais nenhum insulto. – Eu nunca quis ser nada disso, nunca quis agir assim. E me senti ridículo quando percebi que tinha discutido com você por uma besteira. Eu... – parei. Eu... o que? Sentia muito? – Odeio quando a gente discute. E nesse tempo em que você não falou comigo, não ‘teve um só segundo em que eu não senti sua falta. – isso não estava no plano. Ah, não foi culpa minha. É o que eu ‘tô sentindo, falou? – Eu sei que a culpa é toda minha. Também sei que não tenho o direito de pedir que volte a falar comigo. – eu não tinha o direito, mas foda-se. VOLTE A FALAR COMIGO, POR FAVOR! Mas essa parte ela não precisava ouvir. – Só queria que você soubesse que eu... eu... sinto muito.


 O que era mesmo para fazer agora? Ah, sim! Passo V: dar o fora e parecer triste e cabisbaixo. Bem, isso não seria esforço nenhum.


 Olhei uma última vez para Kate, antes de soltá-la e dar as costas. Lily disse alguma coisa sobre andar devagar, para dar tempo de ela me alcançar. Mas eu queria mesmo era sair dali o mais rápido possível. Estava me sentindo meio envergonhado.


 Porque? Ora, é óbvio! O que eu tinha na cabeça?! Usar um plano da Lily (da LILY!) para me dar bem com a Katherine?! E se ela descobrisse isso?! Se sentiria usada, enganada (não sei exatamente porque, mas, vocês sabem, garotas são garotas). E o que eu diria? Me desculparia de novo?


 Eu sei que, para todos os efeitos, não foi culpa minha. Já tinha tentado me desculpar com ela várias vezes, mas não havia brecha. Eu estava em desespero.


 Não me olhe assim, ok?! O que queria que eu fizesse?! A culpa era mesmo toda minha e eu assumi isso! Mas, poxa, me dá um desconto! Não quis ser um energúmeno, só estava com ciúmes...


 Quer saber? A culpa era daquele retardado do Stephan O’Shea! Quem foi que mandou ele se enfiar na fanfic?! Chega logo agora e já quer ir tirando titulo de posse?! Isso é com você, Thomas! Não devia ter enfiado ele na fanfic!


 - Remus!


 Paralisei. Ótimo. Agora estou ouvindo vozes. Além de infeliz, tenho que ser louco. Ei, Merlin! Porque não piora mais?! Ainda não ‘tá ruim o suficiente!


 - Remus!


 Olha só, eu já escutei! Não precisa ficar repetindo!


 - Remus!


 Antes que eu pudesse formular um pensamento coerente (exceto esse), fui atingido por alguma coisa pesada e cai de cara no chão. Aí, doeu. Pirraça podia inventar de jogar coisas pesadas em outra pessoa, porque hoje eu não estava no clima.


 - Remus. – dessa vez a voz veio bem de perto, um sussurro na minha orelha.


 Espera só um instante. Pirraça tinha jogado Katherine em cima de mim?! Me lembrem de agradece-lo mais tarde, sim?


 - Kate? – perguntei, meio zonzo. Tipo, tudo bem que ela foi jogada em cima de mim, mas daí a ficar sentada nas minhas costas? – Fica meio difícil respirar com você aí em cima. – observei, arfando.


 - Desculpe! – exclamou e caiu deitada no chão, do meu lado.


 Me virei de barriga para cima e olhei para ela.


 - Mas o que foi isso? – questionei, porque, pensando bem, se Pirraça tivesse jogado Kate em cima de mim, provavelmente estaria rindo da nossa cara, mas não havia nenhum sinal dele.


 Kate riu, envergonhada.


 - Bom, eu fiquei te chamando, mas você não parava de andar, então... – e riu de novo, desta vez mais alto. E então começou a gargalhar com vontade, segurando a barriga, com lágrimas nos olhos.


 Estava linda.


 Comecei a rir também. Não achava tanta graça assim, mas só o fato de vê-la assim, rindo de qualquer banalidade, me dava vontade gargalhar, me deixava feliz.


 Acho que isso significava que ela me perdoava, não? Me lembrem de agradecer à Lily mais tarde.


 Ficamos assim, rindo, como dois bobos por um ou dois minutos. E me senti muito bem. Foi como uma descarga de adrenalina no meu sangue. Me senti capaz de qualquer coisa. E decidi que ia aproveitar esse momento e esquecer do resto por um tempo. Porque Kate tinha me perdoado. E com isso eu tinha ganhado a semana.


 Então tomei a mão dela na minha e apertei seus dedos com carinho.


 - Obrigado. – sussurrei e plantei um beijo nas costas da mão dela.


 Kate sorriu, parecendo tão alegre quanto eu.


 - Pelo que? – perguntou, apertando meus dedos. Me arrepiei.


 Pelo que? Eu não sabia ao certo.


 - Por tudo. – respondi, me apoiando no cotovelo para olhá-la de cima. – Por me desculpar. Por pular em cima de mim. Por ser incrível.


 Kate bagunçou meus cabelos carinhosamente e deu um beijo na minha bochecha.


 - Por me deixar arrepiado. – prossegui, me arrepiando ainda mais com o beijo dela.  Kate ficou subitamente séria. – Sabe que eu nunca fiquei tão arrepiado assim? – confessei.


 Silêncio. Não era exatamente a reação que eu esperava.


 Se tinha que acontecer alguma coisa, tinha que ser agora. Até porque se continuasse aquele silêncio, a coisa toda ia desandar.


 Me debrucei por cima dela com cuidado. Com a mão livre, enlacei sua cintura fina. Kate me pareceu tão delicada, tão quebradiça. Olhei nos olhos dela, torcendo para que não fugisse de mim, não me rejeitasse.


 Kate parecia assustada. Não queria que parecesse assim e me perguntei porque. Mas eu não ia recuar agora.


 Devagar, fechei os olhos e beijei-lhe os lábios.


 


 


Narrado por Marlene McKinnon


 


 A maioria das pessoas costumam ter um sinal na cabeça chamado Semancol. Alguém aqui sabe o que é isso? Eu explico. É aquele barulhinho que te avisa quando você está fazendo uma babaquice ou uma coisa que não devia estar fazendo. Sabe para que serve? Para ajudar você a entender quando deve parar de fazer o que está fazendo, compreende? Porque provavelmente o que você está fazendo naquele momento não era para estar fazendo. 


 Acabei de perceber que Sirius provavelmente não tem o Semancol. Porque ele deveria saber que o que está fazendo agora não é do meu agrado e, portanto, ele deveria parar de fazer.


 Deu para acompanhar?


 Aí, você me pergunta: mas o que diabos Sirius está fazendo? Bem simples, querido.


 ELE ESTÁ ME CONTANDO DETALHES DE COMO FOI CONVIDAR A LOIRA OXIGENADA DA SUSAN BLAKE PARA SAIR!


 Entendem a minha dor? Pois é.


 - Então eu disse para ela: “Você acaba de ganhar um vale-beijo, baby”. – disse Sirius, com aquela voz imbecil que ele usa quando acha que está sendo sensual. – “Quer retirar agora, ou mais tarde?”.


 ‘Baby’? Ele só pode estar de brincadeira com a minha face.


 - E o que ela respondeu? – perguntei, esperando que ela tenha dado um soco no nariz dele e sem nenhuma vontade de ouvir a porcaria da história pela quinta vez, mas fingindo que não estava nem aí.


 - Ela disse: “Não”.


 Disso eu já sabia, então não foi nenhuma surpresa. Estava na hora de tomar essa garota como exemplo e começar a dizer ‘não’ para essa criatura.


 Credo, eu disse mesmo que ia tomar a Susan Blake como exemplo?


 - E o que você fez?


 Sirius riu, o babaca.


 - Não precisei fazer nada, porque logo em seguida ela perguntou o que eu queria e acabou sendo questão de paciência. – ele riu de novo, o biltre idiota. – Afinal, eu sou Sirius Black.


 Revirei meus olhos. Ele diz isso como se fosse uma coisa boa.


 Eu devo ter feito alguma ofensa pessoal à Merlin, não é possível. Ou quem sabe devo ter dançado só de calcinha na cruz. Porque, ultimamente, só tem me acontecido desgraça.


 - Pois é. – resmunguei, e me sentei no batente de uma janela qualquer no corredor, enquanto Sirius começava a contar sua história mais uma vez.


 Será que eu mereço isso? Quer dizer, eu sei que amigo que é amigo de verdade, é amigo em todas as horas. Mas acho que ninguém vai me castigar se eu deixar de ser amiga do Sirius todas as vezes que ele começar a falar dessa garota. O que seria agora.


 Mas como fazer isso sem deixa-lo chateado? Talvez eu possa fingir uma dor de barriga e dar o fora. Ficar trancada no banheiro seria, sem duvida, uma alternativa melhor do que ouvir mais uma vez a história do ‘vale-beijo’ (essa cantada ele deve ter aprendido com a Lily, só pode).


 Primeiramente, não sei porque diabos ele está querendo pegar essa garota. O que é que ela tem de interessante? Parece ser tão sem sal, sem pimenta, sem vinagre, sem nada. Eu sei que não sou lá a Beyoncé, mas sou melhor que a vagabunda da Susan Blake, não sou? Não? Poxa, não dá nem para contar com os leitores. Estão todos contra mim! 


 O que? Ciúmes? Vá se danar!


 Não, eu não estou com ciúmes. Só acho chato quando a pessoa te chama para conversar e só sabe falar a mesma coisa. Qual é, você tem que admitir que isso é chato.


 Nesse momento, passou pelo corredor o que vocês podem chamar de ‘A Salvação de Marlene’. Porque? Primeiro, porque fez com que eu me livrasse do Sirius. Segundo, porque me fez parar de falar sozinha (ou pensar sozinha [dá na mesma]).


 - Jack! – exclamei, feliz, mas muito feliz, mas muito feliz mesmo.


 Sirius parou de tagarelar ao me ouvir falar. Shii, rimou! As coisas já estão melhorando, viram?


 Jack Torrance, jogador do time de quadribol da Grifinória, sorriu ao me ver. O que, vocês não sabem quem é ele?! COMO ASSIM?! Gente, ele é o garoto com quem eu conversei depois do treino de quadribol, lembram? Aquele treino em que o James não apareceu (N/A: capítulo ‘Cuidando do nosso futuro’)!


 Lembraram? Hein?


 - Oi, Lene! – cumprimentou Jack. Trocamos um abraço.


 Ele é tão legal! E bonito, mas isso não vem ao caso agora.


 - ‘Tá a fim de dar uma volta no jardim? – perguntei, me soltando do abraço, sorridente, usando Jack como passaporte para dar o fora dali. Eu sei, é grosseria. Nem perguntei se ele estava bem e tals, mas eu estava em desespero, entendam. – Faz tempo que não conversamos.


 Jack abriu um sorriso enorme e completamente lindo ao ouvir meu convite. Não sei porque, sair comigo nem é lá grande coisa.


 - Claro. – respondeu, colocando as mãos nos bolsos da calça e dando de ombros. – Se não me convidasse, eu acabaria te convidando.


 Ele é tão meigo, né?


 - Espera, vai me deixar aqui falando sozinho? – esse foi Sirius.


 Me virei para ele e levantei uma sobrancelha.


 - Porque se importa? – retruquei. – A única coisa que você tem falado ultimamente é sobre Susan Blake. Não leve a mal, mas fica chato depois de um tempo. – eu não estou com ciúmes, nem ousem! – Já que gosta tanto dela, então vá falar com ela.


 E dizendo isso, agarrei Jack pela camisa e o arrastei para ir comigo. Ele foi sem fazer objeções. Assim que viramos o corredor, ele começou a rir. Não me perguntem do que, não leio mentes, sabe qual é?


 Me virei para ele.


 - O que? – perguntei, divertida.


 Jack passou o braço pelos meus ombros carinhosamente.


 - Acabei de salvar sua vida, né? – perguntou, com um olhar desconfiado.


 Eu ri. Não era engraçado. Se ele estivesse no meu lugar, não teria rido. Mas eu ri mesmo assim.


 - É o que parece. – concordei. – Mas ainda quero dar uma volta no jardim, se não se importar.


 Ele deu de ombros e tirou o braço dos meus ombros, pegando minha mão.


 - Estava contando com isso. – disse e sorriu.


 Não sei vocês, mas essa é uma das coisas que me encantam nele: Jack sempre está sorrindo.


 Nós dois saímos correndo feito duas crianças em direção ao jardim. E não é que o dia melhorou e muito?


 


 Narrado por James Potter


 


 - AH! – berrei, colocando a mão no coração, praticamente tendo um ataque cardíaco com o susto.


 - AH! – ela berrou e sacou a varinha das vestes, na defensiva.


 - AH! – berramos juntos. Eu, porque vi quem era ela e ela, porque viu quem eu era.


 Evans jogou a cabeça para trás e começou a rir, baixando a varinha. E eu... bem, eu... continuei assustado demais para fazer alguma coisa além de segurar o coração.


 ‘Tá legal, isso é ridículo!


 - EVANS! – ralhei, raivoso. Alguns quadros me mandaram calar a boca. Gente antipática. – Quer me matar do coração? – falei, mais baixo dessa vez.


 Essa baixinha continuou a rir da minha cara e alguns quadros acompanharam ela. Depois de alguns segundos, o corredor todo estava rindo de mim.


 Mundo injusto. Quer dizer que ela ninguém manda calar a boca, né?


 - Só se for de amor. – rebateu Evans, limpando as lágrimas de riso.


 Mas ela não perde uma oportunidade?


 - Francamente, Evans. – retruquei, bravo.


 Ela riu mais um pouquinho com o que eu disse. Depois me pegou pelo braço e me afastou para um corredor sem quadros, em silêncio.


 A pessoa me mata de susto, ri de mim por um minuto e já se acha no direito de ir me arrastando para onde bem entender. Em que mundo estamos?


 - Desculpe – sussurrou, silenciosa. Preocupada com Filtch, imaginei. - Não queria te assustar.


 Mas é claro que não queria, ela nem sabia que eu estava lá!


 - O que está fazendo fora da cama à esta hora? – sussurrei de volta, soltando meu braço com força. Tenho que me lembrar de ser menos brutal às vezes.


 Evans fez cara de incredulidade e cruzou os braços.


 - Não estou vendo seu distintivo de monitor. – acusou. – Então não me venha com banalidades.


 Banalidades? Ela só pode estar de brincadeira.


 - Não mude de assunto! Você sabe perfeitamente que deveria estar no dormitório.


 Evans apontou um dedo na minha cara. Odeio quando fazem isso.


 - Você também deveria. – acusou. Então me encarou de cima a baixo, desconfiada. – O que está fazendo acordado à essa hora?


 Ferrou. Como é que eu ia explicar para ela que tinha acabado de deixar Anne no dormitório? Que tinha ficado aos amassos em uma sala vazia até essa hora da noite?


 Quer saber? Eu não devo explicações à Evans!


 - Não está tão tarde... – desconversei, me ocupando em olhar para os sapatos.


 Evans agarrou meu pulso e quase enfiou o relógio que havia lá no meu olho.


 - É melhor aprender a usar o relógio, James. – provocou.


 Ora, ela ia ver só e... e...


 Mas que MERDA! Era quase meia noite!


 Eu ia responder, mas alguma coisa me atrapalhou. Olhei de relance para o fim do corredor e vi dois olhinhos brilhantes vindo em nossa direção.


 É a gata do Filtch!


 Agarrei o braço da Evans e arrastei-a para trás de uma estátua junto comigo. Por Merlin, se me pegassem, eu estaria morto! ‘Tá legal, talvez não morto, mas com certeza muito bem encrencado.


 Esta vendo só? Essa garota é um imã para desastres! Foi só esbarrar com ela, que tudo começou a dar errado.


 - O que...? – Evans começou a dizer, mas tampei-lhe a boca com a mão, o que fez com que quase o rosto todo dela desaparecesse.


 Me sinto tão grande perto dessa coisinha pequenininha chamada Lily Evans.


 No espaço pequeno, meu corpo ficou colado ao da Evans. Eu podia sentir a respiração dela no meu pescoço. Não foi legal. Principalmente quando notei que não estava ligando muito para o fato de as curvas dela se encaixarem perfeitamente no meu corpo.  Ainda mais quando notei que estava prestando atenção ao fato de que ela tem curvas.


 Esperei que a gata passasse e que eu não pudesse mais ouvir seus passos. Então saí com a Evans de trás da estátua.


 - Isso foi desnecessário. – disse ela, ajeitando as vestes.


 Desnecessário?!


 - Eu acabei de salvar sua vida. – disse. E acabei pensando melhor: – É, você tem razão. Foi desnecessário. Deveria ter me escondido sozinho e deixado você levar uma detenção. – não que ela fosse dar muito importância para isso.


 Evans revirou os olhos.


 - Não era disso que eu estava falando. – e retirou um pedaço de pergaminho velho do bolso traseiro da calça jeans. Ela o abriu e apontou a varinha para seu interior. – Eu juro solenemente que não vou fazer nada de bom. – aquilo era um tipo de feitiço?


 Meus olhos se arregalaram. O pergaminho passou a ser um tipo de mapa, com todos os cômodos de Hogwarts desenhados com exatidão em suas várias dobraduras (que eram muitas). Fiquei observando enquanto Evans examinava o mapa, os olhos cerrados para enxergar melhor.


 ‘Tô tão chocado que chego à estar sem palavras. Eu sei, também estou chocado.


 - Aqui. – disse ela e apontou para um ponto no mapa intitulado ‘Filtch’. – Ele está na sala dele, dormindo em cima da própria mesa. E babando. – acrescentou com uma careta. - Por isso eu disse que se esconder foi desnecessário. Ele nunca iria nos pegar.


 Mas o que...? Como? Quando? Onde?


 - Esse mapa mostra... – ofeguei. – Todo mundo?


 Evans sorriu (o primeiro sorriso inteligente que eu a vejo dar [deve ser uma espécie de milagre]).


 - Todo mundo. – confirmou. – Onde estão e o que estão fazendo em cada minuto de cada dia.


 - Maravilha! – exclamei e tive que me controlar para não tomar o mapa das mãos dela. Então estreitei os olhos. – Onde conseguiu isso? – perguntei, desconfiado. De quem será que ela roubou essa joça?


 A garota deu de ombros.


 - Mal feito, feito. – sussurrou para o pergaminho e o mapa sumiu. – Fui eu que fiz. – dobrou o pergaminho e o enfiou de volta no bolso de trás da calça.


 Sei, e ela espera que eu acredite nisso? HÁHÁHÁ. HÁHÁ. HÁ. Até parece.


 - Você? – eu ri, debochado. – Só pode ser piada.


 Evans me encarou por cima dos óculos. Pareceu magoada com meu comentário.


 - Piada é você ficar até tarde da noite agarrando sua namorada em uma sala vazia e depois se achar no direito de vir me criticar. – disse, séria.


 Espera só um segundo... Eu estou levando uma bronca da Evans?! Eu não ‘tô em um bom dia. Acredite, isso geralmente não acontece.


 - Foi mal. – resmunguei, meio envergonhado. Nunca me passou pela minha cabeça que aquele mapa podia mostrar até o que EU estava fazendo.


 Mas é claro que a Evans ia usar aquele mapa para espionar minha vida.


 Evans sorriu para mim, voltando ao normal. Nossa, ela se contenta com um simples ‘foi mal’? Queria que a Anne fosse assim.


 - Vamos fingir que o mapa estava mostrando apenas você andando na escola no meio da noite, porque acordou morrendo de fome, ‘tá? – sugeriu ela.


 Concordei com a cabeça e já estava pronto para me despedir e ir para o dormitório, quando Evans acrescentou:


 - Quer ir até cozinha? Isto é, se estiver com fome.


 Eu tinha perdido o jantar, então é obvio que estava com fome. Mas onde é que ela imaginava que ia encontrar a cozinha? Até onde eu sei, nenhum dos alunos sabe onde fica a cozinha. Talvez aquele mapa doido mostre...


 - E como você espera encontrar a cozinha? – perguntei, porque eu realmente queria saber.


 Evans sorriu, marota.


 - Isso é um ‘sim’? – perguntou, esperançosa.


 Droga, nem tinha me tocado que sem nem pensar já tinha concordado.


 Revirei meus olhos.


 - Talvez. – resmunguei. – Mas quero deixar bem claro que isso não é um encontro. – decidi, sendo categórico. Não era justo deixar que ela misturasse as coisas.


 Evans ergueu o dedo mindinho.


 - Eu juro. – prometeu.


 - E não vai poder me chamar para sair. – acrescentei.


 A biltre fingiu trancar os lábios e jogar a chave fora. Senti que minha boca estava se abrindo em um sorriso e fiz força para impedir. O que saiu foi meio que uma careta.


 Evans riu de mim enquanto começávamos a andar.


 - Sabe, James, tudo bem sorrir para mim. – comentou alegremente.


 Eu a ignorei.


 - Vai me contar como foi que fez esse mapa? – mudei de assunto. Não que eu quisesse manter qualquer tipo de conversa com ela, mas o silêncio ia ficar meio tenso depois de um tempo.


 - Bem, não foi sem ajuda, isso eu garanto. – assegurou ela.


 - Katherine? – chutei.


 Evans confirmou com um aceno de cabeça. Isso já era de se esperar.


 - E Marlene.


 Marlene? Isso é meio estranho. Um mapa tão complexo como aquele teve a ajuda de Marlene? Ela deve ter ficado assistindo, é claro.


 - Estou surpreso. – confessei.


 Evans fez uma careta.


 - Eu e Marlene não somos burras, por mais que você pense o contrário. – disse. – Posso não ser a melhor da turma e Marlene pode não ter lido a biblioteca inteira, mas sabemos coisas que talvez nem você saiba.


 HÁ! Disso eu duvido! Mas é melhor nem dizer nada. O médico dela disse que não é bom contrariar.


 - Por falar em coisas que eu não sei... – comecei, mudando de assunto. De novo. Parece que é impossível ter uma conversa normal com essa garota. – O que estava fazendo andando pelo castelo à essa hora?


 - Estava dançando. – respondeu Evans, dando de ombros, fazendo pouco caso daquilo.


 Franzi a testa.


 - Dançando? – estranhei. – Desde quando você dança?


 Viramos um corredor e seguimos alguns passos antes de ela decidir me responder.


 - Bom, desde... Sempre, eu acho. – e riu de si mesma. – Francamente? Não tenho idéia.


 Não sei se você, caro leitor, chegou a reparar, mas me parece que a Evans costuma rir muito de si mesma. Para ser sincero, acho que ela está sempre sorrindo. ‘Taí uma coisa que eu posso colocar naquela bendita lista.


 - Você dança que tipo de estilo? – perguntei, vendo nessa conversa uma oportunidade para recolher as supostas qualidades que ela tinha.


 Eu até poderia ver isso depois, mas ter outra conversa com essa baixinha não estava nos meus planos para o futuro.


 - Eu danço tudo o que tocar. Dança de salão, ballet, street dance… - Evans respondeu. – Só não conte aos meus pais. Para eles, eu tenho que ser uma futura bailarina em uma das escolas famosas da Rússia.


 - Não sabem que você dança mais do que ballet? – isso era meio imprevisível.


 - Não.


- Então... como foi que aprendeu os outros ritmos? – porque se os pais dela não sabiam que ela dançava outra coisa, como poderiam pagar para que aprendesse?


 Evans sorriu, travessa.


 - Existe um bar nos subúrbios de Londres que se chama Lar dos Bêbados. – a Evans? Andando pela parte pobre da cidade? – Lá é um lugar com gente de todo tipo, que foi para Londres em busca de oportunidades e acabou preso em um emprego chato. O cozinheiro queria ser guitarrista, o barman é dançarino, o garçon é ator, o faxineiro é comediante. Cada um com seu sonho. Foi lá que eu aprendi.


 Viramos outro corredor.


 - Seus pais não são ricos? – questionei.


 - Sim. – ela respondeu, provavelmente se perguntando aonde eu queria chegar.


 - Então o que levou você à andar pelo subúrbio?


 Evans me jogou um olhar chateado. Pela segunda vez na mesma noite. Eu devo estar meio insensível hoje.


 - O que pensa de mim? – perguntou, juntando as sobrancelhas. – Acha que eu sou o tipo de riquinha mimada e esnobe?


 Dei de ombros, sem querer dizer que sim, porque era exatamente o que eu pensava.


 - Você não me conhece, Potter. – e suspirou. – Você nem tenta me conhecer.


 Ela me pareceu meio triste. Nem sequer olhou mais para mim, preferiu olhar para as janelas. E eu não encontrei nada para dizer.


 Nunca pensei que fosse me sentir mal pela Evans. Será que devo me preocupar com isso? Não acontece com frequência.


 Eu não deveria me sentir mal, deveria? Quer dizer, aquela é a Evans, a garota que eu odeio. A idiota, arrogante, prepotente. Então porque, em nome de Merlin, eu estava me sentindo mal? Ora, porque ela ainda é uma garota! E eu detesto magoar garotas. Se é que a Evans podia ser considerada uma garota.


 Ah, eu não vou me desculpar! Estamos em um país livre, minha gente! Faz mal eu demonstrar o que eu penso dos outros? E, se quer saber, eu nem ligo para esse silêncio chato, falou? Por mim, a Evans nem abriria mais a boca!


 Ei, não me olhe assim! Se eu me desculpar, ela vai ficar se achando depois e não é isso o que eu quero. O que? Como assim, não preciso me desculpar? E espere que eu faça o que? Quebre o silêncio?


 É, talvez assim ela não fique se gabando.


 Mas isso não vai acontecer de novo, então nem comece a se animar, ok?


 Bufei, derrotado, e perguntei:


 - Qual a sua cor preferida? – porque, bem, se o negócio era tentar conhece-la, então era melhor começar agora. E eu ainda tinha a lista para fazer e precisava de informações.


 Evans se virou para mim e riu, alegre.


 - Azul. – respondeu, enfiando as mãos nos bolsos, imitando minha posição. – Mas não aquele azul sem graça! – alertou. Como se eu pudesse pensar o contrário!


 - Qual azul? – como se existisse mais de um.


 - Aquele que aparece no céu toda vez que está amanhecendo. Meio desbotado, meio fosco, sabe?


 Eu não tinha idéia do que ela estava falando.


 - Não. – respondi, com sinceridade.


 - Devia assistir à um nascer do sol um dia desses. – recomendou. – Então vai ver meu azul. E aí, quem sabe, você comece à dar mais valor para as pequenas coisas.


 É difícil admitir, mas eu não conseguia mesmo me lembrar de quando foi o último nascer do sol que eu tinha assistido. Evans tinha razão? Eu não dava valor para as pequenas coisas?


 - E qual é a sua cor preferida? – Evans perguntou de volta.


 - Preto. – respondi, automaticamente. E logo me arrependi. Não estava querendo falar da minha pessoa logo para a Evans.


 Ela fez uma careta.


 - Porque? – estranhou. – É uma cor tão sem graça.


 Eu ri, divertido. Peraí, eu ri?


 - Exatamente. – disse. – Meu cabelo é cor de abóbora enlatada. A única cor que fica bem em mim é o preto.


 - Eu discordo.


 Revirei meus olhos. A opinião dela nem conta.


 - E seu animal preferido? – prossegui, perguntando a primeira coisa que me veio na cabeça.


 Evans parou para pensar. Viramos em outro corredor e este era cheio de quadros. A garota me guiou até um deles e começou a fazer cócegas em uma pêra. Eu sabia que ela era mentalmente perturbada, mas nunca imaginei que chegasse a tanto.


 Isto é, até a pêra começar a rir e virar uma maçaneta. Aí, eu comecei a me perguntar se o mentalmente desequilibrado não era eu.  


 - Mariposa. – respondeu Evans, girando a maçaneta e abrindo o quadro, como uma porta.


 Nós dois entramos pelo buraco do quadro e fechamos a porta.


 - Mas mariposas são destrutivas. – discordei, pensando em como esse poderia ser o animal preferido de alguém. – São consideradas pragas em muitos lugares.


 A cozinha era um lugar enorme. E quando eu digo enorme, eu quero dizer no sentido literal da palavra. Havia panelas, caldeirões, frigideiras, talheres, pratos e taças por toda parte, tanto limpos quanto sujos. Nunca vi tanta prataria empilhada. Isso sem falar na quantidade de comida, que era absurda. Tortas, bolos, macarrão, purê, carne, sopa, legumes, doces (e até chocolate quente) tomavam as mesas que tinham no local. E acredite quando digo que nunca vi tantos elfos domésticos juntos.


 Evans sorriu, divertida. Ainda estou tentando descobrir se foi por causa da minha cara de choque ou do que eu havia dito antes.


 - Na verdade, são animais muito delicados. – defendeu ela. – Sabia que existe uma espécie de mariposa que se alimenta só de lágrimas? – isso me fez tirar os olhos da cozinha e me virar para ela, incrédulo. – Pois é. – confirmou. – É só o que ela bebe e come a vida toda.


 Eu não sabia disso. E fiquei envergonhado por não saber. Como podia a Evans saber de uma coisa que eu não sabia?


 Nesse momento, um elfo soltou um gritinho feliz e veio correndo na nossa direção. Observei a Evans ficar de joelhos e abrir um sorriso carinhoso.


 - Sr. Dingles! – ela exclamou e o elfo quase se jogou nos braços dela. – Como vai? Bem?


 Gente, eu ‘tô chocado. Será que sou só eu?


 - Srta. Lily! – o elfo chamado Dingles soltou, parecendo uma criança na Disney. – Vou muito bem. À que devo a honra de sua presença?


 Honra? Ele não pode estar falando sério.


 Evans cruzou os braços e levantou a sobrancelha, brincalhona.


 - Nem comece com esse tratamento de realeza. – ralhou. – O que foi que conversamos sobre isso?


 Dingles pareceu envergonhado.


 - Srta. Lily é amiga de Dingles. Nada de tratamento especial. – sussurrou, com a cabeça baixa.


 - É isso aí. – fez Evans e lhe jogou uma piscadela.


 O elfo abriu um sorriso de orelha à orelha.


 - Sr. Dingles, esse é meu amigo, James Potter. – Evans me apresentou.


 Fiquei de joelhos para me apresentar ao elfo, que se atirou em cima de mim, com um abraço.


 Evans riu.


 - É um prazer, Sr. Dingles. – eu disse, rindo também.


 Dingles me soltou, com um salto.


 - O prazer é de Dingles, Sr. James. – disse ele e me deu um soco no ombro.


 Ai! Ai! Doeu!  


 Evans gargalhou alto, vendo minha careta. Ela me cutucou com o cotovelo.


 - Fui eu que ensinei isso para ele. – segredou-me.


 - Tinha que ser. – sussurrei, bravo, massageando o ombro.


 A garota revirou os olhos para mim.


 - Nem doeu tanto assim. – observou. – O que vai querer comer?


 Pensei a respeito. Estava com tanta fome que seria capaz de comer o próprio Dingles, se me oferecessem.


 - Acho que vou querer frango frito. – me decidi. Afinal, elfos não pareciam lá muito apetitosos.


 Evans fez que sim com a cabeça, concordando com a minha decisão.


 - Sr. Dingles, pode trazer frango frito para nós? – perguntou, educada.


 Dingles fez que sim com a cabeça, as orelhas balançando com o movimento.


 - Posso trazer também batatas assadas na manteiga? – ofereceu o elfo, quase esperançoso. – Quem sabe suco de morango? E sorvete como sobremesa?


 Uau. E eu aqui querendo só frango.


 Evans deu de ombros.


 - Traga o que quiser.


 Dingles correu para dentro da cozinha, quase derrubando uma pirâmide de panelas que estava em seu caminho e quicando de tanta felicidade. Acho que era melhor alguém prendê-lo na face da Terra.


 Evans agarrou a manga da minha camisa e me puxou para uma mesa redonda de madeira, no canto do recinto. Nós sentamos de frente um para o outro, porque eu me recusava a sentar ao lado dela.


 - E qual é o seu animal preferido? – ela me perguntou.


 Um sorrisinho tentou escapar pelo canto dos meus lábios, mas eu o segurei bem a tempo.


 - Gosto de corsas. – contei, apoiando os cotovelos na mesa, casualmente. – Acho que são animais muito elegantes.


 Por algum motivo obscuro, Evans abriu um sorriso enorme ao ouvir isso, como se para ela significasse muita coisa.


 Decidi ignorar essa reação.


 - Um dia preferido? – prossegui perguntando.


 - Véspera de Natal. – ela respondeu, prontamente. – Minha família sempre dá uma festa, na qual eu faço uma apresentação de dança. É sem dúvida o melhor dia do ano.


 Fiz que sim com a cabeça, compreensivo.


 - Isso quer dizer que faz apresentações de dança em público? – adivinhei.


 - Eu costumava fazer. – confessou. – Mas parei.


 Não entendi.


 - Porque? – questionei.


 Evans riu e apoiou as mãos na mesa, brincando com os próprios dedos.


 - Porque começaram a me pagar por isso. – deu de ombros. – Aí, perdeu a graça.


 Não deu para segurar. O sorriso saiu, grande e carinhoso, e foi mais forte do que eu.


 Estão animados assim porque? Estavam torcendo para isso acontecer, não é?


 - Nunca pensei que fosse ouvir algo assim de você. – admiti, torcendo para que ela não tivesse notado nada de especial no meu sorriso.


 Evans sorriu, marota.


 - Acho que é porque sou surpreendente. – e piscou para mim. Então pareceu se lembrar de alguma coisa. – Por falar nisso, eu não me lembro de ter te dado sua cantada diária hoje.


 Revirei meus olhos.


 - Não vai ser necessário. – resmunguei, com uma careta. – Não estou sentindo a menor falta. – o que não era verdade. No café da manhã, eu tinha notado que estava faltando alguma coisa.


 Não tive muito tempo para pensar nisso, porque Dingles chegou com a nossa comida nessa hora. Colocou tudo em cima da mesa e ganhou um beijo da Evans em ambas as bochechas, antes de sair saltitando, feliz.


 E vou te contar, hein? Batatas coradas crocantes por fora e macias por dentro; frango frito sequinho e saboroso; suco de morango doce e gelado. Fala sério? Deu água na boca, não deu? Morram de inveja, reles mortais.


 - Você acaba de ganhar um vale-beijo, James. – disse Evans, do nada. – Quer retirar agora ou mais tarde?


 - Ótimo – reclamei. – Eu não ia conseguir dormir se não recebesse uma cantada dessas hoje. – com ironia, é claro. – E Sirius já usou essa, só para você saber.


 Evans, que estava se servindo, parou.


 - Agora Sirius decidiu roubar minhas cantadas?! – exclamou, irritada.


 Coloquei a comida no meu prato e enfiei um pedaço da batata na boca. Por Melin, eram a melhor coisa que eu já tinha comido na minha vida!


 - E qual é o seu dia preferido do ano? – Evans rebateu minha pergunta, com a boca cheia de frango.


 Segurei uma risada. E ainda bem que o fiz, ou voaria frango para todo lado.


 - Com certeza não é o Natal. – contei, concentrado na comida. – Acho que é o dia do aniversário de casamento dos meus avós.


 - Porque?


 - É o dia em que comemos macarronada com frango, assistimos ao vídeo do casamento deles e ouvimos as histórias deles na sacada da casa. – expliquei, e fiquei feliz com a lembrança. – E é no verão.


 Evans franziu a testa.


 - Não gosta do frio? – ela perguntou, como se isso fosse alguma anormalidade.


 - É gelado e tem neve. – disse, explicando tudo. – Você gosta?


 Ela bufou, impaciente.


 - É claro!


 - Porque? – eu realmente não conseguia entender como alguém podia gostar dessa época do ano.


 - As nuvens escuras e o vento batendo na janela me inspiram. – justificou e tomou um gole de suco. – É a época em que eu faço as coreografias mais graciosas e criativas.


 É difícil admitir, mas isso é uma coisa que eu ia gostar de ver.


 - Qual seu maior sonho? – prossegui, bebendo um longo gole de suco para engolir o frango.


 Evans fez um gesto com as mãos, pedindo para eu esperar, enquanto engolia sua porção de batata.


 - Meus sonhos mudam de um dia para o outro. – respondeu, simplesmente, dando de ombros.


 Hum?


 - Como assim? – perguntei, com uma careta de confusão. Eita, menina complicada, viu?


 - Gosto de levantar de manhã e escolher um sonho para realizar naquele dia. – contou.


 Era um hábito e tanto.


 - Qual foi seu sonho hoje?


 - Aprender a cantar. Foi o mesmo sonho de ontem, mas como não consegui realizar ontem, acumulou para hoje.


 O porque de ela querer aprender a cantar, é um mistério para mim.


 - Sim, mas... – comecei. – Não tem nenhum sonho permanente?


 Evans deu um sorrisinho tristonho.


 - Tem você. – respondeu, em um sussurro.


 Senti a garganta e pigarreei. Talvez fosse a hora de dizer para ela que eu já estava cansado de ouvir a mesma mentira todo santo dia.  


 - E o seu sonho, James? – perguntou Evans, e parou tudo o que estava fazendo para prestar atenção, como se realmente quisesse saber.  


 Eu não estava confortável para falar disso.


 - Ainda não tenho nenhum. – desconversei, sem olhar para ela, remexendo a comida.


 - Qual é. – fez Evans. – Todo mundo tem um sonho.


 Eu poderia ter dito que o meu sonho era Anne. E não estaria mentindo, pelo menos não totalmente. Mas a verdade era que Anne era só uma parte do meu sonho. Então me peguei contando à ela sobre a outra parte, aquela que realmente importava para mim:


 - Meu pai tinha um piano de corda. Quando eu tinha cinco anos, ele me ensinou a tocar. E todas as vezes que minha mãe ficava triste, nós dois nos sentávamos no piano e tocávamos para ela. – parei e olhei para Evans, para ver se estava me ouvindo. Ela estava deitada nos braços, sobre a mesa, acompanhando tudo o que eu dizia. – Eu tinha oito anos quando ele morreu e tivemos que vender o piano para arcar com as despesas. E minha mãe passou o resto do ano chorando toda noite, sozinha, no quarto. O que acabou comigo, porque eu não tinha mais o piano para tocar para ela e deixa-la feliz.


 Evans tinha uma expressão desolada no rosto. Ela estava... triste por mim?


 - Sinto muito. – sussurrou e esticou o braço para pegar minha mão. Não deixei. Puxei o braço para longe do dela.


 - Ela ainda chora às vezes. – continuei. – E eu continuo sem um piano.


 A garota fez que sim com a cabeça, compreensiva.


 - É esse o seu sonho? – perguntou. – Um piano?


 Franzi o nariz.


 - Você me acha um idiota, né?


 Evans bufou e ajeitou os óculos.


 - Claro que não. Porque acha isso?


 - Não sei. Anne me acha um idiota. Disse que eu devia gastar minhas economias com outras coisas. Talvez eu deva esquecer o passado e voltar toda a minha atenção para o futuro. Talvez o piano nem significasse tanto assim. – eu ri de mim mesmo. – Por Merlin! Minha mãe nem sabe tocar piano! Porque eu daria um piano à ela?!


 Evans se endireitou na cadeira e suspirou, a comida esquecida no prato.


 - Primeiramente, esqueça a opinião da Blake, falou? A cabeça dela tem tanto espaço que daria para um avião aterrissar. – tentei segurar a risada, mas não deu. E me senti culpado por rir. Droga, Anne é minha namorada, não posso rir quando falam mal dela! – Segundo: você está pensando demais.


 Revirei os olhos, impaciente.


 - E quer o que? Que eu pare de pensar?


 - Obviamente! Se é um sonho, tem que vir do coração, James. – disse e colocou a mão no próprio peito, do lado esquerdo. – Você tem que parar de pensar se é certo ou errado. Se tem uma coisa que eu aprendi, é que não precisa estar certo o tempo todo. – e então sorriu. – Tudo bem cometer alguns erros.


 Era um ótimo conselho. Me fez perguntar a mim mesmo de onde ela tinha tirado aquilo, quem tinha dito isso à ela, ou se era essa a sua filosofia de vida (vai ver era por isso que arranjava tantos problemas).


 Ora, mas porque eu sempre tinha que julgar como errado tudo o que ela me dizia? Era só um conselho. Eu podia aceitar, não podia?


 Presenteei-a com um sorriso. Nunca pensei que, algum dia dessa minha vida, fosse receber conselhos da Evans. Fazer o que, né? Vou relevar dessa vez.


 - Viu? – disse Evans, com um sorriso maroto. – Não sou tão ruim assim.


 Eu ri, balançando a cabeça negativamente.


 - Você é encrenca, Evans.


 


 


N/A: agora vocês entenderam o porque de o titulo do capitulo ser ‘vale-beijo’. Espero que esse aqui esteja um pouquinho melhor do que o último. Por falar nisso, eu coloquei a imagem que estava faltando no último capitulo, quem quiser ir dar uma olhada...


 Bom, o próximo capítulo pode ou não chegar na semana que vem. Quem vai decidir são vocês, porque eu estou dependendo de comentários, falou? É o que eu como no café da manhã.


 Pessoal, sobre a serenata da Lily, como ela não é cantora, gostaria que todos vocês imaginassem a voz dela como a da Alanis Morrisete (alguém já ouviu falar?) que não tem lá uma voz maravilhosa, mas cujas músicas sou apaixonado.


 Resposta aos comentários:


 And Allegra: ei, eu vi você aqui na fanfic uma vez e depois nunca mais... Deu fora? Tá tão ruim assim?


 L.Oliveeira: eai, colega, beleza? Eu sei que demorei, sei que não tá tão bom assim, sei que o capítulo tá grande demais e sei também que você nem deu as caras aqui na ultima postagem. Mas eu resolvi que ia responder um comentário seu que envolvia sua torcida para rolar uma briga. Bom, eu tenho uma novidade para você: vão rolar TRÊS, meu bem! MUAHAHAHAHAHAÁ [risada maquiavélica]. Quanto ao Stephan, relaxe e prepare-se para odiá-lo ainda mais, porque a coisa com ele vai ficar feia...


 Neuzimar de Faria: como assim as garotas tem porque gritar pelo Taylor Lautner?! Poxa, Neuzimar, e eu aqui achando que você era uma senhora de respeito... kkkkkkkk brincadeira. Mas ainda não acredito que você acha isso. Francamente, ele nem é tudo isso, tá? De qualquer maneira, Marlene e Lily vão fazer uma super dupla dinâmica (nada de sertaneja, Merlin me livre) porque as irmãs Blake acabaram de colocar o nariz onde não foram chamadas e, cá entre nós, o bicho vai pegar...


 Lana Sodré: veja bem, a serenata da Lily tem mais chances de dar problema do que de dar resultados positivos... Não sei você, mas eu acho a Anne também não vai gostar nada desse plano maluco (acho que alguém vai sair na porrada por aqui... Mas eu só acho, sabe?). A parte boa, é que teremos mais alguns personagens entrando na encrenca, e eu acho que as coisas vão começar a esquentar por aqui (até porque já passou da hora, né?)...


 Helena Alevato: cadê você, mulhé?


 Maria_Fernandes_99: LOL? Sério que o capítulo ficou tão ruim assim a ponto de você nem se dar ao luxo de criticar? [Thomas chateado]


 Maria Clara Pereira Garcia: OI! Leitora nova? Nunca tinha te visto por aqui, mas... SEJA BEM VINDA!!! [fogos de artificio]. Poxa, fico feliz que esteja gostando da fanfic. Desculpe pelos atrasos, de verdade, eu não faço por querer... De qualquer maneira, o próximo eu espero que chegue logo. E continue comentando, ok? Diga o que acha, pode interagir com a fanfic, me deixa muito feliz.


 


 Enfim, 27 páginas de mais enrolação... Até eu to ficando entendiado.


 


Abraços,


Thomas. 

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Comentários (3)

  • L.Oliveeira

    Primeiro, ao capítulo: O JAMES É DA LILY E SOMENTE DELA! DISTRIBUIREM CRUCIO NESSAS VADIA! Sério, a Lily AMA esse garoto. Ele tem que parar de pensar. Viu como ela é fofa? Adorei esse capítulo|! Não diga que está ruim u.u e o Remus tomando atitude foi a melhor! Tá certo, colega! Depois, Lene está hora de ver que você estava com ciúmes, SIM! HAHAHASegundo: BRIGA? TRÊS?! AMOOOOOOOOO! E eu não dei as caras porque eu não estava mexendo no computation, porque mamis não deixou. Mas olha só, comentei nos dois, viu? E amei os capítulos! Vê se não demora u.u 

    2013-07-26
  • Neuzimar de Faria

    Mas esse capítulo ficou o máximo! Divertido e doce ao mesmo tempo. Os casais se definindo, James entrevendo as qualidades da Lily ... que ela sabe ser respeitosa e meiga (quanto cuidado ao tratar o elfo!). Ia ser bem legal se, em algum momento da história, ela desse a ele um piano e ele tocasse para ela dançar (se ele, cabeça-dura, aceitasse o presente, é claro). Uma pequena reunião em família da qual a mãe dele participaria também. Ele conhecendo a Lily ainda mais...E a Lily está ficando expert em conselhos, não é? Conselhos para o Remus e até para o James, quem poderia imaginar?! Tomara que a Kate não fuja do Remus e que o Sirius dê uma chance p'rá Marlene, coitadinha da criatura completamente de quatro por ele.Ah, também ficou bem legal os personagens conversando com os leitores.  Enfim, 27 páginas da mais pura diversão. Quero mais !!! 

    2013-07-23
  • Lana Silva

    Que pura enrolação nada. Eu adorei o capitulo. Tipo... Que perfeito. James reparando na Lily, no sorriso dela, em como ela não é só uma encrenqueira como ele realmente acha que ela é. Reparando até que Lily tem curvas kkkkk achei tão fofo, ele tentando não sorrir e uma hora para de tentar não sorrir para Lily. É claro que ele ainda acha que ela mente pra ele quando diz que gosta dele, mas uma hora vai entender que Lily o ama! Blake é uma grande idiota, ficar desencorajando os sonhos do garoto, vê se pode isso ? Com uma namorada dessa ninguém precisa de inimigo... Sirius as vezes é tão idiota... Se fosse comigo já teria deixado ele a mais tempo. Acho que esse amigo da Lene pode ajudar Sirius a notar que Marlene tá ali... Vai correr da outra Blake, que também é uma idiota e dá nisso. Eu amei o capitulo, li rindo de um monte de coisa, você está de parabéns, porque a fanfic cada dia fica mais perfeita. E diga ao Reminho que a gente - pelo menos eu - prefiro ele ao Stephan... E quero saber o que aconteceu depois do beijo Remus/Kate *-*Beijoos! 

    2013-07-21
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