A Balada



Chorei. A dor física era muito forte, mas a interna era ainda maior. Dilacerada, completamente... era o que eu estava. Faltava o ar dos pulmões a me preencher. “Força”, disse uma das irmãs ao meu lado. Força? Para que eu precisaria de força? A minha força teimosa dos últimos meses não me levara a lugar nenhum. A constância de meu gênio me domava, e com ela eu seguiria. Mais do que retraída e introspectiva, eu era, sim, persistente. Lutara por um amor que não era verdade. Naquele instante do choro, eu só pensava no rosto dele, e esperava que um dia pudesse revê-lo. O rosto e o homem.


Quando ele passava a cavalo perto de casa, eu me escondia no jardim para fitá-lo, tímida e distante. Agora ele estava lá novamente, inventando desculpas para explicar tão demorada ausência. Não diria, jamais, que estivera enfeitiçado pela filha do lunático da colina. Não contaria que ela esperava um filho. Ele próprio não acreditara quando eu finalmente cedi e o libertei, julgou-me insana, julgou-se louco.


Desde o dia em que lhe ofereci água com amortentia, a poção do amor mais forte que encontrei, ele viveu comigo, e foram tão doces abraços, tão ardentes beijos... e eu ignorava a obsessão desmedida que demonstrava por mim. Colada em seu corpo, eu me derretia e esquecia o frasco bem guardado em meu armário, selado para ser aberto novamente dentro de algum tempo. E quanto não me senti feliz com as provas de amor, com as palavras de afeto! Amor, afeto... eu sabia que era falso, doía-me no fundo da alma ver-lhe as pupilas vazias. E quando dizia meu nome... Mérope, Mérope... o timbre de sua voz me machucava.


Ele não me amava e eu sabia. Não era correto dar-lhe a poção e eu sabia. Eu sabia de todos os erros que me conduziram e poderia tê-los evitado, mas não o fiz. Não lutei contra meu gênio porque o sentimento em mim era muito maior do que a razão e gritava. E quando decidi não lhe dar mais o preparado, foi porque a tristeza era enorme e me sufocava. Se eu havia ido até ali, deveria seguir. Era o ponto sem volta, eu mesma havia decidido. Porém eu percebia cada vez mais claramente a falta de amor e isso me rasgava. E novamente eu ignorei minha consciência e segui meu coração.


Quando ele me viu, lágrimas em meus olhos escuros, e principalmente quando ouviu de meus pálidos lábios tudo o que devia ser dito, eu pude sentir o silêncio plúmbeo. Então ele explodiu, nunca eu ouvira tamanhos xingamentos e palavras perversas... mas não eram injúrias. Agüentei calada ele liberar sua raiva e ao fim pedi... com desespero e arrependida pela interrupção da amortentia que Tom... fica comigo... mas nem a minha gravidez o fez ficar.


Chorei e vaguei e vaguei e chorei. Por meses, comi mal e dormi ao relento, não queria voltar à nossa casa, embora o peito me mandasse pedir perdão. No fim, e é sempre no fim, o orfanato me pareceu adequado. Eu estava tão mal... estranhei até o calor.


Mas o que ouço agora? “O nome, querida, o nome”. Mais uma vez a irmã. A dor se foi, pois o choro de uma criança afasta todos os pensamentos ruins... ainda mais quando essa criança é seu filho. O aperto em minha garganta ainda existe, mas já não incomoda. Fecho os olhos e está cômodo, quero dormir. “Qual o nome do seu filho?”. Ela insiste tanto... deve importar... sei que não devo fazer isso, mas... Tom. Tom Servolo Riddle, uma homenagem ao homem que me rejeitou e ao pai que me prendeu por tanto tempo. E embora meu esposo... talvez esposo... esteja tão longe, eu ainda o amo. Amo demais para admitir de outra forma que não essa. Sei que é um erro relegar a uma criança um nome tão carregado de lembranças nefastas, mas não penso em outro agora. Meu coração me trouxe até aqui, meu coração dará nome ao meu rebento. Sim, elas estão dizendo mais alguma coisa. Não consigo abrir os lábios como me pedem, sinto não ter boca ou nariz, o ar não me entra mais. Meus pulmões param e o choro está longínquo.

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Comentários (1)

  • Violettaa

    Perfeito dramático...triste.... Coitado do Tom bebe abandonado por uma mãe louca de paixão e cega... Que não teve nem vontade de viver por amor ao seu próprio filho.. Capitulo perfeito...=P 

    2012-10-15
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