Pode você me culpar?

         Harry,

  Hoje fujo do usual para te escrever sem medir minhas palavras ou suas consequências. Depois de tantos anos, trago à tona o que pode vir a ser nossa ruína, mas, pela primeira vez, não me importo com a catástrofe que virá. Espero que você possa ver que não há por que perder o controle. Espero também que possa ficar tudo certo, embora o nosso certo tenha se perdido anos atrás. Enfim…

   Harry, você realmente escuta as conversas dos nossos olhares? Pergunto, carinho, porque me soa impossível a sua ingenuidade em relação a isso. Impresso nos seus orbes verdes e refletido nas minhas pestanas castanhas está o retrato perfeito do nosso amor. Amo-te Harry, com toda a minha lealdade grifinória, amo-te. E sou irrevogavelmente sua, mas você parece não notar. Ou talvez não possa notar. Ou evita notar. Seria… Doloroso demais, eu sei. 

   E, se prestar um pouco mais de atenção, poderá ver o fantasma de um olhar de perda em meu rosto e enfim escutar o silêncio barulhento de uma mulher que ainda espera seu amor, mas já não pode tê-lo, embora o possua da forma mais terna e eterna que pode existir. Oh, Harry… Tento voltar naquela dança que jamais existiu para reparar minha falha, para enfim te ter em meus lábios e em mim, do jeito que deveria ter sido. Porém, não posso consertar o que não existe, não posso formar um passado de ilusões para finalmente ter o presente dos sonhos. 

   Fizemos nossas escolhas, eu sei. E, deus, você a ama tanto quanto eu o amo, mas nós nunca os amamos o suficiente. Eu sei disso também. Como pode ver, ainda sou aquela sabe-tudo irritante vital e dona de todos os seus segredos. E você ainda é o melhor amigo, o vital, o íntimo. O quase irmão, como tanto falam e como falamos, também. Mas ninguém é ‘quase irmão’ e nosso erro foi pensar que poderíamos ter sido.

   Numa inocência quase infantil, sem querer machucar ninguém, pergunto-te se, antes de dormir, você também se pergunta: e se? E se não fosse ruivo o tom dos cabelos que eu vejo pela manhã? E se nós estivéssemos juntos? E se…?

   Porém, ao apertar sua mão por puro instinto, ao ir com você sem pestanejar, ao ver você precisando de mim a cada indispensável segundo, passo a entender. Talvez por romance ou destino, estamos fadados a um amor conhecido, porém omitido e não menos sincero. E pode alguém me culpar por ter me rendido a ti? Por ter visto o quão certo soava nós dois envelhecendo juntos em lugar nenhum? Por ter visto o que nenhum outro alguém pode ver? Pode alguém te culpar, sob essas mesmas circunstâncias? Pode nós, nos culparmos?

   Harry, pode você me culpar?

       Daquela que te ama e te é eterna,

              Hermione Jean Granger (Potter) Weasley

P.s.: observe como seu sobrenome teria se encaixado perfeitamente no meu.

Fim

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