Único
Em uma sala brega
Sentei-me no sofá surrado e florido, olhando sugestivamente para o carpete mal-polido e as cortinas desbotadas. Lembrei-me da grama mal-aparada em frente à casa, da cerca mal-pintada, do jardim mal-cuidado. O carro que me trouxera até ali tinha a pintura arranhada. O bairro em que se encontrava a casa era simples. O cachorro que me recebera na porta era um vira-lata sem raça específica.
Agora eu me pergunto: como eu – um Malfoy elegante, podre de rico e de sangue puro – vim parar neste lugar? Como? E repito: como?
Bem que meu falecido pai havia me avisado. Ele havia me dito que ficar com ela – vulgo: Hermione Granger – não iria dar certo. E acho que, mesmo estando mais velho e mais acabado do que um elfo doméstico, meu pai estava certo. Afinal, se eu tivesse escutado suas sábias palavras, não estaria sentado nessa sala brega.
Não, espere. Devo reformular a frase. Eu não estaria sentado nessa sala brega com um velho na minha frente, me encarando como se eu fosse a reencarnação de Voldemort. Vulgo dizer que este velho sentado na minha frente é o homem que minha adorada Hermione chama de pai.
O Sr. Granger é um homem idoso, que anda com uma bengala – por causa de um problema na perna direita, imaginei -, usa óculos de lentes mais grossas que o meu pulso e está começando a ficar enrugado. Ou seja, não consegue fazer mal nem a si mesmo. E, mesmo sabendo de todas as limitações do homem, eu estou completamente apavorado.
Ele tem sobrancelhas grossas e olhos escuros, cabelos negros com alguns fios grisalhos. Não tinha barba. Podemos dizer que o sr. Granger não é exatamente um pessoa de rosto amigável.
Continuo me perguntando se vale a pena passar por tudo isso, sendo que a causadora de tal fato é a sangue-ruim da Granger.
Tenho certeza absoluta de que você deve estar me achando um covarde de primeira, mas é bom parar com isso. E não é pelo fato de eu não ser, em hipótese alguma, covarde – óbviamente -, mas sim pelo fato de eu, Draco Malfoy, estar sentado nessa sala brega não apenas na presença incrivelmente agradável do sr. Granger, mas sim na presença de mais dois indivíduos.
Assim, reformulo nossa frase. Eu não estaria sentado nessa sala brega com um velho na minha frente me encarando como se eu fosse a reencarnação de Voldemort e mais dois dícipulos em seu encalso. Deu pra acompanhar?
Afinal, na minha frente estavam, não necessariamente nessa ordem: O-Menino-de-Cicatriz-na-Testa, o sr. Granger – tenhamos respeito – e o Cabeça-de-Cenoura (leia-se: Harry Potter, sr. Granger e Ronald Weasley).
Quem aqui entende o meu assombro?
Pois é... O pai de Hermione mais os dois patetas que se diziam seus irmãos estavam me encarando com uma expressão idêntica de desconfiança.
Ah, sim. Porque é que eu estou aqui mesmo? Por causa da sangue-ruim da Grager.
Sabe, eu não estava com medo deles – com a exceção do sr. Granger. Eu nunca teria medo deles. Não por mim. Eu estava com medo por nós. Afinal, Hermione levava à sério a opinião dos três e queria que me aceitassem como seu namorado, pois se não o fizessem... bem... digamos que a coisa iria desandar. Enfim, eu estava com medo de não ser aceito e perdê-la. Perder Hermione.
Estremeci. Valeria mesmo à pena?
Minha pergunta foi respondida quando Hermione entrou andando elegantemente na sala, carregando uma bandeija com várias xícaras de chá, os cachos castanhos balançando conforme ela caminhaca, um sorriso destraído nos lábios rosados, os olhos cor de mel brilhando com felicidade. Hermione usava uma roupa casual, uma calça jeans e uma blusa branca, mas estava – à meu ver – incrivelmente linda.
Bem, é claro que valia a pena.
Ela depositou a bandeija na mesinha de centro e retirou um elástico do bolço, prendendo os cachos em um coque desajeitado. Sorri com o gesto; ela sempre fazia isso quando estava nervosa. Hermione pegou as xícaras e entregou uma à cada um de nós.
Peguei a minha xícara, roçando propositalmente meus dedos nos dela, buscando calma. Hermione se endireitou, sorrindo para todos e jogando um beijo para mim. Ela voltou para a cozinha para ajudar a mãe à preparar o almoço, imaginei.
Bebi o chá com pressa, queimando a língua.
- E então – começou o sr. Granger. – Draco Malfoy, não? – perguntou, levando a xícara à boca.
- Sim, senhor. – respondi.
- Sr. Granger – ele me corrigiu.
Tentei engolir. Não funcionou.
- Desculpe.
Pude ver que ele não gostou, voltando à beber seu chá. Ora, veja só! Meu erro nem podia ser considerado um erro. E, se por um acaso o fosse, foi um erro tão insignificante que não poderia afetar em nada a situação.
O Potter e o Weasley sorriam com meu desconforto. Ah, que ótimo. Agora vou ter que aturar gozação dos patetas.
- Já ouvi falar muito de você, sr. Malfoy.
- Draco – corrigi automaticamente. – Pode me chamar de Draco.
O sr. Granger levantou uma sobrancelha.
- Sou eu quem decide isso. E acho que não temos o mínimo de intimidade para que o senhor se sinta no direito de exigir como me dirijo ou não à você. – disse.
- Sinto muito.
- Não, não sente. Você foi mal-educado e impertinente, isso sem contar que me interrompeu. É esse tipo de educação que quer apresentar aos meus netos?
Por Merlim, eu e Hermione estávamos juntos não havia nem um ano! Sem falar que não tínhamos nem vinte e dois anos de idade ainda. E ele já estava pensando em casamento?
- Me desculpe, sr. Granger. – disse, um pouco irritado. – Não vai se repetir. – garanti.
- Até porque, se voc...
- Não vai se repetir. – garanti novamente, agora verdadeiramente o interrompendo.
O sr. Granger me examinou minuciosamente, os olhos negros mais desconfiados do que realmente deveriam estar.
- Como eu dizia, já ouvi falar muito de você, sr. Malfoy. – continuou ele. – Não apenas por intermédio de minha filha, mas também por parte de Harry e Rony. – continuou, gesticulando para os patetas, digo, rapazes. – E nem sempre as informações proferidas junto do seu nome me foram de total agrado.
- Posso imaginar... – resmunguei, jogando um olhar matador ao Cicatriz e ao Foguinho.
- Você é filho de Lúcio Malfoy, não?
- É óbvio, já que o sobrenome é o mesmo – sussurrei.
- O que?
- Isto é, sim, sr. Granger. – me corrigi.
O homem balançou a cabeça afirmativamente, pensando, me encarando com os olhos semicerrados.
- Ele não foi muito educado para conosco. – comentou o sr. Granger.
- Ele não era educado com ninguém, senhor. – concordou Potter.
- Ele nem educação tinha. – continuou o Weasley.
Fechei minha mão em punho e me imaginei batendo nos três.
- Mas não é meu pai que namora Hermione, sr. Granger. Sou eu. E portanto não é ele que está em pauta aqui. – retruquei. Não sei porque, mas acho que fui mal-educado.
Os três fecharam a cara em unissomo e eu dei um sorriso ironico.
- O que torna a situação ainda pior. – comentou o sr. Granger. – Se bem me recordo, você era um tipo de delinquente no mundo mágico, não?
- Malfoy veio da Sonserina, senhor. É claro que era um delinquente. – disse o Pobretão, sorrindo.
- A Sonserina não influencia minha concepção do que é bom ou ruim, sr. Granger. – retruquei, me sentindo o máximo.
- Mas ainda assim se aliou à Voldemort. – disse o Cabeça Rachada, me jogando um balde de água fria. O sr. Granger balançou a cabeça afirmativamente, concordando, tomando chá. – Ele ainda tem a Marca Negra, se o senhor quiser se certificar. – acrescentou Potter, apontando para o meu braço esquerdo. Eu fechei a cara para todos eles.
O sr. Granger se aprumou no sofá, cuspindo chá e tocindo. Weasley começou a bater nas costas dele.
- ELE TEM UMA TATUAGEM?! – ralhou o velho. Revirei meus olhos. Eu era cúmplice do pior bruxo das trevas de toda a história da magia e o ele estava preocupado com o fato de eu ter uma tatuagem. Era isso mesmo? Ou eu tinha ouvido errado?
- Não acredito... – resmunguei.
Os patetas também pareciam não acreditar.
- O que mais? O que mais ele tem? Um piercing? – perguntou o sr. Granger.
- É claro que tenho um piercing. – eu disse, a ironia acentuada em cada palavra.
O sr. Granger arregalou os olhos, não precebendo minha ironia.
- Um piercing? Onde? – os olhos escuros do homem me analisaram, à procura do suposto piercing que eu tinha adquirido.
‘Tá, agora eu estava irritado.
- Um piercing?! Uma tatuagem?! O que importa?! – explodi, me levantando. – Sabe, eu achava que os pais de Hermione eram tão maravilhosos quanto ela, mas vejo que me enganei completamente. Afinal, que tipo de pessoal julga alguém pela aparência?
Se Hermione e a sra. Granger conseguiram me ouvir, não deram sinal. Mas os olhos do sr. Granger se arregalaram, em ligeira supresa, enquanto os patetas se recuperavam do susto.
Sentei-me no sofá florido, apoiando o rosto nas mãos, detestando aquela sala brega mais do que o necessário. Ah, que ótimo. Eu havia gritado com o pai da minha namorada. Agora sim íamos dar um passo positivo na relação.
Mas ninguém gritou comigo, como eu esperava. Ninguém me expulsou da sala. Potter e Weasley me encaravam, lívidos. Porém, o sr. Granger parecia conformado.
- Meu rapaz – começou ele. – Creio que começamos da pior maneira possível.
- Não vejo como discordar. – eu disse.
- Espero que entenda minha preocupação. Sabe, eu sou pai! – e riu-se.
- Percebe-se.
- Não é nada contra você. Mas quero que saiba que Hermione sempre foi uma mulher independente. Desde pequena não precisava de ajuda e sempre com uma personalidade e tanto. – ele riu-se novamente. Sorri. Eu bem sabia disso. – E agora que ela encontrou você, bem... vejo nela uma confiança em você e fiquei com medo de que não merecece isso, sr. Malfoy. Tenho medo de que ela dependa do homem errado.
Aquilo fez com que eu levantasse a cabeça e olhasse para ele, estupefato. O que?!
- Espere aí, o que? – disse eu. – Sr. Granger, me desculpe, mas creio que entendeu tudo errado. Hermione é linda, inteligente, engraçada e completamente independente. Não percebe? Não é ela que precisa de mim. – declarei. – Sou eu que preciso dela.
Os três homens, supostos defensores de Hermione, tiveram reações diferentes: o Potter me olhou surpreso, mas sem desconfiança; o Weasley me encarou raivoso, deixando claro que não acreditava em uma palavra do que eu dizia; o sr. Granger sorriu para mim, satisfeito com minha resposta.
- Muito bem, Draco. – ele disse. Sorri quando ele me chamou pelo primeiro nome. – Acho que agora podemos almoçar.
X&X
N/A: olha eu aqui de novo, aproveitando mais uma madrugada de insonia para postar fanfics. É, acho que eu não tenho o que fazer mesmo...
Essa foi uma idéia que me ocorreu e eu decidi colocá-la em prática e, como tudo o que eu escrevo, veio parar aqui na FeB.
Bem, a única coisa que peço é para comentárem. Boas opiniões atraem boas idéias.
Beijos,
Thomas Cale.
Comentários (1)
Eu precisando escrever uma fic que tem prazo de entregar.... mas aqui lendo rsrsrsrsrsAdorei a fic! Ficou engraçada e consegui imaginar cada cena que descreveu! Tem alguns errinhos de ortografia/digitação, mas coisas que passam mesmo! Gostei especialmente do: "Não é ela que precisa de mim - declaro - Sou eu que preciso dela"Parabéns!
2012-04-21