Prólogo
( Every rose has its thorn - Poison )
. Quem passasse e visse a cena podia bem pensar que se tratava apenas de mais uma discussão infantil , e talvez o fosse .
A roseira pendia emaranhada ao muro ,há poucos centímetros de sua cabeça . A menina colocava- se na ponta dos pés e esticava os dedinhos mas não conseguia alcançá-la. Começava a irritar-se ; As bochechas pontilhadas de sardas tornavam-se avermelhadas pelo esforço . Era alta para sua idade , todos diziam , e não gostava de não conseguir dar conta de uma tarefa. '' Se ao menos pudesse já usar magia...''
O menino olhou-a curioso por alguns instantes e depois aproximou-se , e pondo-se na ponta dos pés alcançou com facilidade o que ela tentava momentos atrás. Olhou a rosa e a garotinha o fitava ; Grandes olhos azuis observando se ele ousaria ficar com a flor que era dela .
- Toma, fica pra você – ele estendeu a flor em sua direção esperando que ela a pegasse .
Ela pareceu distrair-se com o estranho e tocou o cabo repleto de espinhos sem olhá-lo, largando-o por reflexo ;
- Ai ! – a rosa rolou contra o chão .
- O que foi ?
- A flor ... me espetou . Isso machuca ,
- Lógico que espetou , é uma rosa .
- Mas rosas não deviam picar ,- ela bateu os cílios e as lágrimas rolaram contra sua vontade - picar é coisa ruim, para bichos e tudo o mais ... não para flores bonitas .
Ele pareceu achar graça no comentário , ela não entendeu ;
- Bichos como escorpiões ?
Ela apertou o dedo machucado, refletindo , e confirmou :
- É ,como escorpiões .
O garoto encontrou um lenço no bolso e aparou a rosa do chão ,envolvendo-a nele com cuidado ,depositou-a na mão aberta da menina agora receosa em segurar ; mas ele tomou seus dedos com firmeza e os enrrolou no cabo da flor .
- Pronto , viu ? Agora não machuca mais .- ela não disse nada , só o encarou por alguns instantes. - até as rosas podem te machucar , igualzinho aos escorpiões ,depende do jeito como você a trata .. e ela vai te tratar de volta assim.
- Mentira .
- Por que mentira ?
- Não importa o quão bem você cuide de um escorpião, ele sempre vai tentar machucá-lo . Essa é a diferença ;
Ele não soube o que dizer . No fim das contas , ela não era tão boba quanto as meninas de sua idade que ele conhecia . Na verdade , mostrara-se a mais inteligente . Recolheu as mãos aos bolsos e chutou uma pedra pequenina que encontrou no chão .
- Hey , você ficou triste ? - A menina tombou a cabeça pra o lado e as trancinhas ruivas pareceram murchar consigo .
- Não , só pensando . Papai também diz mais ou menos isso. Que quando se foi mau, as pessoas se afastam por medo .
- Medo que você pique ? Não entendi , você não foi mau . Tentou me ajudar ,
- Não entendo direito quando ele fala também – admitiu -Deve ser algo assim .
O silêncio caiu entre eles . Ambos pareceram refletir sobre aquilo em sua inocência de cinco anos de idade . Por fim ele murmurou .
- Acho que eu sou como um escorpião .
- Ah ?
- As pessoas.. algumas pessoas. As vezes se afastam - ele fitou o grupo de crianças na outra margem do lago . Há alguns minutos atrás brincava com dois dos meninos , até que os pais se apressassem em afastá-los . Não questionou nem insistiu ,já havia acontecido outras vezes . A mãe lhe dissera que não deveria se importar ou jamais sentir vergonha . O pai envergava o rosto e se retirava toda vez que ele tocava no assunto , até que o menino percebeu que aquilo o deixava triste , e não quis incomodá-lo mais .
- Por que ?
- Eu acho... que elas tem medo – não entendia a razão , mas só podia ser isso .
- Que você as espete ?
Ele não pode responder e a menina entreteu-se em afagar uma pétala da bonita rosa que ele lhe ajudara a conseguir .
- Sabe de uma coisa ? eu acho ... que nem todo escorpião deve tentar machucar a gente , né ? Alguns devem até ser legais . Só que tem gente que é boba mesmo . Meu tio diz que a gente nem sempre é tudo que os outros pensam .
- Você acha ? – o rosto infantil se iluminou ao olhá-la, desconfiado
Ela confirmou com a cabeça, feliz – Tenho certeza !
- É , então devem ser mesmo ... – ele abriu o sorriso , embora faltassem alguns dos dentes de leite .
A menina ouviu o soar da voz forte do pai que esperava do outro lado do parque .
Depositou um beijo rápido na bochecha do garotinho loiro , despedindo-se , e correu ao encontro do homem ruivo que a esperava diante a sebe . Ele ficou ali na grama vendo-a se afastar e acenando para ela .
- Scorpius ? Quem era a menina com quem estava falando, filho ?
Era sua mãe , e ajoelhou-se ao seu lado pegando as mãos dele nas suas .Notou no polegar uma gota de sangue pequenina que ele sequer tinha percebido .
- O que foi isso , Scorp ?
- Uma rosa, mãe – a menina já ia longe carregada pelo pai , o pequeno queixo apoiado no ombro dele e a florzinha presa à uma mão enquanto a outra acenava . – ela machuca um pouquinho, às vezes , mas descobri que não me importo muito com isso . Posso gostar de rosas , pensou , então há quem possa gostar de escorpiões . O tio dela deve ser um cara que sabe das coisas ...
E sorriu sem saber bem porque .
------------------------ x ------------------------
Comentários (2)
Que coisa mais linda! Uma linguagem super bem trabalhada e uma carga de pura inocência... Vou acompanhar, com certeza. Adoro ler fics em que as crianças protagonizam (pelo menos alguma parte), a gente sempre aprende com a visão simples de mundo que elas tem. Quase sempre elas estão certas sobre as coisas. E eu, simplesmente, adoro essa metáfora da Rosa e do Escorpião *-*
2011-12-23Aiin que fofo *-*
2011-12-22